Documentos secretos revelam: Lula fez lobby para Odebrecht em licitação na Guiné
Os papéis do Itamaraty também mostram
que o ex-presidente usou o nome de Dilma Rousseff junto a presidentes
africanos
Na manhã de 13 de março de 2013, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva embarcou em São Paulo num jato Falcon 7x, fretado pela construtora Odebrecht, rumo a Malabo, capital da Guiné Equatorial. O país é governado há 36 anos pelo ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, com quem Lula mantém excelentes relações. Lula se encontrou com empreiteiros brasileiros, que reclamavam da demora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, e do Banco do Brasil para a liberação de financiamentos de obras na África. Em seguida, esteve com o vice-presidente da Guiné, Ignacio Milán Tang.
Falou como homem de negócios. Disse que estava ali para conseguir
contratos para a Odebrecht. Usou sua influência sem meias palavras. O
mais poderoso lobista da Odebrecht entrava em ação.
A embaixadora do Brasil em Malabo, Eliana da Costa e Silva Puglia,
testemunhou a conversa. “Lula citou, então, telefonema que dera ano
passado ao Presidente Obiang sobre a importância de se adjudicar obra de
construção do aeroporto de Mongomeyen à empresa Odebrecht (este
aeroporto servirá às cidades de Mongomo, terra de Obiang, e à nova
cidade administrativa de Oyala)”, escreveu a diplomata, em telegrama
reservado enviado, logo depois do encontro, ao Itamaraty.
“Adjudicar” é um termo jurídico comum em contratações de órgãos
públicos. Costuma designar o vencedor de uma licitação. Em português
claro, portanto, Lula havia pedido ao presidente da Guiné que desse a
obra do aeroporto à Odebrecht. E, como bom homem de negócios, fazia,
naquele momento, questão de reforçar o pedido ao vice-presidente.
O relato sigiloso da embaixadora em Malabo, revelado agora por ÉPOCA, é
a evidência mais forte de que Lula, após deixar o Planalto, passou a
atuar como lobista da Odebrecht, ao contrário do que
ele e a empreiteira mantêm até hoje. ÉPOCA já havia mostrado, também por
meio de telegramas do Itamaraty, que Lula fizera lobby para a Odebrecht em Cuba, junto aos irmãos Castro – chegara a usar o nome da presidente Dilma Rousseff para assegurar que o BNDES, continuaria financiando obras no país, como de fato continuou.
O caso da Guiné, no entanto, é ainda mais contundente. A diplomata
brasileira flagrou Lula numa admissão verbal e explícita de que ele
agia, sim, em favor da Odebrecht. Naquele momento, o governo da Guiné
tocava uma licitação para as obras de ampliação do aeroporto. A Andrade Gutierrez,
outra empreiteira brasileira, também participava da concorrência, mas
não contou com a ajuda do ex-presidente. Lula, ao menos nesse contrato,
tinha um único cliente. Um cliente VIP, de quem o petista recebia
milhões de reais – apenas por palestras, garantem ele e a Odebrecht.
O telegrama da Guiné compõe um conjunto de documentos confidenciais,
obtidos por ÉPOCA, sobre as atividades de Lula e da Odebrecht em países
que receberam financiamento do BNDES. Esses papéis estão sendo
analisados pelo Ministério Público Federal em Brasília. Como revelou ÉPOCA em abril, os procuradores investigam Lula oficialmente. Ele é suspeito de tráfico de influência internacional,
um crime previsto no Código Penal, por atuar em benefício da maior
construtora brasileira, envolvida no petrolão.
Os documentos obtidos por
ÉPOCA demonstram que Lula percorreu a África atrás de bons negócios
para a Odebrecht e outras empreiteiras, das quais também recebia por
“palestras”. Como no caso de Cuba, usou o nome de Dilma. Os papéis
mostram, também, que Lula, ainda na Presidência, marcou reuniões de
empresários africanos com o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, o que
contradiz a versão do executivo sobre as relações do petista com ele e o
banco.
Surgem cada vez mais fatos que contradizem Lula e sua versão de que
nunca fez lobby para a Odebrecht e outras empreiteiras. Na última
semana, o ex-presidente foi citado num relatório da Polícia Federal na Operação Lava Jato que mostra uma série de trocas de e-mails de
executivos da Odebrecht. Numa dessas mensagens, enviada em fevereiro de
2009, o ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,
Miguel Jorge, diz a um assessor especial de Marcelo Odebrecht,
presidente do grupo, que o “PR fez o lobby” para a construtora numa obra
na Namíbia, na África. “PR”, segundo os investigadores, significa
Presidente da República, cargo ocupado por Lula na época dos fatos.
As reuniões de Lula na Guiné deram início a um tour de negócios pela
África. Ele passaria em outros três países. Dois dias depois do encontro
com o vice-presidente da Guiné, Lula chegou a Acra, capital de Gana.
Foi recebido com pompa pelo chefe de Estado do país, John Dramani
Mahama. Sem muitos rodeios, numa conversa privada, Mahama pediu o apoio
de Lula para conseguir junto às autoridades brasileiras a liberação de
uma linha de crédito no valor de US$ 1 bilhão
destinada ao financiamento de projetos de infraestrutura. Segundo
registro feito num telegrama reservado do Itamaraty, o presidente ganês
“frisou que o apoio do ex-presidente Lula a essa sua demanda serviria
para facilitar e acelerar as necessárias negociações relativas à
aprovação do crédito”.
Após ouvir atento o pleito de seu colega, o líder petista encontrou uma
solução. Destaca a mensagem diplomática: “O ex-presidente Lula disse
acreditar que o BNDES teria condições de acolher a solicitação da parte
ganense e, nesse sentido, intercederia junto à presidenta Dilma
Rousseff”. A pedido de Lula, o presidente de Gana entregou uma nota
formalizando a solicitação de crédito. Quatro meses depois, no dia 19 de
julho de 2013, o BNDES abriu seus cofres e liberou para um consórcio formado, sim, pela Odebrecht e pela Andrade Gutierrez a contratação de US$ 202,1 milhões
(R$ 452,7 milhões, em valores da época) para a construção de uma
rodovia em Gana. A taxa de juros do empréstimo é a segunda menor
concedida pelo BNDES de um total de 532 operações voltadas para a
exportação. O prazo para o pagamento da dívida também é camarada: 234
meses, ou seja, 19,5 anos, bem acima da média de 12 anos praticada pelo
banco.
De Gana, Lula seguiu para Benin, acompanhado de
empreiteiros presos na Lava Jato, como Léo Pinheiro, da OAS, e
Alexandrino Alencar, da Odebrecht. Num encontro reservado com o
presidente de Benin, Boni Yayi, Lula expôs as dificuldades para a
liberação do empréstimo pelo BNDES para o país. “(Yayi)
solicitou apoio do ex-PR Lula para a flexibilização das exigências do
COFIG/BNDES”, diz um telegrama. O Comitê de Financiamentos e Garantias
(Cofig) é o órgão que auxilia na análise de diversas demandas de
operações de crédito para a exportação feitas no BNDES. Os empresários
brasileiros tiveram a oportunidade de prospectar projetos de
infraestrutura. “Embora o tom da visita, por parte do Instituto Lula,
tenha sido mais de cortesia e amizade, o evento ajudou a dinamizar as
discussões em torno da relação entre atores privados dos dois países e,
principalmente, atraiu a atenção de empresários brasileiros para o
potencial de investimentos no Benin”, diz o telegrama. A aventura de
Lula na África era um sucesso.
O OUTRO LADO
Procurado por ÉPOCA para esclarecer os e-mails apreendidos pela PF, o ex-ministro Miguel Jorge disse que Lula agiu de forma apropriada.
“Se o lobby é feito sem nenhum interesse de lucro pessoal, todo
ex-presidente e ex-ministros deveriam usar sua influência em favor das
empresas de seu país. Lula, por exemplo, cobra cerca de US$ 200.000 para
dar uma palestra para cerca de 300 pessoas, sem promover um produto
específico, enquanto o ex-presidente americano Bill Clinton cobra cerca
de US$ 300.000”, disse. Questionado sobre o fato de Lula receber
dinheiro da Odebrecht, sua maior cliente, para dar palestras em países
onde a construtora possui obras financiadas pelo BNDES, Miguel Jorge
respondeu: “Aí, é uma avaliação que não é tão fácil de fazer”.
O Instituto Lula, por sua vez, disse que processará jornalistas de ÉPOCA.
“A diplomacia presidencial contribuiu para aumentar as exportações
brasileiras de produtos e serviços, que passaram de US$ 50 bilhões para
quase US$ 200 bilhões”, disse o Instituto. “Temos a absoluta certeza da
legalidade e lisura da conduta do ex-presidente Lula, antes, durante e
depois do exercício da Presidência do país, e da sua atuação pautada
pelo interesse nacional”, disse o Instituto, em nota. Quanto à
investigação do Ministério Público sobre Lula, o Instituto Lula afirmou
que “há a afirmação textual do procurador de que não há elementos que
comprovem nenhum ilícito e que a abertura do inquérito deu-se para
estender o prazo”. Por fim, o Instituto disse que “não há o que comentar
sobre supostos documentos mencionados pela revista sem ter conhecimento
da íntegra desses documentos sem manipulações, para oferecer a resposta
apropriada, se for o caso”.
O BNDES disse que “todos os contatos entre o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e o então presidente Lula ocorreram dentro do papel institucional de
cada um e da mais absoluta lisura”. Afirmou o banco: “Faz parte da
rotina do presidente do BNDES receber empresários e representantes de
países estrangeiros. A tramitação das operações de financiamento do
BNDES obedece a um processo de análise rigoroso e impessoal, envolvendo
mais de 50 pessoas, entre equipes técnicas e órgãos colegiados”.
Procurada, a Odebrecht Infraestrutura diz que mantém uma relação institucional
com o ex-presidente Lula e que ele foi convidado para fazer palestras
em eventos voltados a defender “as potencialidades do Brasil e de suas
empresas”. A empresa diz que apresentou proposta para o projeto do
Terminal do Aeroporto de Mongomoyen, na Guiné Equatorial, mas não foi
vencedora na licitação. A construtora também disse que os trechos de
mensagens eletrônicas apontadas em relatório da Polícia Federal apenas
registram uma atuação institucional legítima e natural nos debates de
projetos estratégicos para o país. A companhia lamentou a divulgação e
“interpretações equivocadas dos e-mails”.
As investigações do Ministério Público Federal no Distrito Federal sobre a suspeita de tráfico de influência internacional
praticado pelo ex-presidente e a Operação Lava Jato poderão confluir em
algum momento. Os investigadores de Brasília já pediram à força-tarefa
de Curitiba o compartilhamento de provas. Procuradores da capital
federal apuram se os cerca de R$ 10 milhões pagos pelas empreiteiras
envolvidas no Petrolão para a LILS, empresa de palestras de Lula,
tiveram origem lícita e uma contraprestação de serviços. Caberá,
portanto, ao Ministério Público indicar se há elementos que justifiquem a
denúncia do ex-presidente.
Clique para saber mais sobre os malfeitos de Lula em Cuba - mais roubalheira
Ler na íntegra em Época
http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/10/documentos-secretos-revelam-lula-fez-lobby-para-odebrecht-em-licitacao-na-guine.html