O jantar que lembrou um saidão de Natal da Lava Jato avisa: Alckmin esqueceu o que Lula fez nos últimos 15 anos
A ocupação das mesas evocava a definição do crime de formação de quadrilha ou bando
(Pausa para a visita de lembranças longínquas. Como no resto do mundo, na Taquaritinga em que vivi até o fim da adolescência ocorriam combinações estranhas, alianças bizarras, malabarismos eleitoreiros de alta periculosidade. Mas também para essas acrobacias havia limites, demarcados pelo sentimento da honra. Era a vergonha na cara que riscava a difusa fronteira que separa a crítica feroz da infâmia intragável. “Vejamos o exemplo elementar: um homem íntegro não pode admitir que o qualifiquem de ladrão”, ensinava o advogado Carlos Pastore, que inibia com uma advertência soberba quem cruzasse a linha inviolável: “Considere-se proibido de me saudar”. Se não reagisse com altivez à ultrapassagem dessa barreira, políticos gravemente insultados perdiam o respeito da própria família, começando pela mulher, dos amigos e dos eleitores.)
Estaria preocupada com os destinos da nação a roda que reunia Gleisi Hoffmann, Aloizio Mercadante,e Paulinho da Força e Andrés Sanchez, ex-presidente do Corinthians?
Às vésperas de outro ano eleitoral, todos acordam e dormem buscando a melhor maneira de extrair das urnas de 2022 um cargo vistoso, um gabinete de bom tamanho e gordas verbas federais. Esses atrativos justificam a presença no restaurante de deputados, prefeitos e governadores de diferentes partidos. Estava lá até Arthur Virgílio Neto, que acabou de fracassar nas prévias promovidas pelo PSDB para a escolha do candidato ao Planalto. A exemplo de Alckmin, o ex-senador e ex-prefeito de Manaus está caindo fora do ninho cada vez mais inóspito. O que se desconhecia é a disposição amnésica de Virgílio.
Há 15 anos, ele prometia no Senado punir com “uma surra” o conjunto da obra de Lula. Repetiu a ameaça com tamanha insistência que o presidente baixou no Amazonas para dedicar-se pessoalmente a impedir a reeleição do inimigo. Afastado do Senado, Virgílio parecia um pote até aqui de mágoa antes de aparecer no jantar. O sorriso fácil avisou que a fila puxada por Alckmin vai crescendo. Nela só existem vagas para quem faz de conta que, de 2006 para cá, não houve o julgamento do Mensalão, a Lava Jato, o Petrolão, a prisão de Lula. É tanta coisa que é melhor esquecer.
O prêmio a dividir é o posto de vice de um titular que, se eleito, assumirá a chefia do governo com 76 anos de idade. A questão biológica favorece Alckmin, um quase setentão. Em 2002, o PT recitava que a “esperança vencera o medo”. Passados 20 anos, o medo cresceu. A súbita conversão de um fundador do PSDB mostra que desta vez a esperança venceu a vergonha.
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Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste