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domingo, 3 de janeiro de 2021

Canto da Sereia e o Bafo do Dragão - DefesaNet

Carlos César Reis de Oliveira
Licenciado em História
Especial para DefesaNet

Canto da Sereia e o Bafo do Dragão

Nas últimas duas décadas, a República Popular da China - RPC teve uma mudança radical na forma como participa na economia mundial. Com mão de obra farta e barata, ela atraiu todo tipo de empresa. Que viam, ao investirem lá, uma oportunidade ímpar de reduzirem seu custo de produção, aumentando sua lucratividade. 

De quebra teriam a possibilidade de ofertarem parte de sua produção ao mercado interno da China. Cujo potencial, na casa do um bilhão de habitantes era algo irresistível. Em troca teriam de transferir parte da tecnologia e ter um sócio local. Este contexto era o que podemos dizer o “Canto da Sereia”. E como tal, ilude e cega! a quem se deixa conquistar por algo fácil de mais.
 
Os novos sócios dos investidores estrangeiros eram pessoas de confiança, ligadas ao Partido Comunista Chinês - PCC. Que se beneficiaram economicamente do apoio estatal, tornando-se ou formando, uma nova classe social. Num país que, por conceito ideologia, as diferença de classes deve sempre ser combatida.
 
Em termos industriais o primeiro marco econômico chinês significativo é a conquista de um espaço específico da economia mundial. A RPC se tornou a grande fabricante de produtos baratos. Que no Brasil eram conhecidos como produtos de R$ 1,99.  Todo e qualquer produto barato, era produzido na RPC. Se a qualidade fosse baixa e ele estraga-se, não tinha problema. Ele era descartável. Era só toca-lo fora e comprar outro. Foram assim com baldes e bacias plásticas, ferramentas, brinquedos, lâmpadas e uma infinidade de utensílios e objetos. Vivíamos um período de abundância. Era o início da Era da Globalização.
 
A RPC se capitalizou. Não no sentido de ter uma economia capitalista plena, mas sim de conseguir engordar suas reservas monetárias. Aos poucos a transferência de tecnologia direta e indireta fizeram a mudança da sua economia. O país começo a produzir produtos com maior grau de sofisticação, maior valor agregado. Deixando de ser um ator secundário na dinâmica econômica e industrial. Para possibilitar os seus primeiros passos rumo a sua independência.

Observem que esta transferência tecnológica foi direta e indireta. A direta é a que a empresa estrangeira levou para lá ao se instalar. Já a indireta é fruto da qualificação! posterior da mão de obra local. Que processou os novos conhecimentos e interagindo no ambiente interna da empresa pode produzir novos conhecimentos. E como o conhecimento é um processo interno e pessoal. Ele pode ser repassado a outras pessoas, independente da vontade e do controle do seu criador. Com isto surgiram empresas 100% chinesas, concorrentes das empresas estrangeiras que lá se instalaram.
 
A armadilha estava armada. O dilema que se apresenta é como evitar a pirataria, a violação do direito autoral, a concorrência desleal sem ter mais prejuízos. Retirar o investimento feito significa perda de competitividade no âmbito global. Já processar quem o copia é algo difícil. O conhecimento é um bem abstrato. E num país estrangeiro, com um regime político forte, centralizador e extremamente nacionalista a lógica é outra. O Canto da Sereia começo a mostrar o seu lado obscuro.

A reação a isto veio na política externa de enfrentamento do presidente Donald Trump. Mas esta é uma briga de gente grande. 

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Me refiro ao Projeto de Pesca Integrada,  apresentado pela empresa “brasileira” Ample Develpo Brazil Ltda, com sede em Goiânia – GO, e cujo presidente se chama  Yunhung Arthur Lung. Segundo o documento que é de domínio publico. 

Eles desejam:
 

1º. Se instalar em área do Porto Organizado de Rio Grande, cujo tamanho mínimo é de 100 hectares;
 
2º. Receber Licença de Operação;
 
3º. Incentivo Fiscal, na forma de Carência de Imposto de Renda e de Imposto de Importação.

 
O primeiro item é um processo simples, de alçada estadual.
Que tem de ser tocado pela Superintendência dos Portos do Rio Grande do Sul; com o devido acompanhamento e anuência do órgão fiscalizador portuário nacional, que é a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ.
 
O segundo item é de competência do órgão ambiental estadual. Neste caso a ação é promovida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental – FEPAN. Sendo acompanhado pela Superintendencia dos Portos do Rio Grande do sul e pela ANTAQ.
 
Já no tocante ao terceiro item, a isenção fiscal isto é algo que toca em parte o Governo Federal (Imposto de Renda e Imposto de Importação) e em outra o Governo Estadual. Que tem direito a cobrar Imposto sobre Circulação de Mercadorias – ICMS. E que incide sobre os bens importados. Já que não esta claro se eles desejam, também, estes pontos. Considero tanto o ente federal como o estadual neste item.
 
Em contra partida nos oferecem:
 

1º Construir uma frota de pesca de arrasto marinho com 400 (quatrocentos) barcos;
 
2º Construir uma Planta de Processamento de Peixe Congelado, com capacidade para 500 toneladas/dia.
 
3º Investir em um Porto de Pesca, com localização em águas profundas, com instalações de base para dar apoio às atividades essenciais da logística da pesca.

 
Aqui a leitura tem de ser mais atenta. O termo “Construir” pode ser compreendido sob o aspecto da fabricação. Por exemplo:

Serão construídos 400 barcos em estaleiros.
Neste caso não há referência nenhuma de que a construção seria um desdobramento do projeto inicial. Vale lembrar que construir leva tempo. E como o volume planejado de embarcações é grande a mobilização do nosso setor industrial teria de ser planejada com muita antecedência. Os barcos de pesca também possuem tamanhos e capacidade bem distintas.
 
“Construir” também pode ser compreendido como montar, formar ou agrupar, ou seja, trazer 400 barcos para operarem junto à empresa. Neste caso seriam empregados barcos já existentes. Ou então, os mesmos poderiam ser construídos em outro país e trazidos ou “importados” para o Brasil.
 
Os barcos são definidos, denominados, com “barcos de arrasto marinho”. Isto já indica o tipo de pesca que a empresa pretende empreender em nossas águas. A pesca de arrasto se subdivide em pesca de fundo (solo marinho). Onde a rede vem arando o solo marinho. Levantando e revolvendo tudo o que se encontra depositado no fundo.

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Fora do contexto sul-americano, o problema também ocorre junto a Europa. Lá há dois pontos de conflito. Um o Mar Mediterrâneo e o outro junto a costa atlântica da Espanha, de Portugal e da França. Onde o mesmo comportamento predatório se faz presente. Este modus operandi é o que se pode dizer a principal marca do setor pesqueiro chinês. Pressioná-lo ou modificá-lo exige de nossa parte poder político e policiar (militar). E isto nós definitivamente não temos.

Nossa capacidade diplomática esta muito diminuída no atual governo, e a militar (naval) muito mais. Desta forma temos de ser realistas. Ao invés de arranjarmos mais um problema, devemos declinar do convite. Que a princípio é tentador como o Canto da Sereia. 

Mas que com o passar do tempo, acaba por nos defrontar com o Bafo do Dragão.
 

Nota DefesaNet

As implicações geopolíticas e militares desta oferta chinesa serão analisadas em próximo artigo.

O Editor

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sexta-feira, 17 de maio de 2019

“Mas os piratas existem!”

Lembram-se de 2010? Há quase dez anos a economia brasileira crescia 7,6%, embalada pelo excepcional quadro global e pelas políticas de expansão do governo, sobretudo do crédito dos bancos públicos. Esse artigo não é sobre nada disso.

Em 2010, meu filho, que acaba de completar 15 anos, idade dos alunos avaliados pelo Pisa, exame que mede a qualidade da educação em mais de 70 países elaborado pela OCDE, estudava em uma escola particular no Rio de Janeiro. Era a hora da história, aquele momento em que as crianças sentam-se ao redor da professora para ouvi-la contar sobre aventuras e fantasias. Ela havia escolhido uma história sobre piratas, aqueles de perna de pau, olho de vidro, cara de mau. Corte dessa cena.

Tomada seguinte: em 2010, os piratas da costa da Somália corriam os mares a pleno vapor, capturando mercadorias e embarcações. Vocês devem se lembrar do filme que contou parte dessa história bem real — Capitão Phillips, lançado em 2013, protagonizado por Tom Hanks. Pois em 2010, os piratas da Somália estavam por toda parte. Nas manchetes dos jornais, na televisão, nas conversas entre familiares e amigos. O adolescente de agora que então tinha 5 aninhos sempre foi garoto atento.
Os piratas bem reais da Somália atiçaram sua imaginação de menino.

Retomo a cena na escola. Quando acabou a história, alguém perguntou para a professora se os piratas existiam. A professora disse que não, piratas são da imaginação, da fantasia. Imagino que ela se referia aos de perna de pau, olho de vidro, por aí vai. A resposta não agradou um de seus alunos, que rapidamente disse: “Mas os piratas existem!”. Quando a professora insistiu que não, eram apenas personagens em uma história, ele retrucou: “E os da Somália?”. Silêncio. Ele ficou tão contrariado com esse silêncio que a primeira coisa que me contou quando chegou em casa foi o que havia passado na escola. Eu já sabia que a educação no Brasil, mesmo nas supostas melhores escolas particulares, deixava a desejar. Essa história, entretanto, virou espécie de mito familiar sobre as imensas lacunas da educação brasileira, lacunas que atingem a todos, dos mais pobres à elite.

Aos fatos. No último exame Pisa para o qual temos os dados completos, o de 2015 — o exame é aplicado a cada três anos e ainda não temos as informações de 2018 —, o desastre da educação no Brasil ficou mais uma vez explícito. [atenção: 2015 - Bolsonaro sequer pensava em ser candidato a presidente da República.] O Pisa define sete níveis de proficiência em três áreas: ciências, matemática, e leitura. Os níveis mais baixos são o 1a e o 1b, que retratam a incapacidade de alcançar o nível mínimo de proficiência, considerado como o alcance do nível 2. O Pisa também traz informações sobre o nível socioeconômico dos alunos avaliados em cada país, definido por meio de um índice com metodologia clara. Desse modo, é possível avaliar o desempenho nas três áreas das diferentes classes sociais. Agora, preparem-se.

Comecemos pela matemática. Segundo os dados do Pisa, em 2015 86% dos alunos de nível socioeconômico mais baixo não alcançaram o nível 2; 83% dos alunos de classe média baixa e média não alcançaram o nível 2; 72% dos alunos de níveis socioeconômicos mais altos não alcançaram o nível 2.  A desgraça no manejo de conceitos, operações, e raciocínio matemático é generalizada.

Nas ciências, 72% dos alunos de nível socioeconômico mais baixo não alcançaram o nível 2. Isso se compara a 60% para a classe média baixa e para a classe média, e a 35% para os níveis socioeconômicos mais altos. A desigualdade em ciências é clara, mas o resultado é desastroso para um país que será atingido em breve pelas mudanças no mercado de trabalho provenientes dos avanços tecnológicos que exigirão alto grau de proficiência em matemática e ciências.

Por fim, o trágico acidente de leitura. São 65% de analfabetos funcionais nos níveis socioeconômicos mais baixos, 53% nas classes médias e 32% entre os filhos das elites do país. Repito: um terço dos filhos da elite brasileira são, pelo Pisa, analfabetos funcionais.  Está aí a pirataria cometida por governos sucessivos, acentuada pela atual guerra ideológica do bolsonarismo, que tem a educação como alvo, e um ministro da pasta sem preparo ou estratégia. Deixo-os com o verbete.
Pirataria: crime de depredação cometido no mar de lama contra embarcações e passageiros responsáveis pelo futuro da nação.


Monica De Bolle, Revista Época