Se porventura eu estivesse vivendo na Roma Antiga e ali escrevesse esse texto em latim, o seu título talvez fosse
outro:”Pimentorium in anus outrem refrescus est” !!!
A eterna mentira da forma “federativa” do Estado Brasileiro, prevista
em todas as suas constituições, a partir de 1891, inclusive na vigente, de 1988, acaba
de mostrar as “garras” e escancarar a existência de um estado “unitário”, jamais
federativo,como deveria ser.
Coincidentemente ao tempo em que se acelera a discussão sobre
o chamado pacto federativo, na tentativa inclusive de corrigir as
distorções oriundas da má distribuição
das receitas tributárias entre os três entes federativos - União,Estados e
Municípios - onde a parte do “leão” compete à União Federal.e as “migalhas” aos
Estados e Municípios, ferindo de “morte” o próprio conceito de federação, os
brasileiros assistem estupefatos ao projeto federal de reduzir o “teto”, a
alíquota máxima do ICMS, sobre certos itens, inclusive sobre a gasolina e, que
na verdade é a principal fonte de receita tributária dos Estados, favorecendo igualmente
os municípios,que recebem em repasse 25%
do ICMS.
Ora, não tem o mínimo fundamento a constituição prever a
distribuição da carga tributária entre a União,Estados e Municípios, fixando cerca de 70% (setenta por cento) dessa carga
tributária total em benefício da União, em detrimento dos Estados e
Municípios,que “rastejam” para ficar com os cerca de 30% restantes, sendo
obrigados a viver em eterna “penúria” para fazer frente às suas inúmeras
atribuições constitucionais.
Disso resulta uma pirâmide tributária absolutamente invertida, desde o momento em
que os municípios e os estados, que deveriam ter a maior fatia, e onde as pessoas
realmente vivem, trabalham, e produzem, são deixados à margem para privilegiar o
“império” da União.
Expressão originária dos constitucionalistas alemães,o
estado federal consiste numa espécie de estado-de-estados (Staatenstaat), ou
seja, um estado é formatado a partir da união de diversos estados-membros. Desse
modo,os estados organizados em federação representam o poder supremo.O poder
político central deve ser a realização da autoridade coletiva dos
estados-membros. E essa é a
“matriz” política do Brasil.
Mas a forma federativa de estado acabou se desenvolvendo
principalmente nos Estados Unidos, sendo a constituição de 1787 o marco inicial
do moderno federalismo, nascido na Convenção de Filadélfia, presidida por George
Washington. E como já aconteceu em diversas outras situações,o “papagaísmo”
cultural brasileiro tentou adotar o modelo americano. Mas “copiou” mal. Muito
mal. Os estados e municípios não são verdadeiramente entes federativos,porém
mero “acessórios”, “mendigos” da (pseudo) federação. Os governadores e prefeitos
municipais vivem em Brasilia, mendigando recursos da União,que na verdade
deveriam ser seus.
Rui Barbosa já havia detectado, em 1898, a farsa federativa
em prática no Brasil: ”Eis o que vem a ser a federação do Brasil; eis em que
dá,por fim,a autonomia dos estados,esse princípio retumbante,mentiroso,vazio
como um sepulcro,a cuja superstição se está sacrificando a existência do pais,
e o princípio da nossa nacionalidade”. E durante a Constituinte que aprovou a
Carta de 1946, Mario Mazagão afirmava: ”Caminhamos, infelizmente, para uma
centralização tão categórica que, nesta marcha,dentro de pouco tempo,os últimos resquícios da federação estarão extintos”.
Ataliba Nogueira não deixou por menos:”Estamos a cada passo
reduzindo o país a estado unitário. A esfera de competência da União foi
alargando-se de tal jeito que contribuiu para essa inconveniente e desnaturante
centralização. A União é aqui o estado-providência. Acham-se capaz de
resolver,milagrosamente,todos os problemas,e lhe entregam,de mãoi atadas,a
federação”.
Com a vaga promessa de “compensar” as perdas tributárias dos
Estados e Municípios,num flagrante “conluio” entre os Poderes Executivo e Legislativo
da União Federal, acabaram de aprovar a PLP 18/2002, reduzindo o teto, a alíquota
máxima, determinada pelos
Estados-membros,do imposto sobre
circulação de mercadorias e serviços-ICMS, incidente sobre combustíveis,gás natural,energia
elétrica, comunicações e transporte coletivo. O teto atual, que no RGS,por
exemplo, é de 25%, passará a ser de 17%, reduzindo o preço ao consumidor na
medida da redução tributária. [O RS tem um ICMS exagerado talvez para pagar pensão vitalícia a um ex-governador que chegou a cogitar que tinha chance de ser Presidente da República Federativa do Brasil.
Todos esquecem que os grandes gastos, ainda que controlados por estados e municípios caem sempre sobre a União Federal.
Exemplo recente e já esquecido: para combater a pandemia uma decisão suprema deu poder total aos estados e municípios para adoção de todas as medidas contra a covid-19 incluindo, sem limitar, gastos em caráter emergencial.
A roubalheira foi de tal ordem, = imagine mais de 20 estados e 5.000 e poucos municípios com permissão para gastar sem licitação, em regime de urgência = que até loja de vinho vendeu respiradouros e nada foi apurado.
Ao Governo Federal restou apenas pagar as faturas. Valeu a regra de sempre: a UNIÃO o ÔNUS, aos estados e municípios o BÔNUS.
Obviamente, uma centralização dos recursos arrecadados permite um maior controle.]
Mas esse “ganho” do consumidor certamente será só
na aparência. Na verdade a União está
“roubando”essa parcela do ICMS dos Estados e Municípios, porém mantendo os
mesmos preços, ou mais, no caso dos combustíveis, para os consumidores, em vista dos seus ilimitados reajustes,a partir
da Petrobrás,”controlada” pela União. Isso se chama “passar a perna” nos
Estados e Municípios, mediante artifícios fraudulentos.
Ademais, não venha o Governo culpar a Petrobrás, o “dólar”,ou
o preço internacional do barril de
petróleo. O Governo é o “chefe” da Petrobrás. Por isso teria poderes para
modelar a petrolífera com os mesmos expedientes adotados na vizinha Venezuela, por
exemplo, que não tem investidores privados “sanguessugas", e é estatal pura, onde o
litro da gasolina custa pouco mais de 10 (dez) centavos,e o consumidor enche o tanque do carro com cinco reais.
Essa política da União nada menos significa que fazer
“bondade”e “demagogia” às custas dos outros. A perda de arrecadação dos estados
e municípios deverá gerar grande impacto,”empobrecendo” ainda mais esses entes “marginais” da
federação.
Afinal de contas,que “federação” seria essa cuja constituição
define os tributos da União no seu artigo 153, e os dos Estados,no artigo
155, incluindo aí o ICMS, porém se dá o direito, mediante aquele dispositivo da “lei complementar”, de intervir, não só nos
seus, mas também nos tributos de competência estadual?
Por que será que esses políticos regionais incapacitados que
sofrem na própria carne os efeitos dessa “estrepolia” federal não têm competência de denunciar esse assalto que seus estados sofrem de parte da União? Que negam a própria
federação?
Sérgio Alves de Oliveira
Supremo considerou que a redução das receitas dos Estados com a alíquota menor do ICMS sobre combustíveis, energia e transportes deve ser reembolsada pela União