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quinta-feira, 25 de maio de 2023

Censura, caruncho, ditadura - Silas Velozo

         Após quatro congelamentos ineficazes de preços no Brasil, inflação a mais de 1.000% ao ano, detonando principalmente o bolso dos pobres, essa receita fracassada não foi reprisada em 1994.

Em vez disso, instituiu-se a URV (unidade real de valor), que seria nosso câmbio comercial atrelado ao dólar americano, sem mudar nossa moeda na tora.

Mesmo sem compreender economia nos meus 39 anos na época, senti firmeza. Foi um rearranjo gradual da economia, prudente, sólido e, como os anos subsequentes mostram, dos mais bem-sucedidos contra hiperinflação.

O PT e a esquerda tupiniquim foram contra, pra variar, agourando iminente fracasso da ação de respeitados e responsáveis economistas. E bateram sem dó, criticando isso e toda estruturação necessária após.

Óbvio, não foi a primeira fake news da turma vermelha, talvez sim, uma das mais evidentes até então.

Mas a esquerda sempre se supera na difamação e mentiras.

Hoje um corrupto condenado em três instâncias desgoverna o país, ladeado por outros condenados, alegando não terem feito nada de errado, mantidos por um sistema jurídico inconstitucional e antiético.

Enquanto empreiteiros também corruptos e outros criminosos desfilam livres, manifestantes são presos, jornalistas e parlamentares cassados e perseguidos, assim como fizeram Lênin, Stálin, Mao, Fidel e fazem Maduro, Putin, Xi Jinping e tantos ditadores ao redor do planeta pra esconder seus podres.

Querem fugir do elementar: liberdade de expressão e equanimidade jurídica são itens básicos ao bem-estar geral, trazem segurança, inovação e prosperidade.  “Proteger” a democracia enquanto censura e caruncha o estado de direito, dissimulando sua ditadura, é a mais nova fake news da esquerda tupiniquim.

*        Silas Velozo é escritor, compositor e instrumentista em MG.

 

quinta-feira, 27 de junho de 2019

Judiciário não tem mais cerimônia na encampação das prerrogativas conferidas aos legisladores

A fogueira do ativismo judiciário

O Brasil não tem boa classificação nos rankings sobre segurança jurídica. Profusão de leis e normas administrativas redigidas em linguagem equívoca ou deliberadamente contraditória. Sobreposição de instâncias administrativas e judiciárias. Procedimentos de controle e fiscalização caros, que deveriam ser baratos; ou baratos, quando deveriam ser caros. Quebra constante e imotivada de contratos privados. Falta de efetividade das sanções, insignificantes ou draconianas, raramente ponderadas.

É preciso elevar os valores da previsibilidade e da confiança, duas variáveis necessárias para a fruição do progresso contemporâneo. Nos estudos nacionais e internacionais, o grave problema da insegurança jurídica, com custos econômicos e sociais expressivos, tem capítulo de destaque para a insegurança judiciária. O sistema de justiça dá relevante contribuição para o ambiente normativo turvo e labiríntico.

A estrutura de justiça – não apenas o Poder Judiciário – é cara, gigantesca e, o mais danoso, ferozmente intervencionista. Como muitas das instituições do País, diante da falta de controle cívico e social, as do sistema de justiça também têm a possibilidade de funcionar para si, por si e para os seus. Premido pelas influências históricas da cultura geral, o sistema de justiça contribui para o adiamento infinito rumo ao país do futuro, que poderíamos ser, com democracia, livre iniciativa e valor social do trabalho, tudo selado pela lei votada por Parlamento escolhido em eleição módica e disputada por partidos políticos orgânicos.

Mas, para além dos problemas gerais, comuns a todas as instituições, o sistema de justiça está enredado numa crise particular: a da usurpação da democracia representativa, da intervenção desabrida na prerrogativa do povo de fazer escolhas entre várias políticas públicas.   No desejo de contemplar todos, a Constituição de 1988 projetou a mais libertária e rica das nações. É uma espécie de retomada do País dos bacharéis. O governo de 64 conviveu com altas taxas de crescimento econômico. Mas a ordem jurídica tinha muito subproduto de atos institucionais, para o desprestígio dos bacharéis. Os economistas ganharam o protagonismo da liderança.

As crises do petróleo e a hiperinflação permitiram a virada. Depois de marcar os economistas com o epíteto de tecnocratas – não raro quando cobravam racionalidade e responsabilidade com o dinheiro público –, os bacharéis inscreveram na Constituição de 1988 as mais belas promessas.  Pouco depois, a queda do Muro de Berlim veio lembrar que os fatos da realidade cobrariam o seu preço. Só conseguimos alguma recuperação quando economistas notáveis puseram o Plano Real de pé e refundaram a ordem econômica. Isso sob o fogo cerrado de violenta guerrilha judiciária. O ministro da Fazenda Pedro Malan chegou a ser instado a pagar dezenas de bilhões de reais, só pelo fato de implementar o Plano Real. A URV, espinha dorsal do plano, foi julgada depois de 25 anos de sua criação.

Esses incidentes, independentemente do seu desfecho, demonstram que o sistema de justiça disfuncional tem a possibilidade de atacar, pesadamente, a autoridade de outro Poder de Estado, apenas pela execução de política pública afiançada pelo povo, no sistema democrático, e manter sob suspeição, por décadas, a iniciativa. Mas a obstrução judiciária de políticas públicas definidas pela democracia é só parte do problema. O sistema de justiça resolveu legislar abertamente. Não há mais nenhuma cerimônia na encampação das prerrogativas conferidas aos legisladores. Por intermédio das mais variadas modalidades de ações judiciais, certa “hermenêutica dos novos tempos” propõe e executa todo tipo de política pública. Faz “leis judiciárias” para todos os assuntos. Agora, à beira do precipício, vem o convite para o passo fatal: a criação de lei penal, por analogia, pelos juízes.
Centenas de milhares de brasileiros foram vítimas do genocídio das últimas décadas – negros e pardos, jovens e pobres, a maioria. Nem sequer a mais antiga das leis penais, a que sanciona o homicídio, foi aplicada com mínima eficiência. O Código Penal autoriza a pena máxima de 30 anos. Pouco importam o sexo, a raça, a cor da vítima. Portanto, não faltava, nem falta, lei punitiva com alto grau de severidade.
Todavia, estamos na iminência de cometer grave erro civilizatório, para regredir ao que Nelson Hungria chamou de a “mística hitleriana”. Depois de lembrar que o Código Penal comunista permitia ao juiz condenar por analogia “se uma ação qualquer, considerada socialmente perigosa, não se acha especialmente prevista no presente Código, os limites e fundamentos da responsabilidade se deduzem dos artigos deste Código que prevejam delitos de índole mais análoga” –, Hungria registrou que “esta pura e simples substituição do legislador pelo juiz criminal era incomparável com a essência do Estado totalitário, corporificado no Führer”.

Hitler desejava mais, segundo Nelson Hungria: “Preferiu-se uma outra fórmula, que está inscrita no ‘Memorial’ hitlerista sobre o ‘novo direito penal alemão’: permite-se a punição do fato que escapou à previsão do legislador, uma vez que essa punição seja reclamada pelo ‘sentimento’ ou pela ‘consciência’ do povo, depreendidos e filtrados, não pela interpretação pretoriana dos juízes, mas (e aqui é que o leão mostra a garra...) segundo a revelação do Führer”.

A lançar um dos mais simbólicos direitos fundamentais na fogueira da insegurança jurídica alimentada pelo ativismo judiciário, será preciso saber quem vai incorporar a mística hitleriana, para revelar a nós, os juízes, os crimes do novo direito penal da analogia. O vanguardismo messiânico, presente na Revolução Russa e no nazismo, tentou refundar o mundo sem passar pela ordem do direito burguês, liberal. Não deu certo. Nem dará. A barbárie nunca civilizou a barbárie.


Editorial -  O Estado de S. Paulo 

domingo, 10 de março de 2019

Foi possível há 25 anos, há que tentar sempre

É preciso manter viva a esperança, a aposta no diálogo e a busca das convergências possíveis

A virada de fevereiro para março de 2019 marcou o 25.º aniversário de lançamento da URV e, portanto, do real, no qual a URV se converteria quatro meses depois. Nos primeiros 25 anos do real a taxa média anual de inflação brasileira foi de cerca de 7%-7,5% ao ano, alta por padrões internacionais para períodos tão longos (embora hoje estejamos com as expectativas aparentemente ancoradas em taxas bem mais baixas). Esse desempenho deve ser visto à luz do nosso longuíssimo passado de inflação alta, crônica e crescente – até o real.
Com efeito, o Brasil foi o recordista mundial de inflação acumulada no período que se estende do início dos anos 1960 ao início dos 90. O País desconhecia taxas de inflação inferiores a 10% ao ano desde 1950. A média do período 1950-1980 foi da ordem de 25%-30% ao ano. Chegamos a 100% em 1980, a 240% em 1985, a 1.000% em 1988 e a 2.400% em 1993. Esse tipo de aceleração inflacionária por período tão prolongado, sintoma de conflitos distributivos e intenções de gastos em consumo e investimento que excediam de muito a capacidade de resposta da oferta doméstica, mascarava a extensão do desequilíbrio fiscal estrutural ex ante, para usar o terrível jargão dos economistas. Hoje esse desequilíbrio mostra sua face mais visível nas contas públicas, em particular de Estados e municípios, que não contam mais com a inflação crescente para mascarar seus problemas, tampouco têm capacidade de endividamento adicional, não podendo escapar de fazer dificílimas escolhas, inclusive a de apoiar reformas que lhes permitam algum raio de manobra, especialmente nas áreas de pessoal, previdência e gradual retomada dos investimentos, nas quais residem os grandes e fundamentais desafios a enfrentar.
Mais de uma vez neste espaço expressei minha confiança de que o real tenha vindo para ficar, e para sempre, como a definitiva moeda nacional, com seu poder de compra relativamente estável, porque isso era, e é, do interesse de todos os brasileiros. Para tal avançamos em algumas áreas mais: o regime de taxas de câmbio flutuantes está em vigor há mais de 20 anos e o regime de metas de inflação completará seus 20 anos em junho. Esperamos que ambos se consolidem como os regimes cambial e monetário que mais convêm ao País e ao seu futuro, à parte legítimas controvérsias sobre – dados os regimes – a operacionalização das políticas monetária e cambial e sobre os níveis específicos das taxas de câmbio e de juros. A consolidação desses dois regimes depende de avanços na área fiscal. A propósito, antes de comentário final sobre a difícil situação neste crucial ano de 2019, quero aproveitar a oportunidade destes 25 anos da URV/real para chamar a atenção para algo que não mereceria ficar relegado aos escaninhos da memória de uns poucos, porque é relevante para o Brasil de hoje – e seu futuro.
Como é sabido, FHC assumiu o Ministério da Fazenda em fins de maio de 1993, como o quarto ocupante do cargo antes que o governo Itamar Franco alcançasse seu oitavo mês. Em 13 de junho daquele ano, cerca de três semanas depois, foi dado a público o então chamado Plano de Ação Imediata, que colocava a questão do que chamava o descalabro das finanças públicas brasileiras no seu contexto mais amplo, resumido em cinco pontos, que reproduzo textualmente.
“1) O Brasil só consolidará sua democracia e reafirmará sua unidade como nação soberana se superar as carências agudas e os desequilíbrios sociais que infernizam o dia a dia da população. 
2) A dívida social só será resgatada se houver ao mesmo tempo a retomada do crescimento autossustentado da economia. 
3) A economia brasileira só voltará a crescer de forma duradoura se o país derrotar a superinflação que paralisa os investimentos e desorganiza a atividade produtiva. 
4) A superinflação só será definitivamente afastada do horizonte quando o governo acertar a desordem de suas contas, tanto na esfera da União como dos estados e municípios. 
5) E as contas públicas só serão acertadas se as forças políticas decidirem caminhar com firmeza nessa direção, deixando de lado interesses menores.”

Este quinto e último ponto detém surpreendente atualidade, relevância e urgência, e deve continuar a ser visto em conjunto com os pontos 1 e 2. Como há 25 anos, é imperiosa a necessidade de governos equacionarem a situação de suas contas, tanto na esfera da União como dos Estados e municípios. Se em 1993 era fundamental um ataque determinado à inflação de mais de 2.000%, o fim da hiperinflação não era um fim em si mesmo. Como dizia o ex-ministro Ricupero, era apenas o começo do início do princípio: a agenda para o Brasil pós-derrota da hiperinflação se confundia com a agenda muito mais ampla do desenvolvimento econômico social e institucional do País – livre da droga da inflação, seu zumbido e sua poeira que mascaravam e, portanto, nos impediam de descortinar os verdadeiros problemas do País. Que continuam a assombrar-nos, para muitos como indecifráveis esfinges e quimeras.
Não é preciso, como sugeriu Camus, “imaginar Sísifo feliz”, mas é preciso, sim, mostrar que nem todas as quimeras são indecifráveis e nem todas as esfinges necessariamente nos devorarão. Já o fizemos no passado, apesar de todos os riscos e incertezas. É preciso manter viva a chama da esperança, a aposta no diálogo e a busca das convergências possíveis. Que sempre existem, apesar das aparências em contrário e do desassossego com certas disfuncionalidades destes primeiros 70 dias do governo e 40 dias do novo Congresso. Há que apostar no poder da persistência e no “realismo esperançoso” de Ariano Suassuna, para evitar a simplória dicotomia entre apenas duas posições polares: “otimistas e pessimistas”. Ou talvez pior para uma democracia pluralista: o “nós contra eles” substituindo o “eles contra nós”. O Brasil é maior que isso – e os brasileiros merecem algo melhor.