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domingo, 12 de julho de 2020

Bolsonaro precisa do tumulto - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

Se o capitão Bolsonaro evitasse confrontos irracionais, seu governo mostraria a confusão em que está

Problema não está apenas no despreparo, mas na inércia produzida pela inépcia     

No dia 21 de maio, quando já se estava no patamar de mil mortos por dia pela Covid e a pandemia já havia matado 20.047 pessoas, a juíza Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, mandou um ofício à Casa Civil, oferecendo R$ 508 milhões dos cofres da Lava-Jato para remediar a situação. Pedia apenas que lhe dissessem para onde o dinheiro deveria ir. Nada. Gabriela Hardt reiterou a oferta a 17 de junho, e a Casa Civil respondeu apenas que havia recebido os dois ofícios. No dia seguinte o Ministério da Saúde informou que estava estudando o caso. Nessa altura batera-se a marca do milhão de infectados e 48.426 mortos.

Na semana passada o dinheiro continuava esperando um destino. Os mortos chegam a 70 mil. (Em meados de abril o Itaú Unibanco anunciou que doaria R$ 1 bilhão para o combate à pandemia. Partindo do zero, criou um conselho, buscou iniciativas e já entregou mais de R$ 156 milhões. Foram 16 milhões de máscaras, cinco milhões de testes rápidos, 190 respiradores, cestas básicas para sete mil famílias, mais doações à Fiocruz e a hospitais de campanha em São Paulo.)

Durante todo esse tempo esteve natimorto na Casa Civil o tal “Plano Marshall” do ministro-general Braga Netto, reciclado com o nome de Pró-Brasil e detonado pelo doutor Paulo Guedes na fatídica reunião de 22 de abril com poucas palavras: “Não chamem de Plano Marshall, porque revela um despreparo enorme”. O problema não está apenas no despreparo, mas na inércia produzida pela inépcia.
[os valores ofertados não alcançam nem metade do valor total dos Fundos Eleitoral e Partidários que, por decisão da Justiça atendendo pedido do senador Davi Alcolumbre,não pode ser aplicada no combate ao coronavírus.
E considerando que a doação do Itaú Unibanco vai bem, obrigado, fica difícil levar para o tronco o presidente Bolsonaro, usando como argumento um entrava burocrático de um órgão do Poder Executivo.] 

(.....)

Cadê, Guedes?
O ex-deputado Bruno Araújo pegou leve ao cobrar do ministro Paulo Guedes o futuro e as reformas que oferecia: “Cadê o Brasil novo que o atual ministro tanto promete e nunca entrega?”.
Faltou perguntar a Guedes onde foi parar aquele seu amigo inglês que em abril ofereceu-lhe 40 milhões de testes para Covid por mês.

[não pregamos golpe, não desejamos golpe, nem contragolpe - além das nossas convicções políticas não permitirem, somos muito pequenos para ter tais desejos - expressamos  apenas o pensamento, a opinião, o entendimento que se o boicote, as críticas que nada somam, = uma verdadeira sabotagem = nome adequado, já que a continuidade, o método, o padrão, não permite  chamar apenas de  oposição = é algo bem pior, mais danoso, o governo do presidente Bolsonaro perde as condições de governabilidade e algo terá que ser feito. 
Ou todos aceitam o presidente Bolsonaro, conforme vontade soberana de quase 60.000.000 de eleitores, ou o CAOS CAÓTICO estará estabelecido e precisará ser contido.]

Estatais imortais
Desde 2008 a Viúva sustenta o Centro Nacional de Tecnologia Avançada (Ceitec). Entre outras atribuições, ela seria uma estatal fabricante de chips. A repórter Luísa Martins informa que fracassou a tentativa do ministro Paulo Guedes de liquidá-la.
A primeira fábrica de circuitos integrados brasileira surgiu em 1978, com o óbvio amparo da Boa Senhora. De lá para cá a Apple virou a Apple, Bill Gates tornou-se um bilionário com a Microsoft e os chineses da Lenovo compraram a operação da IBM no país, mas os chips nacionais nunca emplacaram.

As estatais, como o Fantasma da Selva, são imortais. A Valec, que deveria operar o trem-bala, ligando o Rio a São Paulo em três horas, vai bem, obrigado. O governo dizia que o trem estaria rodando na Copa de 2014, mas o seu projeto foi transferido para outra estatal, a EPL. A ideia do trem-bala sumiu, mas a estatal continua lá.

Brooks Brothers
Entrou em recuperação judicial a Brooks Brothers, a mais antiga loja de roupas dos Estados Unidos. Ela vestiu 41 dos 45 presidentes americanos, de Lincoln a Obama. A capa preta que Franklin Roosevelt usou em 1945 na conferência de Yalta saiu da loja da Madison Avenue. Seus vendedores eram bestas, mas neste século tomaram jeito.

A loja fez fama numa época em que preço e qualidade determinavam o prestígio de uma marca. A epidemia das grifes abalou-a, e a Covid derrubou-a.
Tomara que se recupere.

Gabeira e as alas
Fernando Gabeira disse tudo quando mostrou seu espanto diante da frequência com que se fala em “ala ideológica”, “ala militar” e “ala pragmática” no Palácio do Planalto:
“Parece escola de samba.”

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista 


terça-feira, 25 de abril de 2017

Bye-bye, baby Kim: o destino do norte-coreano foi selado

Estados Unidos e China se entenderam sobre a conveniência de cortar as asinhas nucleares do pequeno ditador. Será que vai ter chuva de Tomahawk?

A batata de Kim Jong-Un está assada.
Evidência número um: Donald Trump convidou todo, repetindo todo, o Senado americano para ir à Casa Branca na quarta-feira.

Evidência número dois: Trump e Xi Jinping, o presidente da China, falaram por telefone. “Os dois líderes reafirmaram a urgência da ameaça representada pelos programas balístico e nuclear da Coreia do Norte e se comprometeram a reforçar a coordenação para conseguir a desnuclearização da península coreana”.

Evidência número três: Nikki Haley, a embaixadora americana na ONU, disse que os Estados Unidos “não descartam um ataque preventivo” caso a Coreia do Norte teste um novo míssil balístico de médio alcance, teoricamente capaz de levar uma ogiva nuclear até o Japão.

Isso tudo significa que as duas maiores potências econômicas do planeta se puseram de acordo em relação ao que Trump chamou de “encrencas” provocadas deliberadamente pelo ditador de 33 anos, herdeiro da dinastia fundada pelo avô que criou um dos países mais bizarros da história.  Ainda não é possível saber se o acordo Trump-Xi é com Kim ou sem Kim. Ou seja, se o rotundo ditador continua e é nada gentilmente convidado a se retirar. Nas duas hipóteses, tem que parar de testar bombas nucleares e mísseis que possam transportá-las.

O segredo da eventual solução de um problema intratável, fora da esfera da contenção, há mais de 60 anos, é a negociação entre Trump e Xi. A China tem poder total sobre a miserável Coreia do Norte, onde só sobra dinheiro para o programa nuclear e a programação de diversões da família Kim. Estrategicamente, a China sempre usou esse poder para reforçar seu poder de pressão na esfera asiática e no plano mundial. Se Xi mudou uma política estrutural é porque era alguma coisa a mostrar em troca.

Por mais poder que, silenciosamente, tenha acumulado, ele ainda precisa responder à altíssima e fechadíssima cúpula do Partido Comunista Chinês. O próprio Trump já disse que iria oferecer um “belo acordo comercial” à China se ajudasse a resolver a questão do encrenqueiro júnior da Coreia do Norte.  O sinal mais evidente de que a China estava mudando de ideia foi espetacularmente exposto no jantar em Mar-a-Lago oferecido por Trump a Xi. Na hora da sobremesa, bolo de chocolate, Trump deu a autorização final para que a Marinha americana mandasse a chuva de Tomahawks para a base aérea síria, em represália pelo ataque com gás sarin que atingiu civis inocentes.

Depois do café, Trump explicou a Xi o que estava acontecendo e o líder chinês concordou que era um castigo certo pelo uso absolutamente proibido de armas químicas. Sobre o que mais os dois concordaram ainda ficaremos sabendo, mas a recepção em Mar-a-Lago está se firmando como um dos jantares de maior peso histórico desde que Roosevelt, Stalin e Churchill jantaram em Yalta e dividiram o mundo do pós-guerra.  Yalta estabilizou a situação mundial em troca de uma traição horrível: Stalin ganhou de presente todos os países do Leste europeu que só se livraram do domínio soviético mais de 50 anos depois. De qualquer maneira, consagrou o status quo já existente, com a vitória da URSS nos territórios ocupados pela Alemanha nazista. Pragmaticamente, Churchill fez depois uma pergunta retórica: “O que a Polônia queria? Que começássemos outra guerra mundial?”  O comportamento abusivo de Kim Jong Un e as reações de Trump, depois de oito anos de politico externa assustadiça do governo Obama, despertaram uma curiosa divisão no mundo. Os anti-trumpistas passaram a torcer pelo ditadorzinho doido. 

Comemoraram quando a força de ataque do porta-aviões Carl Vinson, capaz de mandar a Coreia do Norte de volta para a idade da pedra à qual muitas vezes já parece ter regredido, estava “indo para o lugar errado”. Também levaram a sério todas as declarações delirantes de que a Coreia do Norte “ameaçava afundar” o porta-aviões e talvez, quem sabe, reduzir os Estados Unidos a cinzas nucleares. A CNN disse, a sério, que “não havia conseguido confirmar com fontes independentes” se a Coreia do Norte iria realmente afundar o Carl Vinson e destruir os Estados Unidos.

Todas as outras pessoas normais, embora nem sempre totalmente informadas sobre a complexidade dos elementos envolvidos, passaram a torcer para que Trump mandasse logo uma chuva de Tomahawks na cabeça do Kim. Muita gente também ficou com medo de uma guerra mundial e o assunto explodiu nas redes sociais.  Calma, gente. Não parece que vai ser dessa vez. Embora a capacidade de encrenca de um regime como o norte-coreano em situação de beco sem saída não possa ser subestimada, os chineses possivelmente se ocuparam de tarefas que sabem fazer bem, como ameaçar, chantagear, cooptar, comprar e, se preciso, detonar seus protegidos. O importante, agora, é não deixar a Coreia do Norte desabar. E não deixar a China parecer que cedeu em posição de fraqueza.

Trump, claro, será espinafrado por fazer concessões demais. Etc etc etc.

 Fonte: Blog Mundialista -  Vilma Gryzinski