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quinta-feira, 28 de maio de 2020

Ignorância da Lei – Editorial - O Estado de S. Paulo

Críticas de Bolsonaro e de seu entorno ao STF mostram seu nível de desinformação

Quanto mais o presidente Jair Bolsonaro e seu entorno militar reclamam do Supremo Tribunal Federal (STF), alegando que ele está avançando na jurisdição do Executivo e impedindo o chefe da Nação de governar, mais vai ficando claro que as acusações contra a Corte são absurdas e que as decisões tomadas por seus ministros são rigorosamente baseadas nas leis em vigor e na Constituição. [conforme interpretação do Supremo, ainda que do tipo criativa.] 

As mais recentes decisões do STF são prova disso. No caso da pandemia de covid-19, quando Bolsonaro tentou anular as medidas na área da saúde tomadas por prefeitos e governadores para combater o contágio da covid-19, o STF nada mais fez do que reafirmar a estrutura federativa do Estado brasileiro, tal como está prevista em vários artigos da Constituição. O artigo 1.º institui como forma de Estado a “República Federativa”. O artigo 18 afirma que o federalismo pressupõe autonomia administrativa dos entes federativos e deixa claro que não há uma relação de hierarquia entre eles. E o artigo 23 é taxativo quando afirma que é “competência comum da União, dos Estados e dos municípios zelar pela guarda da Constituição” em áreas essenciais, como a saúde pública. [só que a decisão do Supremo alijou a  União Federal, tirando espaço para qualquer atuação do Presidente da República = que representa a União Federal.]  

Foi por isso que, ao julgar uma ação de inconstitucionalidade contra a MP 926, que dispõe sobre “medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública” e confere ao presidente da República “a competência para dispor, mediante decreto, sobre serviços públicos essenciais”, o STF decidiu, por unanimidade, que a MP não podia anular a competência dos Estados e municípios de legislar de forma concorrente em relação à política sanitária de saúde. A não observância da autonomia dos entes federativos constituiria uma “afronta ao princípio do federalismo”, disse o ministro Edson Fachin.

Outra decisão do STF que suscitou reclamações do presidente e de seu entorno militar, mas que também estava fundada no direito positivo, foi adotada pelo ministro Alexandre de Moraes após a demissão de Maurício Valeixo do comando da Polícia Federal (PF). Moraes ordenou que fossem mantidos os delegados federais envolvidos no inquérito de apuração das fake news contra integrantes da Corte. Nada mais fez do que se valer de suas prerrogativas como magistrado. O mesmo ocorreu quando concedeu liminar suspendendo o decreto de nomeação do delegado Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal. Por ser amigo pessoal da família Bolsonaro e por estar a PF investigando um de seus filhos, o ministrou alegou que a nomeação configurava “desvio de finalidade e inobservância dos princípios da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”, previstos pelo artigo 37 da Constituição. [conveniente por respeito tanto à Constituição Federal quanto ao Poder agredido, decisões que afrontem diretamente à autoridade do presidente jamais devem ser tomadas de forma monocrática.
A partir do momento em que os ministros do STF abrirem mão de uma onipotência que não possuem - ONIPOTENTE SÓ DEUS - ficará mais fácil o diálogo.
Que necessidade tem de um despacho intimando ministros de Estado, destacar uma velharia que foi aposentado no começo do século 19? condução debaixo de vara.] 

O presidente e seu entorno militar também criticaram a decisão do ministro Celso de Mello de permitir a divulgação do vídeo da patética reunião ministerial de 22 de abril e de pedir ao procurador-geral da República que se manifeste sobre o pedido de apreensão do celular de Bolsonaro e de um de seus filhos. Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o cidadão Augusto Heleno classificou as medidas como “afronta à autoridade máxima do Poder Executivo”. Esqueceu-se, porém, como afirmou o STF, em nota, que Mello “limitou-se a encaminhar à PGR, que é o órgão da acusação, a notitia criminis, com esse pleito de apreensão formulado por três agremiações partidárias”. Lembrou, também, que o § 3.º do artigo 5.º do Código de Processo Penal “confere legitimidade a qualquer pessoa do povo para efetuar comunicação de crime perseguível mediante ação penal pública”. [vide  o comentado  parágrafo anterior.]


É evidente, assim, que em momento algum o STF agiu por vontade individual [decisão monocrática o que significa?] de seus ministros. É evidente, também, que a Corte não tomou qualquer decisão à margem da lei e que aplicou rigorosamente a Constituição, segundo a qual, num sistema republicano e federativo não existe poder absoluto ou ilimitado. [cabe expressar minha opinião com uma pergunta:
que tipo de poder é o que permite que um ministro do STF possa, de forma monocrática, deferir liminar suspendendo uma lei, parcial ou totalmente?
E tal suspensão valerá até que o plenário do STF aprecie e reforma a decisão.
Sendo que o ministro autor da liminar é quem decide quando a matéria será apreciada pelo colegiado Supremo.
Enquanto o plenário não se manifestar a lei impugnada não vale - apesar de ter sido aprovada por maioria nas duas Casas do Poder Legislativo e sancionada pelo Presidente da República, Chefe do Poder Executivo.] Portanto, a reação do presidente e de seu entorno – principalmente o cidadão Heleno – às decisões do STF não procedem. Tais reações carecem de base legal e mostram o nível de desinformação dos que estão à frente do Executivo, bem como sua ignorância sobre o funcionamento das instituições do País.

Editorial - O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 14 de junho de 2018

MPF defende poder para investigar e fazer acordos antes de processos

Procuradoria é contra medida proposta por deputado tucano que restringiria as apurações às autoridades policiais 

O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou nota técnica ao Congresso Nacional em que sugere alterações no texto do Projeto de Lei 8.045/2010, que institui o novo Código de Processo Penal (CPP) brasileiro. No documento, o MPF defende que seja mantida a competência originária da instituição para apurar infrações criminais, conforme já decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela própria Câmara dos Deputados, quando rejeitou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37. O documento sugere que seja incluído no texto algumas regras para a utilização do acordo penal.

As informações foram divulgadas pela Secretaria de Comunicação Social da Procuradoria-Geral da República. A nota técnica foi elaborada pela Câmara Criminal em conjunto com a Secretaria de Relações Institucionais do MPF e analisa o substitutivo apresentado pelo relator-geral do PL na Câmara, deputado federal João Campos (PSDB-GO). O Ministério Público Federal (MPF) encaminhou nota técnica ao Congresso Nacional em que sugere alterações no texto do Projeto de Lei 8.045/2010, que institui o novo Código de Processo Penal (CPP) brasileiro. No documento, o MPF defende que seja mantida a competência originária da instituição para apurar infrações criminais, conforme já decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela própria Câmara dos Deputados, quando rejeitou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37. O documento sugere que seja incluído no texto algumas regras para a utilização do acordo penal.

A nota técnica lembra que o tema já foi amplamente discutido no país. Em 2013, a Câmara, por 430 votos a nove, rejeitou a proposta de conferir às autoridades policiais competência exclusiva para apurar infrações penais. Já em 2015, o plenário do STF também reconheceu que o Ministério Público tem competência originária para promover investigação de natureza penal.  Na ocasião, o STF entendeu que, se o artigo 129 da Constituição atribui ao Ministério Público a função de promover a ação penal pública, é necessário assegurar os meios necessários para o exercício dessa função, o que inclui a possibilidade de realizar suas próprias investigações.  “Além disso, condicionar a atuação do Ministério Público à hipótese de abuso de poder político ou econômico e ao “fundado risco de ineficácia da elucidação dos fatos pela polícia” fatos de difícil comprovação — tornaria quase inviável qualquer investigação criminal por parte da instituição”, assinala a Procuradoria.

“A limitação indevida do poder investigatório do Ministério Público ensejará a impunidade de diversas condutas criminosas graves, deixando uma série de bens jurídicos penais (e, consequentemente, direitos fundamentais) sem a devida proteção”, alerta a nota técnica.
O documento reforça que apenas o inquérito policial, que é uma espécie de investigação criminal, é exclusivo da polícia. O MPF questiona, ainda, o parágrafo 4º, inserido no artigo 18 do PL, que impõe à investigação criminal realizada pelo Ministério Público as mesmas exigências feitas ao inquérito policial, incluindo o controle periódico de duração pelo juiz responsável.

Segundo a nota técnica, a proposta deve ser alterada, pois o Judiciário não tem competência para realizar o controle externo do Ministério Público. O controle sobre a duração das apurações deve ser realizado pelos órgãos de revisão da própria instituição, a quem compete essa tarefa.

Acordo penal
A nota técnica encaminhada pelo MPF também sugere a inclusão de dispositivos para melhor regulamentar o capítulo específico do novo CPP que trata da utilização do acordo penal. O instrumento jurídico permite que, em crimes de menor e médio potencial ofensivo, seja feito um acordo entre acusação e acusado, o que possibilita o encerramento antecipado da persecução penal.  O mecanismo já é utilizado nos Estados Unidos e em alguns países da Europa e está em expansão na América Latina. A Corte Europeia de Direitos Humanos também defende o uso dos acordos penais, visto que o instrumento possibilita o encerramento mais rápido dos processos criminais, além de desafogar os tribunais.

As medidas propostas pelo MPF no documento busca adequar o novo CPP às normas já previstas na Resolução 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público, que prevê um processo de negociação transparente, com respeito aos direitos fundamentais e aos princípios de ampla defesa e da razoável duração do processo.  A resolução, que já está em vigor, estabelece que todo o processo de negociação seja acompanhado por um defensor, gravado em áudio e vídeo, e celebrado por escrito. Vigoram no Brasil alguns tipos de acordo penal, como a transação penal, acordos de colaboração premiada, justiça restaurativa e acordos de não persecução penal.  “Assim como ocorrido na proveitosa experiência estrangeira, conclui-se que o acordo penal representa um importante instrumento para a realização da justiça penal brasileira, pois, de um lado, garante mais eficiência à persecução penal e, de outro, mais previsibilidade do processo ao acusado”, conclui a nota técnica.

O uso da ferramenta evita a tramitação longa de uma ação penal, com desgaste para as partes envolvidas, além de representar economia de gastos para o Judiciário, diz o documento.

Veja
 

 

sábado, 30 de abril de 2016

Janot quer exclusividade no controle da impunidade - formalidades burocráticas vão facilitar impunidade de bandidos, se Janot for atendido pelo Supremo

Janot pede ao STF que proíba PF de negociar delações

PGR enviou à corte uma ação direta de inconstitucionalidade contra lei que legitima participação de delegados federais nas tratativas. 

Associação de delegados afirma que deferimento da ação representaria risco a operações

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, protocolou no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira uma ação direta de inconstitucionalidade argumentando que caibam exclusivamente ao Ministério Público as negociações de acordos de delação premiada. Dirigida ao presidente da corte, ministro Ricardo Lewandowski, a ação pede, na prática, que se proíba a Polícia Federal de pactuar acordos de colaboração sem a participação dos procuradores do MP.

A ação de Janot mira trechos da lei 12.850 de 2013 que legitimam a participação de delegados da PF nas tratativas. Segundo o chefe do Ministério Público Federal, os trechos são inconstitucionais e devem ser suspensos e anulados por contrariarem “o devido processo legal, o princípio da moralidade, o princípio acusatório, a titularidade da ação penal pública conferida ao Ministério Público pela Constituição, a exclusividade do exercício de funções do Ministério Público por membros legalmente investidos na carreira e a função constitucional da polícia, como órgão de segurança pública”.

Rodrigo Janot afirma que a investigação policial deve ser feita “em harmonia com as linhas de pensamento, de elucidação e de estratégia firmadas pelo MP”. Para o procurador-geral, “motivos corporativos” acabaram por atribuir à Polícia Federal funções além da competência de “subsidiar a atuação do Ministério Público”, a quem cabe dirigir a investigação criminal até a denúncia à Justiça ou arquivamento.

A exclusividade do Ministério Público, conforme argumenta Janot, está relacionada, entre outros princípios, à preservação da autoridade do juiz, à ampla defesa e à competência para negociar o perdão judicial e a diminuição de penas a delatores.  Embora busque retirar da PF a prerrogativa de negociar com colaboradores, Janot pede ao STF a “modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade” para preservar o efeito dos acordos de delação já firmados por delegados federais que os tenham considerado em investigações e processos criminais.

Por meio de nota da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), os delegados federais “lamentam” a ação de Janot ao STF, cujo possível deferimento classificam como “extremo retrocesso”. Segundo a nota da ADPF, “soa muito estranho que no exato momento em que a Polícia Federal realiza as maiores investigações de combate à corrupção, seja proposta uma Ação para dificultar a atuação da Polícia Federal”. Os delegados federais argumentam que a ação representa risco às operações Lava Jato e Acrônimo e ironizam: “As organizações criminosas que afrontam a nação brasileira comemoram a Ação proposta por Rodrigo Janot”.

Um dos exemplos recentes de acordo de delação firmado com a Polícia Federal sem a participação inicial do Ministério Público é o de Danielle Fonteles, dona da agência de propaganda Pepper Interativa, ajustado no âmbito da Operação Acrônimo, cujos depoimentos implicaram as contas da campanha da presidente Dilma Rousseff em 2014 e o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT).

A delação de Danielle à PF baseou o indiciamento de Pimentel. Ao chegar à Procuradoria-Geral da República, a delação de Danielle foi dividida em duas partes. Citações à presidente Dilma Rousseff foram encaminhadas ao STF, e as menções a Pimentel, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde corre o processo da Acrônimo.

Além de Daniele Fontelles, delatores da Operação Lava Jato, como os lobistas Julio Camargo e Fernando Baiano, também negociaram a colaboração com a PF.

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo