Acordo EUA-China deveria preocupar o Brasil
Desencontros
ideológicos não impedem americanos e chineses de se entenderem sobre comércio
de bens de alta tecnologia, e reduzirem o espaço a países fechados
Estados
Unidos e China têm em comum uma forte cultura nacionalista e uma longa lista de
desencontros, em vários campos. De disputas comerciais a conflitos geopolíticos
e ideológicos. Mas também coincidem em saber quais os próprios e reais
interesses, e em buscarem, de maneira pragmática, acordos com todos.
Economistas costumam chamar esses entendimentos de “ganha, ganha”, em que, no
final das contas, nenhum dos lados perde.
Algo que, há 12 anos, a política externa brasileira não entende, portanto não pratica.
Algo que, há 12 anos, a política externa brasileira não entende, portanto não pratica.
Juntos,
em Pequim, neste início de semana, para o encontro de cúpula da Apec, sigla em
inglês da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, os presidentes Barack Obama e Xi
Jinping demonstraram como devem agir líderes num mundo crescentemente
globalizado: assinaram um tratado de redução de tarifas de bens de alta
tecnologia. Parte de um acordo mais amplo envolvendo 54 economias, trata-se do
maior entendimento de liberação comercial assinado no âmbito da Organização
Mundial do Comércio nos últimos 17 anos. Como a China era quem mais resistia,
os demais países devem formalizar a adesão, na sede da OMC, em Genebra, no mês
que vem.
Outra
lição para o Brasil: de acordo com o “Wall Street Journal”, a China resistia a
aderir ao entendimento porque desejava proteger sua indústria de semicondutores
— o conhecido cacoete da “reserva de mercado” e criação de “campeões nacionais”.
Por certo, reanalisou a questão e concluiu o óbvio: que é melhor a
liberalização comercial, onde ela, e todos, podem ganhar mais.
Calcula-se
que serão eliminadas tarifas — outras, reduzidas — sobre vendas de US$ 1
trilhão e, nos EUA, criados 60 mil empregos. Os chineses, é óbvio, concluíram
que abrindo mão do protecionismo também ampliarão o mercado de trabalho
interno. O oposto ao senso comum.
A miopia
da política comercial brasileira, embebida em ideologia, vai em sentido
contrário. Enquanto chineses e americanos se entendem em torno do comércio, a
Brasília companheira se mantém atolada num Mercosul em estado de apoplexia, com
a economia argentina derretendo e a Venezuela em fase de implosão. Cada acerto
como este entre 54 países reduz espaços para o Brasil.
Ao mesmo
tempo, o comércio externo brasileiro retrocede, devido à grande dependência
para as exportações de produtos primários — cujas cotações estão em queda — e à
baixa competitividade da indústria.
A defesa
de uma economia fechada não é exclusividade de gabinetes de Brasília. Em São
José dos Campos, o sindicato que representa trabalhadores da Embraer quer que o
novo jato da empresa, o cargueiro KC-390, seja produzido com o máximo de
componentes nacionais. Os companheiros estão muito desinformados sobre o que há
tempos acontece no mundo. Se a Embraer atender ao pedido, fechará a linha de
montagem do jato e terá de demitir os filiados do sindicato.
Transcrito do O Globo