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quinta-feira, 10 de junho de 2021

Cabeça de camarão - Nas Entrelinhas

Luiz Carlos Azedo

Hoje, Doria não seria o candidato do PSDB à Presidência. Perderia as prévias da legenda para o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, ou o senador Tasso Jereissati (CE)

O que é o centro democrático? O ex-ministro Moreira Franco, discípulo do pessedismo de Amaral Peixoto, resume assim: a direita da esquerda e a esquerda da direita. Juntar essas forças num projeto eleitoral é o maior desfio político da conjuntura para os partidos que compõem esse campo — DEM, PSD, MDB, PSDB, Cidadania, PV e PDT —, porque as eleições de 2022 estão logo ali e o cenário eleitoral foi polarizado pelo presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Existe um eleitorado órfão, porque não deseja a continuidade de Bolsonaro ou a volta de Lula. Para essa fatia de eleitores, o chamado centro democrático é como um suculento camarão empanado. Nas eleições, porém, sem cabeça, o crustáceo morrerá na areia da praia.

Como na música Cartomante, de Ivan Lins e Vitor Martins, grande sucesso na voz de Elis Regina“Cai o rei de Espadas/ Cai o rei de Ouros/ Cai o rei de Paus/ Cai, não fica nada” —, os pré-candidatos que buscam articular e unificar esse campo estão desistindo ou se inviabilizando. Os casos mais emblemáticos são o ex-juiz da Lava-Jato Sergio Moro, uma espécie de rei de Espadas na crise ética, e o apresentador Luciano Huck, o rei de Ouros, para grande massa de empreendedores do país. O primeiro iniciou uma bem-sucedida carreira de consultor jurídico na área de análise de riscos; o segundo, vai dar um upgrade na carreira de comunicador, ao substituir o apresentador Fausto Silva nas tardes de domingo da Rede Globo.

Está difícil a vida do rei de Paus, o governador de São Paulo, João Doria, que lançou precocemente sua pré-candidatura e confrontou Bolsonaro na crise sanitária. O problema dele é o desgaste que enfrenta pelo fato de São Paulo ser o epicentro da pandemia de covid-19, com grande impacto na economia no estado e reflexos no desempenho de seu governo. Ensanduichado entre uma base bolsonarista muito forte, principalmente nas médias e pequenas cidades do interior, e a recidiva do petismo nos grandes centros urbanos, Doria não consegue fechar majoritariamente o eleitorado paulista. Sem São Paulo, sua candidatura não decola nacionalmente

Hoje, Doria não seria o candidato do PSDB à Presidência. Perderia as prévias da legenda para o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, ou o senador Tasso Jereissati (CE), um dos líderes históricos do partido. O quarto pretendente, o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio, é um azarão. A Executiva Nacional do PSDB aprovou, por unanimidade, as regras para a escolha do candidato do partido à Presidência da República em 2022. Elaborada pelo ex-deputado Marcus Pestana (MG), e discutida em uma comissão que debate as prévias do PSDB, encabeçada pelo ex-deputado José Aníbal (SP), o modelo pôs em xeque a candidatura de Doria.

Pelas regras aprovadas, os votos dos filiados sem mandato valerão 25% do total. Os outros 75% dos votos serão dados por três grupos diferentes: prefeitos e vice-prefeitos filiados ao PSDB; vereadores, deputados estaduais e distritais; e deputados federais, senadores, governadores e os ex-presidentes da sigla. Doria defendia votos com o mesmo peso para todos os integrantes do partido. Inconformado, quer mudar as regras do jogo na próxima reunião da Executiva.

Rei de Copas
Enquanto o rei de Paus não é escolhido pelo PSDB, o rei de Copas também não consegue derivar para o eleitorado de centro como gostaria. O candidato do PDT, Ciro Gomes, escolheu Lula como principal adversário no primeiro turno, mas essa estratégia não foi endossada pelo presidente da legenda, Carlos Lupi. É uma tática complicada, porque pressupõe deslocar o petista da disputa com Bolsonaro, seduzindo os eleitores de centro. Poderia até ocupar o espaço deixado pela disputa interna no PSDB, mas não é o que acontece. O problema é que o estilo de Ciro não se encaixa muito nesse figurino, por ter construído uma trajetória eleitoral de candidato de esquerda.

Resta ainda outra pré-candidatura sem legenda garantida, a do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, que pleiteia a vaga de candidato a presidente do DEM, partido hoje muito próximo do Bolsonaro. E uma legenda sem candidato, o PSD do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, que procura um nome competitivo de perfil liberal. DEM e PSD são partidos importantes para a chamada união da direita com o centro e do centro com a direita.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, colunista - Correio Braziliense


quinta-feira, 16 de julho de 2020

Cai fora, cai fora! - Nas entrelinhas

Passou da hora de o general Pazuello, interino na Saúde, voltar para o seu comando na 12ª Região Militar, que cuida dos suprimentos, embarcações e hospitais do Exército na Amazônia”

[Presidente Bolsonaro, sugerimos que consulte o artigo 84 da Consituição e use a competência que nele é conferida.
Tenha em conta que Pandiá Calógeras sendo engenheiro foi um excelente ministro da Guerra o mesmo valendo para o ótimo desempenho de José Serra na pasta  da Saúde, não sendo médico - fatos lembrados pelo ilustre articulista.]

O pior acidente aéreo de todos os tempos aconteceu em 1977, na Ilha de Tenerife, na Espanha. No dia 27 de março daquele ano, uma bomba explodiu no aeroporto de Gran Canaria, umas das Ilhas Canárias, e todos os voos foram desviados para o aeroporto de Los Rodeos, na ilha de Tenerife. Por conta da confusão no controle de pousos e decolagens, dois Boeing 747, um da KLM Royal Dutch Airlines, holandesa, e outro da Pan América Word Airways, norte-americana, se chocaram próximo ao solo do aeroporto. Morreram 583 pessoas, 248 passageiros da KLM e 335 dos 396 passageiros da Pam Am, cujo copiloto sobreviveu. Da cabine de seu avião, enquanto taxiava para decolar, o comandante americano Victor Grubbs viu outra aeronave vindo em sua direção, acelerando para levantar voo, em meio às névoas que cobriam a pista. “Esse filho da mãe está vindo para cima da gente!”, disse. “Cai fora, cai foral!”, gritou Robert Bragg, o copiloto que escapou da tragédia, com mais 60 pessoas.

O Brasil registrou 1.261 mortes pela covid-19 nas últimas 24 horas, isso é mais do que dois acidentes de Tenerife juntos. Se formos considerar os acidentes ocorridos no Brasil, o número de mortos é seis vezes maior do que o da queda do Airbus A-320 da TAM em Congonhas, na noite chuvosa de 17 de julho de 2007. Vinda de Porto Alegre, a aeronave ultrapassou a pista principal do aeroporto durante o pouso, passou sobre a Avenida Washington Luís, colidiu com o prédio da TAM Express e explodiu, matando todos os 187 passageiros e tripulantes a bordo e mais 12 pessoas em solo. O total de 75.523 óbitos por coronavírus registrado na pandemia equivale a 403 acidentes de Congonhas, ou um avião caindo no Brasil a cada três dias, se considerarmos que a primeira morte ocorreu em 17 de março.

Esse tipo de comparação é um recurso jornalístico para evitar que as estatísticas sejam banalizadas em razão da frequência com que os fatos ocorrem. É o que está acontecendo com a pandemia de coronavírus, cujas mortes estão sendo naturalizadas pelo governo federal desde que o presidente Bolsonaro disse que “todos nós vamos morrer um dia”. Na ocasião, 25 de março, eram 139 mortes. Quando o Brasil passou a China, com 5 mil mortos, em 28 de abril, Bolsonaro disparou: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. Agora, a média móvel de novas mortes no Brasil na última semana foi de 1.067 por dia, uma variação de 8% em relação aos óbitos registrados em 14 dias. Os últimos sete dias foram os mais letais no país. Com 39.705 casos registrados nas últimas 24 horas, chegamos a 1.970.909 de brasileiros infectados pelo novo coronavírus.

Desembarque
No Distrito Federal, no Paraná, em Santa Catarina, em Minas Gerais, em São Paulo, em Mato Grosso do Sul, em Mato Grosso, no Acre, em Rondônia, em Tocantins e no Piauí a pandemia continua seu avanço; o relaxamento do distanciamento social nesses estados está sendo desastroso, apesar de ter havido mais tempo para o sistema de saúde se preparar, o pessoal técnico ter mais conhecimento e experiência e os cuidados paliativos para reduzir o número de mortes também terem evoluído. O problema maior no combate à epidemia, porém, é que o Ministério da Saúde virou cabeça de camarão: não tem ministro, apesar dos elogios que o presidente Jair Bolsonaro faz ao general Eduardo Pazuello, que há 60 dias ocupa interinamente o cargo. “Predestinado” era o copiloto da Pam Am, que pulou da cabine do avião acidentado a quatro metros do solo, antes que ele explodisse, não Pazuello, como disse Bolsonaro.


Passou da hora de o general Pazuello voltar para o seu comando na 12ª Região Militar, na Amazônia, que cuida dos suprimentos, embarcações e hospitais do Exército no Pará, no Amazonas, no Acre, no Amapá, em Roraima e em Rondônia. Sua presença no ministério virou sinônimo de fracasso, porque o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa de um líder, que coordene e oriente todos o pessoal da saúde pública no Brasil, como fazia o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, demitido por Bolsonaro no auge de seu prestígio.[Mandetta era um excelente líder = na organização de comícios, que era a principal ocorrências nas entrevistas que na condição de palanqueiro,transformou as supostas entrevistas.]  E também porque os dois meses de interinidade criam um problema para o próprio Exército, que mantém, interinamente, no comando da 12ª Região Militar, o coronel Luís Moisés de Oliveira Braga Otero.

Pazuello teve uma conversa amigável, por telefone, com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a propósito do contencioso provocado pelas declarações do magistrado sobre a presença do Exército no Ministério da Saúde. O imbróglio mostra que está tudo errado. O coronel Antônio Élcio Franco Filho, que anda com uma faca ensanguentada na lapela, é o secretário executivo do Ministério da Saúde. O secretário de Atenção Especializada à Saúde é Luiz Otávio Franco Duarte, outro coronel. O major Angelo Martins Denicoli ocupa o cargo diretor de monitoramento e avaliação do SUS, enquanto o tenente-coronel Reginaldo Machado Ramos comanda a Gestão Interfederativa e Participativa. Nenhum deles entende de saúde pública.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense