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segunda-feira, 11 de maio de 2020

Crise vai impor uma reestruturação ampla à indústria global de petróleo – Editorial - O Globo

Entre mudanças de regulação que o abalo neste mercado força está o fim do regime de partilha no Brasil

O rumo da indústria mundial de petróleo começou a ser esboçado nos resultados das maiores empresas do setor nos Estados Unidos e na Europa durante o primeiro trimestre. As cinco maiores produtoras dos EUA e da Europa preveem cortes de custos em torno de 23% nos próximos meses, além de redução drástica em dividendos e suspensão parcial de produção. Shell, Exxon, Chevron, Total e British Petroleum perderam valor de mercado nos três primeiros meses do ano. O lucro da BP entre janeiro e março caiu 67% (para US$ 800 milhões). No Brasil, a Petrobras divulga resultados na quinta-feira.

Nada indica uma recuperação do setor nos próximos meses. Há excesso de estoques, guerra de preços e a pandemia do novo coronavírus só começou a ter impacto econômico fora das fronteiras da China a partir de meados de fevereiro. A Petrobras já paralisou 62 plataformas. Ao colapso nos preços soma-se uma queda de 30% no consumo global devido à pandemia.

Sobra petróleo em terra e no mar. Os EUA começam esta semana com 85% de ocupação do armazenamento terrestre, além de manter navios carregados com 20 milhões de barris ancorados na costa oeste, segundo a consultoria francesa Kpler. A Petrobras já reduziu sua produção em 23 mil barris/dia e, talvez, precise ir além, porque o frete para exportação subiu muito. Para portos chineses, por exemplo, aumentou de US$ 3 para US$ 11 por barril no espaço de 12 meses — e esse nível de custo supera o de extração em alguns campos brasileiros. O preço de referência mundial, o do óleo tipo Brent, caiu de US$ 70 em janeiro para US$ 20 por barril.

Esse cenário vai impor uma ampla reestruturação em toda a indústria.
No caso brasileiro, por exemplo, constata-se um otimismo governamental que contrasta com a realidade. Pelas projeções oficiais, na etapa pós-crise seria possível atrair até US$ 100 bilhões em investimentos privados na área de petróleo. Tudo é possível, sempre, mas a dinâmica recessiva da indústria petrolífera em todo o mundo sugere ser essa retórica reveladora de um governo ansioso por fontes externas de financiamento.

Mais realista seria uma união do Executivo com o Legislativo para empreender reformas na regulação setorial. Por exemplo, acabando com regimes de partilha e de cessão onerosa, e adotando um sistema único de concessão. Facilitaria a atração de capitais, até porque as reservas nacionais têm parâmetros de custos de produção bem competitivos.

 O Globo - Editorial 




terça-feira, 26 de março de 2019

Cadáver verde

Vou repetir: chegamos lá, o cadáver humano agora será lixo orgânico

Anos atrás, na época do COP 15, a conferência ambientalista em Copenhague, escrevi uma coluna aqui na Folha ("Cadáver verde") em que previa o uso de corpos humanos para alimentação hipervegana. O raciocínio, numa chave distópica, era que um dia a ciência iria descobrir a senciência (se você não sabe o que é, olhe no Google) nos vegetais, e toda a gente bacana contra a violência na alimentação, herdeiros do utilitarista Peter Singer e seu "Animal Liberation", seria obrigada a concluir que a única alimentação sustentável e ética possível seria comer cadáveres humanos. Cheguei perto da realidade.

Você, curioso, talvez se pergunte: como alguém pode prever coisas assim? Simples: aposte no ridículo, na hipocrisia social, no interesse econômico e, antes de tudo, no pior travestido de bem. A fórmula é quase infalível. Ia esquecendo! Acrescente uma pitada de niilismo inconfesso.  No caderno Mundo do dia 3 de março, a Folha publicou uma reportagem fundamental que descrevia o processo de tramitação de uma lei no estado de Washington, na costa oeste americana (uma espécie de paraíso do partido democrata, um parque temático que poderia se chamar "nirvana hipster"), segundo a qual cadáveres humanos poderão ser usados como adubo, ao invés de cremados ou enterrados (cremar está na moda, inclusive no estado em questão). O termo científico é "compostagem humana". O termo em si significa uma espécie de reciclagem de lixo orgânico. No caso, o lixo é o cadáver humano. Você entendeu? Vou repetir para fins didáticos: sim, chegamos lá, o cadáver humano agora será lixo orgânico.

O filósofo britânico Edmund Burke (1729-1797) escreveu certa feita que a sociedade era uma comunidade de almas que reúne os mortos, os vivos e os que ainda não nasceram. O mesmo autor, comentando uma cena em sua imaginação que viria a acontecer na realidade, dizia que o povo, ao invadir os aposentos da rainha durante a Revolução Francesa, descobriria que uma rainha era apenas uma mulher, e uma mulher, apenas um animal.  Esses trechos se constituem em fundamento do que a filosofia posterior chamaria de "imaginação moral". A expressão intitula um livro primoroso escrito pela historiadora americana Gertrude Himmelfarb, recentemente publicado pela É Realizações, "Imaginação Moral". Leia.


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A ideia é que a moral é dependente da função imaginativa depositada em experiências ancestrais narrativas, afetivas e mesmo estéticas. Adam Smith, no século 18, e John Stuart Mill, no 19, referiam-se a duas dimensões de modo semelhante: "moral sentiments" (sentimentos morais) e "moral affection" (afeto moral), respectivamente. Haveria na moral um estrato afetivo, estético, imaginativo, narrativo, alheio à lógica geométrica da ciência? Sim. Segundo o conceito de imaginação moral, uma vez que você dilacera o tecido narrativo da moral com argumentos econômicos, calculadores e sofistas (Burke, de novo) você abre um abismo no comportamento humano que jamais será organizado moralmente apenas pela lógica racional (sinto muito, Kant), e menos ainda pela científica. Da compostagem humana, chegaremos a comer cadáveres humanos porque um ser humano é apenas mais um animal.
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Matéria Completa - Folha de S. Paulo - Luiz Felipe Pondé