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quarta-feira, 13 de março de 2019

Caso Marielle: há mais dúvidas do que respostas



[insistimos em que a investigação de um assassinato  não pode atropelar mais de 50.000 investigações de homícidio, em curso - para saber mais clique aqui.]


A execução da vereadora Marielle Franco e do seu motorista Anderson Gomes está sob investigação há 363 dias. A 48 horas do aniversário de um ano dos assassinatos, o Ministério Público e a polícia anunciaram com estardalhaço a prisão dos supostos assassinos: Ronnie Lessa e Élcio Vieira de Queiroz, ambos egressos da Polícia Militar. Quem mandou matar? Não há sinal dos mandantes.

Alegou-se que "provas técnicas" levaram à identificação dos executores de Marielle e Anderson. Pode ser. Mas essas provas não foram colocadas sobre a mesa nas entrevistas. Informou-se que os criminosos nutriam uma "repulsa" pela figura de Marielle e por sua pauta política. Mataram por "motivo torpe", alegou a Promotoria. Cometeram "crime de ódio", declarou o representante da polícia civil. Impossível não é. Mas faz pouco nexo. 

No mundo em que as coisas fazem sentido, matadores de aluguel matam como um negócio. Não costumam se dar ao luxo de custear uma operação sofisticada para matar uma pessoa por não gostar das atividades dela. Agem por dinheiro, não por capricho. As autoridades não excluem a hipótese de surgirem os mandantes.

O governador do Rio, Wilson Witzel, soltou fogos. "É uma resposta importante que nós estamos dando à sociedade, a elucidação de um crime bárbaro…" Elucidação? Longe disso. Se os representantes do Ministério Público e da polícia civil do Rio tivessem convocado a imprensa nacional para anunciar uma nova receita de feijoada, haveria no panelão dessa investigação de quase um ano muito caldo (dois suspeitos estão no fogo) e pouco feijão (falta mostrar as provas técnicas). Carne, nem pensar —esse gostinho, a plateia só vai sentir quando forem respondidas as perguntas centrais: quem mandou matar? Por quê? Convém lembrar que a investigação do caso Marielle está sob investigação da Polícia Federal. Isso ainda vai longe. 



[a única certeza que há, é a de quando o alarde das prisões dos suspeitos cessar, após o próximo dia 14, os suspeitos serão silenciosamente libertados (nesses casos não convocam entrevistas) e as investigações continuam.

Utilizam dezenas de policiais para investigar dois homícidios, utilizar a PF para investigar a investigação, enquanto milhares de homicídios (incluindo latrocínios e outros  crimes mais graves)  são deixados de lado.]




sábado, 5 de maio de 2018

Decisão do STF sobre foro deixa lista infindável de dúvidas

Tantas incertezas indicam que a nova interpretação dada pelo Supremo estará sob questionamento constante 

O Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, alterou a interpretação dada ao foro por prerrogativa de função, impondo limitações que não derivam diretamente da Constituição. A primeira delas restringe o foro por um critério temporal, definindo que apenas crimes ocorridos durante o mandato exigem foro especial; a segunda impõe um critério material, exigindo que a prática do crime tenha se dado em razão da função pública. O tribunal estabeleceu também que findo o mandato, encerra-se a prerrogativa de foro, com uma exceção dada apenas àqueles casos que já estiverem prestes a serem julgados.

A decisão se assentou na ideia de mutação constitucional, mas os motivos parecem ter sido de ordem prática, para desafogar o Supremo da incumbência de tribunal criminal e promover maior eficiência no desenrolar de inquéritos e ações penais, em um contexto onde o Supremo parece ter admitido que o foro por prerrogativa de função era, de fato, um foro privilegiado, mas sem qualquer parâmetro para tal afirmação. As instâncias ordinárias da justiça terão realmente mais condições de processar poderosos? É muito pouco provável.Tamanha mudança traz uma lista infindável com essa e outras dúvidas sobre sua implementação.

Sabe-se que o novo entendimento será imediatamente aplicado aos casos penais em andamento no Supremo, mas não está claro se afetará apenas deputados e senadores ou se abrangerá todas as autoridades que têm prerrogativa de foro no Supremo, como ministros, por exemplo. Além disso, a incerteza ficou aparente pelas dúvidas expostas pelos próprios ministros: crimes relacionados a caixa dois, ou seja, para obtenção do cargo, estão dentro ou fora da nova regra? E os crimes praticados nos gabinetes? 

Juízes de primeira instância poderão aplicar medidas cautelares e suspender o exercício de mandato de deputados e senadores? E realizar busca e apreensão em gabinetes? Os demais tribunais, devem observar as mesmas regras nos seus processos de competência originária? Restringe-se o foro para deputados e senadores e o mantém intacto para juízes, promotores e prefeitos?  Tantas incertezas indicam que a nova interpretação dada pelo Supremo estará sob questionamento constante. A forma pela qual o Supremo chegou a essa mudança de interpretação não ajuda: uma questão de ordem em ação penal, suscitada pelo próprio ministro relator.

A decisão, repentina e processualmente exótica, mostra que o Supremo pode se valer de qualquer ação em andamento para derivar questões constitucionais relevantes, sem que tenha sido provocado a isso e mesmo quando há debate pendente no Legislativo (ainda tramita uma PEC que extingue definitivamente o foro por prerrogativa de função em todas as situações).  Esse é só mais um exemplo da expansão de competências dada pelo tribunal a si mesmo. É verdade que não se trata de um fenômeno exclusivo de nosso tribunal; afinal, já é célebre a frase de um dos juízes da Suprema Corte americana dizendo que a Constituição é o que os juízes dizem que é. A Constituição brasileira é que o Supremo diz? Decisões recentes, tomadas no curso de uma agenda de moralização da política, têm afastado o tribunal do sentido muitas vezes literal da Constituição. Amplia seu poder, mas não sua autoridade: quanto mais inusual, dividida e imprevisível a decisão, maiores os questionamentos.

Muito poder, sem controle nem mesmo processual, deveria ser acompanhado de moderação. Para cortes infladas, o remédio é a autocontenção— e nisso o Supremo Tribunal Federal tem falhado.


Folha de S. Paulo
 



Eloísa Machado de Almeida é professora e coordenadora do Supremo em Pauta FGV Direito SP