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terça-feira, 21 de março de 2023

O Brasil pertence aos índios? - Percival Puggina

[como de hábito, estão sempre ocupados em nada nada fazer.]

         Corria o ano 2000 e a nação se preparava para festejar os 500 anos do Descobrimento. Nunca a esquerda foi tão indigenista! Cabral era vaiado nas salas de aula e na mídia
Se aparecesse alguma caravela, seria afundada. 
Aliás, fizeram uma que, de maneira muito suspeita, se recusou a navegar. Em Porto Alegre, o relógio que fazia a contagem regressiva serviu a culto indígena prestado por descendentes de europeus que copiaram performances apaches aprendidas do cinema ianque. Tocaram fogo no relógio, dançaram em torno da fogueira e foram comemorar num restaurante.

Quando escrevi criticando a representação teatral e o incêndio, que contou com proteção do oficialismo petista da época, respondeu-me um padre, reprovando minha posição. O que segue é um extrato dos argumentos que usei na réplica e atende solicitação de leitor do Instagram que, há alguns dias, me pediu informações sobre o tema.

Comecei a carta ao padre alertando para a obviedade tantas vezes mencionada por mim: o fato de o espaço físico do nosso subcontinente já estar povoado não significa que ele não tenha sido descoberto porque, de fato só se descobre o que já existe; o que não existe e passa a existir é criado ou inventado. Os portugueses descobriram algo que lhes era, em todos os seus aspectos, desconhecido.

São raríssimos os casos em que os atuais ocupantes de quaisquer áreas do globo estão nelas e as têm como suas desde os primórdios. Não era diferente aqui, antes de Cabral. As tribos disputavam o litoral, por ser mais aprazível do que o interior. Na Bahia, onde aportaram as caravelas, os tupiniquins haviam expulso os tapuias, nome que significa “índio do mato”.     

No Peru, os Chavins, os Nazcas, os Paracas, os Moches que ocupavam a costa do pacífico no século XVI, foram expulsos ou submetidos pelos Incas. E os astecas, a quantos expulsaram e sacrificaram? 
Que fizeram na Europa e norte da África, ostrogodos, visigodos, suábios, hérulos, vândalos, entre outros? 
Por ser meu interlocutor da época um presbítero, pareceu-me oportuno lembrá-lo de que nem Deus conseguiu que a Terra Prometida estivesse desocupada e disponível para o povo da Aliança quando os israelitas se retiraram do Egito. Rolou sangue, muito sangue.
 
Aliás, é bom que os cristãos devotos desse tão engenhoso quanto inútil revisionismo histórico tenham presente o que aconteceu quando Constantino decretou e impôs o fim da religião do Império Romano
Nunca vi qualquer religioso “progressista” ou conservador, reclamando do que foi feito com a civilização e a cultura romana anterior ao Cristianismo. Coitados! Num canetaço imperial lhes tomaram a fé e os templos. Quantos deuses romanos ficaram ao relento! 
Tampouco vi alguém denunciando a ação evangelizadora e restauradora da civilização empreendida por cristãos junto aos bárbaros na baixa Idade Média. 
Nem sobre os procedimentos de Clóvis, rei franco, após seu batismo.
 
Lamentar o fim da “civilização” pré-cabralina, como tantas vezes ouço, é fazer uso totalmente inadequado da palavra civilização. 
Pode-se falar em “cultura”, mas tampouco esta teve um fim. 
Há tribos que vivem até hoje como viviam ao tempo do Descobrimento. Mas será isso positivo? Será bom que essas pessoas vivam privadas dos benefícios da civilização e sirvam de laboratório para estudos antropológicos? 
 
Por outro lado, tenta-se extrair dividendo político e moral de uma suposta descoberta petista sobre os problemas dos povos originários após o Descobrimento. Não subestimem os meus professores de escolas públicas nos anos 50, lá em Santana do Livramento!  
Aprendi deles e dos mais elementares livros de história da época que os índios foram vítimas de violência, tentativas de escravidão etc. Não sei de onde saiu o suposto mérito petista de, num furo de reportagem, trazer à superfície a verdade sobre tais fatos. Novidade é a tentativa de extrair, além do impróprio dividendo moral, o lucro ideológico disso, jogando brasileiros contra brasileiros, tentando simplificar a história para reduzi-la aos termos da interpretação marxista de luta de classes. 
Novidade é entrar de martelete e picareta no relato dos acontecimentos históricos para deslegitimar todos os títulos de propriedade do país. Que eu saiba, nem Engels pensou nessa!

Na Ibero América, a esquerda católica, conhecida na Itália como “cattocomunista” parece não reconhecer o valor da conversão, do batismo e da evangelização de um continente inteiro. Chego a crer, que muitos religiosos veem com maus olhos a cruz plantada nas areias de Porto Seguro, após a primeira missa, pelos nossos descobridores que ante ela se ajoelhavam para que os nativos (na forma da carta de Caminha) “vissem o respeito que lhe tínhamos” ...

Muitas vezes, nas datas nacionais que cultuam o verde e amarelo da nossa bandeira, quando a esquerda está na oposição, seus militantes costumam proclamar do alto de sua simulada benignidade que nada há a comemorar porque as coisas não vão bem. 
A gente os conhece, mas sempre me surpreende quando quem diz isso é um religioso católico ou cristão. 
Afinal, se fossem boas essas razões, as próprias festas cristãs deveriam ser suspensas porque estamos tão longe do Reino de Deus e de seus critérios que deveríamos entoar, em todas as missas, um cântico que iniciasse com “Nada a comemorar, Senhor!”.

Eu continuo crendo no valor do batismo e convencido de que há um bem intrínseco na evangelização e na civilização. E quando vejo essas dezenas de milhões de mestiços que compõem a parcela majoritária da população do norte, nordeste e centro-oeste brasileiro, trazendo nos cabelos, nos olhos, na estatura, as marcas de suas raízes indígenas, e os encontro nas missas e na vida civilizada, me alegro pela obra dos jesuítas e de quantos para cá vieram, com os recursos da época, fazendo a história como sabiam, com a coragem que nos falta e com os conhecimentos inerentes ao período em que viviam.

Todas essas manifestações de repúdio aos brancos que se intrometendo aqui não viraram índios e não trouxeram a bordo antropólogos, sociólogos, psicólogos e filósofos me suscitam uma dúvida: onde querem chegar? Devemos voltar para a Europa, confinarmos os brancos em reservas e devolvermos tudo para os índios? 
Nos juntarmos a eles no mato? Des-descobrir? Desconstruir? Desevangelizar? Deseducar? Desmestiçar? 
Retornarmos os brancos à Europa, os negros à África, os amarelos à Ásia? Não conheço pensamento mais racista do que esse.

Admito que muitos pensem diferente. Também eu preferia que essas coisas e muitas outras tivessem ocorrido de modo diverso. Mas não vou passar a vida remoendo fatos ocorridos em séculos passados, escrutinando-os anacro Terra Prometida unicamente. Menos ainda criando um impasse sem solução sobre nossa identidade nacional. Não podemos corrigir o passado, mas o futuro, sim.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


terça-feira, 9 de novembro de 2021

O preço do radicalismo - Revista Oeste

Ana Paula Henkel

O resultado da eleição na Virgínia mostra que a agenda radical de políticas identitárias e segregacionistas vem incomodando milhares de americanos

<i>Outdoor</i> 'Novo dia para a Virgínia', do candidato Glenn Youngkin | Foto: Rosemarie Mosteller/Shutterstock
Outdoor 'Novo dia para a Virgínia', do candidato Glenn Youngkin | Foto: Rosemarie Mosteller/Shutterstock
 

Desde a campanha presidencial em 2020, havia uma expectativa entre os norte-americanos sobre as políticas que seriam implementas pelos democratas se conseguissem derrotar o malvadão do século Donald Trump. Numa eleição cheia de perguntas sem respostas, Joe Biden foi eleito o 46º presidente dos Estados Unidos, mesmo não tendo saído do porão de sua residência, nem para debates com o seu oponente. No imaginário de milhões de cidadãos, pairava a dúvida das acusações dos inimigos de Biden sobre a guinada radical do partido para o lado extremo da esquerda americana. Sabe-se que o nome do ex-vice de Barack Obama não foi empurrado para fora das primárias democratas à toa. Ele poderia, tranquilamente, derrubar a retórica inflamada de que o partido flertava com políticas radicais como a agenda de identidade de gênero, big government, socialismo na América e até um dedinho mais pesado no controle social e econômico por parte da esfera federal.

Bem, o que era flerte virou casamento. E dos mais pomposos! Em apenas dez meses, nunca na história da nação mais próspera do mundo um presidente viu seus números de aprovação derreterem em tão pouco tempo. E não é por suas gafes nem perdas de memória ao vivo. Há alguns artigos aqui em Oeste cheios de detalhes sobre os passos da atual administração que faz Jimmy Carter parecer um bom presidente: o desastre da retirada caótica das tropas americanas do Afeganistão; a crise imigratória sem precedentes na fronteira sul com a entrada de quase 2 milhões de ilegais apenas neste ano; a estagnação e a inflação combinadas e firmadas como caminho econômico (stagflation), mesmo com a recuperação econômica em curso deixada por Trump; a crise nos portos e as prateleiras vazias em todo o país; os sinais de fraqueza militar diante do mundo; a interrupção da independência energética; o desemprego nas alturas… and counting.

Tudo isso poderia fazer parte de uma crise “compreensível” dentro de uma pandemia global (análise dos democratas mais ferrenhos) se não fosse a continuação da agenda no novo radical Partido Democrata que prega, dia sim e outro também, que forças policiais são malvadas e desnecessárias, que toda pessoa branca é racista por natureza, que todo menino que “se sente” como menina tem o direito de usar o banheiro feminino, que aborto até o último mês de gravidez é questão de “saúde pública”, que assassinos, estupradores e criminosos que estão na prisão deveriam ter o direito de votar; entre outros pontos surreais que são parte de uma agenda ideológica nefasta.

Em 20 de janeiro de 2021, em seu discurso de posse, Joe Biden prometeu “unir” uma América dividida pelo bufão nazista-fascista que estava prestes a acabar com a democracia nos EUA. Pois bem, depois de dez meses na Casa Branca, pouquíssimas aparições e muitas gafes, Joe Biden conseguiu mostrar as verdadeiras cores de seu governo, que em nada, absolutamente nada, refletem as palavras proferidas em janeiro.

A agenda marxista de “negros versus brancos”, “mulheres versus homens”, “ricos versus pobres”, “filhos versus pais”, “vacinados versus não vacinados” está a todo vapor desde 21 de janeiro de 2021. E essa agenda assustadora que inclui a aceitação obrigatória de 47 gêneros, não apenas masculino e feminino, não ficou restrita à esfera de debates políticos vazios ou às castas de abastados desmiolados em Hollywood. Ela chegou com uma força avassaladora, impulsada pelo governo federal, às escolas.

Em vários distritos escolares nos Estados democratas, professores tentam aplicar cursos como “Explorando e Compreendendo a Branquitude” e “Como Ser um Educador Antirracista”, em que os militantes disfarçados de educadores empurram barbáries baseadas na doutrina conhecida como Critical Race Theory, ou CRT, algo como “Teoria Racial Crítica”. Esses cursos pregam o “pecado original” de crianças brancas que, teoricamente, nascem sem saber que são racistas por natureza (mas são!) e, por isso, ajudam a sociedade a “assassinar o espírito das crianças negras”. Chocados? Apertem o cinto.

A política norte-americana, assim como no Brasil, é hoje muito bem delimitada. Não é difícil identificar quem vota em democratas ou republicanos. No entanto, há um ponto de convergência entre eles que parece não acompanhar o pêndulo político-ideológico. Filhos. Você pode até ter uma simpatia por políticas mais invasivas do governo na economia ou em programas sociais, mas essa simpatia acaba quando o assunto é a invasão do governo na esfera da educação familiar e o que os pais podem ou não demandar das escolas públicas pagas com dinheiro desses pais, republicanos e democratas.

Enquanto no Brasil o vermelho simboliza a cor de partidos de esquerda, nos EUA é o oposto. O vermelho é a cor dos republicanos e o azul a dos democratas. No cenário eleitoral no país, os Estados são divididos entre os blue states (que votam nos democratas), os red states (que votam nos republicanos) e os purple states (os Estados roxos, que votam em candidatos dos dois partidos).

Nesta semana, o pêndulo político de um desses Estados azuis mudou de maneira surpreendente. Talvez surpreendente para muitos democratas, mas não para milhões de americanos que acompanham a política nacional com o pragmatismo característico ianque. A Virgínia, um Estado considerado deep blue, ou seja, que vota fervorosamente com os democratas há muitos anos, elegeu um novo governador, uma nova vice-governadora (eleita separadamente) e um novo procurador-geral do Estado. Todos do Partido Republicano. A corrida, que aconteceu em 2 de novembro, foi a primeira prova do governo Joe Biden e pode ser um termômetro para as eleições legislativas em 2022, os chamados midterms, quando republicanos podem reconquistar a maioria na Câmara e no Senado.

Em maio, um garoto, autointitulando-se uma pessoa do gênero oposto, entrou no banheiro feminino e estuprou uma menina

Glenn Youngkin, Winsome Sears e Jason Miyares não derrotaram apenas candidatos do partido oponente que domina o Estado desde 2003, mas uma agenda bizarra que saiu das cabeças desmioladas dos justiceiros sociais em Washington e está sendo empurrada em parques e escolas.

É fato que essa agenda radical de políticas identitárias e segregacionistas vem incomodando milhares de pais, e, se ela tivesse ficado restrita à redoma hollywoodiana e seus parquinhos-satélites, talvez democratas continuariam tranquilos em seus gabinetes nos Estados deep blue. O problema é que jacobinos, como escrevi em meu artigo da semana passada sobre o linchamento do jogador de vôlei Maurício Souza, não conseguem se desvencilhar do radicalismo vil. 
Há quase cinco anos escrevo sobre os perigos da agenda impositiva e sem o menor debate sobre transexuais no esporte e no universo feminino. 
E um dos perigos é a normalização de homens biológicos que “se sentemcomo mulheres invadindo espaços particularmente sensíveis para nós, espaços que vão além de quadras e campos esportivos. Falo de banheiros, vestiários e dormitórios.

E não foi por falta de tantos alertas feitos por tantas mulheres. O resultado que mais temíamos dessa agenda lúgubre aconteceu. Em maio deste ano, um garoto, usando saias e se autointitulando uma pessoa do gênero oposto, entrou no banheiro feminino de uma escola do Condado de Loudoun, na Virgínia, e estuprou uma menina menor de idade. Em junho, durante uma reunião do conselho das escolas públicas do condado, Scott Smith, pai da menina estuprada, pediu satisfação à escola em público e, sem obter resposta, elevou o tom da voz e foi preso por questionar enfaticamente se a escola sabia do ocorrido. O vídeo do pai sendo derrubado no chão e algemado por policiais viralizou. Além de Smith, os pais presentes na reunião escolar estavam protestando contra a proposta do conselho de liberar o uso de banheiros e vestiários para qualquer aluno que se identificasse como transexual, mesmo sem nenhuma avaliação. Os questionamentos foram totalmente ignorados, e, logo após o término do recesso escolar de julho, o conselho aprovou a proposta que autorizava o uso de banheiros e vestiários de acordo com “a identidade social” de cada aluno.

Diante dos vídeos que correram as redes sociais da reunião em que Smith foi preso, a escola em questão soltou um pronunciamento oficial sobre o alegado estupro, afirmando que jamais houve tal crime cometido por um aluno transgênero em nenhuma das escolas do Condado de Loudoun. No memorando, distribuído para os pais e para a imprensa, membros do conselho escolar afirmaram que “nossos estudantes não precisam ser protegidos, e eles não estão em perigo. Por acaso temos ataques regulares em nossos banheiros e vestiários?”, dizia o documento. O superintendente do distrito, Scott Ziegler, chegou a afirmar que não havia nenhum registro de estupros ocorrido nos banheiros da escola, completando que essa “pessoa predatória que se identifica como transgênero não existe”.

E aqui, nesse ponto, o pêndulo democrata desaparece. A política não chega aonde filhos estão desprotegidos e pais enfurecidos. Com pouco menos de um mês das eleições para o governo estadual da Virgínia, o candidato democrata Terry McAuliffe disse: “Eu não deixarei que os pais entrem nas escolas e tirem livros e tomem suas próprias decisões. Não acho que os pais devam dizer às escolas o que elas devem ensinar”. O sinal havia sido dado. Imediatamente, a Associação Nacional de Conselhos Escolares enviou uma carta ao presidente Joe Biden pedindo que os pais que se colocassem contra a obrigatoriedade dos cursos que “promovem a luta contra o racismo” fossem considerados “terroristas domésticos” pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América. Sim, você leu corretamente.

Não parou por aí. O pedido “caiu” na mesa do procurador-geral dos Estados Unidos, Merrick Garland, e o resultado foi um comunicado oficial do Departamento de Justiça para que agentes do FBI se reunissem com as polícias locais para discutir como conter o “número crescente de ameaças contra membros de conselhos escolares, professores e outros funcionários da educação”. O impacto inicial foi, obviamente, o aplauso fácil da turba ridícula de militantes jacobinos. Não durou muito. No mesmo dia, pais se reuniram em um número muito maior dessa vez por todo o país e Garland foi chamado para uma audiência no Senado Federal em que foi massacrado com perguntas retóricas dos senadores republicanos. O assunto, que até ali estava na esfera da mídia estadual, tomou proporções nacionais, e pais por todo o país estavam furiosos por terem sido chamados, mesmo que indiretamente, de “terroristas domésticos”.

Nesse meio tempo, um juiz da Virgínia, diante de provas concretas, condena o rapaz autointitulado transexual que estuprou a menina no banheiro feminino da escola. Provas de que a escola acobertou o fato aparecem e a política, mais uma vez, desaparece. O sistema educacional e a segurança dos filhos unem pais de todos os espectros políticos. Glenn Youngkin, o candidato republicano, se colocou ao lado dos pais e focou sua campanha no perigo da agenda de políticas segregacionistas raciais e de identidade de gênero, ganhando força em todos os setores eleitorais em que democratas reinavam. Youngkin levou com folga condados democratas de grupos negros e latinos, assim como em grupos de mães solteiras. O resultado da imposição de um manual vil de destruição de parte do tecido social que alimenta uma sociedade moralmente saudável foi a perda do controle de um Estado vital para os democratas.

Glenn Youngkin, um rico empresário, conseguiu devolver o governo da Virgínia para os republicanos em uma corrida que teve o maior comparecimento entre os eleitores do Estado na história recente. A participação eleitoral nessa eleição foi maior do que em qualquer outra eleição para governador na Virgínia desde 1997. Winsome Sears, a vice-governadora eleita, imigrante, ex-militar e também republicana, é a primeira mulher negra na história do Estado a ocupar um cargo no Executivo estadual. Jason Miyares, eleito procurador-geral do Estado pelo partido republicano, também entra para a história como o primeiro latino a ocupar o cargo na Virgínia.

Parece que o Estado que nos deu George Washington, Thomas Jefferson e James Madison, Pais Fundadores da América, está agora sob o comando dos pais.

Leia também “Este homem é uma lutadora” 

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste

 

domingo, 31 de janeiro de 2021

Homens em esportes femininos? - Revista Oeste

Ana Paula Henkel

O festival de canetadas de Biden, entre várias medidas 'progressistas', estabelece que homens biológicos que se declarem mulheres poderão competir em times femininos

No artigo da edição passada para a Revista Oeste, relatei como o novo presidente dos Estados Unidos é uma antiga peça da velha política de Washington no novo cenário da esquerda norte-americana. Joe Biden transita pelos corredores do Capitólio e da Casa Branca há 47 anos. É o que era chamado por Donald Trump de mais uma “criatura do pântano” — uma referência aos bancos de rios e ao solo úmido da planície inundada sobre a qual foi construída a capital. A expressão “drenar o pântano” foi usada incansavelmente por Trump em sua administração com a intenção de passar a mensagem de que a velha política de compadrio de Washington seria combatida e as “criaturas do pântano”, expostas.

Mas, depois de quatro anos de malcriações digitais e políticas reais, o bufão laranja perdeu. O pântano venceu. Pelo menos por agora. E junto com essa vitória, com ou sem fraude, suas criaturas estão de volta, ouriçadas com a possibilidade do poder absoluto — aquele que disseram que Trump usaria — por pelo menos dois anos. Além da Presidência, os democratas agora detêm o controle das duas casas legislativas. Oligopólios e tecnocratas financiaram a campanha que elegeu políticos para proteger oligopólios e tecnocratas. Lobistas endinheirados pendurados em cargos na Casa Branca operam para que a vontade de cidadãos comuns não interfira na ordem do dia ou na vida de oligopólios e tecnocratas que financiam campanhas… É o pântano em seu maior esplendor.

Ainda há quem insista em dizer que não existe esquerda nos Estados Unidos e que o Partido Democrata seguiria apenas uma linha social-democrata. Bem, se estivéssemos falando de algumas décadas atrás, até concordaria com essa afirmação. No entanto, hoje, infelizmente, essa não é a realidade do antigo partido de John F. Kennedyse estivesse vivo, ele provavelmente seria um republicano.

Com a desculpa da pandemia, os debates presidenciais antes das eleições norte-americanas de novembro foram cancelados. Com um candidato escondido no porão, o país não pôde ver, entender ou ter certeza das plataformas da dupla Biden/Harris. Coletivas com jornalistas eram sempre evitadas pelo então candidato democrata. As entrevistas, quando aconteciam, eram ensaiadas com os mesmos militantes da imprensa. E mesmo com todas as evidências do caminho que a dupla seguiria existia uma pontinha de esperança de que, se Donald Trump não conseguisse a reeleição, Biden, uma vez no topo do poder, não seguiria a agenda da esquerda radical de sua vice, Kamala Harris. Como Biden sempre foi ligado à ala moderada do partido (e talvez por isso tenha saído vitorioso das primárias democratas), havia uma pequena expectativa de que ele não se ajoelharia diante da agenda globalista raivosa. Mas a tal pontinha de esperança e a tal pequena expectativa viraram pó logo na largada do mandato.

Nas primeiras 72 horas como presidente dos Estados Unidos, Biden já havia assinado trinta ações executivas, sendo 19 ordens executivas diretas, todas seguindo os perturbadores caminhos da nova esquerda. Dez das canetadas de Biden reverteram direta e imediatamente as políticas de Trump. Apenas para efeito de comparação, nos mesmos primeiros três dias na Casa Branca, Donald Trump assinou uma única ordem executiva; Barack Obama, cinco; George W. Bush, nenhuma; Bill Clinton assinou apenas uma.

Fonte: Fox News

A razão para tantas ordens executivas poderia ser a pandemia? Poderia. Mas boa parte delas nada tem a ver com o vírus, e sim com a agenda radical democrata. O pacote de ordens é uma clara demonstração do que mais arrepia os conservadores e os verdadeiros liberais: a sanha intervencionista do Estado sobre os cidadãos por meio de um governo onipresente e onipotente, sem a menor participação da sociedade.

As pautas ideológicas da nova esquerda norte-americana andam a todo o vapor. Seguem uma tendência histérica no mundo. A mesma turma que grita “ciência” para quase tudo defende a ideia de que não há diferença entre um homem biológico e uma mulher biológica — embora celebre Kamala Harris como a primeira mulher a ser vice-presidente dos EUA. 
Dentre as ordens executivas que Joe Biden assinou, uma é muito preocupante: ela coloca meninas competindo com meninos nos esportes. É isso mesmo. Trump havia ordenado exatamente o oposto, obrigando o governo federal a respeitar a obviedadeveja vocêcientífica do sexo biológico. A canetada de Biden proíbe o governo federal de “discriminar com base na orientação sexual ou identidade de gênero”. A medida autoriza que atletas transgênero, meninos e homens biológicos, possam competir com meninas e mulheres em escolas e universidades apenas identificando-se como mulheres. Isso é gravíssimo.
Ryan T. Anderson, pesquisador sênior do Departamento de Princípios Americanos e Políticas Públicas da Heritage Foundation, em uma entrevista nesta semana foi além. Ele tocou em um ponto que sempre menciono em minhas palestras e artigos sobre transexuais no campo esportivo feminino: a judicialização no esporte — agora com o agravante de que as mulheres que não são atletas também terão de buscar a defesa de seus direitos naturais nas cortes.
Insanidade! Anderson disse: “Pelos próximos quatro anos, veremos litígios intermináveis sobre a privacidade feminina quando se trata de espaços exclusivos para mulheres, como banheiros, vestiários e abrigos para sem-teto, onde os homens que se identificam como mulheres dirão que têm o direito civil de entrar e usar aqueles espaços. Haverá litígios em nome de atletas do ensino médio e universidades que perderão corridas e competições para meninos do ensino médio que se identificam como meninas. Veremos litígios de médicos e enfermeiras. É a guerra cultural que atingiu o enésimo grau com o presidente que estava falando sobre união e a cura da nação”, finaliza o pesquisador.

10 mil criminosos estrangeiros soltos. Praticamente um STF ianque

Curiosamente, a consequência dessa ordem absurda do democrata pode trazer união. Não a união que Joe Biden finge que prega, tampouco a que ele desejaria que acontecesse. Um dia depois de assinar a ordem executiva determinando que toda e qualquer instituição educacional que receba financiamento federal deve obedecer ao critério de “como as pessoas se identificam”, e não seu sexo biológico, a hashtag “#BidenErasedWomen” (Biden apagou as mulheres) disparou no Twitter. O movimento nas redes sociais reuniu mulheres democratas, republicanas e pessoas de ambos os lados do espectro político. Todos apontavam os vários perigos da medida que elimina o significado do sexo e traz vários efeitos devastadores para as mulheres. Com a permissão para que homens biológicos possam competir com mulheres em esportes femininos, além do perigo de lesões graves nas modalidades de contato físico para as mulheres, meninos receberiam bolsas universitárias designadas especificamente para as mulheres sob a Lei Título IX (Title IX) — lei federal que garante às atletas o direito a oportunidades iguais nos esportes em instituições educacionais beneficiadas por recursos federais, desde escolas primárias até faculdades e universidades.

E seguimos. A lista das canetadas de Biden em menos de 72 horas incluiu apagar várias determinações da administração Trump em relação a imigração e segurança doméstica. O novo presidente e queridinho da velha mídia desfez as diretrizes relativas à adição de imigrantes ilegais ao Censo. A nova ordem agora permitirá que eles sejam adicionados ao Censo norte-americano e, obviamente, ao número que determina a representação no Congresso, inflando a representação dos Estados com porcentuais mais elevados de imigrantes presentes ilegalmente. Biden também cessou imediatamente a construção do muro da fronteira sul e até sugeriu substituir a palavra “imigrante ou estrangeiro” por “não cidadão” nas leis de imigração dos EUA.

O democrata também propôs a Lei de Cidadania dos Estados Unidos de 2021. Trata-se de um projeto de lei que oferece anistia e cidadania norte-americana imediata a aproximadamente 11 milhões de imigrantes ilegais. Ele também suspendeu as deportações e ordenou que o Immigration and Customs Enforcement (ICE) liberte todos os imigrantes ilegais detidos. Um memorando interno do ICE divulgado por Tucker Carson, âncora do canal Fox News, diz aos agentes para “liberar todos imediatamente”. Se isso se aplica a todos os 14.195 detidos sob custódia do ICE, convém destacar que 71% desse contingente é comporto de criminosos condenados ou acusados de crimes além de ingresso e permanência ilegais no país. Ou seja, na prática, Biden terá ordenado a libertação de mais de 10 mil criminosos. Praticamente um STF ianque.[devemos ter presente que nos 13 anos da  praga petista governando o Brasil, a impunidade se consolidou, de tal forma que já no governo Bolsonaro o STF criou em território brasileiro nacional zonas de exclusão nas quais é vedada a ação policial, incluindo o sobrevôo.]

Quando Trump implementou a proibição de viagens à China nos primeiros dias da pandemia de coronavírus em janeiro de 2020, o então candidato Biden criticou a ação executiva como “xenófoba”, alegando que tais restrições não funcionariam. Um ano depois, Biden, por meio de mais uma ordem executiva, implementou suas proibições de viagens ao Brasil, à África do Sul, à Grã-Bretanha e a outros 26 países europeus.

Desde que assumiu o cargo, na última quarta-feira, a caneta de Joe Biden parece ter vida própria. Entre as decisões executivas, algumas afetarão profundamente os assuntos internos, como o cancelamento da licença para a construção do oleoduto Keystone XL — assunto sobre o qual tratei no artigo da semana passada. A medida é terrível para canadenses e norte-americanos. O oleoduto de quase 2 mil quilômetros do Canadá até Nebraska se juntaria a redes já existentes para que 830 mil barris diários de petróleo canadense chegassem facilmente a refinarias e portos na Costa do Golfo. De lá, poderiam ser exportados para o resto do mercado mundial.

Infelizmente, o projeto Keystone se tornou uma vítima da política ideológica de esquerda. Embora o Departamento de Estado do presidente Barack Obama tenha descoberto por meio de cinco estudos separados que o projeto não teria impacto nas emissões de gases do efeito estufa, grupos ambientalistas lutaram contra o oleoduto desde o primeiro dia. Uma análise adicional mostra que o transporte de petróleo por trem ou navio-tanque geraria mais emissões de gases de efeito estufa e mais riscos de vazamento. Mais de 60 mil empregos foram apagados com essa assinatura de Joe Biden.

Entre as ordens impostas por Biden em menos de uma semana está a volta imediata ao Acordo Climático de Paris e à Organização Mundial da Saúde, instituição que errou em praticamente tudo acerca da pandemia histórica e hoje não passa de uma extensão do comando ditatorial chinês. Desde o fim da década de 1980, presumimos que a abertura do comércio à China comunista transformaria o Estado repressivo daquele país. Os EUA apostaram nisso mesmo depois da cena histórica na Praça da Paz Celestial. Não funcionou. Agora temos uma China ainda mais comprometida em reprimir seu povo e os trabalhadores norte-americanos acabaram perdendo ao longo das últimas décadas postos valiosos em razão da usurpação chinesa. Trump iniciou uma guerra comercial e, apesar de muitos hoje estarem cientes das várias facetas do jogo desonesto chinês, figuras do pântano continuam fingindo cegueira, uma vez que estão de mãos dadas com negócios da China. Literalmente.

Também contra todas as probabilidades, e arrumando brigas no Pentágono que podem ter custado sua reeleição, Trump reduziu os níveis de tropas norte-americanas no exterior, especialmente no Iraque, no Afeganistão e na Síria. Ele provou algo que parecia quase impossível ou inimaginável: a ideia de que um presidente norte-americano não iniciaria novas guerras. Em menos de uma semana, Biden já aumentou o contingente de tropas no exterior e sinalizou aos senhores das armas do pântano que a torneira não vai secar.

A velocidade com que a lista de desejos da esquerda foi concedida por meio das ordens executivas de Joe Biden mostra exatamente onde estamos. Os democratas e a sanha da agenda globalista não desejam união, eles querem dominação. Sobre as famílias e seus filhos, sobre as comunidades e suas decisões. Podemos até debater se Donald Trump é um verdadeiro conservador, no sentido original da palavra, ou se ele é apenas um narcisista de carteirinha. 

No entanto, durante quatro anos, sua agenda foi implementada de acordo com uma plataforma conservadora baseada em liberdade e responsabilidade. E, para isso, acredito não haver retorno. O norte-americano voltou a sentir o tato das rédeas em suas mãos. Ser conduzido por burocratas e tecnocratas em uma união global com um governo distante é o maior dos pesadelos — é a última coisa que um cidadão comum por aqui desejaria, democrata ou republicano.

Pela velocidade com que a caneta de Biden anda atuando, não me surpreenderia se o mau uso da nova tinta azul trouxesse de volta aquele velho e surrado boné vermelho. Pode ser que “Make America Great Again” volte não apenas por ser moda ou um movimento político de oposição, mas por acabar tornando-se uma realidade.

Leia também o artigo “Burocracia: do absurdo ao sinistro”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste