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quinta-feira, 3 de agosto de 2023

8 de janeiro, a narrativa e os fatos - Percival Puggina

         Se por um instante você deixar de ver os acontecimentos do dia 8 de janeiro como são narrados, para analisá-los como registrados pelos próprios olhos, notará enorme diferença.

Segundo as instituições, durante um par de horas, a nação periclitou frente ao abismo de uma ditadura fascista. No horizonte imediato, haveria fogo e ranger de dentes porque ali, a olhos vistos, transcorria o “pan demônio”, ou seja, a reunião de todos os demônios, do terrorismo ao golpismo. [destaque: em um país presidido por um presidente ex-presidiário - o EX é que foi descondenado, NÃO FOI inocentado = põe demônio no país.] Felizmente, lhe dizem, a emergência foi debelada com os golpistas presos em ação fulminante e integrada dos bastiões da democracia, do estado de direito e das liberdades públicas.

Mil e quinhentas pessoas se envolveram na tal “intentona fascista”. 
Era uma ensolarada tarde de domingo. 
Sem banda, carro de som ou megafone, saíram do acampamento junto ao QG e marcharam em direção à Praça dos Três Poderes. Os homens, pela idade média, se militares, estariam quase todos na reserva; as mulheres eram intrépidas e ameaçadoras vovós e tias do Zap. Levavam cadeiras de praia, bandeiras, faixas. 
Enquanto a República vivia momentos tão decisivos, cantaram hinos, tiraram selfies, perambularam pela vastidão do despovoado local. 
Era uma praça sem garrafinhas de água e sem pipocas. 
Apenas um inesperado vendedor de algodão doce veio do nada com sua colorida mercadoria para adoçar o "golpe".
 
Em que pese tudo que se diz sobre os riscos de uma população armada, nenhuma pistolinha sequer foi vista e, menos ainda, ouvida
Cerca de 10% dos golpistas partiram para uma arremetida final contra a desguarnecida e vazia Bastilha brasiliense. 
Enquanto os demais, desde fora, gritavam “Não quebra! Não quebra!”, eles atacaram as vidraças republicanas e foram adiante, golpeando móveis e bens do patrimônio nacional. 
Dois dos três prédios invadidos já tinham sido objeto de tais crimes em outras ocasiões.[todas as invasões pretéritas realizadas por hordas esquerdistas, com destaque para a da Câmara comandada por um tal de Bruno MARANHÃO (já falecido) ... coincidência do nome com o estado mais pobre do Brasil e que foi governado de 2015 a 2022 pelo atual ministro da Justiça.]

Enfim, pouco depois, um punhado de policiais militares do Distrito Federal surgiu e colocou todos a marchar de volta para a frente do QG onde, na manhã seguinte, embarcariam na segunda ratoeira de sua malsucedida "intentona".

A imensa maioria dos que foram à Praça dos Três Poderes era movida por temor.  
Temiam o braço pesado de um Estado que se agigantava assustadoramente sobre a nação. 
Acabaram comprovando nas suas vidas as razões do temor que sentiam.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.


domingo, 5 de fevereiro de 2023

Haja paciência! - O Globo

Dorrit Harazim

‘Nossa época é essencialmente trágica, por isso recusamo-nos a ver nela a tragédia. Mas o cataclismo já aconteceu; estamos entre ruínas, começamos a reconstruir pequenas casas, refazer pequenas esperanças. O trabalho é árduo: o caminho para o futuro não será tranquilo. Apesar de tudo, damos a volta, arrastamo-nos sobre as pedras. Só nos resta viver, não importa quantos céus tenham caído.’ Assim começa o primeiro parágrafo do clássico de D. H. Lawrence “O amante de Lady Chatterley”, lançado em 1928 e proibido até 1960. A obra tratava de sexo e traição de modo explícito demais para a época, mas poderia servir para retratar o estado atual da nação brasileira. São muitos os céus que caíram e não param de cair sobre o país.

Nesta semana, o recém-empossado governo Lula teve de lidar com nova vertente do infame 8 de Janeiro golpista destinado a desestabilizar a normalização do país. Haja paciência! Vencedor do primeiro e segundo tempos do pleito eleitoral, Lula festejara sua diplomação no 12 de dezembro com bolsonaristas já vandalizando Brasília num ensaio de terceiro turno. Não obtiveram a adesão esperada nem a atenção investigativa que mereciam. Na véspera do Natal, houve novo repique, quando dois terroristas bolsonaristas tentaram explodir um caminhão-tanque no abarrotado aeroporto da capital. Por frustrado, o plano não embaçou a posse presidencial na virada do ano — aquela, alegre e colorida, desarmada e plural, com a rampa do poder transformada em passarela das gentes brasileiras.

O 8 de Janeiro pegou a nação e o novo governo despreparados. Para a massa bolsonarista intoxicada pela derrota civil (nas urnas) e militar (as Forças Armadas se mantinham na caserna), só interessava o golpismo. Os atos destrutivos daquele dia tiveram uma dinâmica que o Monde Diplomatique qualificou, com propriedade, de fascista — “uma subjetivação delirante, que mobiliza as massas lutando por autoritarismo como se lutassem por sua libertação”. Abortada na 25ª hora — mais por sorte do que por prontidão do governo Lula —, essa mistura de tentativa de putsch, intentona ou golpe está longe de ser erradicada. [Nossa Opinião, que coincide com a de grande parte dos brasileiros que pensam: ao atual governo não interessava prontidão; 
- precisamos ter presente que, só os jornalistas da 'mídia' militante' e os integrantes da esquerda, declaram que os atos mais violentos e infames do dia 8 de janeiro, não tiveram a participação de infiltrados =  tentando repetir no Brasil o incêndio do Reichstag em 1933 e os infiltrados tinham interesse em propiciar ao governo capanga do petista pretexto para endurecer o regime.] Apenas hiberna. Ou ressurge em roupagem farsesca, à altura da imaginação de um Alfred Jarry, autor do maravilhoso “Ubu rei”. 
 
Nesta semana, autoridades alternavam um estado de alarme com descaso diante da “denúncia” de que Jair Bolsonaro, enquanto ainda no poder, participara de uma trama para grampear e tirar do caminho ninguém menos que o ministro-xerife Alexandre de Moraes, do Supremo. 
O denunciante dado a mil e uma versões não era crível. 
Mas, depois do 8 de Janeiro, ninguém mais no governo pode descartar qualquer trama golpista, por mais fantasiosa que seja. A sanha da extrema direita em brecar o governo Lula 3 já deu sinais suficientes de que rondará Brasília enquanto não for cortada sua raiz.

Quatro anos atrás, em meio à perplexidade nacional diante da eleição de Bolsonaro para presidente da República, a Academia Brasileira de Letras (ABL) promoveu um ciclo de conferências que buscava respostas para o fato de o Brasil nunca chegar a lugar algum. Entre os palestrantes de vivências e saberes variados, estava o jurista, diplomata e acadêmico Rubens Ricupero. [a fala será a transmitida por parabólica? ou a colunista já esqueceu o lema daquele diplomata "o que é bom a gente divulga, o que é ruim a gente esconde'? A propósito: A Globo estava envolvida.] Recomenda-se aqui a leitura da íntegra de sua fala, disponível no site da ABL. O texto culto e denso cobre um amplo arco de nossa história. Em determinado momento, ele cita o filósofo franco-lituano Emmanuel Lévinas, que, indagado se o colapso do comunismo significara uma vitória decisiva da democracia, respondeu: [(texto mencionado não transcrevemos por falta de credibilidade do autor, o diplomata do 'escândalo da parabólica'.)]  

(...) 

[Sugestão à colunista e aos demais pautados da mídia militante: continuem malhando o governo anterior, fazendo narrativas tentando comprometê-lo até com a morte da Olga Prestes e coisas do tipo, mas, mencionem pelo menos uma vez por mês alguma realização prática do atual governo a favor do BRASIL e do POVO BRASILEIRO. 
Uma olhada rápida na Lei nº 13.260, Lei Antiterrorismo, também é conveniente e assim evita-se que xingar o atual governo seja considerado ato terroristas.
Obrigado.]

Vamos nessa, mas sem deixar de olhar por sobre o ombro.

Dorrit Harazim, colunista - O Globo - MATÉRIA NA ÍNTEGRA



sábado, 25 de maio de 2019

Um presidente ingovernável

São imprudentes, obscuros e arbitrários os objetivos por trás da manifestação arquitetada por idólatras do “Mito” e fomentada pelo capitão em pessoa nas redes sociais. Não vá se falar em mero protesto. A insurgência contra os poderes constituídos flerta diretamente com o autoritarismo — ainda mais levada a cabo diretamente pelo mandatário. Ele, prudentemente, depois de alertado, resolveu recuar da ideia tresloucada de estar à frente participando ativamente nas ruas. Se assim o fizesse poderia incorrer em crime de responsabilidade por atentar, de maneira insofismável, contra a Carta Magna que no artigo 85, incisos II, III e IV condena qualquer afronta ao livre exercício dos Poderes. Uma mobilização com esse intuito empurraria Bolsonaro à porta do impeachment. De qualquer maneira, ele procura impor o conceito de um governante vivendo sem a necessidade de dialogar com forças moderadoras, tal qual um monarca absolutista com pendores ditatoriais. 

Não se engane: o problema de Bolsonaro não é com o Congresso ou com a massa amorfa de políticos classificada como “Centrão” que, no seu julgo, converteu-se em inimigo número um do Brasil. O mandatário tem algo mesmo, de verdade, contra a democracia e daí a ofensiva às instituições basilares que lhe dão respaldo — Parlamento, Judiciário, imprensa e Forças Armadas. Sim, por que até na direção delas mirou a artilharia de descrédito recentemente. Redes bolsonaristas, de maneira inflamada e raivosa, pedem o fechamento do Congresso, a deposição de ministros do Supremo, a invasão de autarquias e conclamam o povo a servir de massa de manobra nessa marcha da insensatez, indevida e beligerante. A intentona tem método e fim: manietar todos aqueles que lhe pareçam adversários, pelo mero princípio de discordar de suas estultices e ambições. O chefe da Nação sonha em comandar fora das regras do jogo, sem interposições ou freios. 

Diante da desconcertante inabilidade que exibiu para governar, Bolsonaro transfere a responsabilidade dos erros aos outros. Na sua visão, desconectada dos fatos, não conseguiu fazer o que precisava porque o “sistema” não deixou, e não em virtude da incapacidade nata deveras exibida. Orientou os “eleitores-raiz”, menos de seis meses após a posse, a tomarem as ruas munidos do ingrediente autocrático para a disruptura. Na prática, diversas organizações, movimentos sociais e mesmo empresariais — aliados de primeira hora — evitaram embarcar na aventura, com traços golpistas. O MBL e o “Vem Prá Rua”, que deram a argamassa de mobilização do impeachment de Dilma Rousseff, não avalizaram a articulação oficialesca e oportunista da claque de Bolsominions. A pergunta concreta, ainda sem resposta, coloca o presidente no foco da pregação: Bolsonaro busca protestar contra o quê? Se foi ele, justamente, no exercício da militância ideológica, quem travou o diálogo com as demais instituições, por que agora se acha no direito de anarquizar o convívio? 

O País vive os impactos devastadores de uma guerra ideológica que dá as costas às necessidades elementares do povo. Emprego, renda e crescimento ficaram em segundo plano. Problemas cotidianos não são atacados. Restou óbvio que o mandatário considera impossível governar sem semear o conflito, demonizando os demais esteios constitucionais. Há poucos dias veiculou em sua rede digital um texto, qualificado por ele como de “leitura obrigatória para quem se preocupa em antecipar os fatos”, apontando o País como “ingovernável” sem os “conchavos”, deixando-o de mãos atadas. A mensagem atribuía o fracasso prematuro da nova gestão à influência de forças ocultas, corporações que impedem qualquer presidente de governar – uma versão rotineiramente incutida pela claque do mandatário nos áulicos seguidores. Inevitável traçar um paralelo com a carta-renúncia do ex-presidente Jânio Quadros, nos idos dos anos 60, que também atribuía seu naufrágio presidencial a terríveis forças do “sistema”. Daí à conclamação para a tomada das ruas, sitiando Legislativo, Judiciário ou quem mais atravessar suas pretensões, foi um passo. Bolsonaro busca transformar o Brasil numa versão venezuelana à direita, com protestos diários contra e a favor de um modelo arbitrário de poder. 

De uma maneira ou de outra terá de perceber que não existe espaço para governar na base do grito por aqui. A ideia, ventilada por ele, de um Brasil livre de “impedimentos institucionais” é abjeta. Jair Messias Bolsonaro, do alto dos 57 milhões de votos angariados nas urnas, precisa deixar de lado o papel de mero chefe de um grupo sectário e assumir devidamente, movido a princípios republicanos, a dimensão do cargo recebido por outorga da maioria da população. O Messias não foi ungido por Deus, como tentou fazer crer em outro de seus posts desconexos, mas pelo poder do povo (na tradução literal de democracia)

Até aqui se comportou como um presidente ingovernável, guiado por devaneios, espírito conspiratório e intrigas geradas no núcleo duro de seus filhos indóceis com a inestimável colaboração do Rasputin da Virgínia. Levado a rompantes inexplicáveis e indevidos — como o de chamar estudantes de “idiotas úteis”, dentre outras baboseiras — converteu-se, ele próprio, em fator de instabilidade, ameaçando a Nação. Se persistir nessa trilha esbarrará, certamente, nos freios e contrapesos institucionais, com desfecho traumático.


Carlos José Marques, diretor editorial da Editora Três