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sexta-feira, 23 de junho de 2017

Liminares de Fux sobre auxílio-moradia já custam R$ 4,5 bilhões aos cofres públicos

Contas Abertas

Mais de dois anos e meio depois, decisões liminares provisórias – do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux já custaram aproximadamente R$ 4,5 bilhões aos cofres públicos. O montante representa o valor mensal de R$ 4,3 mil pagos para mais de 17 mil magistrados e quase 13 mil procuradores do Ministério Público Federal desde setembro de 2014.
O montante representa, por exemplo, quase o dobro do que a União investiu em saúde (R$ 1,2 bilhão) e educação (R$ 1,4 bilhão) até maio deste ano.  O valor do auxílio-moradia é exatamente 73¨% maior do que as aplicações somadas. Os valores da União foram calculados com base na soma das despesas de investimentos (GND 4) com as de inversões financeiras (GND 5), excluindo as despesas financeiras, conforme definido nos Parágrafos 4º e 5º do Art. 12 da Lei nº 4.320, de 1964.
A benesse é paga a juízes, desembargadores, promotores, procuradores, conselheiros e procuradores de contas e aos próprios ministros do Supremo. Um dos pontos mais polêmicos do benefício é que ele é válido para quem mora na mesma cidade em que trabalha, e até mesmo para quem tem residência própria.
Apesar de ser considerado uma verba indenizatória, não é preciso comprovar despesas com moradia. Somente não pode receber quem já utiliza um imóvel funcional – cedido pelo Estado –,quem não está mais na ativa ou é casado com alguém que já conta com o mesmo auxílio. O benefício está “liberado” desde setembro de 2014, quando Fux, determinou, por meio de liminares – decisões provisórias –, o repasse para todos os magistrados do país e em um valor padronizado, de R$ 4.377, o mesmo dos ministros do próprio STF. Por simetria, todos os membros do Ministério Público e de tribunais de contas também passaram a contar com o extra no contracheque.
O valor depois foi mantido pelo Conselho Nacional de Justiça, em resolução aprovada em obediência à liminar de Fux, em outubro de 2014. A norma regulamentou a concessão do auxílio-moradia, estabelecendo que o valor do benefício só poderá ser pago em relação ao período iniciado em 15 de setembro de 2014 e não acarretaria retroatividade. Também em outubro de 2014, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou resolução (117/14) que regulamentou a concessão de auxílio-moradia aos membros do Ministério Público da União e dos Estados. A decisão se baseou nas liminares do ministro Fux e considerou “a simetria existente entre as carreiras da Magistratura e do Ministério Público, que são estruturadas com um eminente nexo nacional, reconhecida pelo STF”.
A Advocacia-Geral da União interpôs Agravo Regimental contra a decisão, que ainda está pendente de julgamento. Para a AGU, a liminar que determinou o pagamento de auxílio-moradia aos juízes é “flagrantemente ilegal” e “já está ocasionando dano irreparável para a União”.
Para Gil Castello Branco, secretário-geral da Contas Abertas, na situação em que o país se encontra, todos os gastos têm que passar por um pente-fino. O auxílio-moradia é um aumento de salário disfarçado. “Esse tipo de benefício distorce a estrutura de cargos e salários nos Três Poderes, o que, por si só, já é um problema. E é inconcebível que o auxílio seja pago por meio de uma decisão provisória. Decisões de um só ministro deveriam ser apenas emergenciais ou circunstanciais. Isso gera quase um folclore. Cria-se uma situação quase irreversível. E se o Supremo não confirmar a liminar? Quem recebeu vai ter que devolver os valores?”, questiona o economista.
Já o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Jayme de Oliveira, rebate as críticas ao benefício. “Não é aumento disfarçado. É uma ajuda de custo prevista na Loman. Temos que discutir no parlamento, quando o projeto da nova Loman for enviado, se vai ou não ser mantido”, frisa. Mas mesmo juízes beneficiários se mostram contra o benefício. O juiz Celso Fernando Karsburg, do Tribunal Regional do Trabalho da 4.ª Região, abriu mão do benefício de R$ 4,4 mil mensais por considerar o pagamento “imoral” e “antiético”. Depois dele, que publicou artigo em um jornal regional no início de outubro explicando seu ponto de vista, outros dois desembargadores gaúchos também negaram o auxílio.
 
Fonte: Contas Abertas 
 
 

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Supremo decidirá futuro da Lei de Responsabilidade

Mais do que nunca a LRF é a base para a recuperação dos estados e da União, porém existem liminares concedidas pelo STF há 16 anos que ameaçam a própria legislação

O Poder Judiciário brasileiro já é sobrecarregado em condições normais, devido à cultura legiferante do país e a uma Constituição detalhista. Em grave crise como a atual, com abalos na economia e na política, aumentam os conflitos na sociedade e, por decorrência, há uma pressão maior nos tribunais, em busca de mediação.

A situação fica mais séria quando a própria aplicação da solução para a vertente econômica da crise está sendo questionada na Justiça. É o que acontece com o ajuste fiscal, a ser feito mais pelo corte de gastos do que pela elevação de receitas, não só porque a carga tributária já é insustentável — 36% do PIB, a mais elevada entre os emergentes, e equivalente à de algumas economias desenvolvidas —, mas também porque abortaria a débil recuperação econômica sinalizada em alguns setores.  Ajuste fiscal é termo citado sem parcimônia, assim como a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ocorre que a LRF não pode ser aplicada por inteiro, como necessário no caso da crise dos estados, por exemplo, pelo fato de alguns artigos e o próprio conceito da LRF estarem sub judice no Supremo, e há 16 anos.

A perspectiva da crise, já profunda, é potencialmente muito mais séria. Afinal, sempre há a possibilidade de que as liminares concedidas contra partes da LRF, logo que ela foi sancionada, em 2000, possam ser referendadas em plenário. Esta é mais uma pesada dúvida que existe sobre o sucessor do ministro Teori Zavascki, com quem estava este processo. Não dependerá mais do ministro a ser indicado pelo presidente Temer a Lava-Jato, mas sim a própria estabilidade econômica.

O início de tudo é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 2.238-5), impetrada logo após a LRF entrar em vigor, por PT, PCdoB e PSB. Não foi acolhido totalmente o pedido para ser declarada inconstitucional toda a lei, mas foram suspensos parágrafos de dois artigos, o 9º e o 23 º, imprescindíveis para o ajuste nos entes federativos.


Um deles estabelece um princípio lógico: se a arrecadação não atingir o esperado, o Executivo será obrigado a reduzir os repasses previstos em orçamento, ou empenhados, para o Judiciário e o Ministério Público. Não será considerado invasão de poderes. Mas tem sido. Daí os atrasos na folha de salários de servidores, pensões, aposentadorias, menos de magistrados, procuradores e similares.

Um outro impede a aplicação também de conceito inatacável, dentro das leis da razoabilidade, pelo qual jornada e salários de servidores podem ser reduzidos proporcionalmente. Melhor que demissão, como permite a própria Constituição, em caso de descontrole fiscal, como agora.  Os economistas José Roberto Afonso, autor da LRF, e Luciano Felício Fuck registraram em publicações técnicas da área jurídica que, se o Supremo, 16 anos depois de concedidas as liminares, decidir cassá-las e ainda referendar a constitucionalidade da LRF, terá enorme mérito: o de confirmar que o Estado tem base legal para executar o ajuste que a economia precisa. Caso contrário, ficará estabelecido que o Brasil não é maduro para aplicar a Lei de Responsabilidade Fiscal. Continuará sob o risco de ajustes inflacionários selvagens, como na década de 90, e a ciclos curtos de crescimento, “voos de galinha”.

Fonte: Editorial - O Globo