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segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Judiciário - STF – protagonismo e privilégio - Carlos Alberto Di Franco

 Gazeta do Povo

Alexandre de Moraes

Procuradora-geral interina questionou a legalidade da decisão de Toffoli que permitiu a Moraes atuar como assistente de acusação.| Foto: STF

Quando o Supremo Tribunal Federal tem excesso de protagonismo na mídia, boa coisa não é.  
De fato, seus ministros dão entrevistas a respeito de tudo. 
Falam fora dos autos com uma desinibição que provocaria grande constrangimento em muitos de seus ilustres predecessores. 
É verdade que vivemos, todos, a síndrome da exposição compulsiva. 
E os integrantes da corte, seres humanos que são, não escapam ao fascínio e aos riscos de tamanha visibilidade.
 
A edição do jornal O Estado de S.Paulo de 1.º de novembro, em seu espaço opinativo, testemunhou, mais uma vez, a forte presença do STF nas páginas dos jornais.  
Um editorial e um artigo trataram de decisões da corte que, a meu ver, geraram perplexidade e insegurança jurídica.
 
O título do editorial foi sugestivo: “O privilégio do sr. Moraes”.  
Trata dos desdobramentos do imbróglio que envolveu o ministro Alexandre de Moraes e sua família no aeroporto de Roma. 
Em recurso interposto no inquérito que investiga suposta agressão contra o ministro e sua família, a Procuradoria-Geral da República (PGR) fez dois pedidos ao ministro Dias Toffoli, relator do caso:  
- o levantamento integral do sigilo das filmagens contendo as supostas hostilidades; 
- e a reconsideração da decisão que admitiu a participação das supostas vítimas, desde a fase da investigação, como assistentes da acusação.


A corte suprema, infelizmente, não tem contribuído para fortalecer a sua credibilidade.
Aos olhos da população, transformou-se num espaço político 

 

O controle seletivo das filmagens passou a ser exercido de modo ilegal e abusivo num país em que a arbitrariedade do poder faz de conta que a lei não vale para todos. 
Basta pensar na triste comédia das imagens da baderna de 8 de janeiro.
O ministro da Justiça já apresentou três ou quatro versões. 
Só não entregou as imagens solicitadas pelo Congresso Nacional e devidamente autorizadas pelo STF. “Não se pode construir privilégios em investigações criminais e, por tal razão, não se pode admitir a manutenção do sigilo fragmentado da prova no caso em exame”, disse a PGR a respeito do sigilo. 
Lembrou ainda que a restrição imposta prejudica o trabalho do Ministério Público e afeta a compreensão dos fatos pela opinião pública. Ademais, as supostas vítimas deveriam ser as maiores interessadas em que tudo aparecesse.
 
Por outro lado, a decisão do ministro Toffoli de admitir o colega Alexandre de Moraes e sua família como assistentes de acusação na investigação da suposta agressão contraria o Código de Processo Penal e a jurisprudência do próprio Supremo.  
Esse é o entendimento de juízes, procuradores e advogados ouvidos para esclarecer o assunto. 
Todos entendem que a assistência de acusação só poderia ser admitida em uma fase seguinte do caso, ou seja, no curso da ação penal. 
Sobre a participação de Alexandre de Moraes e familiares como assistentes de acusação, a PGR afirmou se tratar de um “privilégio pessoal” (forte isso), em razão de inexistir essa figura na fase de investigação. “Não se tem notícia de precedente de admissão de assistência à acusação na fase inquisitorial. Tal privilégio jamais foi admitido para quaisquer das autoridades acima elencadas, nem mesmo para o presidente da República”, diz o recurso do Ministério Público. 
O crescente poder político do ministro Alexandre de Moraes, a quem respeito como pessoa e constitucionalista, não é bom para o país, para a imagem da corte e para ele próprio.
Mas vamos ao segundo texto que chamou minha atenção: “Advocacia silenciada nos tribunais”. 
Seu autor, Ruiz Ritter, é advogado criminalista, doutorando e mestre em Ciências Criminais pela PUC/RS. 
Ele informa que a Diretoria do Conselho Federal, presidentes de diversas seccionais e membros honorários vitalícios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) tiveram audiência com o ministro Alexandre de Moraes para “requerer respeito ao direito de sustentação oral” no Supremo Tribunal Federal, após o tribunal pautar no plenário virtual os julgamentos referentes aos atos de 8 de janeiro deste ano.
O autor argumenta, com razão, que “acerta a OAB na cobrança institucional ao STF de ‘respeito’ ao direito dos advogados de se pronunciarem na corte, assim como em qualquer tribunal”.
Impedir a realização da sustentação oral presencial, admitindo a modalidade “gravada”, é um modo concreto de silenciar a advocacia e inibir o direito de defesa.

O momento atual do Brasil é de paixões exacerbadas, nervos à flor da pele. É em momentos assim que se exige uma maior prudência e ponderação de todos. Há efeitos da politização que causam danos de difícil reparação para a vida de um país. Um deles é a destruição da segurança jurídica, que no Brasil de hoje é visível a olho nu e, infelizmente, está sendo causada pela conduta de alguns ministros do STF, que é – ou ao menos deveria ser – o principal responsável pela garantia do cumprimento e da estabilidade do ordenamento jurídico e da defesa das liberdades.

LEIA TAMBÉM:  Presos Políticos - Corretor de seguros é condenado a 17 anos de prisão, sem ser ouvido pelo STF - Cristina Graeml

A corte suprema, infelizmente, não tem contribuído para fortalecer a sua credibilidade. Aos olhos da população, transformou-se num espaço político. Não creio que seja radicalmente assim. 
Mas é a percepção que existe. E isso não é nada bom. 
É hora de os ministros de STF fazerem uma sincera autocrítica. O Brasil merece.
 
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos
 
Carlos Alberto Di Franco, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 
 
 

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Pacheco e Lira assistem à incitação de uma crise com o Supremo

A crise muda de patamar quando bancadas do boi, da bala e da bíblia anunciam emenda constitucional para anular decisões do Supremo Tribunal Federal  

 Congresso Nacional

 Sede do Congresso em Brasília — (iStockphoto/Getty Images)

Sob o olhar complacente dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, as bancadas de parlamentares autoproclamados conservadores incitam o Congresso a uma crise com o Judiciário. Atritos e pressões fazem parte do jogo institucional, mas a crise muda de patamar quando na confluência de interesses peculiares as bancadas do boi, da bala e da bíblia anunciam projeto para alterar a Constituição com objetivo de anular decisões do Supremo Tribunal Federal. [em nossa opinião, as bancadas estão concordando por os interesses serem comuns às bancadas  - não tinha sentido seria convergir, divergindo no que apoiam.]

Reivindicam um poder que o Legislativo não tem: o de revogar sentenças judiciais sempre que a decisão do tribunal não for “unânime” ou passível de ser interpretada pelos parlamentares como uma extrapolação dos “limites” constitucionais.

Propostas de emenda constitucional do gênero já tem a adesão pública de líderes do PP de Lira e do PL de Valdemar Costa Neto e Bolsonaro, e de frações do PSD de Pacheco, do Republicanos e até do PSDB.

O interesse comum, como tem repetido o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, é “fazer um movimento” para demonstrar insatisfações com o Judiciário em temas como marco temporal na demarcação de terras indígenas, aborto, drogas, lei eleitoral, inelegibilidade de Jair Bolsonaro e punições aos envolvidos na insurreição de 8 de janeiro.

Seria mero blefe, comum na rotina parlamentar, se a iniciativa estivesse restrita aos discursos. Porém, a sedução autoritária da imposição de limites a outro Poder ganhou forma de projetos de emenda constitucional e ímpeto para avançar na Câmara e no Senado — embora todos os envolvidos saibam que, por princípio, é inconstitucional. [certamente o colunista foi pautado para, a exemplo daquele jornalista da TV Globo, decretar, no caso, 'inconstitucionalidade' de conduta parlamentar.]  

É notável que a crise fomentada no Congresso tenha como fundamento a alegação de invasão da atribuição legislativa pelo Supremo. O exemplo mais citado é a decisão do tribunal sobre demarcação de terras indígenas.

Na vida real, o STF foi provocado por um partido, o Psol, [que por ser um partido nanico,  sem votos e sem representatividade, quer ganhar no tapetão do Poder Judiciário o que não se sustenta no voto.] a decidir sobre um assunto marcado pela histórica omissão do Congresso: a proposta legislativa sobre demarcação de áreas indígenas completou 17 anos de tramitação antes da sentença do Supremo, na semana passada.

José Casado,  jornalista - Revista VEJA


sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Quem decide sobre aborto é o povo - O Estado de S. Paulo

Opinião do Estadão

Não há nada na Constituição que deslegitime a legislação vigente nem que impeça sua mudança.Mas alteração manejada pelo Judiciário seria intolerável violação da soberania popular

A ministra Rosa Weber, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), pautou para hoje o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 442, interposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em 2017, com a pretensão de que a Corte declare a inconstitucionalidade dos artigos 124 e 126 do Código Penal e descriminalize a interrupção da gravidez até a 12.ª semana de gestação. Quando a ação foi ajuizada, Rosa Weber, sua relatora, afirmou que o tema precisava de “amadurecimento”, mas prometeu que o tribunal não deixaria a sociedade sem resposta. À época, como agora, contudo, a única resposta que a sociedade espera da Corte é que ela respeite a decisão dessa mesma sociedade.

Os termos da disputa sobre o aborto são bem conhecidos. Resumidamente, os favoráveis alegam o direito das mulheres de dispor do próprio corpo. 
Sem negar essa liberdade, os contrários afirmam que ela termina quando começa o direito à integridade de outro corpo, no caso do nascituro. [ditado antigo, válido,  sempre atual e correto: "O seu direito termina onde começa o do outro".] 
Cada um é livre para advogar quem deveria ter direito a quê. 
O que é incontroverso é que, num Estado Democrático de Direito, quem determina quem efetivamente tem direito a que é o povo, seja indiretamente, através de seus representantes eleitos, seja diretamente, através de plebiscito.

A determinação em vigor, consagrada pelo Legislativo no Código Penal de 1940, estabelece a prevalência do direito à vida do feto em detrimento do direito de escolha da mulher, exceto quando a gravidez é não só indesejada, mas forçada (estupro), ou quando há risco de vida da gestante. Posteriormente, o STF autorizou o aborto de fetos anencefálicos, dada a inexistência de expectativa de vida extrauterina.

A Constituição não dispôs especificamente sobre o aborto. Não se trata de descuido do Poder Constituinte. 
Sua decisão foi delegar ao legislador infraconstitucional a competência sobre o tema, mas, ao assegurar a inviolabilidade do direito à vida, recepcionou a tipificação dos crimes contra a vida do Código Penal. 
Para contornar esse inconveniente, o PSOL pariu a hermenêutica bastarda de que o ser humano, antes de nascer, não teria direitos fundamentais, porque não seria uma “pessoa constitucional”, só uma “criatura humana intrauterina”. O Código Civil, porém, estabelece que “a personalidade civil da pessoa começa no nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.

Um eventual deferimento da ação traria como consequência incontornável o acréscimo de mais uma excludente de ilicitude às já estabelecidas na lei. Ou seja, o Judiciário estaria legislando, em flagrante violação à prerrogativa do Legislativo.

A única resposta cabível da Corte à ação deveria ter sido dada já em 2017, pela própria Rosa Weber: negar conhecimento para que a questão fosse tratada pelo Poder Legislativo.  
De lá para cá, intensificaram-se, frequentemente com razão, as críticas ao Judiciário por intrometer-se na competência dos outros Poderes. 
Agora, a Corte tem mais uma vez a oportunidade concreta de demonstrar respeito ao princípio da separação dos Poderes
Mas o risco de que, mais uma vez, o desrespeitará não é pequeno.

De fato, alguns ministros até se anteciparam. Já em 2016, num caso pavoroso de teratologia jurídica, o ministro Luís Roberto Barroso extrapolou o objeto de um julgamento sobre um habeas corpus e extraiu a fórceps da Constituição um período de três meses de gestação dentro do qual o aborto não seria ilegal, no que foi seguido por Edson Fachin e pela própria Rosa Weber.

Não há nada na Constituição que deslegitime a legislação vigente. Tampouco há algo que impeça a sua eventual mudança. 
O aborto pode ser legalizado, assim como a sua proibição pode ser constitucionalizada, e inclusive há várias propostas num sentido e no outro tramitando no Congresso. 
Nesse debate, cada 1 dos 11 ministros do STF certamente tem sua convicção sobre o que deve ou não ser normatizado. Mas essa convicção vale exatamente o mesmo que a de cada um dos mais de 150 milhões de eleitores brasileiros, não menos e, sobretudo, não mais.
 
Notas & Informações - O Estado de S. Paulo
 
 

terça-feira, 5 de setembro de 2023

Atuação da PGR e do STF prova que Justiça brasileira está entre a demência e o desvario - J. R. Guzzo

Gazeta do Povo - VOZES
 
OAB e PGR querem oferecer acordo para quem foi preso no acampamento diante do quartel e não participou de invasão na Praça dos Três Poderes.| Foto: Renan Ramalho/Gazeta do Povo
 
 
Foi enfim solta pelo ministro Alexandre de Moraes, após oito meses de prisão fechada, a última presa por participação nas depredações do dia 8 de janeiro em Brasília.  
Sua prisão durante este tempo todo vai ficar como ponto de referência de um dos momentos mais infames na história do Judiciário brasileiroa negação de justiça, pura e simples, para os que foram presos neste episódio infeliz.

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Em nenhum momento o STF, que assumiu o comando do caso como se fosse uma delegacia de polícia, aplicou a eles as regras elementares da lei penal brasileira. 
Foram tratados, desde o primeiro minuto, como presos políticos – sem direito à defesa plena por seus advogados, sem direito às garantias legais devidas a acusados primários, sem direito às prerrogativas mínimas que a lei oferece para qualquer criminoso.

Como é o caso de tantas vítimas da repressão aos atos de baderna contra os edifícios dos Três Poderes, a mulher solta depois de oito meses no cárcere é uma acusada primária, sem nenhum tipo de antecedente criminal, tem ocupação conhecida e residência fixa – ou seja, pelo que determina a lei, teria de ter sido solta após umas poucas horas de detenção. Jamais poderia ficar presa esse tempo todo.

É um momento de demência, do qual não se conhece precedentes, no Brasil ou em qualquer democracia minimamente séria do mundo.

O ministro Moraes, que age ao mesmo tempo como vítima, policial, promotor e juiz desse e centenas de outros casos, acusa essa senhora, junto com a PGR, de associação criminosa armada e “golpe de Estado”. Pior: ela queria usar “substância inflamável” para “implantar um governo militar” e depor o “governo legitimamente constituído”. 
Como seria materialmente possível, para um bando de pessoas que não tinham sequer um estilingue, e invadiram o Palácio do Planalto com cadeirinhas de praia, carrinhos de bebê e gente que vendia algodão doce, derrubar o governo do Brasil? 
Não eram eles que tinham os tanques de guerra e os caças a jato; a força armada estava exatamente do lado contrário.
 
Também não se sabe por que essa senhora foi solta, se cometeu todos aqueles crimes de lesa-pátria – nem se há alguma prova contra ela, e nem porque teve de esperar oito meses para a polícia, o Ministério Público e o ministro Moraes chegarem à conclusão de que deveria sair da cadeia
 Por que, enfim, terá de usar tornozeleira eletrônica ou ficar em casa à noite – e por que não pode se comunicar pela internet? 
Se ela é esse perigo todo, não deveria continuar presa? 
Nada, em nada disso, faz qualquer nexo legal, ou meramente lógico. Ao contrário: as decisões dos ministros e da PGR, transformada em prestadora de serviços do STF, estão transformando a Justiça superior brasileira num desvario cada vez mais descontrolado.
Nada, talvez, comprove com tanta clareza essa marcha rumo à insensatez quanto a decisão de Alexandre de Moares, originada na PGR, de permitir que 1.156 denunciados pelo 8 de janeiro não respondam a julgamento. Todos eles foram soltos porque a PGR, segundo ela própria diz em documento escrito, não encontrou provas de que tivessem cometido qualquer crime.  
Fim do caso, então? Não no Brasil do STF – nem um pouco, aliás.
 
Para não responderem a processo, os 1.156 denunciados terão de confessar, num prazo de 120 dias, que cometeram os crimes pelos quais estão sendo acusados. Como assim – que crimes? 
Como o sujeito vai confessar um crime que o próprio acusador está dizendo, oficialmente, que ele não cometeu?  
É um momento de demência, do qual não se conhece precedentes, no Brasil ou em qualquer democracia minimamente séria do mundo. 
Você não fez nada – mas tem de confessar que fez, para não ser processado. É isso, hoje, a Justiça brasileira.
 
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 

sexta-feira, 1 de setembro de 2023

As mentiras de Lula - Revista Oeste

Silvio Navarro

De volta ao poder, o petista espalha fake news impunemente pelo mundo, é aplaudido pela imprensa velha e passa longe de qualquer investigação do Judiciário

Presidente Lula | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/Ricardo Stuckert/PR



O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, durante sua última viagem internacional, que “sente vergonha” porque o Brasil não tem voos para o continente africano. 
No exterior, disse que a Operação Lava Jato jamais encontrou um centavo que o vinculasse a empreiteiras corruptas. Também afirmou que “não é frustrado por ser pobre” e que Dilma Rousseff foi inocentada, pela Justiça, do crime das pedaladas fiscais. 
Em tom irônico, elogiou o comportamento pacato da imprensa na ditadura de Angola. Tudo isso em uma semana. É a marca do seu terceiro mandato: a mentira.

Vamos aos fatos: o Brasil tem voos regulares para a África, operados pela Latam, Ethiopian Airlines e Gol, para destinos como Joanesburgo, Adis Abeba e Luanda, partindo do Aeroporto de Guarulhos (SP). 
Qualquer busca no Google mostra que a Lava Jato descobriu milhões depositados na conta da empresa de palestras do petista (L.I.L.S) por empreiteiras do esquema corrupto. Em declaração ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado, Lula informou ter patrimônio de R$ 7,4 milhões — ou seja, está longe de ser um pobre frustrado. 
 
O Tribunal Regional Federal (TRF-1) manteve o arquivamento de uma ação por improbidade administrativa contra Dilma Rousseff, mas jamais se manifestou sobre o mérito da causa ou disse que ela é “inocente” do crime fiscal. A imprensa em Angola não é livre jornalistas que criticam o governo são presos por fake news ou ataque à soberania nacional.
Desta vez, a viagem ao continente africano não chamou a atenção só pelas cifras milionárias — dinheiro dos pagadores de impostos — que o casal Lula e Janja tem torrado mundo afora. 
Nem pela velocidade no embarque: já somam um tour internacional a cada 20 dias. Foi a 12ª viagem em oito meses, para 16 destinos, um recorde até mesmo para os padrões do petista — que já chegou ao novo mandato com retrospecto de 80 países visitados, além da Antártida, Guiana Francesa e Palestina. O que mais despertou a reação nas redes sociais foi a profusão de fake news. 
 
Lula e a mulher desembarcam em São Tomé, na África | Foto: Ricardo Stuckert/PR

Diz o editorial do jornal:
“fabricar desinformação”.  
Mas isso não é alvo de um inquérito — talvez mais de um — no Supremo Tribunal Federal (STF) há quatro anos? 
Por que nenhuma fala do atual presidente é enquadrada em fake news? Por que as agências de checagem, a polícia da imprensa livre, não o corrigem?

Há casos em que as bravatas do petista podem ser desmentidas simplesmente pela matemática. Por exemplo: disse que o Produto Interno Bruto (PIB) não cresceu em 2022 — o resultado positivo foi de 3%, superior ao da China —, bem como os números do desmatamento da Amazônia e do cerrado (que subiram na gestão Marina Silva neste ano). Ou que o PT erradicou a fome no Brasil. Ou, ainda, que o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) não invade nem destrói áreas privadas produtivas. indica que o MST voltou com força total. Já são 66 invasões de terras neste ano. 
 
(.....)

Nesta semana, outro golpe brasileiro contra o governo norte-americano: Lula defendeu a entrada do Irã no banco do Brics, agora comandado por Dilma Rousseff. Desde janeiro, o banco de fomento tem ganhado contornos de enfrentamento contra o G7 — o grupo das sete economias mais industrializadas do mundo.

O outro combustível para a fábrica de mentiras é a certeza da impunidade. 
 Num país que assistiu à prisão de dezenas de pessoas por fake news, à perda das redes sociais por políticos, jornalistas e influenciadores “da direita”, à censura de um documentário, Lula tem permissão para dizer o que quiser.  
Nenhum simpatizante da esquerda é investigado pelo Supremo Tribunal Federal. Provavelmente, nunca será. Porque, juntos, eles “derrotaram o bolsonarismo”, como deixou escapar o ministro Luís Roberto Barroso.

Leia também “O mosaico do 8 de janeiro”
 

Colunista Silvio Navarro - Revista Oeste
 
 
 


sábado, 12 de agosto de 2023

Para o Judiciário, os irmãos Batista são diferentes de todos os outros brasileiros - Gazeta do Povo

Vozes - J.R. Guzzo

A convivência de seis anos entre o Ministério Público e os irmãos Batista, donos de um dos maiores complexos de produção de carnes do mundo, é uma lição inesquecível sobre como a justiça brasileira criou dois tipos diferentes de cidadão neste país os muito ricos, que sempre têm direito a tudo e nunca devem nada, e todos os demais, que são obrigados a cumprir a lei 24 horas por dia. 
Os proprietários da JBS aceitaram em juízo, em 2017, pagar 10,3 bilhões de reais para não irem para a cadeia. Em troca, delataram à Operação Lava-Jato os barões mais ilustres da corrupção passiva do Brasil. 
 
Como se sabe, não aconteceu nada com os barões, que têm a proteção automática do Supremo – um deles, inclusive, acabou virando presidente da República. 
Mas também não aconteceu nada com os Batista. 
Já foi, logo de cara, um negócio de pai para filho – os delatores ganharam 25 anos para pagar o que deviam. Depois, ficou melhor ainda. 
Os empresários entraram no MP com uma ação contra o próprio acordo que tinham assinado, e até agora, seis anos depois, não pagaram quase nada do que se comprometeram a pagar; não mais que 5% do total. Ainda assim, não ficaram satisfeitos. Estão conseguindo, no Ministério Público Federal, um desconto de quase 70% no total da fatura que não pagaram. Ou seja, eles não querem pagar, não querem ir para a cadeia e não querem ficar devendo.
 
O procurador que cuidava do caso até há pouco, Carlos Lima, já tinha negado o recurso de “revisão” do acordo apresentado pelos irmãos Batista; estão querendo que os 10,3 bilhões prometidos se transformem em 3,5 bi. O procurador, na ocasião, disse que o pedido não tinha nenhum cabimento, e negou-se a permitir o desconto.
Os empresários, argumentou ele, assinaram o acordo de sua livre e espontânea vontade, com a plena assistência dos seus advogados. 
Para ficar soltos, confessaram a prática de crimes e delataram cúmplices. Se não querem pagar a importância que o MP propôs, por que raios aceitaram o acordo
Bastaria não assinar; ninguém obrigou nem um nem o outro a assinar papel nenhum. De lá para cá, lembrou Lima, não aconteceu nada de novo para mudar os termos do que foi combinado. Estão achando, agora, que os valores são “excessivos”? Mas por que não falaram isso em 2017?

    Ou seja, eles não querem pagar, não querem ir para a cadeia e não querem ficar devendo

Mais que tudo, ao prometerem pagar os 10 bilhões, os irmãos Batista se livraram do xadrez da Lava Jato, no qual foram parar tantos gatos gordos da roubalheira nacional. 
Agora estão querendo, ao mesmo tempo, escapar da cadeia e do pagamento.
Inicialmente o MP federal achou que não dava para eles terem as duas coisas – se não querem pagar, deveriam ter optado pela cadeia. Ou é uma ou é outra. Mas isso aqui é Brasil democrático de 2022, onde o artigo 1º. da Constituição (não a que você conhece, mas a que realmente está valendo) diz que é mais fácil o camelo da Bíblia passar pelo buraco de uma agulha do que um réu confesso de corrupção ir para a penitenciária – sobretudo se a ladroagem foi de milhões. 
 
A defesa dos empresários (incluindo-se o ex-ministro Ricardo Lewandowski, que até outro dia dava sentenças no STF), conseguiu ressuscitar o pedido que já estava enterrado – só que agora, por uma dessas coincidências sobrenaturais que só acontecem na justiça brasileira, o processo foi parar com um novo procurador, Ronaldo Albo
O que você acha que aconteceu? O dr. Albo decidiu que a JBS, subitamente, passou a ter razão – e concordou em descontar 70% do valor a ser pago, como querem os empresários.

Não tente fazer isso com as suas dívidas. Eles são diferentes de você.

Conteúdo editado por: Jônatas Dias Lima

J.R. Guzzo, Colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

 

quarta-feira, 12 de julho de 2023

PCC forma advogados e tenta se infiltrar no Judiciário e no Ministério Público - Gazeta do Povo

Ideias - Gabriel de Arruda Castro
 

Organização criminosa 

Não é de hoje que o Primeiro Comando da Capital (PCC) utiliza o serviço de advogados para cometer crimes.  
Mas a principal organização criminosa no Brasil também trabalha para formar os próprios juízes e promotores.
 
Autoridades têm detectado uma movimentação da facção criminosa para ingressar em tribunais de justiça e no Ministério Público por meio de concursos públicos
Até onde se sabe, não há fraude envolvida no processo de seleção: tudo seria feito dentro das regras como parte de uma estratégia de longo prazo, que inclui o financiamento das mensalidades de Direito a jovens que, no futuro, possam ser aprovados nos concursos públicos e passem a atuar como agentes do crime organizado dentro da máquina estatal.
 
As tentativas de infiltração se tornaram mais frequentes nos últimos anos e chamaram a atenção do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). 
Na última semana, o órgão determinou na que a Polícia Federal investigue a tentativa do PCC influenciar o Judiciário por dentro. O corregedor do CNJ, Luis Felipe Salomão, assinou a ordem.

O avanço do PCC nesse campo é mais um passo na estratégia do grupo, cuja atuação vem se tornando mais sofisticada, e se assemelha ao comportamento de grupos criminosos de outros países — como a máfia de Chicago, chefiada por Al Capone nos anos 30, e a organização liderada pelo traficante colombiano Pablo Escobar.

Tecnologia para barrar a infiltração
Embora mantenha discrição sobre o tema, o Ministério Público do Estado de São Paulo confirma que o PCC vem tentando se infiltrar no poder público.

O subprocurador-geral José Carlos Cosenzo afirma que o fato já é conhecido há alguns anos. “Nós já detectamos, alguns concursos atrás, da mesma forma que a magistratura detectou”, diz. Ele acrescenta que a facção criminosa tem bancado as mensalidades do curso de Direito para futuros advogados e agentes públicos. “Eles patrocinam o curso de Direito na universidade para depois a pessoa advogar para eles e tentar ingressar nas carreiras jurídicas. Eles tentam colocar gente no Ministério Público e no Judiciário”, explica.

O método “tradicional” do PCC para influenciar a atuação da Justiça e dos órgãos de segurança pública envolve dois caminhos: a violência direta e a corrupção. No primeiro caso, as consequências costumam ser pesadas. No segundo, a tentativa de cooptação pode ter o efeito contrário do desejado. A formação dos próprios quadros para influenciar a atuação da Justiça é, de certa forma, uma tentativa de evitar esses riscos. Ao comprar a lealdade do futuro bacharel de Direito, o PCC passa a ser credor de uma dívida sem prazo de validade. “Para eles, é melhor colocar uma pessoa que eles já conhecem desde muito antes”, analisa Cosenzo. [nos parece que a violência direta como forma de intimidação e a corrupção como forma de cooptação, nos parecem mais eficientes -  sempre tem os que se deixam intimidar e passam a ser, no mínimo, omissos e espaço para a corrupção sempre existe em qualquer instituição pública.
Já quanto a formação de 'quadros', desde o ingresso nas faculdades até se tornar um promotor, magistrado ou um ministro de tribunal superior, é um caminho, porém,  entendemos ser extremamente demorado e incerto, o que não combina com a urgência que sempre prevalece na maioria das ocasiões dentro das organizações criminosas.]
 
Não necessariamente os integrantes do PCC prestam concurso para os cargos mais altos, como o de promotor e juiz. Outras funções, como oficial de promotoria e analista, também são procuradas pelos criminosos. “É mais fácil se infiltrar em cargos menores onde você tem acesso aos processos do que num cargo maior em que você é vigiado por todos”, afirma o subprocurador. [nos tempos atuais o acesso de servidores é sempre restrito  e o poder de decisão praticamente nenhum - alguma valia só é encontrada se o processo de infiltração, demorado e complicado, ocorrer na condição de  MEMBRO do MP ou do Poder Judiciário. 
Ter acesso a processos, o que é fácil para alguns servidores, é de pouca valia, especialmente nos tempos atuais, em que tudo é digitalizado - o que facilita havendo destruição, imediata restauração.]

Cosenzo explica que o Ministério Público tem aprimorado a investigação sobre os inscritos nos concursos. Além do cruzamento de dados com outras unidades da federação, o processo inclui entrevistas com pessoas próximas do candidato e, mais recentemente, ferramentas digitais que ajudam a detectar qualquer suspeita no passado do candidato. O trabalho tem o apoio do Cyber Gaeco, unidade criada em 2018 como um braço do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado.

Depois de tomarem posse, os aprovados no concurso também passam por dois anos de acompanhamento rigoroso durante o estágio probatório. "No tempo em que ele está no estágio probatório, nós continuamos fazendo o levantamento dos antecedentes e do histórico social. Se tiver algum problema de qualquer ordem que possa prejudicar a atuação do membro como integrante do MP, ele é dispensado”, explica Cosenzo.

O subprocurador diz que não pode detalhar os números, mas afirma que o número de candidatos ligados ao PCC vinha crescendo na última década, até que houve uma queda considerável no último concurso. Ele atribui a diminuição aos esforços adotados para barrar candidatos ligados à organização criminosa.

O Ministério Público do Estado de São Paulo realiza concursos, em média, a cada dois anos. Atualmente, o órgão tem um processo de seleção em andamento.

"Sintonia dos Gravatas"
As evidências da infiltração do PCC em órgãos estatais existem pelo menos desde a década passada.

Em maio de 2015, agentes da penitenciária de Presidente Venceslau encontraram uma carta em que os criminosos tratam de uma mesada de R$ 5.000 paga a Luiz Carlos dos Santos, [peixe pequeno, até o valor da propina é desmoralizante, indicio seguro da pouca importância do corrupto (nos lembra aquela namorada do atual presidente, Rose Noronha, que era subornada com gorjetas, pequenos agrados)   = o valor do suborno é diretamente proporcional à importância do subornado.] então integrante do CONDEPE (Conselho Estadual e Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo). Os intermediários do acerto eram dois advogados: David Gonçalves e Vanila Gonçalves.

A carta dizia: “O Luiz Carlos do CONDEPE, ele esta trabalhando com’ nóis’, já foi autorizado a inclusão do nome dele na folha de pagamento no quadro dos gravatas”, dizia o texto, assinado por “Sintonia Final” — a cúpula do PCC. Na carta, a operação era tratada como prioridade. “Não será economizado moedas para essa situação, tudo que for necessário de dinheiro pode ser usado, sem miséria, o quadro de gravatas também já foi avisado da prioridade deste projeto.”

Durante as investigações, os promotores descobriram que Vanila e Davi tentaram se tornar conselheiros do CONDEPE, mas fracassaram. O pagamento de propina a Santos era o plano B. O órgão é composto por 18 integrantes, indicados por diferentes setores da sociedade. Santos era vice-presidente do colegiado.

O juiz do caso, Gabriel Medeiros, afirma nos autos que os criminosos do “passaram a interferir em órgãos públicos e autoridades do Estado, como Delegados de Polícia, Juízes, Promotores, etc.” — graças à influência exercida pelo conselheiro cooptado. Um dos objetivos era forjar denúncias irreais sobre as condições dos presos para fundamentar futuras denúncias a órgãos internacionais.

Santos ganhava bônus para cumprir algumas missões, como realizar audiências públicas chamando atenção para as supostas condições precárias dos presídios.Os advogados recebiam um pagamento mensal do PCC.  Na sentença de condenação de Abel Pacheco de Andrade, um dos líderes do PCC, o juiz Gabriel Medeiros escreveu que os criminosos “estenderam tentáculos para o seio do poder público.”

A investigação também trouxe à luz o papel dos advogados dentro do PCC. O núcleo jurídico da facção (chamado de “Sintonia dos Gravatas”) foi estruturado em 2016. Na época, havia 40 advogados atuando como agentes da organização criminosa. Esses intermediários são peças-chaves na engrenagem do PCC por poderem se comunicar de forma sigilosa com os chefes do grupo e receber grandes somas de dinheiro disfarçados como honorários.

A partir da estruturação da “Sintonia dos Gravatas”, eles passaram a prestar assistência aos familiares, bancando despesas médicas e os custos de funerais e outras tarefas, mais nebulosas, como a cooptação de agentes do Estado para favorecer o PCC. “Os advogados integrantes do corpo jurídico do PCC raramente realizavam serviços de índole jurídica aos líderes, pois essa tarefa ficava a cargo de outros advogados contratados para esse fim específico”, afirma o juiz na sentença.

Servidor da Justiça cooptado
No ano passado, o Ministério Público do Mato Grosso do Sul encontrou outras provas da infiltração do PCC no Judiciário. Advogados (inclusive um defensor público) atuavam em conluio com o então chefe do cartório da 1ª Vara de Execução Penal do Tribunal de Justiça do Estado. Rodrigo Pereira da Silva Corrêa usava o acesso privilegiado aos sistemas internos para fornecer informações aos membros do PCC. Em troca, recebia propina — intermediada por advogados da facção. [vale destacar que todos os exemplos foram resultado da cooptação, via corrupção, nenhum de 'quadro' formado para a tarefa.]

As informações vazadas incluíam dados sobre futuras remoções de detentos ligados à organização criminosa, e motivaram o planejamento de atentados (abortados) contra autoridades do Judiciário. Em 2021, já sob suspeita de ligação com o PCC, Rodrigo havia sido removido do cargo no tribunal.

Estratégia previsível
Promotor de Justiça no Rio Grande do Sul e autor de livros sobre criminalidade, como 'Violência, Laxismo Penal e Corrupção do Ciclo Cultural', Diego Pessi afirma que a tentativa de influenciar o poder público é parte da própria natureza das organizações criminosas: “O assédio do crime organizado às instituições não é algo recente no Brasil. A história desses grupos criminosos mostra que, desde sempre eles buscaram uma relação promíscua com o poder”, explica.

Olavo Mendonça, major da Polícia Militar do Distrito Federal e especialista em segurança pública, concorda: ele diz que a tentativa de se infiltrar no poder estatal é um passo previsível na trajetória do PCC. "Não existe crime organizado poderoso sem a infiltração no poder público", diz. Mendonça afirma que a polícia também já notou uma movimentação suspeita em seus concursos. “Aqui no Distrito Federal já aconteceram tentativas de infiltração. E, em todas as vezes que a gente soube, a Polícia Militar tomou as devidas providências e a pessoa foi excluída." Para Mendonça, a tática de infiltração é pouco frutífera: "É impossível ter uma pessoa tentando se infiltrar e que tenha um comportamento 100% normal. Eles facilmente identificáveis. Se não num primeiro momento, num segundo”, diz.

Por outro lado, Mendonça diz que a infiltração é menos comum do que a cooptação direta. "Em 90% das vezes eles buscam as pessoas que já estão dentro das corporações. É muito mais fácil cooptar do que colocar alguém para dentro desde o começo”, diz.

De certa forma, o subprocurador Cosenzo concorda. Ele afirma que o PCC tem poucas chances de sucesso em sua tentativa de subverter o Ministério Público e o Judiciário. “É dificílimo. A probabilidade é quase zero, por causa da forma como fazemos a investigação sobre a vida social dos candidatos”, assegura.

 

Já Diego Pessi lembra que, embora a varredura cuidadosa sirva para afastar os membros do PCC, é preciso acompanhar de perto uma possível mudança de estratégia da organização. Pessi diz que o crime organizado modifica a sua forma de atuação continuamente, sempre em busca de brechas legais. “Os processos de seleção realizados pelo MP e magistratura são rigorosos, inclusive no que concerne à análise da vida pregressa dos candidatos. Mas isso não significa que não haja motivos para preocupação”, alerta.

Gabriel de Arruda Castro -  Ideias - Gazeta do Povo 

 



segunda-feira, 10 de julho de 2023

O realismo do absurdo - Percival Puggina

 

        Na nossa história recente, o criminoso que aflige a sociedade é amplamente protegido por um certo garantismo penal que se generalizou no Judiciário. Estranhamente, porém, o mesmo garantismo não se aplica ao cidadão que se manifesta, pacificamente, de um modo que desagrada o Estado.      

No Brasil, nada é mais realista do que o completo absurdo, caro leitor. Nesta terra de bandido solto, com mandato, decidindo sobre nossas vidas e acesso aos recursos públicos, disparate é a sensatez! Mais dia, menos dia, vamos colocar tornozeleira na Polícia, algemar os promotores e estabelecer quota máxima de sentenças condenatórias por magistrado. Excedo-me na ironia?

Toda vez que passo na rua por um desses pobres catadores de papel que, como se fossem animais de tração, puxam as próprias cargas para os locais de reciclagem, me vem à mente a questão da criminalidade
A mesa do catador é escassa, o agasalho pouco, a habitação precária, a vila não é salubre e o trabalho duríssimo. 
Ao lado, bem perto, operam traficantes e suas redes. Têm do bom e do melhor. Mas ele segue puxando seus fardos e contando centavos porque prefere ganhar a vida trabalhando. 
Combater a criminalidade, agilizar os processos, eliminar a impunidade e endurecer as penas é sinal de respeito a essa referência moral emergente no país! É por ele, pelo catador de papel, que escrevo este artigo. E também porque sou portador de uma anomalia que me faz ser a favor da sociedade, desconfiar do Estado e me opor à bandidagem.
 
No entanto, a cada dia, aumenta o número daqueles que estendem o dedo duro para nós, o povo, indigitando-nos como principais culpados pelos males que a insegurança nos impõe. 
Nós, você e eu, leitor, seríamos vítimas da nossa própria perversidade e os grandes responsáveis, tanto pela situação do papeleiro quanto pela opção do traficante, do ladrão, do assaltante, do homicida e até dos corruptos porque muitos de nós os elegem, sabendo ou não sabendo.
 
 Por isso, falando em nome de muitos, de poucos ou apenas no meu próprio, gostaria de conhecer a natureza do delito que nos imputam, dado que estamos sendo novamente desarmados pelas exigências que cercam a posse de qualquer arma, encarcerados por grades de proteção e temos as mãos contidas pelas algemas da impotência cívica. Nós só queremos que nos permitam progressão para o semiaberto, puxa vida!

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

domingo, 25 de junho de 2023

A cada fala do “imperador” togado, maior a insegurança - Katia Magalhães

       Se, como todos sabem, as palavras voam, e só a escrita permanece, qual o propósito de deitar estas linhas sobre a entrevista de uma autoridade?  
Em que pese a sabedoria desse velho adágio, a comunicação verbal adquire relevância sempre que envolve alguém imbuído de poderes virtualmente ilimitados e que traduz autêntico “sincericídio” sobre o modo como o poderoso em questão tem exercido sua posição de mando e pretende continuar a fazê-lo.

Em evento recente organizado pela revista Piauí, o ministro Alexandre de Moraes tornou a monopolizar os holofotes e concedeu uma entrevista divulgada pelo periódico sob a manchete “MORAES DIZ QUE EM SEIS MESES JULGARÁ CASOS MAIS GRAVES DO 8 DE JANEIRO”[1]. Trocando a toga pelo manto de suposto justiceiro, Moraes, erigido, logo no início da reportagem, à figura que “personificou o esforço do Judiciário em lidar com a extrema direita organizada” – afinal, personalismo pouco é bobagem! -, começou por gabar a própria eficiência, segundo ele, evidenciada pelo acúmulo de processos sob sua condução. Em relação a seu burnout, afirmou, em tom quase irônico: “não ganho mais por causa disso, eu não trabalho menos e sou vigiado 24 horas por dia. Bom não pode ser.”

No entanto, a contrapartida a todo o heroísmo” alexandrino é a crescente concentração de poder nas mãos de alguém enxergado, por boa parte da sociedade, quase como o juiz único do Brasil. Inebriado pela ânsia de determinar o que pode ou não ser dito e o que pode ou não ser feito, Moraes tem apreciado condutas de pessoas que, à luz da Constituição e das leis, não estariam sob sua jurisdição, como foram os casos dos empresários ditos “golpistas de Whatsapp”, das plataformas digitais, dos governadores Ibaneis e Zema, do ex-ministro Anderson Torres e tantos outros, discutidos em detalhes neste espaço. Tudo isso sob o silêncio conivente de seus pares e do Senado, ao qual cabe a função institucional de contenção de abusos da cúpula judiciária. Ou, pelo menos, caberia…

Indagado por jornalistas sobre a receita para a aceleração no ritmo de julgamento dos acusados de participação nos atos de vandalismo do 8 de janeiro, Moraes admitiu que as condutas de cada invasor não serão analisadas individualmente, pois “é um caso de condutas múltiplas. Quem estava lá participou. Não preciso dizer que fulano quebrou a cadeira A ou riscou o quadro B. Estar lá [invadindo prédios públicos] já é crime.” Em relação a esse tópico, me permita, caro leitor, uma breve digressão sobre uns poucos tecnicismos, apenas para que você seja capaz de avaliar, por si mesmo, toda a extensão da “singularidade” da manifestação do togado.

Em situações em que vários indivíduos se reúnam para a prática (“concurso de pessoas”) de um certo delito, e, ainda, nas hipóteses em que uma pessoa, por meio de mais de uma conduta, incorra em mais de um crime (“concurso de crimes”), cabe ao Ministério Público, ao propor a ação penal, descrever os fatos e atribuir a cada agente a prática de uma ou mais infrações, conforme evidenciado pelas provas. 
Da mesma forma como o julgador tem de absolver ou condenar cada réu por uma ou várias condutas bem definidas, até mesmo para poder fixar a pena cabível. Isso importa, sim, na obrigatoriedade imposta a qualquer magistrado de afirmar se “fulano quebrou a cadeira A, ou riscou o quadro B”, e, acrescento ainda, se “fulano quebrou a cadeira A e riscou o quadro B”. 
Ora, qualquer leigo entende que a deterioração de objetos configura crime de dano, diferente do delito da invasão em si, e que um agente que tiver invadido e destruído dezenas de antiguidades não poderá ser punido da mesma forma que um invasor destruidor de um único objeto acessório de valor ínfimo, e, muito menos, do mesmo modo que alguém que tiver invadido sem nada danificar!

Tal conclusão óbvia decorre do princípio da individualização da pena, adotado em todo o mundo democrático e no Brasil[2], segundo o qual, no âmbito criminal, cada pessoa só pode responder por sua própria conduta, devendo o julgador levar em consideração todas as especificidades, caso a caso. Mas quem disse que o redentor da nossa democracia, em sua luta gloriosa contra extremistas, tem de se curvar aos ditames constitucionais?

O filme “O homem que não vendeu sua alma” retrata o período final da trajetória de Sir Thomas More, notável intelectual do século XVI, jurisconsulto e membro da corte de Henrique VIII, no tormento de seus últimos anos. Católico fervoroso, não apoiou o divórcio de seu soberano, as novas núpcias deste com Ana Bolena e, muito menos, a ruptura com Roma. Para manter íntegras as suas liberdades, em particular a de opinião, renunciou a seu cargo de chanceler e recolheu-se à vida simples no campo. “Não importa o que eu acho, mas que eu acho”, afirma ele em uma das primeiras cenas que põem em xeque a faculdade do livre pensar.

Ciente da sua impotência em combater um regime absolutista e ainda fiel à velha amizade com Henrique, Sir Thomas não se entregou a qualquer ataque frontal ao monarca, mas lutou, até o fim, pelo seu direito ao silêncio, do qual nenhuma lei o privava. 
Aliás, tamanho o apego do jurista à legalidade estrita que, em um dos diálogos mais emocionantes, chegou a afirmar que “daria ao diabo o benefício da lei, em prol de sua própria segurança.” 
Lançou mão de uma hipérbole para asseverar sua convicção de que o pior dos canalhas deveria ser sujeito a um julgamento justo, ao amparo da legislação vigente, para que ele mesmo (Sir More) se sentisse seguro de que também o estaria. Eis aí a própria definição de segurança jurídica, que reside na capacidade, garantida indistintamente a todos, de prever as consequências (inclusive as penalidades) para suas condutas.

Contudo, na distante Inglaterra, onde prevaleceu o desejo do monarca, Sir Thomas pagou com sua vida o preço pela discordância, tendo sido preso e executado por “traição dolosa à supremacia real”, ou melhor, apenas por calar.

Sempre que o império da lei é substituído pelo dos homens, ninguém pode se sentir seguro. 
Até quando suportaremos ver, entre nós, o julgamento de réus sem especificação de condutas, enquanto sentenças contra criminosos notórios são anuladas por firulas? 
Censuras e parlamentares defenestrados por fundamentos inexistentes? Que o exemplo de Sir More nos inspire, e que os soberanos da atualidade tenham seus caprichos freados pelas instituições, acionadas mediante pressão de uma sociedade fortalecida e mais madura.

[1] https://piaui.folha.uol.com.br/moraes-diz-que-em-seis-meses-julgara-casos-mais-graves-do-8-de-janeiro/

[2] CF: Art. 5 – XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado

*      

**     Artigo reproduzido do site do Instituto Liberal, em https://www.institutoliberal.org.br/blog/justica/a-cada-fala-do-imperador-togado-maior-a-inseguranca/

Kátia Magalhães -   A autora é advogada formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e MBA em Direito da Concorrência e do Consumidor pela FGV-RJ, atuante nas áreas de propriedade intelectual e seguros, autora da Atualização do Tomo XVII do “Tratado de Direito Privado” de Pontes de Miranda, e criadora e realizadora do Canal Katia Magalhães Chá com Debate no YouTube.

 

 

sexta-feira, 23 de junho de 2023

Judiciário - Se Dias Toffoli pode ser ministro do STF, qualquer um pode - Gazeta do Povo

Vozes - Francisco Escorsim

Ministro Dias Toffoli disse que reconhecer o direito ao esquecimento violaria a liberdade de imprensa e de informação, garantidas pela Constituição.


O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Tenho uma preguiça imensa de falar sobre coisas óbvias, mas num tempo em que é preciso repetir e repetir e repetir que a grama é verde, o óbvio se torna raro. Então, repito: se Dias Toffoli pode ser ministro do STF, qualquer um pode. E mostro por que a grama é verde. [mesmo considerando as fundadas restrições ao notório saber jurídico do ministro Dias Toffoli, temos que reconhecer que ele é bastante criativo. Percebam:
- é dele a ideia da criação do famoso 'inquérito do fim do mundo' que, segundo pessoas que entendem das leis e da Justiça, é a fonte do poder do mais poderoso dos supremos ministros; 
- foi também o ministro Toffoli a primeira suprema autoridade a reconhecer, fora do  solo pátrio, que o Brasil tem um     4º Poder, o PODER MODERADOR, que é exercido pelo STF.]


Um dos critérios para a nomeação de alguém ao STF, segundo o artigo 101 da Constituição, é o de o indicado possuir notável saber jurídico. Confira o currículo de Dias Toffoli antes de ser nomeado e responda: se tinha notório saber jurídico, o que seria apenas um “saber jurídico”? Se algo havia de “notório” naquele momento, não era seu saber jurídico, mas sua atuação em favor do PT e de Lula, que o indicou.

Mas, se você acha que neste caso isso seria discutível e de avaliação subjetiva, não tem como sustentar que o futuro ministro possuía reputação ilibada, outro critério exigido pelo mesmo artigo da Carta Magna. Também não se cumpria à época, pois o indicado havia sido condenado em primeira instância pela 2.ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Macapá “a devolver, junto com outros réus, cerca de R$ 700 mil aos cofres públicos do Amapá.” Isso era um fato, não opinião.

    Nossa Constituição é como um diretor de uma peça teatral ignorado pelos atores que reescrevem o roteiro improvisando conforme a circunstância

O indicado não passava, portanto, nem pelo critério do dicionário,
pois “ilibado” significa, segundo o Houaiss: “1. não tocado; sem mancha; puro. 2. que ficou livre de culpa ou de suspeita; reabilitado, justificado”. Por óbvio (eu avisei), uma condenação mancha a reputação de qualquer um, que só pode ser restaurada caso a decisão seja reformada em instâncias superiores, sendo então considerado livre de culpa ou de suspeita, o que não aconteceu à época da aceitação de Toffoli pelo Senado para o cargo de ministro do STF.

Não estamos falando de presunção de inocência até decisão definitiva, mas de um rígido critério moral, do contrário não se exigiria pureza da reputação. Uma coisa é ser presumido inocente tendo recorrido de uma condenação, mas é óbvio (eu avisei) que a condenação em si mancha a pureza dessa reputação, que pode até continuar sendo boa, mas jamais ilibada até que – e se – restaurada posteriormente. Ou seja, naquele momento a reputação de Dias Toffoli não era ilibada. Não era questão de opinião, era fato.

Por isso, a partir do momento em que o determinado pela Constituição Federal era – e continua sendo – ignorado, tanto por quem o nomeou quanto pelo Senado que o aceitou, os critérios de “reputação ilibada” e “notório saber jurídico” nada mais significam e futuros indicados podem até ser recusados, mas, se o forem, será por pura conveniência política do momento e mais nada.

Diante dessa realidade, que importa se o atual indicado e aceito para ministro do STF Cristiano Zanin é advogado pessoal do presidente da República? Os princípios da impessoalidade e moralidade foram tratados da mesma forma que os critérios referidos de “reputação ilibada” e “notório saber jurídico”: só valem quando interessa aos donos provisórios do poder.

O que me obriga a destacar outra obviedade a respeito da nossa Constituição: ela é como um diretor de uma peça teatral ignorado pelos atores que reescrevem o roteiro improvisando conforme a circunstância. Há quem, na plateia, acredite ser espectador de uma tragédia, mas, na verdade, a peça é uma grande farsa e os palhaços somos nós.


Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Francisco Escorsim, colunista  - Gazeta do Povo - VOZES