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domingo, 10 de julho de 2022

Nem a Constituição pegou - Carlos Alberto Sardenberg

Nem a Constituição pegou 

Considerando que muitas leis não pegam no Brasil, pessoas de boa fé, dentro e fora do sistema político, entenderam, ao longo de décadas, que normas realmente importantes deveriam ser gravadas na Constituição. Assim foi feito – e por isso a nossa Carta Magna é tão extensa. E tão descumprida e emendada.

Está acontecendo de novo.

Em 15 de dezembro de 2016, governo Temer, foi sancionada a Emenda Constitucional número 95. Estabelecia um novo regime fiscal, baseado na novíssima regra do teto de gastos. Por esta, se determinava que a despesa do governo federal em um determinado ano seria igual à do ano anterior mais a inflação. Vigência: até 2036.

Ideia boa: com isso, o gasto público permaneceria constante em termos reais. Com o esperado crescimento do país, o setor público teria seu (excessivo) peso reduzido em relação ao setor privado. As contas do governo seriam colocadas em rota de equilíbrio o tão falado equilíbrio fiscal reduzindo-se déficits e dívida pública.

Mas esses eram exatamente os objetivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, legislação infra-constitucional, sancionada em 4 de maio de 2000, na gestão FHC. Parte importante da consolidação do Real, a norma determinava que o orçamento do governo federal deveria ter metas explícitas de receitas e despesas, prevendo-se superávit primário de modo a que sobrassem recursos para a amortização progressiva da dívida pública.

Para espanto de muitos, a regra funcionou corretamente durante muitos anos. Na primeira gestão de Lula – para espanto de muito mais gente – o governo federal produziu superavits enormes, de até 4,5% do PIB, colocando a dívida em queda e, assim, garantindo o ajuste fiscal. [importante destacar que nos dois primeiros anos do primeiro mandato do governo do descondenado - porém, não inocentado -  a quadrilha petista estava sendo montada e começou suas atividades via  MENSALÃO, roubando de forma modesta.]

No segundo mandato, Lula começou a retomar a expansão do gasto público. A economia mundial ajudava, o governo tinha mais dinheiro. De todo modo, a regra básica da LRF foi mantida.

Dilma estragou tudo. Baseada na tese de que o gasto público tinha poderes universais – servia para melhorar tudo a presidente inventou as pedaladas fiscais para aumentar a despesa em termos reais, fingindo manter a meta de superávit.

Teria sido melhor se tivesse proposto Emenda Constitucional para mudar o regime fiscal
Melhor no sentido de que colocaria a questão em debate aberto. 
Mas como isso poderia pega mal e gerar crises de confiança, Dilma optou pelos truques – como o de espetar despesas do governo federal na Caixa e no Banco do Brasil.

Conhecem o resultado. Déficits, dívida, juros mais altos, inflação, recessão.

Vem o governo Temer com o objetivo de restaurar o equilíbrio fiscal. Como a LRF não pegara, optou-se pela Emenda Constitucional, aquela de número 95.

Ingênuos pensaram: agora ninguém mais rasga.

Rasgaram. E não foi o PT, mas um governo que se apresentara como anti-petista, com o apoio do Centrão, súcia de partidos e blocos parlamentares, cuja vida política está centrada no gasto de dinheiro público conforme seus interesses eleitorais.

Assim chegamos à PEC Kamikase, uma proposta de emenda constitucional para burlar a Constituição e permitir que o governo federal gaste fora do teto. [a matéria omite que a PEC em questão é a única alternativa para reduzir a fome (reduzir, para acabar só com o crescimento econômico,  que com as bênçãos de DEUS vai deslanchar no segundo mandato do governo Bolsonaro.) de milhões de brasileiros. A única forma para atenuar os malefícios advindos de uma pandemia. Lembramos que rejeitar a PEC equivale na prática a decretar "que as pessoas só devem deixar de passar fome depois que a eleição passar". Vale a pena criar no Brasil, para satisfazer à esquerda maldita, um HOLODOMOR?] 

Eis o país de novo no ambiente do desequilíbrio das contas públicas, com mesmas consequências de antes. Por exemplo: o dólar caro, fonte adicional de inflação.

E sabem o que mais impressiona? A ampla maioria a favor da PEC, incluindo as oposições variadas. Mais ainda: o candidato favorito, Lula diz que esse negócio de teto de gasto é uma furada, coisa do mercado financeiro. Aliás, prometia acabar com o teto. Não precisa mais. Bolsonaro e o Centrão já fizeram o serviço.

Assim, os dois principais candidatos e a maioria do Congresso, que deve ser reeleita, anunciam que vão se fartar no gasto público. Como cada setor do eleitorado acha que será especialmente beneficiado com esse gasto, a farra fiscal está garantida. As consequências também, e de novo: inflação, juros altos, baixo crescimento econômico.

Considerando que a emenda constitucional do teto de gastos não pegou, a que outra legislação se poderia recorrer? [a CF 1988, vigente, apesar de extensa, tem muitas falhas (talvez fruto da pretensão dos seus autores de constitucionalizar tudo) e um dos poucos acertos é que pode ser emendada - cabendo, em nosso entendimento, logo que possível, alguns ajustes no artigo 60.]

Biblia, talvez?

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 Coluna publicada em O Globo - Economia 9 de julho de 2022

 

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

Juízes alegam perda de 40% e pedem a Fux projeto de reajuste de subsídios - Estadão Conteúdo

A juíza Renata Gil, que dirige a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), se reuniu na noite desta quarta-feira, 2, com o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), para pedir que a Corte encaminhe com urgência ao Congresso um projeto de lei com previsão de recomposição da remuneração dos membros do Poder Judiciário.

O encontro ocorreu em Brasília com a entrega de um documento com as demandas da classe. Nos cálculos da associação, as perdas inflacionárias da magistratura nos últimos anos chegam a 40%.  “Para efetivar o acesso da população aos serviços públicos e fundamentais é preciso remunerar adequadamente o trabalho de todas e de todos que se dedicam às carreiras públicas”, diz o ofício entregue ao presidente do STF.

A Constituição limita o holerite da magistratura ao que ganha um ministro do STF, o que hoje equivale a R$ 39,3 mil. A AMB estima que, corrigindo a alegada defasagem, o subsídio deveria ser de R$ 54,8 mil.

A sugestão é que o PL seja enviado imediatamente para aproveitar a janela, prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal, que admite a possibilidade de reajustes durante os primeiros 185 dias do ano em que se encerra o mandato do presidente.

O documento lembra que a PEC dos Precatórios limitou o pagamento de despesas decorrentes de sentenças judiciais. Outro argumento é que o Congresso reservou quase R$ 2 bilhões para reajuste de servidores do Poder Executivo e mais de R$ 25 milhões para o aumento de subsídios dos membros da Defensoria Pública da União (DPU).

“Diante dessas razões, revela-se fundamental que Vossa Excelência, na qualidade de Presidente da Suprema Corte, venha a promover as providências necessárias a se garantir a recomposição remuneratória dos Ministros do STF, o que abrirá ensejo também para a recomposição da Magistratura Nacional. Entre tais providências, impõem-se o encaminhamento de projeto de lei à Câmara dos Deputados”, finaliza o documento.

Isto é Dinheiro - Estadão

 

terça-feira, 30 de novembro de 2021

CCJ aprova PEC dos Precatórios; texto vai ao plenário do Senado

A expectativa do governo envolve votar a matéria ainda nesta terça-feira em plenário, mas texto deve ser apreciado na quinta-feira 

VITÓRIA da PEC dos Precatórios na CCJ = mais uma vitória do Brasil, de 17.000.000 de famílias famintas e do presidente Bolsonaro.]

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, por 16 votos a 10, o texto-base da PEC dos Precatórios, nesta terça-feira, 30. O projeto prevê a estipulação de um teto para o pagamento das dívidas da União já tramitadas em julgado e faz alterações importantes no funcionamento do teto de gastos, mudando o índice de inflação como base de cálculo de julho para dezembro para o reajuste das limitações do governo para gastar. Com a proposta, o governo terá um “respiro” de 106 bilhões de reais para dar vazão, ainda, ao Auxílio Brasil, o novo programa assistencial anabolizado, que pagará em média 400 reais pelo período de um ano. Os limites para o pagamento de precatórios estão previstos para circundar em 39,9 bilhões em 2022. O texto segue para o plenário da Casa, onde promete, ainda, enfrentar resistência. A expectativa do governo envolve votar a matéria ainda nesta terça-feira em plenário, mas o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), já ter sinalizou que o texto deve ser apreciado apenas na quinta-feira 2.

O projeto aprovado pela Câmara dos Deputados havia satisfeito o ministro da Economia, Paulo Guedes, que vê na previsibilidade constitucionalizada para o pagamento de obrigações como fundamental para o controle dos gastos públicos — apesar, ressalte-se, do furo no teto, tão defendido pelo ministro. O texto é tido como fulcral para que o governo consiga dar vazão ao pagamento do Auxílio Brasil, o benefício recauchutado de valor médio de 400 reais, mas não aponta a fonte dos recursos. O relator do texto, Fernando Bezerra (MDB-PE), não apresenta fonte de custeios. Uma das exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal é que, ao criar uma despesa permanente, é preciso indicar uma fonte de receita permanente, seja ela criação de tributo. Com a indicação de que o Auxílio Brasil será permanente, o governo constitucionaliza o desrespeito a uma das principais regras fiscais do país.

Para angariar apoio, o relatório aprovado acoplou uma alternativa para beneficiar estados que renegociaram suas dívidas com a União em 2016, por meio do Plano Mansueto. Bezerra inseriu ainda uma previsão constitucional para que o governo centralize o controle dos dispêndios com os precatórios, e evitar a judicialização das dívidas já tramitadas em julgado. O texto prevê ainda um incentivo para que os estados que engendraram medidas de contenções de gastos e controle fiscal arquem com suas dívidas com a União. Segundo a emenda, apresentada pelo líder do governo, Eduardo Braga (MDB-AM), os entes federativos poderão restituir mensalmente os valores diferidos à União até o final do contrato de renegociação caso adotem mecanismos de ajuste fiscal do teto de gastos.

As medidas foram consideradas necessárias dadas as resistências à matéria ainda na CCJ. “Temos diferenças conceituais, mas é importante que possamos, pelo diálogo, nos aproximar de um consenso”, defendeu Bezerra. A sessão chegou a ser interrompida por horas pela costura de consenso por parte dos governistas, sem sucesso. Um grupo de senadores crítico à proposta apresentou, ainda, seus votos em separado em relação à proposta. Como mostrou o Radar Econômico, com a manobra, Oriovisto Guimarães (Podemos-SP), Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e José Aníbal (PSDB-SP) movimentaram-se contra a proposta do governo para apresentar, automaticamente, um texto alternativo, que prevê, entre outros pontos, a priorização do pagamento de precatórios de natureza alimentícia e que qualquer despesa criada pelo governo no ano que vem respeite a Lei de Responsabilidade Fiscal, obrigando o governo a apresentar a fonte de custeio de qualquer dispêndio permanente por parte do Executivo. Durante a sessão na CCJ, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou que as divergências de parte dos senadores em relação ao relatório são conceituais, reiterando a dificuldade do governo de chegar a um acordo pela aprovação da matéria.[a senadora Tebet - que em momentos de devaneio se imagina candidata à Presidente da República (delírio que tem alguns seguidores) - tem que ser mais humana, mais generosa com milhões de famintos e não dificultar qualquer programa do governo, ainda que este governo seja o do capitão, que objetiva minorar o sofrimento de quase 20.000.000 de famílias famélicas.]

VEJA - Economia


sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Pressão total por auxílio turbinado - O Globo

A pressão sobre o ministro Paulo Guedes (Economia) por um Auxílio Brasil anabolizado nunca foi tão grande. No interior do governo, o discurso é que é preciso anunciar quanto antes um benefício permanente que substitua o Bolsa Família e o auxílio emergencial.  O sonho da ala política do Executivo, que já não esconde que resolveu mandar o ajuste fiscal e os escrúpulos às favas, é repetir o valor de R$ 600 da primeira rodada do auxílio emergencial.

[inimigos do Brasil consideram programas de auxílio aos milhões de  necessitados e famintos ações eleitoreiras. 
O inimigo maligno = inimigos do Brasil + inimigos do presidente = criticam programas do Governo Bolsonaro, para mitigar a fome; 
para o 'inimigo maligno', pouco importa que os famintos morram, o número de miseráveis decuplique;
Quando o maior dos ladrões governava,  a mídia militante (que abriga grande parte dos adeptos do 'inimigo') elogiava o Bolsa Família, programa necessário, mal administrado, mas que naquela época - SEM pandemia - quebrava um galho.
aos apoiadores do maligno o que realmente importa é recuperar o governo que perderam em 2018. Os milhões de desempregados, de necessitados, de famintos, que se f ...]

Sozinho na savana, Guedes tenta avisar que não há nem espaço fiscal para pagar esse valor nem o “carimbo” de que o governo precisa no Orçamento para criar uma despesa permanente. O primeiro teria de vir da renegociação dos precatórios, que nesta semana avançou para um acordo, mas ainda com inconsistências que precisam ser resolvidas, como a necessidade de combinar com os credores o tal “encontro de contas” que, ademais, não conseguiria atingir a todos os que têm dívidas a receber.

O carimbo, ou seja, a designação de uma receita para arcar com a nova despesa, uma exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, viria da reforma do Imposto de Renda, em torno da qual existe acordo para votação no Senado. Não se está, nesse caso, fazendo uma conta de equivalência. O raciocínio do governo é que a reforma do IR não precisa cobrir o gasto com o auxílio, que viria da própria arrecadação do governo, que cresceu neste ano. Seria apenas a fonte a justificar o gasto do ponto de vista formal.

Pedaladas? Aos olhos de muitos, sim. Mas o nó dos precatórios é algo que sensibiliza ministros do STF e parlamentares. Os últimos estariam dispostos a, alinhavados os muitos detalhes ainda sem resposta do acordo, votar uma proposta de emenda à Constituição para oficializar a rolagem de quase R$ 50 bilhões dessas dívidas.  Isso significa que está aberta a porta para o auxílio turbinado que poderia ser a âncora eleitoral de Bolsonaro? Não necessariamente. A primeira resistência a chutar o pau da barraca no valor vem, como já escrevi, do próprio Guedes. Resta saber se ele terá forças para resistir a apelos cada vez mais veementes, de ministros que deixam Bolsonaro “pilhado” com esse assunto, como ocorreu em reunião ministerial recente.

A segunda barreira estará no próprio Congresso. Senadores e deputados não estão dispostos a colocar uma azeitona carnuda e já descaroçada na empada de Bolsonaro à reeleição. [senadores e deputados precisam ter presente que eles não foram eleitos para decidir quem ganha ou perde eleições; 
QUEM DECIDE É O ELEITOR. A democracia é representativa, mas em termos de eleições os eleitores não outorgaram procuração aos parlamentares.
O POVO certamente vai lembrar dos parlamentares que para impedir um hipotético favorecimento do presidente Bolsonaro, foram contra o auxílio aos mais necessitados.] A tendência é que um auxílio inflado artificialmente encontre resistências mesmo dos partidos de esquerda, que tradicionalmente defendem os benefícios sociais.Trata-se de um campo minado, como admitem senadores e deputados de esquerda com quem conversei. Por isso, eles não devem se expor em discursos contra um valor de R$ 600, mas contam com a pressão do mercado sobre Guedes e Bolsonaro para “modular” o valor e chegar a um máximo de R$ 400.
E esse seria um combustível capaz de levar o presidente ao segundo turno? Quando se chega a esse ponto da conversa, as opiniões se dividem. A maior parte dos opositores avalia que a rejeição que Bolsonaro construiu é do tipo tóxico, que não se desfaz com esse tipo de artifício. [não se desfaz rejeição que não existe, cuja pseudo existência é fruto da insatisfação dos inimigos do Brasil = establishment + inimigos do Brasil + inimigos do presidente da República + adeptos do 'quanto pior', melhor + arautos do pessimismo; por inexistir,  é inofensiva e não vai atrapalhar o presidente.
Alertamos que a matéria tem que ser lida com atenção, por se tratar de comentários/narrativa apresentada por uma jornalista que, em seus escritos, sempre apresenta narrativas/interpretações contrárias ao presidente da República. É só ler o que ela publica. O que nos diverte é imaginar as dificuldades que a escriba terá para engolir mais quatro anos do capitão.Além do mais, argumentam que a economia tende a entrar em estagnação entre o fim deste ano e o início de 2022, o que tornará ainda mais difícil a execução de um plano eleitoral fiscalmente camicase.

Por fim, existe um risco concreto, que faz Brasília perder o fôlego, de a ministra Rosa Weber dar um basta à farra das emendas do relator — o orçamento secreto —, e isso ser chancelado pela maioria do Supremo. Sem esse que é o grande fator a garantir a Bolsonaro uma maioria parlamentar, com sua popularidade derretendo e com a tensão social escalando para cenas como as vistas nesta quinta-feira com a invasão da Bolsa, a debandada dos partidos do Titanic governista tende a se acelerar.

Vera Magalhães  - O Globo


domingo, 5 de julho de 2020

A lei vale para todos, a depender da interpretação – Editorial

 O Globo


Divisão no STF indica necessidade de emenda constitucional para tornar realista o conceito da irredutibilidade do salário

A sessão de julgamento do Supremo Tribunal Federal da quarta-feira da semana retrasada foi cercada de excepcionalidades. A começar pelo fato de retomar a apreciação de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) instaurada na Corte há 18 anos, por iniciativa de partidos políticos e associações de servidores públicos, contra dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal, então recém-aprovada para servir de lastro do controle das contas públicas, afinal conseguido depois de um longo período de crises em que houve recessão, estagnação e uma hiperinflação que chegou perto dos 3.000% em 1993.




A importância do tema em julgamentoa possibilidade de a Federação, diante de novo risco de descontrole fiscal, estabelecer cortes de jornadas dos servidores públicos, com reduções proporcionais de seus salários — se deve à necessidade de o administrador público tomar medidas para manter o equilíbrio fiscal, e não deixar que graves e crescentes déficits desemboquem em surtos inflacionários, que é a maneira selvagem com que as economias consertam esta disfunção.
Infelizmente, por 7 a 4, o relator do processo, ministro Alexandre de Moraes, foi derrotado no seu voto pela rejeição do pedido de inconstitucionalidade, sendo acompanhado por Dias Toffoli, presidente da Corte, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes, votos insuficientes para rejeitar a ADI, apoiada por Rosa Weber, Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello, Luiz Fux, Celso de Mello e Cármen Lúcia, esta em parte, porque admitiu a redução de jornada.

O tamanho do equívoco cometido pela maioria do plenário do STF também é demonstrado por números, não só por argumentos jurídicos considerando uma adequada interpretação do que estabelece a Constituição sobre as contas públicas, de forma articulada com a LRF. Se não houvesse uma outra leitura consistente da Carta, não haveria quatro ministros favoráveis à manutenção dos dispositivos contestados da Lei de Responsabilidade.

O principal problema nas finanças do Estado brasileiro são as despesas obrigatórias por lei, que se expandem autonomamente. A principal delas, as da Previdência, obriga os países, não apenas o Brasil, a ajustar suas regras de seguridade de tempos em tempos, conforme a demografia exige, com o aumento do contingente de aposentados. É o que foi feito em 2019. Outro foco de dificuldades, no caso brasileiro, é a folha de salários do funcionalismo, que tem dinâmica própria de crescimento — reajustes por tempo de serviço, além de revisões feitas sob pressão das fortes corporações sindicais do setor, por inspirações populistas. Esta conta representa na União o segundo item mais importante nos gastos primários, excluindo o pagamento dos juros da dívida pública. Não é muito diferente em estados e municípios.

Como a folha de salários é gasto engessado, ela continua a subir haja ou não crise, com falta de recursos ou não. Há unidades da Federação em que os inativos já custam mais para os contribuintes do que os ativos. Na União, estados e municípios, a despesa com servidores passou de 12,3% do PIB em 2014 para 13,6% em 2018, segundo dados do Tesouro. E continua em ascensão, pressionando por mais recursos em detrimento de áreas estratégicas como saúde e educação. Entre países desenvolvidos, este índice fica entre 5% e 10%. As estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostram que são raros os países que destinam mais de 13% do PIB ao funcionalismo.


Não apenas argumentos de natureza fiscal e com base em estatísticas sustentam um outro entendimento da arguição da constitucionalidade da LRF. Em seu voto, o relator Alexandre de Moraes registra que o artigo 169 da Constituição, ao qual se relaciona a Lei de Responsabilidade, estabelece regras para a redução das despesas com pessoal, se elas ultrapassarem limites estabelecidos em lei complementar, a LRF. Caso não seja possível reenquadrar esses gastos dentro dos limites legais, servidores estáveis poderão ser demitidos em uma situação extrema. Está escrito. 
[o oportuno está escrito, acima destacado, nos anima a perguntar:
- será que não está na hora da opção ser efetuar modificações mais abrangentes no texto constitucional, deixando de lado   modificações pontuais, via PEC?
Não se pode desprezar o fato que a atual 'constituição cidadã' usa e abusa da concessão de privilegiar a interpretação do que está escrito, relegando a segundo plano o que está escrito.
Já vivemos em uma democracia que viola direitos assegurados na Constituição Federal a pretexto de impor o respeito aos mesmo direitos.
No mesmo diapasão deixamos de seguir o que está escrito para seguir a interpretação do que está escrito.
O Supremo é guardião e intérprete da Carta Magna - está escrito - só que artigos de redação considerada confusa, são deixados de lado, ainda que ratificados por Lei posterior, editada exatamente para complementar o dispositivo de redação 'confusa'
Um exemploartigo 142,  'caput', seu parágrafo primeiro, da Constituição Federal em vigor,  combinado com artigo 15, 'caput',  da Lei Complementar nº 97, em plena vigência.]

Faz sentido, portanto, assim como defenderam Moraes e os ministros que o acompanharam, que em vez da demissão o servidor possa ter o emprego garantido pela redução da jornada e do salário. Quem pode mais, pode menos. Se é possível demitir, deve ser permitido criar um estágio anterior para a redução dos gastos. A tese foi rejeitada no julgamento, mas espera-se que o melhor entendimento dessa questão amadureça com o tempo. Para o bem do próprio servidor. Diante deste desencontro no STF, que se faça então emenda constitucional para condicionar a irredutibilidade dos salários à vida real.

Convenciona-se dizer que no Brasil primeiro veio o Estado, representado pela Coroa portuguesa, e depois o povo. Substituída a Monarquia pela República, na parte de cima desta construção social, onde estavam marqueses, condes, barões, estabeleceram-se elites diversas, com destaque para uma burocracia pública diversificada. São funcionários de diversas formações profissionais, próximos ao poder. Em Brasília, a proximidade aumentou. Nos extratos superiores deste edifício da burocracia, pagam-se bons salários com generosos penduricalhos, há carreiras que evoluem sem sustos e promoções garantidas. Na planície está a grande maioria da população constituída por assalariados do setor privado, cujos salários e jornadas de trabalho estão sendo cortados devido à crise, pela mesma fórmula incluída na LRF, agora declarada inconstitucional. A lei vale para todos, mas a depender da interpretação.

Editorial - Jornal O Globo




quinta-feira, 23 de abril de 2020

A sofisticação de Bolsonaro - William Waack

O Estado de S.Paulo

Presidente está negociando cargos em troca de apoio aos que, no sistema brasileiro, são por definição os representantes do povo: os deputados

Jair Bolsonaro bradou que o “povo está no poder” ao discursar numa manifestação abertamente golpista em frente do QG do Exército, e se empenha em provar o que disse. Está negociando cargos em troca de apoio aos que, no sistema brasileiro, são por definição os representantes do povo: os deputados.  Para seus padrões, é a mais sofisticada jogada política desde que assumiu. Tentar arrebanhar uns 200 deputados da confusa e amorfa massa de parlamentares identificada como “Centrão”. Em busca do que até agora dizia não ser necessário para governar, ou seja, uma base razoavelmente ampla e coordenada na Câmara dos Deputados. [o presidente Bolsonaro comanda um partido político em processo de formação e, por óbvio, necessita de políticos eleitos,  o que torna justificável eventual negociação.]

Os motivos para proceder de forma que prometeu jamais empregar – trocar cargos por apoio político – são dos mais diversos, inclusive a vontade pessoal de “punir” quem considera chantagista, conspirador e traidor, o atual presidente da Câmara, de quem Bolsonaro pretende tomar parte efetiva do controle do “Centrão”. Um dos mais relevantes motivos para a ação do presidente, porém, é o reconhecimento tácito de que o poder do chefe do Executivo diminuiu desde que ele assumiu.

Outro motivo é o efetivo cerco que esferas políticas e institucionais impuseram ao presidente via STF. Bolsonaro tem razão em apontar para o outro lado da Praça dos Três Poderes ao se dirigir por redes sociais a apoiadores e dizer que “eles” (ministros do STF) o impedem de fazer o que quer. Reconhece que, sem o Supremo e o Legislativo, nada vai. [O Supremo e Legislativo são necessário, o pior, que não é possível, é quando mais atrapalham do que ajudam - caso presente.]  

A outra operação política sofisticada (para padrões bolsonaristas) encabeçada pelo Planalto lembra fortemente o que se fez nos tempos da tal “velha política”, que, teoricamente, teria deixado de existir. É sacar praticamente a fundo perdido dos cofres públicos, investir em grandes obras e ver no que dá.  A possibilidade surgiu com a tal ajuda de emergência a governadores e prefeitos que o próprio ministro da Economia chamou de “farra fiscal aproveitando-se de uma crise de saúde pública”. As modalidades desse socorro estão em negociação, mas já abriram uma avenida que permitiria ao Executivo utilizar um “orçamento de guerra” praticamente sem limites e sem restrições do tipo Lei de Responsabilidade Fiscal.

Claro, enquanto for tudo “temporário”, isto é, enquanto durar o estado de calamidade. Sabe-se que, no Brasil, “temporário” em questões fiscais é termo elástico – desonerações “temporárias” de folhas de pagamento, por exemplo, já duram uns 10 anos. E a julgar pelo que se ouve falar no Planalto, o “temporário” entraria pelo próximo ano (para provável desespero do secretário do Tesouro) e abriria a janela para execução de um plano de recuperação baseado em investimentos públicos com foco central em infraestrutura.

É um tipo de intervenção estatal que requer centralização e coordenação e a tarefa foi atribuída a um oficial de Estado-Maior, general Braga Netto, ministro da Casa Civil. Talvez uma pitada de oportunismo político (quem não tem?) tenha levado o ministro Paulo Guedes, um dedicado aluno de Milton Friedman, a cooperar estreitamente nessa empreitada e abraçar-se a John Maynard Keynes. Famoso pela frase, entre outras, de que “se mudam os fatos, eu mudo de opinião” (Guedes, tal como os clássicos Friedman e Keynes, gostaria que os políticos o ouvissem mais).

Os fatos que mudaram são de enorme magnitude. A crise do coronavírus tornou imprevisível o tamanho da tragédia de saúde pública e econômica no mundo e no Brasil. Ela escancarou a falta de liderança no topo do Executivo, a profunda disfuncionalidade do sistema de governo brasileiro e agravou a situação de um país já prisioneiro da armadilha da renda média, com produtividade estagnada – e sem ter conseguido levar adiante o essencial das reformas estruturantes.[os políticos sabotaram, com destaque para Maia e seu fiel escudeiro Alcolumbre.]  Sim, não há manuais prontos para lidar com uma crise dessas. Que já é uma lição prática do esqueçam o que eu disse antes.

William Waack, jornalista - O Estado de S. Paulo


sexta-feira, 3 de abril de 2020

Transitório ou definitivo?

Análise Política

Formou-se o consenso de que na atual conjuntura a única saída é... gastar. Costuma ser assim nas crises que levam sociedades ao limite. Foi assim na quebra de 1929 (sem querer comparar). E até hoje persiste entre os economistas a polêmica: Quem salvou a economia americana, o New Deal ou Pearl Harbor? Leva jeito de ser um debate que persistirá até o fim dos tempos.

Se o estica-e-puxa já superou a etapa de gastar ou não gastar, agora outro arranca-rabo vem aí. O gasto deve ser fluxo ou estoque? Os ortodoxos lutarão pela segunda opção, o gasto emergencial. Os nem tanto flertarão com o Estado gastar mais de modo estrutural. Se a política, nas famosas palavras de Magalhães Pinto, é como nuvem, agora a economia foi quem tomou o ditado para si. Até a Lei de Responsabilidade Fiscal parece balançar, a querida dos que precisam explicar para que serviu mesmo o segundo mandato de FHC.

Ah, sim. O Brasil talvez seja o único país em que uma lei de responsabilidade fiscal é sempre cantada em prosa e verso como “grande avanço”, enquanto cidades, estados e a União estão quebrados.
Mas importante mesmo é existir a lei. 


quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Os jabutis e os números inflados - Míriam Leitão

O Globo

Programa de emprego para jovens depende de imposto inaceitável

O Congresso tem a tradição de pendurar jabutis nos projetos do governo. Ou seja, assuntos estranhos à matéria tratada. Na proposta para estimular o emprego de jovens, o governo mesmo incluiu os jabutis. O programa não criará quatro milhões de empregos. Isso é ficção publicitária. Mandar a conta para o desempregado é uma ideia tão estranha que o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), já avisou que o Congresso vai encontrar outra receita. Fica assim o parlamento com o ônus de consertar o defeito.

Quando a notícia foi dada pelos repórteres nas redações, os chefes duvidaram. É isso mesmo? Será cobrada uma contribuição de quem recebe seguro-desemprego para financiar um programa de emprego? Exatamente. Agora o Congresso terá que se virar para encontrar outra fonte de receita, do contrário ficará com a fama de ter derrubado um programa de estímulo ao emprego de jovens. A Lei de Responsabilidade Fiscal diz que uma despesa só pode ser criada com indicação dos recursos. Então o governo indicou uma receita inaceitável e jogou a bola quadrada para o Congresso arredondar.

Está certo mirar os jovens porque eles são os mais fragilizados. Entre 18 e 24 anos, a taxa de desemprego é de 25%. O governo formatou o programa para ser até 29 anos, mas com a mesma ideia do Primeiro Emprego lançado pelo PT, em 2003. Desonerar para incentivar a contratação. Os estudos mostraram que o programa não atingiu os objetivos, poderia ser refeito, aprendendo-se com a experiência. Mas o governo quis fazer propaganda política. Chamar de “Programa Verde Amarelo”, uma política que pode ajudar, sim, mas é temporária. Além disso, inflou os números todos e ainda transformou a proposta num jabutizal com a inclusão de medidas para diminuir o percentual de correção de indenização trabalhista, acabar com registros de determinadas profissões, permitir trabalho aos domingos e feriados, alterar jornada dos bancários, mudar regras para multas trabalhistas. Tanto assunto que este jornal chamou apropriadamente de minirreforma trabalhista.

E no mesmo dia, sem relação com o programa, acabou com o seguro pago a quem hoje é vítima de acidente de trânsito que beneficia principalmente os pobres. O DPVAT também manda dinheiro para o SUS. O argumento é que o programa tinha fraude. Ora, cabe ao governo combatê-la. A medida pareceu sem sentido, até que foi entendida: era uma forma de causar prejuízos ao ex-aliado, hoje desafeto, Luciano Bivar, presidente do PSL.

O programa em si criará, pelas contas da equipe econômica, 1,8 milhão de empregos em três anos. Mas o governo apresentou cálculos de que o funcionamento aos domingos e feriados criará mais 500 mil empregos, o microcrédito, outros 450 mil, e um programa de requalificação através do Sesi e Sebrae, de pessoas que sofreram acidentes, criaria outros um milhão e 250 mil. Ao todo, 4 milhões. Na maior parte do pacote, o governo está embrulhando vento. O microcrédito já está sendo estimulado através de mudanças micro no Banco Central, o Sistema S tem a função de qualificar trabalhadores, e a abertura aos domingos já foi derrubada em medida anterior.

Algumas ideias podem até ser boas, mas por que pendurá-las num programa de emprego para jovens? Hoje as multas trabalhistas são corrigidas pelo IPCA mais 12%. Os juros caíram e esse valor ficou alto demais. Só com isso o cálculo do governo é que as estatais reduzirão em R$ 37 bilhões o crescimento de suas dívidas trabalhistas. Outra ideia é mais controversa. Os Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) trabalhista poderão ser firmados pela Secretaria de Trabalho, e isso vai evitar as multas mais pesadas do Ministério Púbico do Trabalho. Até a gorjeta foi regulamentada no mesmo pacote.

Quando foi perguntado sobre por que o programa de desonerações do PT não levou a mais emprego, mas o de agora criaria vagas, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, explicou: “Havia liberdade, o empresário pagou dívida, comprou equipamento, depois é que empregou pessoas.” Agora, o governo promete fiscalizar para que a empresa não troque o empregado atual pelo novo funcionário que custará menos. Falta conciliar o argumento com a tese de que este é um governo liberal.

Blog da Míriam Leitão, jornalista - O Globo com Alvaro Gribel, de São Paulo

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Irresponsabilidade fiscal - O Estado de S. Paulo

Editorial

Guardião da Constituição, STF deve zelar pela continuidade de suas normas, promovendo - e não dificultando - medidas que assegurem a responsabilidade fiscal

Na quinta-feira passada, formou-se maioria no Supremo Tribunal Federal (STF) para declarar inconstitucional a permissão de diminuir a carga horária com a proporcional redução de salários de funcionários públicos, tal como previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal como forma de enfrentar situações de grave desequilíbrio das contas públicas. Uma vez que a Carta Magna não prevê expressamente essa possibilidade, a maioria dos ministros entendeu que, por força do princípio da irredutibilidade dos vencimentos, uma lei não pode criá-la.

O estranho nessa história é que não se pode nem mesmo dizer que a posição majoritária entre os ministros do STF protege a Constituição. Ao contrário, ela dificulta que sejam respeitados os limites previstos na Carta Magna. “A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar”, diz o art. 169 da Constituição. Como limite máximo para o gasto com pessoal, a Lei de Responsabilidade Fiscal determinou o porcentual de 60% da Receita Corrente Líquida. Preocupada em assegurar que esse limite seja de fato respeitado, a Constituição previu medidas drásticas para a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios. Havendo risco de ultrapassar tal limite, o ente federativo deverá – trata-se de uma ordem constitucional, e não mera possibilidade – reduzir as despesas com cargos em comissão e funções de confiança em pelo menos 20% e exonerar servidores não estáveis. [a exoneração de servidores não estáveis é ponto pacífico., sem maiores complicadores quanto sua imediata aplicação;
quanto aos servidores estáveis 'escolhidos' para formar o percentual de 20% é necessário que haja norma definindo critérios para a escolha - sendo a lei o instrumento adequado para definir critérios, e legislar é atribuição do Poder Legislativo, não cabe ao Supremo ingressar na competência constitucional de outro Poder. [a exigência constitucional de "ato normativo motivado de cada um dos Poderes" torna a definição de critérios constitucional.]
Vez ou outra o STF exagera legisla e desrespeita a Constituição - sendo criticado - quando decide respeitar a Carta Magna, da qual é Guardião, também é criticado.
Se é dificil ser Supremo, enquanto colegiado, imagine monocraticamente - tentação a qual a maior parte dos ministros não resiste.]

Se essas medidas não forem suficientes, “o servidor estável poderá perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal”. Tudo isso é texto constitucional, incorporado à Carta Magna por meio da Emenda Constitucional (EC) 19/1998. Aprovada após a EC 19/1998, a Lei de Responsabilidade Fiscal previu uma medida mais branda que a exoneração de servidores. “É facultada a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária”, estabeleceu a Lei Complementar 101/2000.

Com isso se forneceu aos Estados e municípios mais um caminho para que fosse respeitado o limite constitucional dos gastos com pessoal. Em determinadas situações, já não seria necessário demitir servidores por causa do desequilíbrio fiscal. Bastaria diminuir as despesas do ente federativo mediante a redução temporária da carga horária, com a correspondente diminuição do salário. Pois bem, a maioria do Supremo entendeu que tal redução de carga horária é inconstitucional. Tem-se, assim, um sistema ilógico. Por uma questão fiscal, pode-se demitir o funcionário público. Esse ponto não estava em discussão, já que a Constituição o prevê expressamente. No entanto, para a maioria dos ministros do STF, não se pode reduzir o salário, mesmo quando se diminua a carga horária de trabalho.

O relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, foi voto vencido. “Não seria razoável impedir ao legislador a criação de um caminho intermediário que preservasse a garantia maior, que é a estabilidade, por meio de uma relativização temporária e proporcional de uma garantia instrumental, a irredutibilidade de vencimentos”, lembrou o ministro Alexandre de Moraes, cujo voto foi acompanhado integralmente pelos ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes. A Constituição não é um conjunto desconexo de normas. Ela dá forma e organiza todo o Estado. E, ao fixar os princípios que devem nortear o poder estatal, a Carta Magna reconhece a importância fundamental do equilíbrio das contas públicas. Como guardião da Constituição, o STF tem o papel de zelar pela efetividade de suas normas, promovendo – e não dificultando – a aplicação de medidas que assegurem a responsabilidade fiscal. A permissão de redução da carga horária e, consequentemente, de salários de servidores públicos prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal era uma clara ajuda para que o art. 169 da Carta Magna seja de fato cumprido. Não faz sentido, portanto, declará-la inconstitucional.
 
Editorial - O Estado de S. Paulo