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sexta-feira, 4 de novembro de 2022

O “Fora Lula!” só começou - Augusto Nunes

Revista Oeste

O partido que nunca soube ser feliz foi surpreendido com o nascimento da oposição que nunca existiu
 
Pronunciamento do presidente eleito, Lula, na Avenida Paulista, em São Paulo, SP, no domingo 31 | Foto: Marcelo Oliveira Março/Futura Press 

Em 28 de outubro de 2002, fui ver o comício da vitória do PT. Seria uma festa e tanto, imaginei. Em campanha desde 1982, quando não passou do quarto lugar da disputa do governo de São Paulo, Luiz Inácio Lula da Silva havia amargado três derrotas em eleições presidenciais. Em 1989, fora vencido por Fernando Collor no segundo turno. Em 1994 e 1998, Fernando Henrique Cardoso o atropelara já na rodada inicial. Só no século 21 a seita da estrela vermelha pôde comemorar a concretização do sonho perseguido anos a fio por seu único deus. Cheguei às imediações do palco armado na Paulista convencido de que testemunharia um Carnaval temporão. Dois ou três discursos bastaram para escancarar o estranho defeito de fabricação: o PT não consegue ser feliz nem mesmo nos momentos de triunfo.

Filho de um político que se candidatou a prefeito de Taquaritinga com menos de 30 anos, exerceu quatro mandatos e morreu no cargo dias depois de virar setentão, nasci e cresci entre discurseiras nas carrocerias de caminhão, santinhos, cartazes e faixas, microfones e caixas de som, cédulas e urnas, foguetórios e aplausos, beijos e abraços, choro convulsivo e ranger de dentes — e nada era mais deslumbrante que o comício da vitória. “É o único dia em que um político é completamente feliz”, dizia Adail Nunes da Silva. “A gente esquece adversários, insultos, brigas, qualquer coisa desagradável ocorrida na campanha. Só lembramos dos que nos ajudaram a ganhar. Não se vê ninguém de mau humor. É pura festa.”

Também nos pequenos municípios paulistas a campanha eleitoral frequentemente roçava o ponto de combustão, as trocas de golpes retóricos provocavam hematomas e ferimentos, de vez em quando se consumava um nocaute. Adail Nunes da Silva sempre foi um homem de bem com a vida, mas num embate eleitoral nada tinha de lorde inglês. Mirava preferencialmente o fígado dos adversários com jabs irônicos e ganchos mordazes. Acusava o desafeto pouco risonho de, no cinema, torcer pelo bandido do faroeste e pelos chifres do miúra no filme que mostrava uma tourada. Quando enfrentou pela primeira vez um devoto de Lula, afirmava que nos comícios do PT a plateia era tão diminuta que, terminado o discurso, o próprio candidato descia do palanque para ampliar a salva de palmas.

O ex-presidiário mentiu à vontade, com o desembaraço de quem transformou em boletins do PT veículos de comunicação que perderam a vergonha

Ele batia e levava. Aos 10 anos, pedi ao irmão de 17 que me levasse a um comício do inimigo. Prudente, Flávio repassou a tarefa a um forasteiro amigo que estava de passagem pela cidade. A primeira frase que ouvi foi proferida por um candidato a vereador da tribo ademarista: “O Adail é ladrão, roubou os trilhos da estrada de ferro”. Contei ao meu pai o que ouvira, ele respondeu com uma lição singela: “Quando alguém falar mal da gente, lembre que a gente vive falando mal deles. Isso é coisa de campanha eleitoral”. Terminada a apuração, os derrotados passavam uma semana pescando e os vencedores se esbaldavam no comício da vitória. Essa foi a regra até o nascimento do Partido dos Trabalhadores.

Naquela noite na Paulista, ficou claro que o acervo de exotismos políticos brasileiros incluía a única torcida do mundo que, além de não saber perder, também não sabia ganhar. Em vez de comemorar a vitória do PT, a chamada “militância” prefere festejar a derrota dos outros. 
Em vez de gargalhar ou flutuar sobre as nuvens em estado de graça, um petista padrão arma a carranca e vaga pelas ruas ou pela internet à caça de gente que rejeite a verdade oficial estabelecida pelo sinuelo do rebanho. O ressentimento parece mais prazeroso que a felicidade. E a celebração colérica atinge o clímax quando arruaceiros anexam ao roteiro quebras de vitrines, depredações de imóveis comerciais e saques de lojas. A festa da violência é afrodisíaca para as velhas vestais que caíram na vida.

Neste 30 de outubro em que Lula se elegeu de novo, atiçados pelo palavrório agora permanentemente raivoso do pregador, os participantes da missa negra na Paulista insultaram Jair Bolsonaro, a família Bolsonaro, ministros de Bolsonaro, jornalistas acusados de bolsonaristas, eleitores declarados de Bolsonaro e suspeitos de terem votado em Bolsonaro. Lula foi dispensado de dizer o que pretende fazer no governo: o público preferia ouvir o que Bolsonaro não poderá fazer. As boas notícias na economia foram tratadas como fake news. O ex-presidiário mentiu à vontade, com o desembaraço de quem transformou em boletins do PT veículos de comunicação que perderam a vergonha. Os vencedores não esperavam a brusca mudança na paisagem política do Brasil que conferiu contornos de data histórica ao 2 de novembro de 2022.

Em milhares de cidades, as ruas foram tomadas por manifestantes antilulistas que, pacificamente, formalizaram o nascimento da oposição que o PT nunca teve de enfrentar. Os atos de protestos — alguns portentosos, todos espontâneos — alteraram dramaticamente o jogo. Quando perdia a eleição, o PT nem esperava a posse do adversário vitorioso para tentar despejá-lo do cargo. Entre 1989 e 2022, os intolerantes irredutíveis gritaram “Fora Collor!”, “Fora Itamar!”, “Fora FHC”, “Fora Temer” e “Fora Bolsonaro”. Desta vez, os súditos do chefe do Petrolão ouviram um inesperado e estrepitoso “Fora Lula!”. Sem multidões a mobilizar, tiveram de suportar em casa a barulheira que apenas começou.

Leia também “Moraes roubou a cena”

Augusto Nunes, colunista  - Revista Oeste

 

segunda-feira, 29 de março de 2021

Lula - o dono do STF. - Suprema Corte funciona como um escritório de advocacia para ladrões milionários - Jovem Pan

 JR Guzzo

Ministro Gilmar Mendes achou que deveria fazer, sem ninguém lhe pedir, um elogio público aos advogados de Lula – ou seja, não ficou contente só em condenar o juiz que condenou Lula, como também pisou em cima

O Brasil está vivendo numa situação de desordem. De um lado, por causa da pior epidemia de sua história, foi paralisado por governadores e prefeitos que ganharam poderes de ditadores — como acontecia na América Central ou em algum fundão da África, onde os golpistas derrubam o governo, ocupam o palácio e tomam a central de energia elétrica
De outro, e aí está o pior da história, todo o sistema de leis entrou em colapso; parou de funcionar como um conjunto organizado, lógico e previsível de direitos e obrigações, e foi substituído por uma junta civil de onze juízes-advogados que aboliu a Constituição, anulou as funções dos poderes Executivo e Legislativo, e hoje decide o que o cidadão brasileiro pode, não pode e o que é obrigado a fazer. O desmanche da economia, das liberdades individuais e da vida social do Brasil, comandado pelas “autoridades locais” e por seus comitês de “cientistas”, deve durar enquanto durar a Covid-19
 
A baderna instalada na sociedade brasileira pelo Supremo Tribunal Federal já são outros 500. Os ministros governam por default, como se diz. Perceberam que o Legislativo, de um lado, se colocou de joelhos diante deles mais de um terço dos seus integrantes têm processos penais nas costas e estão no Congresso para se esconder da polícia; só o STF pode lhes causar problemas, e ninguém ali quer problema. Já sabem, de outro lado, que têm diante de si um Executivo frouxo, derrotado, sem músculos, sem energia e sem cérebro incapaz de reagir às agressões que recebe o tempo todo dos ministros e incapaz, sobretudo, de defender as convicções dos seus próprios eleitores. O STF, assim, não tem nenhum motivo para mandar menos. É obvio que só vai mandar mais.

O último surto dessa ditadura de Terceiro Mundo com pose de “sociedade civil” e roupa de foi um insulto em duas fases aos cidadãos que cumprem a lei e pagam os seus impostos, e mesmo aos que não pagam nada. Num primeiro momento, o ministro Edson Fachin anulou de uma vez só todas as quatro ações penais que envolvem o ex-presidente Lula, inclusive sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro em terceira e última instância. O ministro não deu um pio sobre provas, culpa, confissões ou qualquer outra coisa que tenha a ver com um processo criminal; apenas disse que Lula tinha de ser processado em outro lugar, e por isso as sentenças de condenação assinadas por nove magistrados diferentes não valem mais nada.  

Mas o STF achou que só isso não bastava: além de premiar o réu, decidiu que também tinha de condenar o juiz. Num segundo momento, então, a ministra Cármen Lúcia acrescentou a avacalhação ao desastre: declarou o juiz Sergio Moro “suspeito” — com base em informações obtidas através de crime — de ter sido parcial na primeira das nove sentenças de condenação. Não apenas Lula não tem culpa de nada; agora, o culpado é o juiz que mandou o chefe supremo para o xadrez. Do ponto de vista político, para todos os efeitos, a principal Corte de justiça do país passou a ser sua propriedade privada.

Que raio de “ordem constitucional” é essa? O STF, tudo de uma vez só, endossa o “toque de recolher” imposto pelos governadores — medida que poderia ser decretada unicamente em estado de sítio. Não existe estado de sítio no Brasil, mesmo porque só o presidente da República, pela Constituição, tem o direito de decretar uma providência assim; mas o STF não toma conhecimento dessa deformidade.  
Os ministros prendem um deputado, sem ter nenhum direito a isso; 
ao mesmo tempo, conduzem há mais de um ano um inquérito perfeitamente ilegal contra seus inimigos, com censura à imprensa e prisão de jornalistas.  
Anulam leis votadas de maneira legítima pelo Congresso. 
Declaram nulos decretos do presidente da República. 
Proíbem a polícia de voar de helicóptero sobre as favelas do Rio de Janeiro
Vetam a nomeação de funcionários de primeiro escalão do Executivo. Anulam por motivos políticos, como fizeram neste caso de dupla proteção a Lula, processos que correm legalmente na Justiça. 
Atendem, de maneira quase automática, petições de partidos políticos de esquerda que perdem votações no plenário do Congresso. [o supremo despacho que atende as petições dos partidecos é um carimbo aposto sobre o processo, no qual consta o prazo para o Executivo responder;
a ministra Rosa Weber, saiu um pouco do laconismo dos seus pares, ao optar pela prolixidade e  lembrar ao presidente da República que não fosse atendida sua ordem o presidente estaria sujeito ao impeachment - faltou pouco para usar o medieval 'debaixo de vara'.]
O STF não está mais funcionando, nem por aproximação, como uma Corte constitucional — o que poderia ter a ver com a Constituição, por exemplo, a alteração de menos de 0,1% na área de um parque nacional, que a Câmara aprovou e o STF anulou?  
Também não está funcionando como um tribunal de Justiça comum. 
Está governando — e está governando em favor de uma orientação política e partidária muito bem definida. 
As mentes civilizadas fazem de conta que o STF é neutro. Como assim, “neutro”? Oito dos seus onze ministros foram escolhidos justamente pelos dois governos mais corruptos da história do Brasil, os de Lula e de Dilma Rousseff; são, ao mesmo tempo, os mais beneficiados pelo “salva ladrão” geral que vem marcando sistematicamente as decisões penais do tribunal. Como seria possível esperar imparcialidade de um órgão composto por nomeações puramente políticas? Isso não sai nunca a preço de custo para o público pagante. 
Basta ver as decisões de cada um dos onze. Quem está ganhando?
 
Os ministros vivem numa atmosfera de anestesia moral permanente
É curioso. O STF diz que Sergio Moro é “suspeito”. 
E ele mesmo, o STF, não é suspeito de nada?
Além de todas as suas outras aberrações, o tribunal vem funcionando, há anos, como um escritório de advocacia para ladrões milionários, sejam eles políticos ou não. E o beneficiado não é apenas o PT, nem de longe — neste mesmo bonde estão o alto almirantado do PSDB, o centrão mais extremo e tudo aquilo que, de um jeito ou de outro, consegue roubar alguma coisa de algum cofre do governo.  
A propósito, o ministro Gilmar Mendes, o principal inimigo do juiz Sergio Moro e das investigações anti-ladroagem da Operação Lava Jato, achou que deveria fazer, sem ninguém lhe pedir, um elogio público aos advogados de defesa de Lula. Ou seja, não ficou contente só em condenar o juiz que condenou Lula — também pisou em cima. Esse é o “garantismo” que existe no STF real; 
o que se garante, mesmo, é o atendimento dos desejos, ideias e interesses pessoais dos ministros, dos seus amigos e dos amigos dos amigos.
Neste último episódio, como se sabe, a ministra Cármen tomou a espantosa decisão de mudar o voto que ela própria tinha dado tempos atrás sobre o mesmíssimo assunto; decidira, então, que o juiz Sergio Moro não era suspeito de coisa nenhuma. 
Mas agora, sem que tenha acontecido rigorosamente nada de novo, e depois de ter “conversado muito com o ministro Gilmar Mendes”, resolveu atender o atual chefe da facção pró-Lula do STF e voltou atrás; disse que o seu primeiro voto não valia mais, e veio com um segundo exatamente ao contrário, este a favor do ex-presidente e contra o juiz que o mandou para a cadeia. Não há sustentação nenhuma para o que Cármen fez, nem do ponto de vista jurídico, nem do ponto de vista lógico nem do ponto de vista da honradez;  
na verdade, como lembrou a advogada e deputada estadual Janaína Paschoal, poderia ser enquadrada em crime de responsabilidade — se o STF, é claro, não mantivesse as leis do país, o tempo todo, em estado de morte cerebral. A conduta de Cármen, em todo caso, combina perfeitamente com a atmosfera de anestesia moral permanente em que vivem hoje os ministros do tribunal.
O STF, pelas decisões que tomou nos últimos anos, transformou-se na maior ameaça à segurança jurídica no Brasil em que vivemos; como em qualquer país subdesenvolvido, aqui a mesma lei é diferente a cada vez que é aplicada pelo STF, e vai sempre na direção daquilo que os ministros estão querendo no momento. Tudo serve, nada é previsível. O cidadão, como resultado, está sempre inseguro: nunca sabe o que vão resolver, e nunca consegue se sentir protegido pela lei. 
A decisão de Cármen levou o STF a novos patamares de insegurança jurídica; é como se tivesse dobrado a aposta. Trata-se de insegurança jurídica direto na veia — o que pode haver de mais inquietante que um ministro do Supremo que muda uma decisão já tomada por ele mesmo? Se nem o próprio voto de um ministro vale mais nada, podendo ser trocado como um boné de praia, então o que está valendo? Se isso não é insegurança, então o que poderia ser? 
O fato é que esse tipo de atitude não é novidade, levando-se em conta a qualidade individual dos integrantes do STF. Só é compreensível falar um pouco mais da ministra Cármen, aliás, porque foi ela a última a vir para o noticiário por causa do que fez; normalmente, o mais prático é ignorar que existe. Cármen Lúcia é uma pessoa pequena. Nunca se destacou em nada. Tem a firmeza ética de uma gelatina de segunda linha.  
Sua contribuição à ciência jurídica é igual a três vezes zero;  
como ocorre com seus colegas, nunca produziu em sua atividade profissional mais do que uma turva aglomeração de palavras repetidas, copiadas, mal pensadas e mal escritas. 
 
Até algum tempo atrás, Cármen tinha posições contrárias a Lula e à corrupção porque tinha medo do que poderiam fazer os militares;  
havia uns ruídos, aqui e ali, de que eles estariam insatisfeitos com a impunidade dos ladrões. Mas o tempo passou, os militares nunca saíram de onde estiveram e a estática sumiu; quando a ministra perdeu o medo, trocou de voto e de lado. (Essas coisas não acontecem só com ela: a coragem pessoal jamais trouxe algum problema para os atuais ministros do STF.)
Se tudo isso já não fosse mais do que desastroso do ponto de vista da estabilidade legal, ainda sobra uma pergunta: se o STF é tão “garantista” que exige o cumprimento rigorosíssimo da lei nos mínimos detalhes quando se trata dos direitos dos réus, por que esse mesmo STF admite como válidas informações obtidas através da prática de crimes?  
Foi o que aconteceu no processo em que Moro foi condenado. 
Que raio de “garantia” ao cumprimento da lei existe numa coisa dessas? O tribunal não só admitiu como “provas” contra Moro gravações criminosas de conversas telefônicas; baseou unicamente nelas a sua decisão. E a lei? Não está escrito ali que qualquer elemento obtido de forma ilegal não pode jamais servir de “prova” para coisa nenhuma? Está. Mas a lei, hoje, não é o que está escrito; é apenas aquilo que os ministros querem neste ou naquele momento.  
A conduta atual do STF produz um Brasil cada vez mais subdesenvolvido, mais pobre, mais desigual, com menos oportunidades para todos, menos progresso, menos produção e menos esperança. É uma receita acabada de falência.
 
J R Guzzo, jornalista - Jovem Pan 

quinta-feira, 18 de junho de 2020

Parece que foi ontem - Nas entrelinhas

A centralização do poder, cuja recidiva quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, parecia uma página virada, mas ainda nos assombra

O brasileiro é uma invenção política, civil. Foi uma grande sacada dos mineiros, na luta pela Independência, cujo mito de origem é a Inconfidência, tendo o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, como grande herói nacional. Mas, até a Independência, além dos mineiros, o que havia mesmo eram paulistas, fluminenses, baianos, pernambucanos e gaúchos, que se digladiavam. O Partido Brasileiro surgiu após a Revolução do Porto, que ordenou a volta de João VI a Portugal e convocou eleições para a Assembleia Constituinte que elaboraria a primeira Constituição portuguesa.

Reunia a pequena burguesia urbana, comerciantes e proprietários rurais que defendiam ideais liberais e não acatavam as ordens vindas das Cortes portuguesas. Cipriano Barata, Muniz Tavares, Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, padre Diogo Antônio Feijó e Nicolau Campos Vergueiro, eleitos deputados, lideraram o nosso primeiro partido político, que veio a ter um papel decisivo para a permanência de D. Pedro I no Brasil e, em 7 de setembro de 1822, na Independência, pontificou o santista José Bonifácio de Andrade e Silva, irmão de Antônio Carlos.
Houve uma guerra para consolidar a Independência, o Exército da época era português. Controlava províncias que se mantiveram leais a Portugal: Cisplatina (atual Uruguai), Bahia, Piauí, Pará e Maranhão. No Império recém-criado, de dimensões continentais, era grande a ameaça de fragmentação política. A saída foi D. Pedro I contratar oficiais estrangeiros, entre os quais o lorde inglês Thomas Cochrane e o marechal francês Pierre Labatut, para organizar a Marinha e o Exército, tarefa que coube a Bonifácio, um bacharel, matemático e geólogo civil.

Na Bahia, a Guerra da Independência durou de 7 de setembro de 1822 a 2 de julho de 1823. Comandava por Manoel Pedro, as tropas leais ao Brasil haviam sido batidas pelos portugueses, recuando para o Recôncavo Baiano. Dom Pedro enviou o general francês Pedro Labatut para reforçar as tropas brasileiras, que derrotaram Madeira na batalha de Pirajá (8 de novembro de 1822). Além de cercada por terra, com a chegada da armada comandada por Crochrane, Salvador foi completamente bloqueada, forçando a rendição dos portugueses.  Madeira negociou a volta das tropas remanescentes para Portugal.

Brutal foi repressão no Grão-Pará, que resultou em 1.300 mortos, sendo 240 por asfixia nos porões do brigue São José Diligente (depois, “Palhaço”), por ordem do almirante inglês John Pascoe Grenell. 

(.....)


Liderado por Antônio Carlos, o Partido Liberal patrocinou ali a centralização do poder, cuja recidiva na nossa história quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, uma história que parecia uma página virada com a Constituição de 1988, mas ainda nos assombra, porque continua vivíssima. Em 1º de julho de 1980, ideólogo do regime militar, o general Golbery do Couto e Silva resumiu a ópera numa conferência na Escola Superior de Guerra (ESG), na qual abordou a centralização e a descentralização da administração, fazendo uma analogia com os movimentos de sístole e diástole do coração. Na ocasião, sugeriu aos militares evitar pronunciamentos que indiquem sintomas de enfraquecimento do governo; procurar nos conflitos soluções negociadas que evitem confronto; desconfiar de movimentos que aliem professores e alunos; e reprimir por meios legais manifestações consideradas impróprias contra o governo, tanto no meio parlamentar quanto por parte dos órgãos de comunicação. Uma parte do conflito de Bolsonaro com o Legislativo e Judiciário é fruto de sua personalidade; a outra, mais preocupante, decorre de uma concepção de Estado centralizado e vertical ainda arraigada, apesar de ultrapassada, compartilhada por alguns generais que o cercam.

Leia a íntegra: Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense