Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador general Golbery. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador general Golbery. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 5 de julho de 2022

Jogos de cena! - Percival Puggina

No último dia 2, vivi um ato penitencial assistindo a sequência de infortúnios do jogo entre Ceará e Internacional. Sim, sim, leitor: gosto de assistir bons jogos de futebol e sou torcedor do Internacional.

Enquanto as atropeladas e as infrações coletivas se sucediam com vigorosas reciprocidades e degeneravam em trombadas e empurrões, ficou nítida, para mim, a analogia entre o visto em campo e o observado dentro e fora das “quatro linhas” de nossa institucionalidade.  

No gramado do Castelão, minutos antes do final do jogo, o comentarista já contabilizava 40 infrações (após, houve várias outras e uma expulsão), perfazendo média de uma a cada 2 minutos. Basicamente, é o que acontece no Brasil, onde membros do Congresso Nacional e do STF jogam contra a sociedade, chutam-lhe as canelas e atropelam a ordem jurídica em casuísmos de fazer inveja ao general Golbery.

No gramado, atletas encenavam, frequentemente, aquela coreografia costumeira destinada a impressionar a arbitragem e a torcida. Cobriam os rostos aos berros, como se tivessem os olhos vazados, ou, se o choque era contra o corpo, rolavam sobre si mesmos várias vezes. Se isso não chamasse toda a atenção pretendida, voltavam a acrescentar mais duas ou três voltas sem que qualquer força externa os movesse da posição anterior. Jogos de cena.

Na cena política, notórios ladrões proclamam sua honestidade. Maus julgadores explicam o insustentável dizendo agir contra riscos inerentes a uma sociedade de bárbaros. Atacam liberdades alegando defender a democracia, logo ela, que nasce da liberdade e definha em sua ausência. Jogos de cena.

Como os inquéritos no STF sobre atos antidemocráticos tramitam em sigilo, a gente não sabe por que, há três anos, rolam em campo, queixosos, alguns senhores ministros. Jogos de cena.

Durante a votação da PEC que estabeleceu estado de emergência para auxílios a caminhoneiros, motoristas, famílias carentes, etc. vários senadores oposicionistas também rolaram em campo. 
Diziam-se agredidos em suas mais nobres e rígidas convicções sobre uso do dinheiro público... 
Apelidaram a PEC de “Kamikaze”. 
Acusaram o governo de populismo eleitoreiro. 
No final, de modo hipócrita, aprovaram-na em dois turnos com apenas o voto em contrário do senador José Serra
Pelos mesmos motivos do governo, apoiaram a PEC que coreograficamente rejeitavam. Jogos de cena!

É o futebol que imita a política ou é a política que imita o futebol muito mal jogado?

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Ganha uma viagem à Pensilvânia quem souber que cartas o presidente tem - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

Bolsonaro deve mostrar seu jogo

Os males do governo Bolsonaro são muita briga e poucos objetivos. Talvez nem se possa dizer que o presidente embaralha as cartas; ele as rasga     

Às segundas, quartas e sextas, o ministro Paulo Guedes briga com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Às terças, quintas e sábados, fazem as pazes. Todo dia, Guedes briga com Rogério Marinho, seu colega do Desenvolvimento Regional. Insatisfeito com as brigas que arrumou, Ricardo Salles, do Meio Ambiente, insulta o chefe da Secretaria de Governo, general da reserva Luiz Eduardo Ramos. Do alto de sua erudição, num discurso em que se disse poeta e falou até em grego, o chanceler Ernesto Araújo disse ao mundo que “o Brasil hoje fala em liberdade através do mundo, se isso faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária”. (Se o Brasil virou um pária, isso nada tem a ver com o discurso da liberdade.) Bolsonaro, o maestro dessa banda de música, briga com governadores, vacinas e colaboradores.

Faz tempo, diante da anarquia do fim do governo de João Figueiredo, o general Golbery do Couto e Silva dizia que uma pessoa pode ir para a rodoviária parando em todos os guichês, pedindo um desconto na passagem. Podia até conseguir, mas não podia deixar de dizer para onde queria ir. Olhando o mesmo quadro, Tancredo Neves queixava-se: “Ninguém joga só embaralhando. Tem que dar carta a alguém, e o Figueiredo não está dando carta alguma. Está com todas na mão”. (O tempo mostrou que o general não tinha mais carta, e Tancredo foi eleito presidente em 1985.)

Ganha uma viagem à Pensilvânia quem souber que cartas Bolsonaro tem. Talvez nem se possa dizer que embaralha as cartas. Ele as rasga. Rasgou Gustavo Bebianno, Sergio Moro, Santos Cruz e Luiz Henrique Mandetta. Marcou a do general Eduardo Pazuello. Admita-se que o capitão tem o objetivo de se reeleger, com o apoio do Centrão e dos auxílios emergenciais. [admita-se, até por uma questão de justiça e verdade, que o capitão não criou a pandemia, que impôs a necessidade dos auxílios emergenciais.] Para isso, precisaria que a eleição presidencial viesse rapidinho. Ela não virá, quem está a caminho é uma insegurança econômica bafejada pelo desequilíbrio fiscal. Com o emagrecimento da mística eleitoral que acompanhou sua vitória de 2018, resta-lhe a fidelidade do Centrão. Se ele pudesse, deveria marcar um jantar com Dilma Rousseff, ela acreditou nessa fidelidade.

Muita briga e poucos objetivos, os males do governo Bolsonaro são. Quem sabe onde foi parar aquele programa Pró-Brasil? Era pó e ao pó reverteu. Durante seu governo, o país foi infelicitado por uma pandemia que matou mais de 160 mil pessoas. Não foi ele quem trouxe o coronavírus, mas, em oito meses de angústia, dele não partiu uma só ação ou fala que contribuísse para a boa ordem sanitária. Ressalvem-se a rapidez e o alcance dos R$ 600 mensais que tiraram milhões de pessoas do caminho da fome. Essas medidas, contudo, não deram eficácia à cloroquina no combate à “gripezinha”.

Amanhã completam-se 116 anos da criação, no Rio de Janeiro, da Liga contra a Vacina Obrigatória. Pelo andar da carruagem, Bolsonaro quer liderar um movimento parecido. Em 1904, muita gente boa, como Rui Barbosa, combatia a vacinação contra a varíola, que naquele ano mataria quatro mil pessoas na cidade. Em 1980 a Organização Mundial da Saúde certificou a erradicação da doença. No governo de Rodrigues Alves, o Brasil andou para a frente.

Folha de S. Paulo - Jornal O Globo - Elio Gaspari, jornalista


quinta-feira, 18 de junho de 2020

Parece que foi ontem - Nas entrelinhas

A centralização do poder, cuja recidiva quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, parecia uma página virada, mas ainda nos assombra

O brasileiro é uma invenção política, civil. Foi uma grande sacada dos mineiros, na luta pela Independência, cujo mito de origem é a Inconfidência, tendo o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, como grande herói nacional. Mas, até a Independência, além dos mineiros, o que havia mesmo eram paulistas, fluminenses, baianos, pernambucanos e gaúchos, que se digladiavam. O Partido Brasileiro surgiu após a Revolução do Porto, que ordenou a volta de João VI a Portugal e convocou eleições para a Assembleia Constituinte que elaboraria a primeira Constituição portuguesa.

Reunia a pequena burguesia urbana, comerciantes e proprietários rurais que defendiam ideais liberais e não acatavam as ordens vindas das Cortes portuguesas. Cipriano Barata, Muniz Tavares, Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, padre Diogo Antônio Feijó e Nicolau Campos Vergueiro, eleitos deputados, lideraram o nosso primeiro partido político, que veio a ter um papel decisivo para a permanência de D. Pedro I no Brasil e, em 7 de setembro de 1822, na Independência, pontificou o santista José Bonifácio de Andrade e Silva, irmão de Antônio Carlos.
Houve uma guerra para consolidar a Independência, o Exército da época era português. Controlava províncias que se mantiveram leais a Portugal: Cisplatina (atual Uruguai), Bahia, Piauí, Pará e Maranhão. No Império recém-criado, de dimensões continentais, era grande a ameaça de fragmentação política. A saída foi D. Pedro I contratar oficiais estrangeiros, entre os quais o lorde inglês Thomas Cochrane e o marechal francês Pierre Labatut, para organizar a Marinha e o Exército, tarefa que coube a Bonifácio, um bacharel, matemático e geólogo civil.

Na Bahia, a Guerra da Independência durou de 7 de setembro de 1822 a 2 de julho de 1823. Comandava por Manoel Pedro, as tropas leais ao Brasil haviam sido batidas pelos portugueses, recuando para o Recôncavo Baiano. Dom Pedro enviou o general francês Pedro Labatut para reforçar as tropas brasileiras, que derrotaram Madeira na batalha de Pirajá (8 de novembro de 1822). Além de cercada por terra, com a chegada da armada comandada por Crochrane, Salvador foi completamente bloqueada, forçando a rendição dos portugueses.  Madeira negociou a volta das tropas remanescentes para Portugal.

Brutal foi repressão no Grão-Pará, que resultou em 1.300 mortos, sendo 240 por asfixia nos porões do brigue São José Diligente (depois, “Palhaço”), por ordem do almirante inglês John Pascoe Grenell. 

(.....)


Liderado por Antônio Carlos, o Partido Liberal patrocinou ali a centralização do poder, cuja recidiva na nossa história quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, uma história que parecia uma página virada com a Constituição de 1988, mas ainda nos assombra, porque continua vivíssima. Em 1º de julho de 1980, ideólogo do regime militar, o general Golbery do Couto e Silva resumiu a ópera numa conferência na Escola Superior de Guerra (ESG), na qual abordou a centralização e a descentralização da administração, fazendo uma analogia com os movimentos de sístole e diástole do coração. Na ocasião, sugeriu aos militares evitar pronunciamentos que indiquem sintomas de enfraquecimento do governo; procurar nos conflitos soluções negociadas que evitem confronto; desconfiar de movimentos que aliem professores e alunos; e reprimir por meios legais manifestações consideradas impróprias contra o governo, tanto no meio parlamentar quanto por parte dos órgãos de comunicação. Uma parte do conflito de Bolsonaro com o Legislativo e Judiciário é fruto de sua personalidade; a outra, mais preocupante, decorre de uma concepção de Estado centralizado e vertical ainda arraigada, apesar de ultrapassada, compartilhada por alguns generais que o cercam.

Leia a íntegra: Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

MILITARES NO PODER - O capitão entre os generais - O Globo

Bernardo Mello Franco

Convite a Braga Netto cria situação inédita

O convite ao general Braga Netto cria uma situação inédita em Brasília. Pela primeira vez desde o fim da ditadura, a Casa Civil será chefiada por um militar. Isso não ocorria desde que o general Golbery do Couto e Silva deixou o governo Figueiredo. Ele esvaziou as gavetas em agosto de 1981, três meses depois do atentado do Riocentro.

Agora o governo de Jair Bolsonaro passa a ter nove militares entre os 22 ministros. Isso inclui as quatro pastas com assento no Planalto. Já estavam lá os generais Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), além do major da PM Jorge Oliveira (Secretaria-Geral).

Eleito por um partido nanico, Bolsonaro apelou aos militares para compensar a falta de quadros sem dividir poder com o Congresso. Logo passou a esvaziar os auxiliares de farda. Isolou o vice Hamilton Mourão e demitiu o general Santos Cruz. Os dois haviam entrado em colisão com o guru do clã presidencial, Olavo de Carvalho. [não existe subordinação hierárquica do vice-presidente da República  ao presidente.
Ambos foram eleitos e a função primeira do vice-presidente é substituir o titular em seus impedimos.
O presidente da República pode delegar atribuições ao vice-presidente - atribuições é mais adequado que missões, ainda que ambos sejam militares, tendo em conta que o vice-preidente pode recusar a delegação.
O general Santos Cruz estava no cargo na condição de militar da reserva.]

No auge do conflito, o autoproclamado filósofo disse que a contribuição dos militares à cultura nacional se limitava a “cabelo pintado e voz impostada”. A ala verde-oliva ensaiou uma rebelião, mas preferiu engolir as humilhações calada.

Além de decapitar Santos Cruz, o presidente demitiu generais que chefiavam órgãos como Correios, Funai e Incra. Agora ele volta a recorrer à caserna para substituir o deputado Onyx Lorenzoni.  “Bolsonaro não queria ser visto como um capitão entre os generais. Por isso, usou o primeiro ano do governo para mostrar quem manda”, explica o cientista político João Roberto Martins Filho, da UFSCar. [a frase é inadequada, tendo em conta que um militar sempre tem presente o mandamento constitucional de que o Presidente da República é o comandante supremo das FF AA.] 

Referência no estudo das Forças Armadas, ele diz que os militares acumularam desgastes ao associar sua imagem ao governo. Agora a aliança dos quartéis com o palácio ganha um reforço de peso. Até ontem, Braga Netto chefiava o Estado-Maior do Exército.

Bernardo M. Franco, colunista - O Globo

 

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Os indemissíveis são dispensáveis - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

História mostra que ministros indemissíveis são dispensáveis

O que acontecerá se Moro e Bolsonaro se separarem?

Funaro e Golbery foram asfixiados e pediram demissão 

Não há sinal de que Moro e Bolsonaro voltem a se encantar

As relações do presidente Bolsonaro com seu ministro da Justiça, Sergio Moro, estão estragadas, e não há sinal de que eles voltem a se encantar. Estão afastados pelos projetos e sobretudo pelos temperamentos. O que acontecerá se eles se separarem? Marco Maciel, o sábio vice-presidente de Fernando Henrique Cardoso, já respondeu a esse tipo de questão. Pode acontecer isso ou aquilo, mas sobretudo pode não acontecer nada. A ideia de que, como ministro do Supremo ou mesmo como candidato, o xerife da Lava-Jato sofreria as inclemências do sol e do sereno pode parecer estranha, mas, olhando-se para o outro lado, nenhum presidente pagou caro pela dispensa de um ministro indemissível. Pelo contrário, a conta ficou cara para o presidente que não usou a caneta.

Guardadas todas as diferenças, passaram por Brasília três ministros indispensáveis. O último foi Dilson Funaro, o herói do Plano Cruzado de José Sarney. Sua gestão começava a dar sinais de cansaço e ainda era o ministro mais popular do governo, quando um conhecedor do Planalto informou que ele seria docemente asfixiado. Funaro saiu e virou asterisco.  Indispensável mesmo era o general Golbery do Couto e Silva, chefe da Casa Civil do presidente João Figueiredo, que lhe devia a arquitetura da própria nomeação. Em 1981, na crise do atentado do Riocentro, o presidente alinhou-se com a “tigrada”, e Golbery foi-se embora. Pensava-se que seria impossível substituí-lo. Esmeralda, a mulher do general, que lhe atribuía poderes paranormais, cravou: Ele vai chamar o professor Leitão de Abreu. Não deu outra, e o ex-chefe da Casa Civil do governo Médici manteve o barco à tona. Golbery afundou com a candidatura de Paulo Maluf à Presidência.

Funaro e Golbery foram asfixiados e pediram demissão, já o general Sylvio Frota, ministro do Exército do presidente Ernesto Geisel, foi mandado embora. Frota tinha o peso do cargo, invicto em todos os confrontos com a Presidência. O general supunha-se presidente de um conselho de administração (o Alto Comando do Exército), capaz de emparedar o CEO (Geisel). Quem sabe uma parte dessa história é o ministro Augusto Heleno, ajudante de ordens de Frota. Na tensa jornada de 12 de outubro de 1977, a pedido do chefe, o capitão Heleno fez uma ligação para o general Fernando Bethlem, comandante da tropa do Sul, em quem Frota via um aliado. Se os dois conversaram, é quase certo que Bethlem já soubesse que era seu sucessor. No dia seguinte, Frota estava em seu apartamento do Grajaú.

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, colunista 



domingo, 3 de novembro de 2019

Os BolsoLulas- Elio Gaspari

O Globo

Em um país com 12 milhões de desempregados eles brigam, aqui e alhures, para nada 

Até agora, o radicalismo da inépcia foi monopólio do governo

Em abril de 2018, horas antes de se entregar à Polícia Federal, Lula discursou para sua militância diante do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e disse: “eu não sou um ser humano, sou uma ideia”. Foi adiante: “Eu fico imaginando o tesão da Globo colocando a minha fotografia preso. Eles vão ter orgasmos múltiplos. (...) Eles têm de saber que vocês, quem sabe, são até mais inteligentes que eu, e queimar os pneus que vocês tanto queimam, fazer as passeatas, as ocupações no campo e na cidade; parecia difícil a ocupação de São Bernardo, e amanhã vocês vão receber a notícia que vocês ganharam o terreno que vocês invadiram.” 

Era sonho. Lula foi para a cadeia, ninguém foi para a rua, seu candidato a presidente foi derrotado por 55% a 45% e, em janeiro de 2019, o capitão Jair Bolsonaro tomou posse na Presidência da República. Logo o capitão, que Lula achava fácil derrotar.
Passaram-se dez meses, Lula conta o tempo para deixar a carceragem de Curitiba, e os Bolsonaros deixaram na porta da sua cela a bandeira da pacificação. Num país com 12 milhões de desempregados eles brigam, aqui e alhures, para nada. 

Se Lula vai empunhar essa bandeira, só ele sabe, mas vale a pena lembrar que há poucas semanas o PT foi para a Avenida Paulista com poucas camisas vermelhas. A deputada Gleisi Hoffmann vestia uma camiseta branca com o rosto de Lula enfeitado por flores. Em sua entrevista a Leda Nagle, o deputado Eduardo Bolsonaro disse que “vai chegar um momento em que a situação vai ser igual ao final dos anos 1960 no Brasil, quando sequestravam aeronaves, quando sequestravam-se e executavam-se autoridades, cônsules, embaixadores, com execuções de policiais e de militares. Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar de uma resposta. Ela pode ser via um novo AI-5”.[um novo AI-5, o artigo 142 da Constituição Federal, o resultado de um plebiscito - a opção da  Itália pelo plebiscito foi citada - as opções são muitas.]

Eduardo Bolsonaro corrigiu-se, e seu pai condenou a fala. Mesmo assim deve-se registrar que no fim dos anos 1960 havia também um terrorismo de direita, cujo núcleo clandestino era composto por militares e civis. Era menos letal, mas buscava estimular a tensão política. O nervo da formulação do deputado esteve na frase “se a esquerda radicalizar”. E se a esquerda não radicalizar? Até agora, o radicalismo da inépcia foi monopólio do governo. Ademais, o último atentado terrorista ocorrido no Brasil, em 1981, foi a bomba do Riocentro, mas ele saiu do DOI-Codi do I Exército.
Há radicais na esquerda, mas no Brasil o que está na vitrine é outro radicalismo tosco, demófobo e desorientado. Ele teceu a bandeira da pacificação, levou-a a Curitiba e deixou-a na porta da cela de Lula. 

Porteiros e polícia
Além do fantasma de Marielle Franco, outra assombração ronda o movimento de carros no condomínio onde viviam Jair Bolsonaro e o miliciano Ronnie Lessa no dia do assassinato da vereadora. É o risco de que acabe sobrando para o porteiro que registrou a entrada de Élcio Queiroz na propriedade.[e prestou depoimento mentiroso à polícia.]
Não se sabe o que aconteceu naquele dia, mas uma velha história ensina que polícia e porteiros produzem situações fantásticas. 

Em maio de 1976, Íris Coelho, ex-secretária do general Golbery do Couto e Silva e do presidente Castelo Branco, escreveu-lhe uma carta contando o que havia acontecido ao porteiro de seu edifício. Haviam roubado objetos de carros que estavam na garagem e ele foi preso. Com 11 anos de serviço e pai de três filhos, soltaram-no 24 horas depois: “O pobre estava todo machucado, os tímpanos perfurados. Aplicaram-lhe choque, bateram-lhe a cabeça contra a parede. Foi fichado como ladrão de automóveis e arrombador.”

Iris não era uma novata. Depois de uma audiência com o embaixador soviético, Castelo chamou-a para ditar uma minuta da conversa secreta.
Passaram-se seis meses e o governador do Rio remeteu o resultado da investigação a Golbery, o então poderoso Chefe da Casa Civil da Presidência. Resultava que depois de novos depoimentos e acareações, a polícia apurou o seguinte:
1- O porteiro disse que conversou com Iris, expressou-se mal ou ela não entendeu o que ele falou. Além disso, não a autorizou a fazer qualquer reclamação.
2- As marcas que tinha pelo corpo eram produto de uma alergia.
Íris Coelho voltou a escrever:
“Sinto muito, acredite que lastimo realmente ter sido causa de tanto trabalho e perda de tempo. Do modo como o processo se encaminhava, achei que a melhor solução seria aquela que foi dada na acareação com o porteiro.
Creia-me, aprendi uma grande lição.”
Seja qual for versão, sempre que se chega à conclusão de que o porteiro mentiu, vale a pena perguntar quem estava interessado nisso.

(...)

 
Folha de S. Paulo e O Globo - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista 
 

quarta-feira, 31 de julho de 2019

A ‘realidade paralela’ de Bolsonaro - Elio Gaspari

Bolsonaro pode ter sua realidade paralela, mas Fernando Santa Cruz não foi executado por grupo de esquerda

Se Jair Bolsonaro conversasse com os septuagenários veteranos da “tigrada” da ditadura, não teria chamado o general da reserva Luiz Rocha Paiva de “melancia” (verde por fora, vermelho por dentro). Ele foi um dos principais colaboradores na manutenção do site Terrorismo Nunca Mais [Ternuma]. Talvez também não tivesse sugerido que Fernando Santa Cruz, desaparecido desde 1974, quando tinha 26 anos, foi executado por militantes de esquerda. Fernando era o pai do atual presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, que tinha menos de 2 anos quando ele desapareceu.

O caso de Fernando Santa Cruz exemplifica, como poucos outros, o assassinato de uma pessoa que tinha vida legal, família constituída e domicílio conhecido. Ele morreu no último mês do governo Médici. A política de extermínio das organizações armadas brasileiras que agiam nas cidades já tinha esfriado, pois elas haviam sido esmigalhadas. Em novembro, um comando do DOI de São Paulo matou Sônia Maria Lopes de Moraes, da Ação Libertadora Nacional, e Antônio Carlos Bicalho Lana, que se escondiam no litoral paulista. Em dezembro, o Centro de Informações do Exército sequestrou em Buenos Aires e matou no Rio o ex-major Joaquim Pires Cerveira e João Batista Rita, que haviam militado na Vanguarda Popular Revolucionária. Depois disso, nada. (Do Natal de 1973 ao final de 1974, mataram cerca de 40 militantes do PCdoB nas matas do Araguaia, inclusive os que se renderam. Ou, numa realidade paralela, foram todos resgatados por um disco voador albanês) Nesse período, deu-se a decapitação da liderança do Partido Comunista, que não pegou em armas.

Fernando Santa Cruz havia sido preso no Recife em 1966, quando era menor de idade. Desde 1968 tinha vida legal. Trabalhou no Ministério do Interior e mudou-se para São Paulo, onde trabalhava no Departamento de Águas e Energia Elétrica. Durante o carnaval de 1974, Fernando estava no Rio e marcou um encontro com o amigo Eduardo Collier, militante da APML. Temia ser preso e falou disso com a família. [Eduardo Colier Filho, também militante da organização terrorista AP - Ação Popular e da
APML - Ação Popular Marxista Leninista - APML;

quanto as execuções realizadas pelas próprias organização terroristas são incontestáveis, existindo  centenas de vídeos com depoimento de executores - aqui você tem um vídeo detalhado,  com o depoimento de um dos mais cruéis terrorista e executor, confirmando a prática.] é fato incontestável ]

Um policial de apelido “Marechal” disse que ele estava preso num quartel da guarnição de São Paulo. Daí em diante, nada. A mãe de Fernando, Elzita Santa Cruz, morta há pouco, foi uma leoa e bateu em todas as portas. Os senadores Franco Montoro e Amaral Peixoto perguntaram pelo paradeiro de Fernando da tribuna da Casa. Elzita escreveu ao comandante da guarnição do Rio e ao marechal Juarez Távora. O velho tenente de 1930 enviou a carta ao general Golbery, chefe do Gabinete Civil do presidente Ernesto Geisel, que assumira em março. Meses depois, ela interpelou o próprio Golbery. Na busca por Fernando, teve a ajuda do marechal Cordeiro de Farias, comandante da Artilharia da FEB na Itália. Nada. O ministro da Justiça, Armando Falcão, informava que estava foragido, vivendo “na clandestinidade”. Mentira.



Nenhuma família de militante executado fingiu que ele desapareceu. Bolsonaro pode ter sua realidade paralela, mas o general Rocha Paiva nunca foi “melancia”, nem Fernando Santa Cruz foi executado pela APML. Por falar nisso, Rubens Paiva não foi resgatado por comparsas. Quem diz isso são oficiais que estavam no quartel da PE do Rio em 1971.


Elio Gaspari, jornalista - Folha e O Globo
 

sábado, 30 de março de 2019

1964, o cadáver insepulto


domingo, 27 de janeiro de 2019

O valor do silêncio do general calado

A eleição de Jair Bolsonaro propagou o vírus da anarquia militar. Aqui e ali ouve-se falar em “núcleo militar” influindo no governo e “desconforto” fora dele. Desde que o presidente disse ao ex-comandante do Exército que “o que nós já conversamos morrerá aqui”, disseminou-se a curiosidade em torno do que conversaram. [os insatisfeitos com a eleição do capitão Jair Messias Bolsonaro para a presidência da República e que buscam divulgar a existência de um vírus, que insistem em semear (quando o vírus que existia era representado pelo governo do maldito pt = perda total), resta um consolo:
- na Venezuela tem uma cópia do vírus do perda total que existia no Brasil;
- também na Coreia do Norte, hoje esquecida, existe vírus idêntico.] O fato da vida é que, para impedir-se a eleição de um candidato do PT, com suas obras e suas pompas, levou-se ao Planalto um capitão de pouca disciplina que, em 1988, baldeou-se para a atividade parlamentar. Ele levou na vice um general de quatro estrelas (da reserva) que anos antes perdera o comando das tropas do Sul por ter feito um discurso político.
O general tal acha isso, o general qual acha aquilo. Falta registrar que todos os militares que ocupam cargos civis estão na reserva e comandam apenas poderosas mesas. Chefe militar acha, mas não fala. Ninguém ouviu uma só palavra do general Enzo Peri, que comandou o Exército de 2007 a 2015. O mesmo se pode dizer de Gleuber Vieira, comandante de 1999 a 2003. Ambos tipificam o general calado. Não falavam antes de assumir o comando, nem falaram depois. O general calado é um enigma em si mesmo. Move-se dentro das normas da corporação. Manda, mas não fala, mesmo em épocas em que falam generais que não mandam ou, pelo menos, não mandam tanto quanto se pensa. Olhando-se para trás, é fácil ver o peso do general calado. [o que mais angustia os insatisfeitos com a eleição de Bolsonaro é que um general com poder, com comando - não de uma mesa e sim de tropas - falou e escolher falar com o presidente Bolsonaro e a conversa teve sua morte decretada na única vez em que sua existência foi ventilada.]
Castelo Branco só falou em março de 1964, dias antes da deposição do presidente João Goulart. Emílio Médici foi o silêncio da orquestra e chegou à Presidência sem dizer uma palavra fora das reuniões de generais. Os irmãos Geisel, Orlando e Ernesto, nunca falaram. O general Euler Bentes, que em 1978 foi candidato a presidente pelo MDB (o de Ulysses e Franco Montoro, não o que está aí) nunca falou enquanto esteve na ativa. Derrotado, retirou-se no seu “Sítio do Pica Pau Amarelo” e morreu em 2002. Seu curto necrológio foi publicado abaixo da notícia da morte de “Mocinha”, a inesquecível porta-bandeira da Mangueira.
No ocaso da ditadura e da anarquia militar, [que coincidiu com o surgimento da chamada Nova República na qual foi institucionalizado no Brasil tudo que não presta, passando pela corrupção, incompetência, desvalorização da FAMÍLIA, MORAL e BONS COSTUMES, ascensão de analfabetos ao cargo máximo da República, projeto de poder bancado por partido político cuja única função era disfarçar uma organização criminosa]  havia alguns generais falantes, mas ninguém se lembra, por exemplo, de Ademar Costa Machado e de Jorge de Sá Pinho. Estavam no Alto Comando que barrou as bruxarias da anarquia e garantiu a eleição de Tancredo Neves (pode ser verdadeira a história segundo a qual Tancredo pediu para conversar com Costa Machado, a quem queria colocar no governo. Ele pediu que se encaminhasse a solicitação ao Ministério do Exército). Para dançar um tango e para alimentar a anarquia, não basta um militar, mesmo que seja da reserva. É indispensável uma vivandeira paisana. Durante a campanha eleitoral do ano passado, um general organizou uma reunião para ouvir uma palestra de paisano sobre obras de infraestrutura. Na sessão de perguntas, um oficial quis saber qual dos dois candidatos a presidente teria mais qualificações para tocar o assunto. O comandante da guarnição pediu que a pergunta fosse ignorada e que o oficial saísse da sala.
Ouvir o silêncio do general calado é tarefa impossível, mas uma coisa é certa: ouvir as falas dos generais da reserva em funções civis ou mesmo fora delas, como se falassem pelos quartéis, estimula a anarquia, embaralha os problemas e confunde a audiência. dos movimentos do “Mestre” também conhecido como “Cardeal”.Nos últimos meses de 1963, teve pelo menos três conversas com o embaixador americano Lincoln Gordon, que via nele um conselheiro e redator de discursos do presidente João Goulart. Serpa testemunhou o ocaso de Jango na madrugada de 1ª de abril de 1964. Em julho, encontrou-se com o general Golbery do Couto e Silva, estrela da ditadura nascente. Anos depois, frequentava o gabinete de um coronel da confiança do general Emílio Médici. Em 1969, ao ser nomeado para a Presidência, o general fez um discurso oferecendo-se para praticar um “jogo da verdade” e restabelecer a democracia. Quem escreveu? Jorge Serpa (mais tarde, Médici defenestrou o coronel para liquidar a influência daquilo que o SNI chamava de “Grupo Serpa”).
O poderoso Jorge Serpa baixou à sepultura no cemitério São João Batista na terça-feira. Havia menos de dez pessoas na cena.

(...)

TRÍPLICE TEM TRÊS
Até as pedras sabem que o governo Bolsonaro tem um encontro marcado com inquietações nas universidades.
A retórica obscurantista do capitão levava a crer que dele partissem medidas provocadoras. Deu o contrário. Há professores inquietos diante da possibilidade de serem indicados para as reitorias mestres que não encabeçam as listas tríplices encaminhadas pelos conselhos universitários ao Ministério da Educação.
Como diz o nome, lista tríplice tem três nomes. Em 2009, o governador José Serra nomeou para a reitoria da Universidade de São Paulo o segundo nome da lista. A qualidade da reitoria do professor João Grandino Rodas é outra história.
(...)

Elio Gaspari, Folha de S. Paulo


quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

O vendedor de greves

Esforço para livrar Lula da lei prejudica mais a democracia do que as mentiras que ele diz

Sábado, o País ficou sabendo que o presidente Temer não se intromete em assuntos do Judiciário, mas resolveu meter sua colher imprópria no julgamento de Lula, hoje, no Tribunal Federal Regional da 4.ª Região (TRF-4), em Porto Alegre. À pergunta formulada em entrevista exclusiva pelos repórteres da Folha de S.Paulo Gustavo Uribe e Marcos Augusto Gonçalves sobre como vê o julgamento e se seria melhor que o réu concorresse nas eleições este ano, o presidente respondeu: “Não posso dizer uma coisa que está sob apreciação no TRF. Agora, acho que se o Lula participar, será uma coisa democrática, o povo vai dizer se quer ou não. Convenhamos, se fosse derrotado politicamente, é melhor do que ser derrotado (na Justiça) porque foi vitimizado. A vitimização não é boa para o país e para um ex-presidente”. Pois, segundo Temer, caso Lula seja impedido de se candidatar, isso vai “agitar o meio político”. Ora!

Não é o caso de aqui citar devotos, correligionários e parasitas oportunistas que sonham se coligar com Lula no pleito. Mas, sim, destacar figurões do governo e da oposição – Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin, João Doria, Beto Richa, Ronaldo Caiado, Rodrigo Maia, Raul Jungmann – e vários interessados que dispararam esse mesmo truísmo absurdo e suspeito. No Estado de Direito, vigente no Brasil, não há a hipótese de candidatos escolherem que adversários preferem para a disputa. Ou há?

Eles deveriam é atentar para o pronunciamento de um eventual beneficiário da condenação do ex-líder metalúrgico hoje, o ex-governador do Ceará Ciro Gomes, presidenciável do PDT. Ciro disse que torce pela absolvição de Lula, mas se negou a crer que haja uma conspiração política no Poder Judiciário contra o petista. Em rara prova de lucidez, o ex-ministro do próprio disse que imaginar um complô “ofende a inteligência média do País”. E ainda advertiu que “a consequência inevitável desta constatação teria desdobramentos tão graves que a um democrata e republicano só restaria a insurgência revolucionária”. É isso aí!

Contrariando sua vocação de trânsfuga contumaz, ele é fiel ao juramento de cumprir e defender as leis do País, feito quando assumiu o governo do Ceará, em 1991. Ao contrário, o presidente e alguns citados, ainda vigente o juramento, cometem delito de lesa-pátria, rasgam a Constituição e posam de generosos e benevolentes. Segundo meu avô, de esmola grande cego desconfia. Não é o caso desses que se fingem de cegos para se dar bem no futuro, caso tenham de se submeter ao Estado de Direito, no qual todos têm de seguir a lei. Quem canoniza o réu investe no falso conceito de que voto substitui Justiça e cancela penas, como pregava Antônio Carlos Magalhães à época do mensalão. E deu no que deu!

Nisso, aliás, todos eles têm no condenado a nove anos e meio de cadeia por corrupção passiva e lavagem de dinheiro a mais completa síntese de campeões da patranha, celebrados nas figuras de João Grilo e Chicó na obra-prima da comédia popular brasileira O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna. Basta lembrar que todos manifestam temer uma convulsão social com a eventual confirmação da condenação do Pedro Malasartes dos palanques e palácios. Afinal, ele seria o mais popular líder político do Brasil em todos os tempos. É mesmo? Por que, então, Lula não viaja em aviões de carreira como os mortais comuns e só comparece a eventos controlados pela militância cega por devoção e paixão?

Lula ascendeu entre heróis nacionais como líder das greves de metalúrgicos do ABC paulista em plena ditadura militar, da qual foi vítima. Na verdade, como está explicado no meu livro O que Sei de Lula (Topbooks, 2011), ele teve no general Golbery do Couto e Silva seu propulsor no início da carreira de dirigente. O criador do Serviço Nacional de Informações usou sua liderança carismática para impedir que Brizola empolgasse os movimentos sindicais e solapasse o regime. Emílio Odebrecht, pai de Marcelo, citado nas delações de 77 executivos de sua empresa e de quem Lula é o “Amigo” da tal lista, contou ao depor na delação premiada a procuradores federais da Lava Jato, a mais bem-sucedida operação policial e judicial da História, que Lula impediu greves em empresas suas, tendo recebido dinheiro para fazê-lo.

Foi nesse ínterim que Lula virou santo popular, por ter sido preso e processado após a intervenção no sindicato que presidiu nos anos 70 e 80. Mas sua passagem pela carceragem do Dops paulista à época da ditadura foi mais confortável que a de outros companheiros de cela, conforme testemunho do delegado Romeu Tuma Jr., secretário nacional de Justiça no primeiro governo Lula e filho do policial homônimo, em Assassinato de Reputações (Topbooks, 2013). Tuma relata que o falso mártir foi agente de informações do pai, a quem contava os segredos do movimento grevista. Se Odebrecht e Tuma não mentiram, em vez de vítima, o seis vezes réu de hoje foi, de fato, o que os colegas sindicalistas chamariam, à época, de “traíra” dos trabalhadores e “dedo-duro” dos militantes de esquerda, que sempre o endeusaram. Ninguém, até agora, desmentiu na Justiça os depoimentos aqui citados.

Em périplos pelo País, Lula conta lorotas que mais se acomodariam em narrativas das aventuras de grandes mentirosos do folclore. Como no caso recente em que algum intelectualoide do auditório do teatro Oi Leblon, núcleo de rebeldia juvenil na ditadura sob o nome de Casa Grande, lhe soprou que o assassino de Antônio Conselheiro foi ancestral do presidente do TRF-4, em que hoje está sendo julgado. De fato, o tio-trisavô de Thompson Flores era coronel, não general, e morreu três meses antes do beato de Canudos.

Essa foi apenas uma piada mentirosa e sem graça. Mais graves são as patranhas misericordiosas de pretensos adversários, como Temer, que põem as instituições em risco para tornar um mentiroso serial acima da lei e fora da democracia.
 
José Nêumanne - O Estado de S. Paulo