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domingo, 17 de abril de 2022

A terceira via está morta? Não - Alon Feuerwerker

Vai soar meio acaciano, mas em eleições é sempre bom esperar um pouco para chegar a previsões definitivas. E um assunto a merecer certo cuidado, certa delicadeza no trato, é a assim denominada terceira via. Rótulo aliás ruim, pois parece caracterizar uma turma em luta pela medalha de bronze. Não parece abordagem capaz de despertar grande entusiasmo no eleitor. E não tem despertado.

Os dois principais problemas da terceira via a esta altura da corrida são conhecidos:  
1) a pulverização entre diversos nomes por enquanto pouco musculosos e 2) a resiliência dos dois líderes nas pesquisas de intenção de voto. Mas há um terceiro problema (sempre esse número...), que a ideologia oficial do nem-nem resiste a admitir: o mercado até agora ambicionado pelo centrismo é modesto.

Os mitólogos da terceira via construíram para si a ilusão de haver um grande contingente simultaneamente anti-Lula e anti-Bolsonaro. Lá atrás fizeram uma conta de padaria, mais ou menos assim: “Se Lula tem firmes 35% e Bolsonaro, 25%, há uns 40% que não querem nem um nem outro”. Era obviamente um erro. Nesses 40% tinha gente disposta a não votar em ninguém e também gente que, no limite, não recusaria escolher o ex ou o atual presidente.

O mau resultado de Geraldo Alckmin em 2018 já deveria ter disparado o alerta, e faz tempo, mas o pessoal continua teimoso em projetar os próprios desejos para a realidade, mesmo depois de todas as pesquisas constatarem uma rejeição simultânea de Bolsonaro e Lula em torno de bem menos, uns 15%. Mas, se isso não é suficiente como ponto de chegada, tampouco é ruim na partida. Lembrar Marina Silva em 2010 e Eduardo Campos em 2014.

Lula e Bolsonaro levam vantagem no momento pois, além de capital político próprio consolidado, propõem-se a disputar uma fatia de mercado bem maior: cada um se apresenta como a salvação para livrar o Brasil da ameaça de ser governado pelo outro. O que aproxima ambos de um market share de metade dos potenciais votantes, suficiente para levar a taça. E na caminhada vão pouco a pouco flexibilizando ou a formulação ou as alianças, ou ambas.

Enquanto o dito centro continua aferrado ao nem-nem.

O desejo de retornar ao poder facilitou ao ex-presidente cativar o PT para deglutir Alckmin na vice. Já a opinião pública petista, lulista e progressista foi mesmerizada pelo “vocês não querem mais quatro anos de Bolsonaro, querem?”. Entrementes, a intransigência programática do PT, como era previsível, vai virando fumaça. Quem prestou atenção notou ter subido no telhado a revogação, ou revisão radical, da reforma trabalhista. Vai acontecer com outras pautas, como o teto de gastos e a autonomia do Banco Central.

E, do lado bolsonarista, faz tempo que a antipolítica foi para o arquivo morto.  A terceira via tem um caminho para tentar ser levada a sério num jogo ainda no começo
1) mostrar ambição real de poder, e não só apego a microprojetos (“precisamos fazer bancada”), e 
2) falar para o conjunto do eleitorado, dizer o caminho que propõe para o Brasil retomar o crescimento, gerar empregos, combater a inflação e melhorar a segurança pública. Talvez daí comece a ser ouvida pelo eleitor hoje com Lula ou Bolsonaro.

Mas também pode continuar na ladainha do nem-nem e “contra os extremismos”. Como se sabe, um discurso de grande sucesso no povão. Só que não. 

Alon  Feuerwerker, jornalista e analista político

 

sábado, 22 de janeiro de 2022

A volta do pêndulo - Alon Feuerwerker

Análise Política

No período em que enfrentou a ação combinada dos adversários para enfraquecer e afinal derrubar o governo Dilma Rousseff, o PT viu criarem contra ele um ambiente político-social de catástrofe iminente, catalisado ao final pelos achados e construções da Operação Lava-Jato. Que se somou vetorialmente à brutal recessão de 2015-16 para afinal dar no que deu.

Mas a ideia-força de “qualquer coisa menos o PT” acabou não beneficiando os criadores, pois a contagem dos votos de 2018 trouxe Jair Bolsonaro, e não algum candidato mais representativo da ampla aliança do impeachment de 2016. Por circunstâncias únicas (foram arrastados pela Lava-Jato), fizeram o bolo, mas não comeram o bolo. Aliás, o núcleo político do governo Michel Temer (PMDB-PSDB) saiu enfraquecido das urnas.

Agora o clima é semelhante, mas, de novo, quem mais agita na esfera psicossocial o que os militares chamam de “guerra psicológica adversa” não parece em situação de colher os frutos. A força do PT na criação de ondas de opinião pública é apenas relativa, mas quem recolhe, até o momento, os dividendos do “tudo menos Bolsonaro” é Luiz Inácio Lula da Silva. [os fatos vindouros mostrarão que o descondenado petista não está colhendo nada e não será beneficiário de nada. O infeliz chegará às próximas eleições sem coragem de sequer ir ao bar da esquina. Anotem e cobrem.
Lula, o maior ladrão do Brasil é um nada em termos políticos, morais, e outros. Seu futuro político de há muito deixou de existir, sendo absolutamente SEM futuro.
O descondenado é a própria encarnação do mal, representando tudo o que não presta e não tem futuro.]

A razão é óbvia. Lula é o antípoda de Bolsonaro, pois este elegeu-se na maré para “evitar a volta do lulopetismo” três anos atrás. E, se Bolsonaro não está bem na nuvem da psique coletiva, para onde o eleitor vai olhar antes de tudo? Na volta do pêndulo, para o outro produto conhecido, o principal concorrente, o que disputa as grandes fatias de market share.

Em 1984, com a derrota das “diretas já”, o movimento político para dar fim ao regime confluiu naturalmente para o PMDB, o antípoda do statu quo instalado em 1964. E nasceu a Aliança Democrática de Tancredo Neves e José Sarney. O fluxo costuma mesmo fluir conforme as linhas de menor resistência.[se iniciando a Nova República e com ela a instalação da maior quadrilha, que só sob Bolsonaro está sendo desmontada.]

Daí que Lula, empenhado em evitar surpresas, esteja numa “operação-Tancredo”. Busca consolidar rapidamente a convicção de que vai liderar uma espécie de Aliança Democrática 2.0. Alguém poderia, é claro, levantar dúvidas sobre os resultados da Nova República três décadas depois, mas no atual ambiente não encontrará... ambiente.

O debate, inclusive o debate interno no PT, costuma trazer incógnitas sobre dois pontos: o programa e as alianças. Quanto ao primeiro, a lógica diz que o PT não precisará fazer grandes recuos no ideário social-democrata, desde que possa agitar o “vocês querem mais quatro anos de Bolsonaro?”. [sem os malefícios da pandemia todos vão querer, confirmando no voto, não mais quatro anos e SIM, MAIS OITO ANOS.] Sobre as alianças, há no espectro analítico um certo equívoco recorrente.

Não é verdade que o PT não goste de alianças. O partido tem uma compreensível mentalidade hegemônica, decorrente de seu tamanho e seus resultados na história. Era o que se passava com o PSDB até um tempo atrás. Lula é hiperflexível a alianças, desde que seja o comandante. E é refratário a alianças em que tenha de abrir mão do comando. O que pode atrapalhar a caminhada petista no momento? Menos a “terceira via” e mais se [QUANDO] Jair Bolsonaro conseguir reduzir as taxas de rejeição, se o presidente conseguir desfazer a ideia geral de que ele na Presidência é sinônimo de desastre econômico, sanitário e político. As recentes manifestações do chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, apontam para essa tentativa.

Claro que a terceira via tem tempo para encorpar, mas por enquanto não dá sinais. Pois não comanda o espetáculo. E não é fácil o pêndulo parar sozinho no meio da trajetória.

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

 

 

segunda-feira, 27 de julho de 2020

Agitação e espuma dentro da bolha - Alon Feuerwerker

Análise Política


Esta primeira quase metade de gestão Jair Bolsonaro vem sendo marcada pelo sonho oposicionista de que o governo é uma construção frágil, pronta a desabar pela ação do próximo “fato novo”. Foi assim quando das manifestações em defesa da educação, logo no comecinho do mandato. Mais recentemente, as esperanças da oposição passaram a ser depositadas nos efeitos econômicos e sanitários da pandemia da Covid-19. E de tempos em tempos os olhos brilham quando surge alguma novidade no “Caso Queiroz”.

A realidade, porém, é que Bolsonaro por enquanto defende com sucesso a fatia de mercado conquistada por ele em 2018. O Brasil tinha então 147 milhões de eleitores e o candidato do PSL recolheu no primeiro turno 33% desse eleitorado, 49 milhões de votos, tudo em números arredondados. A esta altura você já percebeu. Os fatos vêm e vão, mas o percentual de “ótimo” e “bom” do presidente oscila sempre em torno desse mesmo um terço.

A taxa de aprovação de Bolsonaro só pode ser medida se se pergunta “você aprova ou desaprova?”, e não deve ser confundida com o ótimo+bom. Ela também oscila pouco, em torno de 40%. Interessante notar que essa ordem de grandeza corresponde ao market share do capitão no segundo turno. Aliás é também o patamar da fatia que aposta que o governo será bom ou ótimo ao final do mandato em 2022. Eis por que é furada a tese do “somos 70%”. Serve como propaganda, mas estrategistas políticos que acreditam cegamente na própria propaganda estão a caminho de ter problemas.

Há, é claro, as variações. Uma foi em meados do ano passado, quando o tema das queimadas na Amazônia ganhou visibilidade. Outra, agora mesmo, na decolagem da pandemia. Mas essas oscilações costumam deslocar mais do “regular” para o ruim/péssimo que qualquer outra coisa. E Bolsonaro tem mostrado resiliência. Quando a pressão afrouxa, as curvas de avaliação dele tendem a voltar para o padrão de “um terço, um terço, um terço”.

Sempre supondo que a conjuntura correrá pelos trilhos desse “normal”, fica claro portanto que a base social de sustentação de Jair Bolsonaro é consistente e ampla o suficiente para ele se segurar na cadeira e ser competitivo em 2022. Poderá ser derrotado? Sim, desde que se encontre um candidato capaz de aglutinar todo o restante do eleitorado e que além disso consiga ganhar alguma margem levando para votar uma parte dos que têm insistido no absenteísmo.

Não é simples. Implicaria costurar uma alternativa em que todas as facções do antibolsonarismo estejam contempladas. Como diz o ditado, seria o casamento do jacaré com a cobra d'água. Por enquanto, o que cada facção antibolsonarista vem pedindo às demais é a capitulação incondicional em nome do combate ao adversário comum. Na real, hoje ainda inexiste na oposição um sentimento autêntico de "qualquer um menos Bolsonaro". Aliás, é o contrário.

Outro problema: a cada gesto de distensão do presidente, os ensaios de coalizão são lipoaspirados. E Bolsonaro tem sido hábil (ou tido sorte) na política, como mostrou a votação do Fundeb. Enquanto o novelo não desenrola, vem restando ao antibolsonarismo repetir o antipetismo praticado na maior parte do extenso período do PT no poder. Promover agitação e criar espuma dentro da própria bolha. Não deixa de ser uma maneira de passar o tempo fazendo algo útil. 


[Recomendamos: alguém explica.]

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político