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sábado, 28 de outubro de 2023

O lar brasileiro de hoje está pior do que no tempo da escravidão - Bruna Frascolla

Vozes - Gazeta do Povo

A concepção de humanidade com a qual o Brasil foi formado fez dele um lugar melhor.

A concepção de humanidade com a qual o Brasil foi formado fez dele um lugar melhor.| Foto: Victor Meirelles/Domínio público 

Em seu As sinhás pretas da Bahia: Suas escravas, suas joias (Topbooks, 2021), Risério desfaz muitos mitos das historiografias oficiais do Brasil. Um deles, ao qual se dá pouca atenção, é relativo ao casamento de escravos. Cito-o: “Até à década de 1970, à maneira de Florestan Fernandes, nossos historiadores e sociólogos consideravam impensável a ideia de que escravos tivessem formado unidades familiares estáveis e duradouras em nosso país. Hoje, reconhece-se que eles foram capazes não só de estabelecer a família nuclear como de articular a chamada 'família extensa'. Filhos e filhas de negros escravizados chegaram muitas vezes a nascer e crescer sob os olhares conjuntos do pai e da mãe. 
Para trazer à luz um só aspecto, escravos que se casavam, sob a bênção da Igreja Católica, deixavam o ambiente promíscuo da senzala e passavam a ter um canto só para eles, marido e mulher, acompanhados somente pelos filhos, no crescimento da família conjugal” (p. 93).
 
Ou seja, a narrativa segundo a qual a escravidão impedia os negros de formarem família é a enésima importação indevida da realidade norte-americana para analisar o Brasil. 
Nos EUA, sim, as famílias dos negros eram desmembradas à medida que o proprietário ia vendendo os escravos. 
Nos EUA, a alforria era fenômeno raríssimo, e um racismo de origem religiosa, profundamente arraigado, vedava aos negros quaisquer possibilidades de ascensão social por meio da integração.
 
A diferença entre nós e eles tem origem teológica. A Igreja Católica leva a sério a afirmação de que o homem, sem predicações raciais ou étnicas, é feito à imagem e semelhança de Deus.  
A diferença entre um índio canibal, um escravo africano e um português era que os dois primeiros ainda não receberam a boa nova e ainda não foram batizados. 
Uma vez batizados, todos eram igualmente filhos de Deus.
 
A racialização do cristianismo, ao menos na modernidade, começa com Lutero, que considerava os espanhóis indiscerníveis dos mouros, turcos e judeus
Lutero, como se sabe, era um tremendo antissemita no sentido literal do termo: odiava a descendência de Sem, que incluía árabes e judeus. 
A Península Ibérica, a seu turno, tinha muito sangue semita graças ao período que permaneceu sob o Califado Omíada.

    As crianças do mundo liberal vão se parecendo cada vez mais com as crianças da Romênia comunista, que foram largadas em orfanatos estatais depois de os dirigentes resolverem aumentar a natalidade a qualquer custo

Com o calvinismo, porém, inicia-se (e aprofunda-se) uma racialização em sentido oposto: com a doutrina da predestinação, Deus tem dentre os homens uns poucos eleitos. 
Reaviva-se, assim, a ideia primitiva e anti-universalista do judaísmo, segundo a qual Deus tem um único povo eleito, alguns filhos prediletos. Em Os judeus e a vida econômica, Werner Sombart considera que puritanismo é judaísmo (ao menos uma imitação), e recolhe evidências de que uma verdadeira adulação aos judeus surgiu na Inglaterra pouco após a chegada do séquito de sefarditas que acompanharam Catarina de Aragão. Menciona, por exemplo, que os levellers se referiam a si mesmos como judeus – coisa impensável tanto no mundo católico quanto no mundo luterano. 
E hoje vemos os descendentes dos puritanos na América bancando um Estado judeu como uma espécie de exclave sagrado no Oriente Médio.
 
O Destino Manifesto é outra emanação do calvinismo: Deus escolheu o povo que colonizou os EUA; e este tem direito a dominar o mundo. No mundo calvinista, o fiel pode dizer “nós, os eleitos”, e vós (resto do mundo), os rejeitados do Pai. 
É um convite à dominação do homem pelo homem e à desumanização do dominado. 
E isso se refletiu na história dos EUA, que mataram ou expulsaram do seu convívio todos os índios (que tinham, sob o México, uma boa relação), e consideraram os negros uma raça inferior, que deveria ou ser mantida escrava (segundo os sulistas escravocratas) ou deportada “de volta” para a África (segundo o Norte abolicionista).  
Com a vitória do Norte, criou-se a Libéria para deportar negros. Isso de deportar segundo a raça, como se vê, não foi invenção dos nazistas.
 
Apesar da difusão do ateísmo pelo ocidente pós-protestante, o espírito do calvinismo não morreu; em vez disso, tornou-se ainda mais materialista. Veja-se por exemplo o casal Collins, “que se identifica como calvinista secular, é particularmente atraído pelo princípio da predestinação, que sugere que certas pessoas são eleitas para serem superiores na Terra e que o livre arbítrio é uma ilusão. Acreditam que o pró-natalismo é uma consequência natural dos movimentos filosóficos que tomam o polos de tecnologia como as colinas de Silício em Austin, Texas.” Como vocês podem ler em português nesta Gazeta, o pró-natalismo do casal, e não só dele, se baseia na crença em QI.  
Desta maneira, pode-se até negar que se seja racista, já que existem negros com QI alto. 
Por outro lado, usa-se uma via secular para cultuar judeus do mesmo jeito, apontando-se o alto QI médio de judeus asquenazitas.
 
Mas o mais curioso, mesmo, é que (como apontei ano passado) essa crença na determinação do QI pela genética não se sustenta sequer cientificamente. 
Afinal, QI é uma junção de matéria (genética) e interação humana. 
Criar um ser humano não é a mesma coisa que preparar uma sopa Maggi. Os dados do QI de negros vêm dos EUA, onde tais famílias são especialmente desestruturadas. 
Por outro lado, as famílias asquenazitas são estruturadas. 
Resolver que a raça funda a diferença populacional é uma decisão arbitrária. 
Nos EUA, os negros foram submetidos a um exército de assistentes sociais voltados ao aborto e à dissolução da família; logo, era de esperar que o QI fosse mais baixo mesmo.

    Hoje, o que as Big Techs vêm consolidando é aquilo que na Idade Média se chamava de “comunismo de mulheres”: nenhum homem tem direito a uma mulher só sua, porque todas são socializadas

No século XXI, estamos, cada vez mais, virando aquilo que os negros eram nos Estados Unidos: os enjeitados de Deus, sob a opressão dos eleitos autoungidos. 
A queda de QI já é uma realidade generalizada e, até onde se saiba, inédita. 
E a explicação não é uma piora no stock racial; em vez disso, trata-se de redução das relações humanas na formação das crianças. 
As crianças do mundo liberal vão se parecendo cada vez mais com as crianças da Romênia comunista, que foram largadas em orfanatos estatais depois de os dirigentes resolverem aumentar a natalidade a qualquer custo.
 
Era mais fácil, portanto, um filho de escravos brasileiros casados esperar ter o pai em casa do que um filho das classes média e baixa de hoje
Agora deixemos as crianças e vejamos então o escravo negro adulto dos calvinistas: ele tinha direito a uma esposa? Não. 
A mulher tampouco tinha direito a um marido. 
Hoje, o que as Big Techs vêm consolidando é aquilo que na Idade Média se chamava de “comunismo de mulheres” (e que surgiu na Reforma protestante também, com João de Leyden): nenhum homem tem direito a uma mulher só sua, porque todas são socializadas. 
O resultado disso, num regime capitalista, é a prostituição universal
Para implementar isso, a propaganda progressista apelou para duas frentes: aos homens jovens, disse que seria muito bom ter uma porção de mulheres; às mulheres, disse que se não desejassem uma porção de homens, eram reprimidas e problemáticas. 
(Louise Perry abordou o assunto pouco tocado, que é a pílula ter deixado as namoradas sem um pretexto para dizer “não” sem magoar. As mulheres foram talhadas pela natureza para serem mais seletivas e, portanto, quererem menos parceiros sexuais do que os homens.)  
 
Acabar com a limitação do sexo ao âmbito do casamento foi relativamente fácil, com a pílula; e foi possível tocar a sociedade com famílias estruturadas assim. Primeiro os casais namoravam (com sexo), depois casavam. Mas o que estamos vendo agora é, também, o fim do namoro.  
Os rapazes são seduzidos pela ideia de que podem ver qualquer moça pelada por uma modesta quantia de dinheiro, e as moças são seduzidas pela ideia de que podem ganhar dinheiro fácil – e só uma problemática e reprimida não acharia ótima a ideia de ganhar dinheiro pelada com fotos descoladas.
 
O caso mais recente é o do viral “Beiçola do Onlyfans”: uma moça de Porto Alegre ficou famosa nas redes pelo marketing ousado, e o clube do bolinha não tardou em apelidá-la de “Beiçola do Onlyfans”, por sua pouca lisonjeira semelhança com o dono da pastelaria de A Grande Família. 
Ao cabo, a jovem Beiçola se encontrou com o ator que interpretava Beiçola e anunciou alguma doação para ele, passando assim a ser vista como boa moça e ganhando muita simpatia dos (outrora) haters. 
Em seguida, a plataforma na qual ela vende as fotos (uma tal de Privacy, não Onlyfans) anunciou que ela ganhou 500 mil reais com as fotos. 
Bom, ao menos no mundo anglófono, é sabido que o boom do Onlyfans, em 2020, se valeu muito da divulgação de valores inflados para convencer as mulheres de que se vender assim era bom negócio.
 
Pois então: uma escrava do Brasil colonial podia viver em paz sem sequer imaginar que milhares de homens deveriam vê-la pelada, ou que ela deveria querer transar com vários homens
Por outro lado, um escravo no Brasil colonial poderia ter para si, grátis, uma mulher que lhe desse atenção, e que não fosse dividida com nenhum outro homem.

Bruna Frascolla, doutora em filosofia - Gazeta do Povo - VOZES


domingo, 24 de setembro de 2023

A escudeira de Flávio Dino - Revista Oeste

Cristyan Costa

Articulações de Eliziane Gama na CPMI do 8 de Janeiro mostram que a relatora vai blindar o ministro da Justiça e figurões do governo federal que têm muito a explicar

 

Instalação da CPMI do 8 de Janeiro. Foram escolhidos Arthur Maia como presidente e Eliziane Gama como relatora | Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Durante o depoimento do ex-GSI Gonçalves Dias à CPMI do 8 de Janeiro, membros da oposição acusaram o militar de receber, previamente, as perguntas que seriam feitas a ele pela relatora da comissão, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA). A própria parlamentar estaria envolvida no caso. Isso porque mensagens de WhatsApp obtidas por congressistas mostram um diálogo no qual o filho de Dias, Gabriel, afirma ter negociado um encontro com Erlando da Silva, chefe de gabinete de Eliziane. Depois dessa reunião, Dias teria recebido uma lista com as interpelações.

Num país sério, uma revelação desse calibre seria a bala de prata para derrubar da posição de relatora uma parlamentar que, desde o início da CPMI, trabalha para blindar o governo e Flávio Dino, ministro da Justiça. Seu padrinho político, é ele o responsável por Eliziane chegar à posição que ocupa hoje no Parlamento e na comissão.  
A senadora trabalha ativamente com aliados da bancada do Maranhão — a maior da CPMI — para chamar ex-membros do governo Bolsonaro, como Anderson Torres e Mauro Cid, em vez de gente que realmente tem muito a explicar sobre o 8 de janeiro, como G. Dias e o próprio Dino. 
Com a caneta da relatoria na mão, caberá a Eliziane indiciar pessoas ao término da CPMI, até mesmo no Supremo Tribunal Federal. 
 
O militar e o ministro da Justiça são atores centrais do 8 de janeiro. Imagens das câmeras de segurança do Palácio do Planalto, divulgadas em abril deste ano pela CNN Brasil, mostram o então ministro do GSI auxiliando invasores e tratando-os com cordialidade. 
Apesar da gravidade, a CPMI só convocou o general dois meses depois de os vídeos virem à tona. 
A demora se deu, sobretudo, por causa de articulações do governo na CPMI patrocinadas por Eliziane, que chegou a afirmar que a presença de Dias no colegiado, logo depois da revelação, “atrapalharia o cronograma dos trabalhos”. 
Sobre Dino, Eliziane não viu “necessidade” de chamá-lo, em razão de “muitas informações do caso estarem sob sigilo”. O ministro da Justiça vinha sendo cobrado por imagens da sede de sua pasta no dia dos protestos. Dino, contudo, sem dar muitos detalhes, afirmou que os vídeos haviam sido apagados.


(...)


Outros deputados confirmam a tese segundo a qual Eliziane age com parcialidade nos bastidores e, principalmente, nas sessões diante das câmeras. Ao citar a troca de mensagens entre o filho de G. Dias e o assessor da parlamentar, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) disse temer que as conclusões da CPMI acabem distorcendo a realidade. “Questionar a parcialidade da relatora não é um crime”, afirmou o parlamentar. “Se eu estivesse sentado na cadeira de relator, teria vergonha.”

Assessor de Eliziane Gama encontrou-se com G Dias antes do depoimento do General à CPMI, indicam mensagens.

Parlamentares oposicionistas apresentaram conversas na sessão desta terça-feira (12) e acusaram a relatora de combinar perguntas com o ex-ministro do GSI.

Senadora não… pic.twitter.com/9J1KxepaTm

— Metrópoles (@Metropoles) September 12, 2023


Espera-se que o relatório final, a ser divulgado em 17 de outubro, proteja Dino e G. Dias das acusações de omissão e ocultação de provas. Nas mais recentes declarações, Eliziane disse que dará prioridade a uma segunda convocação de Mauro Cid, bem como de outros militares, como o ex-ministro Braga Netto. Cid permaneceu em silêncio, respaldado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, Eliziane acredita que essa postura pode mudar, especialmente depois de o militar ter sido interrogado em três ocasiões pela Polícia Federal (PF) e por causa do acordo de delação premiada que ele celebrou com a PF, homologado pelo ministro Alexandre de Moraes.

Amiga do poder

A relação amigável entre Eliziane e os parlamentares de esquerda
no Congresso Nacional ficou mais estreita com a CPI da Covid, em 2021. Embora não fosse membro efetiva da comissão, o então presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), deu a ela uma posição de destaque para atacar o governo Bolsonaro. Com a vitória de Lula, a parceria ganhou musculatura, quando o ministro da Casa Civil, Rui Costa, aprovou a nomeação do marido da senadora, Inácio Neto, para a presidência do Serviço Geológico do Brasil (SGB), uma estatal vinculada ao Ministério de Minas e Energia que faz pesquisa sobre o território nacional e suas riquezas. Além do salário de R$ 30 mil, Neto pode dar pareceres a favor de pedidos para a realização de extração de minerais. O governo Lula ignorou completamente um manifesto feito por funcionários do SGB contra a nomeação.

Divulgado em março deste ano, o documento lista vários processos arquivados ou em trâmite contra Neto. O texto diz que o homem é acusado de praticar crime ambiental, elaborar e usar documentos falsos, sonegar impostos, além de denúncias de agressão à ex-mulher. “Outro agravante é a inaptidão técnico-científica confirmada pela falta de formação para o cargo pretendido, sendo formado em administração, além de inexistência de conhecimento prévio ou experiência na área de geociências, ou mesmo relacionada ao setor mineral”, diz trecho do documento enviado ao governo. A carta dos funcionários lembra ainda que, em 2021, Neto chegou a ter a prisão decretada pela Justiça no Maranhão, por não pagar R$ 560 mil de pensão alimentícia do filho do primeiro casamento.

Neto tem ainda várias denúncias contra ele no Maranhão. A publicação de algumas delas, por jornalistas que atuam em blogs independentes no Estado, renderam processos contra esses profissionais. Werbeth Saraiva, Neto Ferreira, Antônio Martins e Domingos Costa são alguns deles. O grupo acusa a senadora de usar verba de gabinete do Senado para pagar o escritório Spindola, Raposo e Ribeiro Advocacia e Consultoria, que moveu a ação. Comprovantes no Portal da Transparência do Senado confirmam que o escritório presta serviço para Eliziane. 

LER ÍNTEGRA DA MATÉRIA

 

Leia também “O triunfo da injustiça”

 

Coluna Cristyan Costa, Revista Oeste 

 

 

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Casamento poliafetivo: e o juiz citou… Lulu Santos - Guilherme de Carvalho

 VOZES - Gazeta do Povo

Direito de família

Foto: NoName_13/Pixabay
 
Segundo noticiado por O Globo, a 2.ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Novo Hamburgo (RS) reconheceu a união estável poliafetiva entre três pessoas – duas mulheres e um homem – em 28 de agosto. 
Um casal que mantinha relação com outra mulher havia dez anos buscava oficializar a relação, com repetidas negativas de cartórios, e contratou um escritório para defender seu caso na Justiça. 
A decisão favorável veio do juiz Gustavo Borsa Antonello.

Mas sob qual fundamento? Conforme a citação da sentença na reportagem, a busca da felicidade: “O que se reconhece aqui é uma única união amorosa entre três pessoas: um homem e duas mulheres, revestida de publicidade, continuidade, afetividade e com o objetivo de constituir uma família e de se buscar a felicidade”.

Trata-se de um novo capítulo da grande revolução afetiva contemporânea; e um capítulo muito importante. A legitimação dos novos modelos de família recebeu um impulso definitivo com a equiparação entre a paternidade biológica e a paternidade socioafetiva pelo STF, na famosa Repercussão Geral 622 relatada pelo ministro Luiz Fux. 
Segundo a tese central, “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”. Nos termos do jurista Ricardo Calderón: a socioafetividade e a multiparentalidade foram reconhecidas pelo STF.

O que estamos presenciando agora é o completo descolamento da ordem social de sua base natural evolutiva e biopsíquica; mas também de sua teleologia moral, refletida no casamento monogâmico heterossexual

Calderón é, juntamente com Maria Berenice Dias, um dos grandes expoentes nacionais no movimento dos “Direitos Afetivos”, que propõe, em poucas palavras, a completa submissão da ordem familiar ao individualismo expressivo e, assim, ao moderno capitalismo emocional. Eles não diriam isso, obviamente; mas o ataque predatório do individualismo expressivo sobre a moralidade, a religião e o direito é um resultado direito do sistema de hiperconsumo segundo um dos autores mais prezados pelo próprio Calderón: Gilles Lipovetsky.

Segundo tratamos nessa coluna, a moralidade que fundamenta a revolução afetiva é uma espécie de epicurismo psicologizado, resultante do triunfo da mentalidade terapêutica ao longo do século 20. Esse epicurismo pós-moderno estabelece o bem-estar emocional e a autenticidade como uma Lex Legum na organização da vida moral, afetiva e familiar. Calderón chama isso de “família eudemonista”, focada na felicidade individual de seus membros; mas o epicurismo era apenas uma das doutrinas clássicas da felicidade. Seria melhor falarmos em uma eudemonística liberal, a doutrina de felicidade do individualismo expressivo.

Esse epicurismo pós-moderno levou à corrupção da moralidade, à distorção do direito de família e, ao contrário do que pretende, injustiça para mulheres e famílias. 
A militância da nova esquerda e do afetivismo jurídico tende a transformar instituições culturais e sociais em tecnologias do Self, ferramentas de autoafirmação e autoexpressão do indivíduo moderno, epicurista, secularizado e individualista. 
Há um paralelo aqui com a indústria, quando o aumento de alguns confortos produz dejetos tóxicos e altamente poluentes. A expansão irracional dos direitos individuais traz custos sociais que são externalizados e disseminados, atingindo principalmente os mais vulneráveis. Ninguém sofre mais os efeitos destrutivos da flexibilização do casamento e dos deveres dos pais biológicos do que as mulheres e crianças da periferia, por exemplo.

Pois bem: aparentemente foi essa ideologia, segundo se depreende de uma reportagem anterior de Gabriel Stohr no portal Vale dos Sinos, a estrela-guia do juiz Gustavo Borsa Antonello em sua sentença autorizando o “trisal”. Stohr cita a sentença: “Hoje, o que identifica uma família é o afeto, esse sentimento que enlaça corações e une vidas. A família é onde se encontra o sonho de felicidade. A Justiça precisa atentar nessas realidades”. E o juiz concluiu o texto nesses termos:

“Finalizo essa decisão, permitindo-me transcrever a poesia de Lulu Santos, em canção lançada no início da década de 80:

(…)

Eu quero crer no amor numa boa
Que isso valha pra qualquer pessoa
Que realizar a força que tem uma paixão
Eu vejo um novo começo de era
De gente fina, elegante e sincera
Com habilidade pra dizer mais sim do que não

Hoje o tempo voa, amor
Escorre pelas mãos
Mesmo sem se sentir
Não há tempo que volte, amor
Vamos viver tudo que há pra viver
Vamos nos permitir

(Tempos modernos, Lulu Santos)”

Os novos modelos de família emulam até certo ponto o que a família natural faz, mas não completamente. É por isso que o casamento e a família natural deveriam ter uma proteção especial do Estado

A citação é muito interessante, fazendo transparecer a íntima conexão espiritual entre o Judiciário moderno e o ideário moral da elite cosmopolita nacional, conexão essa demonstrada em múltiplos níveis. Do Direito à produção midiática, passando pela universidade e pelo jornalismo, trata-se do mesmo estilo moral: “vamos viver tudo o que há pra viver... vamos nos permitir”: a epítome do epicurismo pós-moderno.

O comentário do grupo de advogados, citado por Stohr, também é muito instrutivo:

“Cada vez mais a Justiça tem compreendido o valor da família, tendo o amor e o afeto como norteadores desta construção familiar. Em um momento em que as forças conservadoras do nosso país lutam para reprimir toda forma de amor, esta decisão vem justamente para mostrar que absolutamente nada pode ser maior que o amor.”

Não é de se admirar que o Brasil esteja em pé de guerra. A elite cosmopolita se imagina lutando pelo amor; e os pobres-diabos parecem realmente acreditar nisso.

O que estamos presenciando agora é o completo descolamento da ordem social de sua base natural evolutiva e biopsíquica; mas também de sua teleologia moral, refletida no casamento monogâmico heterossexual. A superioridade dessa forma de união já era reconhecida no mundo clássico, em Aristóteles, por exemplo. Mas a hegemonia do casamento monogâmico como pacto ou sacramento, que costumo chamar de casamento agápico, é uma das grandes dádivas da igreja cristã e ajudou a criar a civilização ocidental.

Essa forma de casamento sintetiza o mais alto grau de união entre duas pessoas, homem e mulher, nas promessas da conjugalidade, com a mais profunda união entre pessoas mais jovens e pessoas mais velhas, na parentalidade natural. Note o leitor: apenas no casamento monogâmico temos essas duas conexões, sincrônica e diacrônica, operando em bases biológicas e naturais. Os novos modelos de família emulam até certo ponto o que a família natural faz, mas não completamente. É por isso que o casamento e a família natural deveriam ter uma proteção especial do Estado; eles cultivam, guardam e oferecem bens humanos específicos de valor público e comum.

Mas esses bens vêm se tornando cada vez menos visíveis no mundo contemporâneo.  
E o Judiciário brasileiro é responsável por isso, das menores instâncias até o STF. 
Esses poderosos, que trocaram Aristóteles e o apóstolo Paulo por Lulu Santos, não serão lembrados por sua sabedoria.
 
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

domingo, 20 de agosto de 2023

O presidencialismo que resiste à coalizão - Alon Feuerwerker

Análise Política

O sistema eleitoral brasileiro produz amiúde um cenário contraditório, resultado de certo paradoxo: enquanto a eleição presidencial costuma produzir entre duas ou quatro candidaturas que atingem massa crítica, a disputa para o Congresso Nacional sempre resulta num quadro pulverizado.

A cláusula de desempenho promete resolver o problema no médio e no longo prazos, mas será preciso ver se, quando o remédio finalmente funcionar, o paciente ainda estará vivo.

Haveria como corrigir. A cura radical poderia vir de um voto em lista fechada nos estados, acabando, ao mesmo tempo, com a desproporção entre as representações estaduais na Câmara dos Deputados. Ou então implantando o voto distrital misto, com uma certa reserva (talvez 20%) para as listas fechadas.

Se se quisesse aplicar um remédio imediato que não demandasse grandes quóruns legislativos, seria simples: calcular em cada estado as bancadas de deputados federais não mais a partir dos votos dados aos parlamentares e às legendas para a Câmara, mas dos votos dados aos postulantes à Presidência.

Por analogia, as cadeiras nas assembleias seriam calculadas a partir dos votos para governador. E a composição das câmaras municipais respeitaria o desempenho dos candidatos a prefeito.

Essa simples alteração obrigaria os partidos a fundir-se ou formar federações em torno de candidatos viáveis e garantiria que a vontade popular, expressa na eleição majoritária com muito mais nitidez que na proporcional, se traduzisse em possibilidade real de governar.

Mas há um consórcio bem azeitado que resiste a qualquer mudança substantiva.   
É tipo o casamento do jacaré com a cobra d’água: junta as legendas cuja única razão de existir é a intermediação de recursos orçamentários e as correntes bem-pensantes que desfrutam prestígio na elite e na superestrutura intelectual-ideológica, mas raramente são correspondidas pelo eleitor.

E o curioso é que as segundas formalmente desprezam as primeiras pelo “fisiologismo”, termo que só é temporariamente aposentado quando o segundo grupo precisa apoiar algum governo que represente o “mal menor”. E passa a repaginar como “articulação política” o que sempre tratou derrogatoriamente.

É natural e humano que essas janelas de oportunidade aticem o apetite das legendas antes chamadas de fisiológicas, pela momentânea eliminação, ou ao menos redução, do custo reputacional implicado no que normalmente seria xingado como “toma lá, dá cá”. É onde estamos.

Ainda mais quando se nota o azeitamento da relação entre o Planalto e o Judiciário,
o que faz suas excelências do Congresso olharem com cuidado redobrado para a possibilidade de aninhar-se sob as asas do Executivo.

Mas aqui quem me lê poderia fazer uma pergunta: afinal, por que o Executivo precisa fazer tantas concessões?

No mínimo, para garantir que não se formarão massas críticas em torno de possíveis impeachments. E para evitar, ou ao menos controlar, comissões parlamentares de inquérito. Agora mesmo, uma competente articulação política (vou usar a expressão benigna) emasculou ou virou do avesso CPIs originalmente anti-Planalto.

E tem também o “apoio às reformas”. Seria o caso de estudar como e por que governos, um atrás do outro, decidem ter uma agenda legislativa que demanda expressivas maiorias, apenas para, ao fim e ao cabo, e a um custo altíssimo, colher mudanças legais de efeito apenas relativo.

Verdade que isso faz parte da estranha propensão brasileira a, simultaneamente, orar no altar da Constituição de 88 e diariamente revogá-la pela enxurrada de emendas congressuais e decisões do Supremo Tribunal Federal. O que talvez merecesse um estudo de especialistas na relação entre política e psicanálise.

É nesse ponto que se acha o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Para ter governabilidade (outra expressão bonita que se impõe ao governante que não quer virar um Luís XVI), precisa abrir espaço a políticos que nada têm a ver com o que se decidiu na eleição, ou até se opuseram ao que acabou prevalecendo na urna.

É natural que resista, ainda que vá ter de ceder. Aliás, governar o Brasil tem sido um pouco isso. Uns chamam de “presidencialismo de coalizão”.  
Que carrega, dialeticamente, em si seu contrário. 
O que governantes brasileiros mais fazem, no que gastam talvez a maior parte do seu precioso tempo, é resistir ao Frankenstein.

 Alon Feuerwerker,  jornalista e analista político

 

 

segunda-feira, 31 de julho de 2023

Athayde Petreyze: tudo sobre o casamento de Randolfe Rodrigues - Paulo Polzonoff Jr.

Gazeta do Povo - VOZES

"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.

Casamento Randolfe Rodrigues
Casamento de Randolfe Rodrigues: a noiva é a de branco.| Foto: Reprodução/ Twitter

Na sexta-feira (28), eu tomava umas muitas cervejas com meus amigos quando vi, projetado no céu, o unicórnio estilizado que anunciava: o mundo precisa de Athayde Petreyze. Na hora, entrei no Petreyzemóvel e peguei o primeiro avião com destino à felicidade/ a felicidade/ pra mim é você. 
Digo, com destino a Brasília, para o cafonamento do minissenador Randolfe Rodrigues.
 
Vale tudo
Apesar de ter sido inexplicavelmente ignorado pelo cerimonial, entrar na festa realizada na casa de Glória Pires não foi exatamente um problema. Afinal, sou amigo da Maria de Fátima desde "Vale Tudo". 
Sou também presidente e sócio-fundador do Fã-clube Oficial de Orlando Morais (2 membros). 
Além disso, sempre levo no bolso minha infalível carteirinha da FENAJ e uma nota de R$200 para emergências como essa. Ou seja.

Janja 1
Assim que adentro o recinto, meu abrangente olhar jornalístico se vê atraído pela figura que é o centro das atenções do casamento de Randolfe Rodrigues com uma advogada cujo nome até agora não consegui descobrir: a primeira-dama e madrinha Janja. Que, dizem as más línguas presentes ao festerê, usava a faixa presidencial por baixo do vestido de tabuleiro de xadrez.

Janja 2
Ao me ver, Janja deixa o maridão entretido com o causídico Zanin e, de braços abertos, vem correndo em minha direção. “Meu amigo, você veio!”, diz ela, constatando o óbvio e provavelmente me confundindo com alguém. Ao abraçá-la, noto que Janja tinha “esquecido” de tirar a etiqueta do vestido. Com o preço.

Quatro mil, cento e oitenta e seis reais
O vestido de Janja custou R$4.186,00.
Caso vocês queiram saber. 
A estampa quadriculada foi uma referência aos 580 dias que Lula passou na prisão. Dizem.  
E, já que estamos falando dos trajes, não posso deixar de mencionar (e elogiar) o estilo anão chic do noivo, que pegou o terno caneta-azul, azul-caneta emprestado do priminho.

Champã
Muitas taças de champã festa adentro,
uma dúvida ainda me assombra: como é mesmo o nome da noiva?

Violência psicológica
De repente, ouço gritos extremamente agudos – o que atiça meu faro jornalístico. Temendo pela saúde da noiva e vislumbrando a possibilidade de finalmente descobrir o nome da felizarda, saio em disparada. 
Ao chegar no meio do auê, contudo, encontro o minissenador brandindo o celular aberto no Twitter. Digo, no X. “Violência psicológica?! 
Como ela ousa me acusar disso. Ainda mais hoje?!...”, choraminga ele. 
No que é consolado por Renan Calheiros. “Pelo menos é sua ex-mulher, e não...” – diz o alagoano. Não consigo ouvir o restante da frase porque alguém deixou cair um prato.
 
Ciúme
Circulo pelo ambiente cheio de celebridades políticas. 
 Discuto axé com Jaques Wagner e com José Guimarães aposto que na minha cueca cabe muito mais dinheiro. 
Marcelo Freixo me dá dicas de turismo na Baixada Fluminense. 
Ao me aproximar de Gleisi Hoffmann, recebo de um agitado Lindbergh Farias um olhar carregado de ciúmes. Calma, cara!
 
Bloody mary
Bruno Dantas me chama num canto e desanda a falar mal do Deltan.
Enquanto ele fala e fala e fala, porém, meus olhos perspicazes e treinados pelos maiores mestres do colunismo social observam tudo ao meu redor. Num canto, Renan Calheiros dá dicas de implante capilar para Cristiano Zanin. Humberto Costa bebe um bloody mary
Alckmin comenta a ausência marcante de Alexandre de Moraes. 
E Bruno Dantas ainda não parou de falar sobre o Dallagnol. Acredita?
 
Sobre OVNIs e uísques
A caminho do banheiro
, esbarro em Caetano Veloso e engato com ele uma longa discussão. Primeiro, sobre OVNIs. Depois, sobre uísque. Prefiro uísque 21 anos. Ele prefere os de 12. “Entendo”, digo. Só por dizer. E ficamos ali, naquele silêncio constrangido dos gênios, até que passa por nós a daminha de honra, Greta Thunberg.
 
Lua-de-mel
Depois da festa, os noivos entram num carro oficial para passar a lua de mel nas dependências do STF. Dizem. Entediado e sentindo a falta do meu amigo Flávio Dino, pego um arranjo de mesa e umas pratarias como lembrancinha e me despeço, certo de mais uma vez ter cumprido meu comprido dever jornalístico.

Pri, para os íntimos
Priscila Barbosa!
O nome da noiva é Priscila Barbosa!

sexta-feira, 29 de julho de 2022

Pastores são atacados por negar cerimônias a homossexuais. O que diz a lei? - Gazeta do Povo

Gazeta do Povo

Homofobia ou intolerância religiosa?

Pastores evangélicos estão sendo atacados no Brasil por se negarem a realizar cerimônias de casamento e batismo de homossexuais. Ações na Justiça ou ameaças de processo, além de campanhas de difamação nas redes sociais e em meios de comunicação, estão entre os métodos escolhidos para intimidar os religiosos.

O pastor Omar Zaracho se negou a realizar uma celebração para casal de homossexuais e sofreu ataques.| Foto: Instagram/@celebrantewedding
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Um caso emblemático ocorreu na semana passada: o casal lésbico Bianca dos Santos Ventura, de 23 anos, e Isabella Santiago Pereira, 21, apareceu em meios de comunicação alegando ter sido vítima de homofobia por parte do pastor Omar Zaracho. Ele é celebrante de casamentos no município de Búzios (RJ) e se recusou a celebrar a cerimônia de união das duas. O episódio mobilizou associações e grupos LGBT contra o pastor.

A resposta de Zaracho ao pedido do casal, feito via WhatsApp, foi esta: “Como celebrante wedding, sou especializado apenas em cerimônias heterossexuais, portanto, pelo meu grau de profissionalismo e para sempre oferecer um serviço de excelência dentro das minhas capacidades e aptidões, não realizo cerimônias homoafetivas. Igualmente obrigado pelo contato. Atendimento encerrado."

A conversa de WhatsApp foi divulgada em diversos meios sem a permissão do pastor. Juristas membros de associações LGBT deram declarações a veículos jornalísticos afirmando que é proibido alguém se recusar a "prestar serviços" com base em orientação sexual, e que isso seria crime. Em declarações à imprensa, o casal lésbico afirmou que pretende processar o pastor. Nas redes sociais, Zaracho tem sofrido ataques por causa do episódio. No Twitter, o perfil do Procon de São Paulo lhe enviou uma cartilha sobre LGBTfobia nas relações de consumo.
“Intolerância religiosa é crime. Nenhum prestador de serviço é obrigado a realizar um serviço que vai contra seus princípios religiosos, que o levem a negar a sua fé. Uma ideologia não pode estar por cima de uma religião. Precisamos ter igualdade”, afirma o pastor.

As cerimônias de Zaracho, realizadas normalmente em praias de Búzios, atraem diversos públicos – inclusive, em alguns casos, pessoas de fora do estado do Rio de Janeiro e estrangeiros. Ele não limita as celebrações a casais evangélicos, mas uma rápida pesquisa por seu nome em mecanismos de busca da internet deixa evidente que ele é um pastor.

Depois da decisão do STF que equiparou a homofobia ao racismo, em 2019, alguns clientes têm reagido de forma mais negativa a recusas baseadas na orientação sexual, conta Zaracho. “De 2019 para cá, justamente por essa decisão do STF, comecei a receber insultos, pessoas me chamando de homofóbico, disso ou daquilo outro”, diz.

Por conta da publicidade dada ao caso recente, o pastor precisou configurar temporariamente como privado o acesso à página de sua empresa de celebrações matrimoniais no Instagram. "Começaram a entrar no perfil da minha empresa e xingar, insultar, incriminar, chamar de homofóbico. No início, quando eram cinco, seis, dez mensagens, eu fui apagando, porque eu não perco meu tempo respondendo a haters. Simplesmente apago. Então, fui apagando, só que virou uma bola de neve. Não foram nem cinco nem dez, foram mais de 80, a ponto de que eu precisei colocar no privado o Instagram da minha empresa.”

 
Caso não é o único de conflito entre pastores e homossexuais. Mas o que diz a lei?

O caso de Zaracho não é o único recente de pastores acusados de homofobia por negarem celebrar cerimônias para pessoas homossexuais.
Em maio deste ano, um fotógrafo de Aracaju (SE) apareceu em diversos meios de comunicação locais alegando ter sido vítima de homofobia ao ser impedido de receber o batismo em uma igreja presbiteriana por ser homossexual. “Ele [o pastor] me informou que eu não poderia ser batizado, porque eu era homossexual e casado com outro homem”, disse o fotógrafo à TV Sergipe. Um pastor da igreja afirmou ao mesmo veículo: “Todos são muito bem-vindos à família Renovada, mas nós não abrimos mão dos princípios e valores que a palavra de Deus nos diz."

Um caso semelhante ocorreu em setembro do ano passado, quando um cabeleireiro de Araçatuba (SP) afirmou que pastores da Assembleia de Deus Ministério do Belém lhe negaram o batismo pela mesma razão.

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Nos EUA, em 2018, o caso de um confeiteiro que se recusou a fazer um bolo para um casal homossexual chegou à Suprema Corte, com decisão favorável ao confeiteiro.

Tadeu Nóbrega, professor e mestre em Direito Constitucional e diretor da União dos Juristas Católicos de São Paulo (UJUCASP), recorda que o artigo 5º da Constituição permite a objeção de consciência, o que impede que qualquer cidadão seja obrigado a fazer algo que vá contra uma convicção sua, seja ela religiosa ou não. O mesmo artigo garante, além disso, a liberdade de crença.

A decisão de Zaracho, segundo Nóbrega, pode ser considerada “um ato de manifesta objeção de consciência por parte do pastor, que, pela sua própria consciência, não quer fazer um casamento que não seja na modalidade que a religião dele prevê”. “Ao mesmo tempo, também é exercício da liberdade de crença, que também está prevista, junto com a objeção de consciência, no artigo quinto, inciso sexto, que faz a proteção não só dos locais de culto, mas também da sua liturgia. Portanto, não pode o Estado interferir na liturgia. Nem mesmo decisão judicial pode obrigar o pastor ou então um padre a fazer um casamento que não seja conforme às suas próprias regras”, esclarece Nóbrega.

Para o especialista, nem sequer a decisão do STF que equiparou a homofobia ao racismo pode deixar alguma dúvida em relação a isso. O Supremo Tribunal Federal aprovou a tese fazendo a ressalva de que a repressão penal não alcançaria nem restringiria o exercício da liberdade religiosa”, diz.

Além disso, segundo Nóbrega, Zaracho “não teria necessidade de manifestar que se trata de um motivo religioso ou não”. “Até porque a pessoa que busca um prestador de serviço, que busca alguém para fazer essa celebração do casamento, vai querer saber do histórico do prestador, saber quem é, se ele fala bem, se não fala bem etc. Essas duas moças poderiam muito bem ter identificado que ele não apresentava características que coadunassem com aquilo que elas esperavam. E ninguém pode ser obrigado a fazer uma coisa ou deixar de fazer senão em virtude de lei. Uma pessoa não pode ser obrigada a prestar um serviço para o qual ele não está apta e, mais do que isso, que ela não deseja fazer”, explica.

Nayder Rommel, advogado do pastor e mestre em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto
(UFOP), afirma que não há crime porque “o reverendo tem formação para cerimônias entre homem e mulher” e que “atuar de forma diversa seria um exercício profissional sem habilitação – este sim, ilícito penal”.

Para Zaracho, que não injuriou o casal nem emitiu qualquer juízo sobre as duas, tratar o caso como homofobia demonstra uma falta de compreensão sobre como devem funcionar relações comerciais. “Se um fornecedor não satisfaz as minhas expectativas como cliente, procure outro fornecedor e pronto. É uma situação corriqueira da vida. Deparamos o tempo todo com situações assim. Por exemplo, teve uma vez que eu fui procurado por uma colega cerimonialista que falou que um casal estava querendo um celebrante. Depois ela falou: 'Eles pesquisaram bem, viram que você é pastor, e eles não querem'. Eu vou fazer um escândalo? Não, tudo bem. Eles não se identificam, porque sabem que um pastor tem uma linha de como fazer a cerimônia. São coisas corriqueiras."

O pastor pode processar o casal?
Zaracho afirma que há várias razões suficientes para que ele entre com um processo na Justiça contra o casal lésbico; só fará isso, contudo, se for acionado por elas antes.

Ele acha que pode ter havido “difamação, injúria, calúnia e assédio moral e psicológico”. “Embora algumas dessas coisas não tenham sido elas que fizeram, elas foram as autoras ideológicas. Eu recebi uma enxurrada de bullying: falaram de minha roupa, do meu cabelo, da minha forma de falar português [Zaracho é argentino; veio para o Brasil há 14 anos]. Recebi tudo quanto é insulto, xingamento… Eu sei que tenho grandes possibilidades, inclusive contra os meios de comunicação, porque cravaram como se eu já fosse um criminoso”, diz.

O pastor afirma, no entanto, que não pretende optar por esse caminho neste momento. “Não quero gastar meu tempo e energia. Se elas de fato entrarem com um processo, aí sim nós vamos partir para o contra-ataque. Neste caso, está claro que a vítima sou eu. Não fui eu que procurei os meios massivos de comunicação, não fui eu que printei e divulguei conversa privada e não fui que insultei e xinguei alguém”, diz o pastor.

Tadeu Nóbrega diz que, para avaliar a possibilidade de ganho de causa para Zaracho, seria necessário "olhar caso a caso as ofensas que foram praticadas contra ele e a forma como os fatos foram divulgados". "Conforme for, pode haver, inclusive, responsabilização criminal por crime contra a honra, ou, já na esfera cível, é possível que tenha a configuração de dano moral em relação ao pastor”, diz.

 Leonardo Desideri - Vida e Cidadania - Gazeta do Povo


sexta-feira, 8 de julho de 2022

A Bíblia e a prática homossexual - VOZES

Gazeta do Povo - Franklin Ferreira

O livro A Bíblia e a prática homossexual: textos e hermenêutica, publicado em 2021 por Edições Vida Nova, se tornou obra de referência na área – talvez o livro acadêmico recente mais importante sobre o tema. Nesse livro, publicado originalmente em 2001 nos Estados Unidos, o autor trabalha com base nas culturas do mundo antigo e na exegese dos textos bíblicos do Antigo e Novo Testamento para mostrar que tanto a ética bíblica quanto das culturas antigas que orbitaram em torno do mundo bíblico condenam a prática homossexual.

“A destruição de Sodoma e Gomorra”, pintura de John Martin (1852).| Foto: Wikimedia Commons/Domínio público

Segundo dados compilados em 2019, num levantamento inédito do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 94,8% dos entrevistados se afirmaram heterossexuais. Outros 1,2% disseram ser homossexuais e 0,7% bissexuais. Já 1,1% não sabia responder e 0,1% mencionou outra orientação sexual, como assexual ou pansexual
Além disso, 2,3% não quiseram identificar por qual gênero ou sexo se sentiam atraídas. 
E a fatia da população que se identifica como homossexual ou bissexual também é maior conforme o aumento da escolaridade e da renda. 
No período analisado, o Brasil tinha 159,2 milhões de cidadãos maiores de idade. Diante desses números, a obra indicada se torna ainda mais relevante para os cristãos brasileiros.
 
O testemunho do Antigo Testamento                                               Dividida em cinco partes, a obra começa analisando como as diversas sociedades e culturas no período do Antigo Testamento entendiam a questão homossexual
Sua análise cobre a Mesopotâmia, o Egito e o império hitita. 
Gagnon chega à conclusão de que o intercurso homossexual acontecia em algumas situações, das quais se destacam: em primeiro lugar, tendo por objetivo a dominação, ou seja, o homem tinha o papel ativo na relação, e geralmente o fazia como símbolo de humilhação e subjugação do outro; em segundo, em relações homoeróticas no contexto do serviço dos prostitutos cultuais, que aconteciam como forma de adoração aos deuses pagãos.
 
Outro ponto destacado pelo autor é o fato de as leis mesoassírias considerarem que um homem se deitar com outro homem era um ato intrinsecamente degradante para aquele que era penetrado
Nesse sentido, ele mostra que o estupro homossexual tinha como penalidade a castração, ou seja, eles enxergavam o intercurso homossexual de forma tão degradante que aquele que cometeu o estupro era castrado como punição
Por outro lado, seria possível que tais leis permitissem o estupro homossexual de um homem de condição social inferior ou de um homem que não pertencesse ao clã ou à aldeia do estuprador, o que faz com que a penalidade aplicada ao estupro homossexual se destinasse somente aos casos em que o estuprado fosse do mesmo clã ou aldeia, ou fosse de uma posição social igual à do estuprador. Tudo isso demonstrava que as relações homossexuais não eram tidas como normais, ou como uma das maneiras de expressar sexualidade – muito pelo contrário.

Quando Deus diz que “não é bom que o homem esteja só”, Ele não soluciona a questão considerando os animais adequados para o papel, nem criando outro homem, uma réplica do primeiro, mas criando um ser complementar de uma parte do próprio corpo de Adão

Além da questão contextual e cultural, Gagnon passa a analisar o texto bíblico do Antigo Testamento. Uma das primeiras passagens bíblicas abordadas é a história de Sodoma e Gomorra, registrada em Gênesis 19,4-11. 
 Ele demonstra que uma das características da pecaminosidade de Sodoma e Gomorra era a prática homossexual, evidenciada no desejo dos homens daquela região de abusarem dos visitantes na casa de Ló. 
O autor desmonta o argumento de que o pecado que levou à destruição das cidades foi o fato de deixarem de proporcionar justiça social ou falta de hospitalidade, mostrando que vários textos, tanto pseudepígrafos quanto Judas 7 e 2Pedro 2,6-10, ligam o pecado de Sodoma a desejos ávidos de imoralidade sexual. Além de Sodoma e Gomorra, o autor também analisa as passagens de Gênesis 9,20-27, Juízes 19,22-25, Levítico 18,22 e 20,13.

O cerne da análise dos textos do Antigo Testamento está no trecho em que o autor esmiuça o texto de Gênesis 1–3, que fala da criação, mostrando que Deus cria homem e mulher como seres complementares. Segundo ele, quando Deus diz que “não é bom que o homem esteja só”, Ele não soluciona a questão considerando os animais adequados para o papel, nem criando outro homem, uma réplica do primeiro, mas criando um ser complementar de uma parte do próprio corpo de Adão. E ele afirma: “Somente um ser feito a partir do homem deve se tornar alguém com quem o homem anseia se unir em intercurso sexual e casamento, uma união que não somente proporciona companheirismo, mas restaura o homem a sua totalidade original”.

O intercurso homossexual como prática “contrária à natureza” no judaísmo primitivo

A segunda parte é uma introdução histórico-cultural para a análise dos textos do Novo TestamentoAqui o autor se detém no judaísmo e na cultura greco-romana, cobrindo o período entre 200 a.C. e 200 d.C. As obras mais relevantes do período, que o autor analisa, são as de Filo e Josefo. Filo foi um filósofo judeu de Alexandria, no Egito, que viveu entre cerca de 10 a.C. e 45 d.C.; Josefo foi um sacerdote judeu, general e historiador, que viveu entre cerca de 37 e 100 d.C. De acordo com esses escritos, o judaísmo primitivo foi unânime em sua rejeição da conduta homossexual. Não se tem conhecimento de nenhuma voz dissonante.
 

Gagnon aponta que os judeus, à semelhança dos críticos gregos e romanos do intercurso homossexual, rejeitavam a conduta homossexual com base no fato de que era “contrária à natureza”.  

Além do fato óbvio e central de que a lei proibia o intercurso homossexual, havia quatro motivos pelos quais somente o intercurso entre homem e mulher era considerado “de acordo com a natureza” ou “natural”: Em primeiro lugar, o intercurso homossexual é incapaz de levar à procriação; em segundo, o intercurso homossexual, ao unir dois seres sexuais não complementares, representaria uma afronta à identidade sexual que Deus deu a homens e mulheres; em terceiro, o desejo homoerótico constituiria um excesso da paixão; e em quarto, o intercurso homossexual não seria praticado nem mesmo por animais. 

Expandindo o conceito citado no segundo motivo, sobre a descomplementaridade de gênero, o autor afirma: “Na prática, o homem penetrado voluntariamente está se queixando da natureza por não lhe ter proporcionado uma vagina. Na cultura imperial helenística e romana, ‘o parceiro passivo’ em um relacionamento homoerótico, seja por sua própria iniciativa, seja por incentivo ou coação do ‘parceiro ativo’, levava o processo de feminização um passo adiante, fazendo tranças no cabelo, enfeitando-o ou deixando-o crescer, maquiando-se e perfumando-se, adotando maneirismos femininos, usando roupas femininas, arrancando pelos faciais e do corpo ou (em casos extremos) submetendo-se à castração”.

[Por se tratar de uma matéria longa, será publicada na integra, em partes.
A presente matéria também pode ser lida, desde já,  na íntegra, clicando aqui.

Para propiciar aos nossos leitores uma visão Católica, sugerimos clicar aqui, quando também terão a citação de trechos bíblicos, notadamente, do Apóstolo São Paulo e links para outras publicações.]


quinta-feira, 19 de maio de 2022

Casamento-ostentação de Lula implode o fetiche pobrista da militância gourmet - Gazeta do Povo

Madeleine Lacsko

Culpa burguesa

Depois de dizer que a classe média ostenta porque tem duas televisões em casa, luloafetivos precisam dizer que R$ 100 mil em bebida não é ostentação.

"O povo gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual", cravou o inesquecível carnavalesco Joãosinho Trinta, famoso pelos desfiles-ostentação. Reside nessa diferença um grande drama do PT. Enquanto os trabalhadores que formam o partido querem melhorar de vida e desfrutar de luxo e conforto, os intelectuais do partido idolatram a pobreza e cultivam internamente a culpa burguesa.

O casamento-ostentação de Lula colocou esses dois mundos em choque. Ele é um homem milionário que gosta de luxo e jamais escondeu isso de ninguém.                                                     Ocorre que a militância do PT se esvaiu.                       Desapareceram os trabalhadores, sindicalistas, comunidades eclesiais de base. Os mais ruidosos são a militância gourmet, que tem o fetiche do pobrismo. Para esses, o casamento-ostentação virou um drama e foi preciso culpar a imprensa.

O contorcionismo intelectual para lidar com a culpa burguesa mas permitir o justo gosto de Lula por luxo contaminou até a imprensa. Uma tese muito interessante girou em torno do vinho de R$ 90. Ele é caro sim e é impossível para a maioria dos brasileiros. Mas o fetiche pobrista não pode admitir que Lula seja Lula, que goste de coisa cara mesmo e tudo bem. Foi preciso dizer que a imprensa queria um casamento com "coisas de pobre", tipo Itaipava latão.

Como filha de sindicalista do ABC da década de 1980, eu adoro luxo igualzinho a Lula. Se puder, eu quero mesmo. Fosse eu com 76 anos casando com alguém 20 anos mais novo, eu descia de paraquedas embrulhada em diamantes já bêbada de champagne Cristal. Ia ser a cafonalha mais cara que o país já viu. A diferença é que eu não fico chamando de esbanjador quem tem duas televisões em casa.

O falecido Hélio Bicudo toca num ponto que intriga muita gente: a origem da fortuna de Lula. Os luloafetivos argumentam que ele fez esse dinheiro com palestras, conta que só fecha na cabeça de quem tem as próprias contas pagas por papai. 
É um porte de fortuna que não foi construída nem por políticos como Paulo Maluf, que começou a vida indo para a faculdade a bordo de uma Mercedes Benz própria e depois teve todos os problemas que sabemos.

Provavelmente Lula tem uma explicação lógica para a origem de sua fortuna. Infelizmente, apesar de tanto carnaval, ninguém teve competência para esquadrinhar isso. Já ouvi todas as desculpinhas mequetrefes de gente com estabilidade vitalícia e salários nababescos sobre manobras de políticos para se safar. É uma tarefa que não admite erro nem vaidade, simples assim. Dar entrevista condenando corrupção e dar desculpa é muito mais fácil que dar resultado. Tem quem aceite.

A verdade é que o Lula rico com hábitos de elite existe há mais de 20 anos e nunca viu problema nisso. Aliás, duvido que algum pobre raiz veja problema nisso. Quem vê problema e fica com vergonha do gosto de Lula pelo luxo é a militância gourmet luloafetiva. Ela projeta a própria culpa burguesa nele. É o pessoal que paga uma fortuna para se vestir igual mendigo e vive pregando justiça social em Santa Cecília.

No documentário Entreatos, feito durante a primeira campanha vitoriosa de Lula à presidência, já se via o homem de gosto refinado e hábitos de elite. Isso foi antes de chegar ao poder, não depois e com palestras. Numa cena icônica em que prova um terno maravilhoso sob medida com Ricardo Almeida, ele ouve de Vicentinho que tinha saudades da época de metalúrgico.

Lula fica revoltado. E com razão. É hipocrisia dizer que tem saudades de usar um macacão que secou atrás da geladeira quando se está vestindo um Ricardo Almeida lã super 180 sob medida. Uma outra cena do filme mostra que Lula sabe muito bem escolher comida. Ele está num jatinho comendo o serviço de catering e manda devolver porque está ruim. Palocci não percebeu e come.

Como eu sou filha de pobre, já fiz de tudo. No departamento de marketing da holding da CCR, eu cuidava dos eventos. Era uma empresa das empreiteiras durante os governos Dilma e Sérgio Cabral. Sei bem o que esse povo come e bebe. Não entendi a escolha do buffet de Lula até anunciarem a transmissão ao vivo. Explico: não é comida e bebida no padrão de luxo que esse pessoal está acostumado, mas tem a estrutura sensacional de lives da Faria Lima.

O buffet é de luxo, não se enganem. Eles fazem o catering de grandes empresas ali e também no Club Med, em casamentos feitos no Lake Paradise e em Trancoso. Ocorre que o padrão de luxo dos nossos políticos é muito acima até do luxo do nosso empresariado. Sempre você tem de trazer algo de fora ou pedir algo especial e bem mais caro. Foi assim com a lista de Lula, não seria diferente.

Rolei de rir com o contorcionismo do pessoal falando do vinho de R$ 90 e dizendo que não é caro porque no mercado tal você compra um vinho muito mais caro. Coisa de pobre remediado que tem culpa burguesa. Eita, cafonalha, me dá até alergia. Não tem vinho de mercado nesses lugares e o preço de coisas melhores é mais baixo porque vem no atacado. Lula e Janja quiseram um upgrade do serviço que já é de luxo.

Qual o problema de Lula querer gastar R$ 100 mil em bebidas, achar que um dos serviços mais luxuosos do Brasil era pouco e pedir um upgrade? Para mim nenhum, eu não tenho culpa burguesa, sou liberal e amo luxo. Mas o luloafetivo pobrista quer morrer de catapora. Ele precisa imaginar um Lula também pobrista, que nunca existiu. Campanha sem projeto é isso: você estimula a imaginação do fanático. Quem quer um cheque em branco precisa ser uma tela em branco.

Uma biografia antiga de Lula, feita por Denise Paraná, conta a história do segundo casamento dele, com Marisa Leticia. Este foi uma espécie de "Vale a Pena Ver de Novo". Mais uma vez era coisa bem menos luxuosa do que ele queria mas feita num contexto em que as pessoas acham aquilo super luxuoso porque ninguém tem dinheiro.

Estamos numa crise econômica, com preços altíssimos de combustíveis, o maior nível de calote em conta de luz do país, mais expectativa de aumentos, uma guerra mobilizando a Europa. 
Pagar R$ 90 numa garrafa de vinho num país em que você já é rico com salário de R$ 5 mil é ostentar. 
E aqui não falamos em uma garrafa, mas num preço médio de garrafa maior do que o preço médio de um buffet de luxo da Faria Lima. Até aí, coisa de rico.

Ocorre que Lula conhece sua nova militância gourmet. Dia desses, fez discurso falando de "racismo estrutural". E obviamente botou o dedo na ferida que movimenta bilhões na publicidade com o identitarismo, a culpa burguesa. Foi lá simplificar o "eu odeio a classe média" da Marilena Chauí numa versão que veta mais de um aparelho de tevê por família:

Qual foi o bug na cabeça do militante gourmet que tem fetiche pobrista?                                                                                           Ele estava muito feliz até ontem dizendo que a elite brasileira é escravista e que a classe média gasta demais porque tem duas televisões. Condenar o outro é uma forma de fingir não ser parte dessa elite e aplacar a culpa burguesa. Daí ele precisa defender os luxos de Lula, que ontem mesmo mandou ser pobre. Se for fanático, será capacho o suficiente para fazer as duas coisas e ainda se achar virtuoso.

Agora, a militância gourmet vai precisar decidir se virou liberal ou se vai continuar com o fetiche pobrista. Ou a classe média esbanja e ostenta ou vinho de R$ 90 é barato e cada um compra o que quer com seu dinheiro. Eu sempre fui da segunda turma, do cada um faz o que quer com seu dinheiro. Mas entendo a dificuldade de quem até ontem defendia que o Elon Musk acabasse com a fome no mundo.

Eu, sinceramente preferia que o pessoal virasse liberal e começasse a gastar o dinheiro com comida e roupa que não sejam do fetiche pobrista. Ninguém aguenta mais esse povo pagando fortunas por coisas xexelentas para aplacar a culpa burguesa. Umas roupas que ninguém entende, bolsa de lacre de lata de refrigerante, uns cabelos esquisitos e esses desodorantes naturais que - vamos lançar a verdade - não desodorizam sovaco nenhum. Eu não tenho mais paciência.

Para finalizar, deixo aqui para vocês a prova cabal de que pessoas de origem pobre aproveitam a ostentação sem culpa e ainda dividem com os irmãos. Meu convidado preferido do casamento foi o sensacional Paulo Vieira. Fez amizade com o garçom e levou uma caixa inteira de doces embora. Distribuiu para a imprensa. Confesso que me identifiquei. Só estranhei que não levou nenhum arranjo de mesa para botar em casa. Eu teria levado pelo menos um par.

Madeleine Lacsko, colunista - Gazeta do Povo - VOZES