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domingo, 25 de setembro de 2022

Divagações sobre abstenção e “voto envergonhado” - Alon Feuerwerker

   Análise Política

Eleição é época de números, com candidatos, aliados e apoiadores espremendo as estatísticas para saber quem vai ganhar, se vai ter segundo turno etc. Mas também é tempo de especulação e pensamento mágico, boato, rumor, paranoia. Na temporada eleitoral, o objetivo convive bem com o subjetivo. Leva vantagem quem consegue, ele próprio, manter o máximo de objetividade enquanto surfa na subjetividade alheia.

Por falar em números, o dado ainda largamente incerto deste primeiro turno é o comparecimento. Nas últimas três décadas, tem girado em torno de 80%. Se à abstenção adicionarmos os brancos e nulos, o não voto em candidatos nas presidenciais costuma rondar os 30%. Tem aí um ruído em relação às atuais pesquisas, especialmente as estimuladas, em que indecisos, não sabe, não respondeu, nenhum, brancos e nulos não passam de 10%.

Pesquisas no Brasil costumam ser feitas com amostras que procuram expressar o total do eleitorado. Como nelas o não voto em candidatos é sistematicamente subestimado, a pesquisa estimulada acaba superestimando a projeção de apoio aos disputantes.  
O que não seria problema se impactasse igualmente todos os corredores.  
Mas nem sempre é assim. Vamos ver o que acontece neste agitado 2022.

A pesquisa estimulada superestimar o apoio aos candidatos traz subsídios para outra discussão, sobre haver ou não uma quantidade estatisticamente relevante de um certo “voto envergonhado”. Ou seja, o entrevistado despistar nas pesquisas por vergonha de sua opção eleitoral, [tipo votar em um ladrão = além da apologia ao crime, via ode ao criminoso, ainda deixa o eleitor coma sensação de que é um babaca.]  deixando para manifestar-se apenas no escurinho metafórico da cabine de votação. Uma hipótese que alimenta sonhos e temores, dependendo do lado da disputa.

Há, porém, um paradoxo matemático na premissa de haver “votos envergonhados” em número estatisticamente relevante.

Qual é a atitude esperada de alguém com essa tendência?
A dissimulação, o despiste. É altamente improvável que, só para disfarçar sua escolha, um eleitor envergonhado de Jair Bolsonaro responda na pesquisa estimulada “vou votar em Luiz Inácio Lula da Silva”. Mais razoável será ele dizer que está indeciso, que não quer responder, que não quer nenhum, que vai votar em branco ou nulo. E a mesma lógica aplica-se ao eventual eleitor envergonhado de Lula.

Ora, mas se 1) há quantidade estatisticamente relevante de votos envergonhados e 2) a tendência do eleitor envergonhado é despistar, então o não voto em candidatos (indecisos, não sabe, não respondeu, nenhum, brancos e nulos) deveria nas pesquisas estar superestimado, e não subestimado. A série histórica mostra exatamente o contrário: muita gente diz nas pesquisas que vai votar em alguém, mas na hora h não vota em ninguém.

E ainda sobre o efeito da abstenção no próximo domingo, se vai ser neutra ou ajudar um dos lados. No cruzamento das respostas, a diferença entre Lula e Bolsonaro cai quando se expurga quem não votou em 2018. O que concluir? Na hipótese favorável a Bolsonaro, tem gente dizendo que vai votar em Lula, mas na hora nem vai comparecer. Na hipótese favorável a Lula, tem gente que não votou há quatro anos e agora vai votar nele.

Assim como no próximo domingo, você decide no que prefere acreditar. 

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

 

sexta-feira, 3 de julho de 2020

Enfermeiros: Conheça heróis por trás da máscara no combate à covid-19

Conheça histórias de enfermeiros que lutam contra o avanço da pandemia nos hospitais da cidade. O desabafo é da profissional de saúde Lúcia Henrique: "É um vírus que nos rouba tudo, até os afetos"

“Todos nós, colegas de profissão, deixamos diariamente o amor da nossa vida para cuidar do amor da vida de alguém. Quando um de nós morre, ele deixa uma marca para a história da enfermagem, pois foi um guerreiro na luta contra essa doença”. A homenagem feita por Lucas Borges, 25 anos, enfermeiro do hospital de campanha e da UTI montada na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Núcleo Bandeirante aos colegas de trabalho que perderam a vida durante a pandemia. Segundo os últimos dados da Secretaria de Economia, responsável pelo quadro de pessoal, o número de contágio entre os profissionais da saúde é crescente. Em março, foram registradas 24 licenças em relação à doença. No mês de abril, elas passaram para 235 e, em maio, o número mais que dobrou, atingindo 560 licenças relacionadas à covid-19.
Apesar da distância, a família e amigos da enfermeira Wendy a fizeram restabelecer suas forças (foto: Minervino Júnior/CB/D.A Press)

Para Lucas, o temor de contaminar alguém que ama é maior do que o temor pela própria vida. “Somos seres humanos, claro, temos medo de morrer, mas posso dizer por todos colegas que tememos mais pela vida de quem amamos”O enfermeiro que atua em duas UTIs públicas assiste dezenas de pacientes acometidos pela doença, o risco da contaminação é alto e diário.



As centenas de vidas perdidas diariamente surpreendem até o mais calejado profissional. “Aprendemos a lidar com a morte desde o primeiro dia de faculdade, mas essa doença nos choca por levar vidas jovens, pessoas que teriam 40, 50 anos de vida pela frente. Poderia ser um de nós, um de nossos amigos”, lamenta Lucas. O aprendizado é “valorizar cada momento, abraços e contato com quem amamos, tudo pode mudar muito rápido”.

A árdua batalha coloca à prova mente, coração e corpo, por horas a fio. Dedicando-se ao cuidado dos doentes, a enfermeira Yasmin Melo, 25, tem jornada dupla e exaustiva. “De manhã, trabalho no atendimento de um hospital de referência e, à noite, subo a bordo da ambulância e transporto dezenas de contaminados, fazendo a remoção para um ou outro hospital”.

Desafios

O amor à profissão é o que leva Yasmin a encarar os riscos e voltar para casa cansada com cerca de 90 horas trabalhadas semanalmente, mas feliz. “Não fazemos pelo reconhecimento, nem dinheiro. A sensação de ver nos olhos do paciente que ele confia em mim e no meu cuidado é o que vale todos os esforços, todo sacrifício de dividir a casa com a minha família sem ter contato com ninguém”, conta. Os desafios são muitos, um inimigo quase desconhecido, o grande número de contaminados e a gravidade da doença foram empurrados para as mãos de Bárbara Jorba, 23, em sua primeira experiência profissional. “Tenho apenas sete meses de formação e essa realidade tem sido um desafio diário, pessoal e profissional”.

Bárbara atua na Unidade Básica de Saúde — UBS 5 de Taguatinga e é residente de Atenção Básica pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A jovem profissional encara as adversidades com otimismo. “Penso que posso fazer a diferença na vida do paciente, também me inspiro nos demais profissionais que dedicam a vida ao trabalho. Mesmo que custe o convívio com minha família, pois fico a maior parte do tempo isolada no meu quarto”, conta a jovem enfermeira.

O medo que inunda os pensamentos são um martírio enfrentado a cada novo dia de trabalho. Jéssica Gomes trabalha na UTI Pediátrica do Hospital de Brasília e diz que até o profissional mais capacitado cai em ciladas da mente. “Às vezes, ficamos com tanto medo que até anulamos o nosso conhecimento sobre os meios de contágio. Pode até acontecer a paranoia de ficar pensando que pode ter se contaminado a cada minuto”, conta.

O medo de ficar doente e de contaminar os familiares fez com que Jéssica optasse por se hospedar em um hotel custeado pelo hospital em que trabalha. “Quem atua com pacientes contaminados teve a opção de ir. Eu fiquei um mês em isolamento neste hotel e só saí de lá quando deixei de atender os pacientes com covid, nos trouxe mais segurança”.

Angústia

“Um pesadelo, uma sensação de impotência, de ter falhado. Eu me perguntei onde eu errei, onde me contaminei, em qual processo eu falhei. Foram 14 dias longe do meu trabalho, pessoas doentes desamparadas e eu de braços cruzados”. Foi colocando a vida dos outros à frente da sua que Wendy Carvalho, 29, mesmo doente culpou-se por estar longe de seus pacientes da UTI do Hospital Regional de Samambaia.

Apesar da distância, a família e amigos de Wendy a fizeram restabelecer suas forças. “Fiquei isolada, mas perto de todos pelas ligações e vídeos. Sem eles, seria impossível sair bem dessa. Tenho aprendido que a família é o nosso bem mais precioso, aprendi que nós, da saúde, não somos heróis, somos humanos e temos fragilidade e precisamos ser cuidados, além de cuidar”, diz a enfermeira.

Um diagnóstico positivo também mexeu com Lúcia Henrique, 49, enfermeira da Emergência Pediátrica do Hospital Materno Infantil de Brasília (HMIB). “Recentemente, fui acometida pelo vírus e isto me impediu de trabalhar por alguns dias, e hoje, mais do que tudo, quero continuar nesse campo de batalha, pois tenho fé que, em breve, teremos vacinas disponíveis para combater este vírus que tanto nos assusta”, acredita.



A ansiedade por uma resposta é o que tem tirado a paz da enfermeira Talita Freitas, 22, afastada do seu posto na UBS 3 de Samambaia após sentir sintomas da doença. “A gente volta todos os dias para casa sem saber se trouxe o vírus junto. Senti alguns sintomas e fui afastada até que saiam os resultados. É complicado não ter certeza sobre nada”, conta.

A solidão é a pior parte na luta de quem se contamina, Talita diz encontrar afago na companhia do esposo, mas sente falta da família. “Se eu tivesse doente com qualquer outra coisa, teria os cuidados da minha mãe e o apoio da família. Eu chego a me emocionar pelo isolamento e solidão a qual esse vírus nos coloca”, lamenta a profissional.

DepoimentosAs dolorosas experiências vivenciadas pela equipe de saúde, no intento de salvar o paciente, marca a história e o coração destes bravos profissionais. Eles relembraram episódios que mexeram com suas crenças e emoções.

Wendy Carvalho“Um paciente que atendemos como cardíaco ficou grave, passou por reabordagens e hemodiálise. Após muita luta e cuidado, recebeu alta, estava bem, finalmente. A família ficou muito feliz e nós, também. Dias depois a alta, recebemos a notícia que ele tinha ido a óbito por covid, foi muito frustrante.”
Lucas Borges“Recentemente, tivemos um paciente de 28 anos, internado 49 dias, dos quais 29, intubado. Ele passou por todo tipo de procedimento, até traqueostomia, sintomas muito agravados. Ele, agora, está em casa, bem e recuperado. Marcou toda a equipe da UPA e a mim, deixou marcas de felicidade. Ali é onde vemos o reflexo do nosso esforço, é o que nos dá gás para continuar adiante salvando vidas.”
Talita Freitas“Pacientes nos marcam sempre, mas lembro de uma paciente grávida que a mãe e padrasto estavam sendo transferidos em estado grave. Ela fez o teste e deu positivo, começou a chorar e eu, junto. Lembro-me da expressão do rosto e olhar daquela grávida preocupada com seu bebê. Eu sequer pude dar um abraço, o apoio emocional que ela tanto precisava naquele momento.”

Yasmin Melo“Estávamos removendo um paciente intubado. No meio do caminho, ele acordou da sedação. Normalmente, as pessoas tentam de todas as formas se livrar desses acessos, ele não. Permaneceu tranquilo até ser atendido no hospital de destino. Fiz questão de conversar para mantê-lo calmo e, mesmo mal, ele respondia fazendo um joia com a mão. Senti nos olhos dele de que ele estava confiando em nós e na sua melhora.”
Lúcia Henrique“Um garotinho de 7 anos foi conduzido ao isolamento por suspeita da doença. Após ficar sob os cuidados da equipe, ele me perguntou, ‘tia, eu vou morrer de covid?’. Confesso que meu coração reagiu com taquicardia e os olhos marejaram. ‘Não, você nasceu para vencer’, foi o que respondi. Temos de vencer a cada dia de trabalho para dar sempre o melhor aos nossos pequeninos.”
Jéssica Gomes“Uma paciente em remissão do câncer que voltou para ser atendida com covid me marcou, pois o seu otimismo era contagiante. Ela fazia questão de nos deixar bem, pois sabia que nossa rotina é estressante e exaustiva. Assim, a gente lembra de que cuidamos e que podemos ser cuidados.”


 - Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira

Correio Braziliense


sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Bolsonaro diz que ex-assessor estaria envolvido em plano para assassiná-lo - VEJA

Em entrevista exclusiva a VEJA, presidente faz balanço do primeiro ano do governo e projeto 'chapa imbatível' com Moro

Por Policarpo Junior, Marcela Mattos 
 
CONSPIRATA - Segundo ele, um ex-assessor estaria envolvido no atentado a faca, que deixou cicatrizes Cristiano Mariz/VEJA
 
No sábado 14, Jair Bolsonaro acordou por volta das 2 da manhã. Ainda na cama, trocou mensagens pelo celular com o almirante Antonio Barra, o atual diretor da Anvisa. O assunto era irrelevante. Depois, o presidente, que sofre de insônia, dormiu novamente. Às 4 horas, despertou em definitivo, pegou outra vez o telefone e repassou a vários ministros uma análise sobre a situação da Argentina. Até amanhecer, Bolsonaro navegou por redes sociais, divertiu-se vendo memes que circularam sobre ele e a família, falou com a primeira-dama, que estava em viagem ao exterior, e recebeu de assessores um panorama sobre os últimos acontecimentos. O diagnóstico era que não havia nada de anormal, nenhuma turbulência à vista, coisa rara desde o início do governo. O presidente tinha agendado para logo cedo um encontro com VEJA no Palácio da Alvorada.

O presidente vive cercado por seguranças, as instalações do palácio são vigiadas por militares do Exército e, ainda assim, ele não se sente totalmente seguro. Teme ser alvo de um novo atentado. “A gente contraria o interesse de muita gente”, justifica. Bolsonaro revela que, por precaução, dorme com uma pistola carregada ao alcance da mão. “E ainda tem outras arminhas que ficam guardadas por aí”, diz. Tamanha preocupação, segundo o presidente, não é fruto de paranoia. Até hoje ele não engole a versão de que o atentado a faca que sofreu durante a campanha foi obra exclusiva de um desequilibrado mental. “Houve uma conspiração”, afirma. Provas, ele não tem, mas sua teoria agora conta com mais um ingrediente intrigante (e provavelmente falso). Bolsonaro acredita que, além do ex-garçom Adélio Bispo dos Santos de Oliveira, autor da facada, uma figura do seu staff de campanha estaria envolvida de alguma forma no plano para matá-lo. O presidente não revela a quem se refere, mas, ao longo da entrevista, vai fornecendo detalhes que apontam para um ex-ministro. O motivo da traição seria uma vingança por ele não ter escolhido o ex-assessor como candidato a vice.
“O meu sentimento é que esse atentado teve a mão de 70% da esquerda, 20% de quem estava do meu lado e 10% de outros interesses. Tinha uma pessoa do meu lado que queria ser vice. O cara detonava todas as pessoas com quem eu conversava. Liguei para convidar o Mourão às 5 da manhã do dia em que terminava o prazo de inscrição. Se ele não tivesse atendido, o vice seria essa pessoa. Depois disso, eu passei a valer alguns milhões deitado.”






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