Gazeta do Povo - VOZES
O que aconteceu nesse fim de semana, com o Tribunal Superior Eleitoral
sendo chamado a interferir em suposta propaganda eleitoral fora de
época, num festival de música, é apenas uma pequena amostra do que deve
acontecer neste ano, até a liberação da campanha, em 15 de agosto.
Imagino que o TSE não vai conseguir atender a tanta reclamação, com base
no emaranhado de leis que enredam as eleições brasileiras. [Pelo que tem sido visto em termos de empenho do TSE, nitidamente contra o presidente Bolsonaro, havendo sobrecarga de processos serão priorizados os que resultem em decisões contrárias ao capitão.]
Há o Código Eleitoral, leis complementares, leis ordinárias e uma série interminável de leis casuísticas, [interpretações adaptadas] feitas sob medida para cada período eleitoral, além das resoluções e atos dos tribunais eleitorais. É um quebra-cabeça supostamente para dar igualdade de oportunidade a todos os candidatos - o que é uma utopia.
Teoricamente, a propaganda eleitoral só pode começar em 15 de agosto, mas isso é uma hipocrisia, porque de fato ela começou na noite de 28 de outubro de 2018, quando foi conhecido o vencedor do segundo turno na eleição presidencial. Desde então, tudo está embebido de propaganda eleitoral.
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A pandemia teve mais conteúdo de propaganda eleitoral que de coronavírus. A CPI da Covid no Senado foi pura campanha eleitoral. Boa parte da mídia está em campanha eleitoral desde que precisou noticiar o nome do novo presidente. Até agora ninguém reclamou da propaganda fora de época, travestida de notícia. Na verdade, quem percebeu é o leitor, o ouvinte, o telespectador, como se nota nas quedas de audiência.
Penso que assim que deveria ser. Não precisamos de tutores, a proibir e a censurar, a decidir o que podemos ou não podemos ler, ver ou ouvir. Temos discernimento para separar propaganda de notícia, boato e fato - e um smartphone para conferir. Mas, aí, o nosso smartphone também pode ser censurado, se quisermos participar da campanha, ou se usarmos plataformas malvistas pela autoridade tutelar da eleição.
Lembro-me bem das campanhas em que se jogavam de aviões panfletos com denúncias, difamações, acusações. Voto desde 3 de outubro de 1960; já fui mesário e sou, sobretudo, eleitor, o mandante que transfere o seu poder para um mandatário. Meus candidatos ganharam e perderam eleições, mas nunca julguei que alguém devesse ser proibido de fazer propaganda de algum candidato, seja ele quem for. Mesmo porque a proibição é inútil. E deixa a impressão de que o estado está cada vez mais avançando em nossas liberdades, no velho sonho de tornar-se o Leviatã.
Discutem-se filigranas, como a definição de propaganda eleitoral. Seria apenas pedir voto para alguém, ou pedir que não vote em alguém. Mas há mil formas de fazer isso. É muito subjetivo. Citar um nome já é, de fato, fazer propaganda. No fundo esses controles, como vimos durante a pandemia, são formas de nos botar um cabresto, pelo medo. Medo de um vírus ou medo de um juiz que não respeita os direitos fundamentais da Constituição.
Jogam sobre nós a teia de leis que acompanham o calendário desde 1932. As leis tratam de dinheiro de fundos eleitoral e partidário, dos partidos, dos eleitores, dos candidatos, dos prazos, dos gastos, da contabilidade, dos limites, dos honorários advocatícios, dos bens, das redes sociais. Seria bom se tanta lei trouxesse mais transparência às apurações. [algo do tipo do registro do voto impresso = voto auditável ≠ voto em cédulas de papel.]
Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES