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sexta-feira, 21 de abril de 2023

8 de janeiro: o governo é responsável? - Deltan Dallagnol

Gazeta do Povo - Vozes

Uma imagem vale mais do que mil palavras; um vídeo, milhões delas. Especialmente um vídeo que foi escondido a sete chaves da população após ser declarado como "sigiloso" pelo governo e que o governo lutava para sepultar junto com a CPMI do dia 8 de janeiro. 
 O vídeo mostrou a verdade, nua, crua e beirando o inacreditável: vias desimpedidas; sem resistência; nenhum cordão de isolamento; abandono de postos; seguranças recuando; agentes calmos; portas sendo abertas; cumprimentos aos invasores; e oferecimento de água mineral. Passividade e complacência.

As imagens de mais de 20 câmeras de segurança, reveladas pela CNN, mostram o tratamento dado pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI) aos invasores no dia 8 de janeiro.  

Os vídeos não deixam margem para interpretação: o governo acolheu aqueles que depois classificou como terroristas e inimigos do Estado Democrático de Direito. O dia 8 de janeiro foi uma escolha do governo.
G Dias era o responsável, por força de lei, por garantir a segurança do Palácio do Planalto.

Quando uma criança se afoga na piscina, na frente de um salva-vidas que fica parado, assistindo, ele se torna responsável pela morte. Embora o crime de homicídio ocorra quando “alguém mata alguém”, a lei criminal torna o salva-vidas autor do crime. Trata-se do crime chamado “crime comissivo por omissão” ou “crime omissivo impróprio”, porque a realização do crime exige um comportamento (“matar alguém”) que é realizado pela omissão, pela inércia. Esse crime só se configura quando quem se omite tinha, por lei ou por contrato, a obrigação de evitar o resultado e podia evitá-lo. Como um salva-vidas tem essa obrigação e o preparo para realizar o salvamento, ele se torna autor do crime de homicídio ao assistir inerte à criança se afogar.

O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) escolhido por Lula e subordinado diretamente a ele, Gonçalves Dias ou GDias, amigo de Lula por mais de duas décadas, tem o apelido de “sombra” de Lula por estar sempre próximo do presidente nos seus deslocamentos no Brasil e no exterior. 

GDias era o responsável, por força de lei, por garantir a segurança do Palácio do Planalto. Quem diz isso, mais uma vez, não sou eu, é a lei. Está no artigo 1º, inciso VI, alínea “c”, do Anexo I do Decreto 11.331, de 1º de janeiro de 2023, baixado pelo próprio Lula! De fato, essa regra estabelece que é competência do GSI “zelar, assegurado o poder de polícia, pela segurança dos palácios presidenciais”. A regra é clara.

    Tão importante quanto a responsabilização dos envolvidos é a absolvição inequívoca dos inocentes.

Além disso, as evidências apontam que o GSI tinha informações sobre a iminente invasão do dia 8 e tinha condições de impedi-la, mas não só se manteve inerte como dispensou reforços para a proteção do Planalto. 
Com efeito, vários veículos de imprensa noticiaram mensagens trocadas, inclusive por integrantes do GSI, que demonstram que eles tinham informações sobre o risco das manifestações. 
Havia postagens nas mídias sociais que pregavam atentados contra as instituições. 
O próprio ministro da Justiça, ao prestar esclarecimentos perante a Câmara dos Deputados, afirmou claramente que foi informado sobre os riscos de manifestações.

No entanto, o GSI dispensou da prontidão, naquele fim de semana, o Batalhão da Guarda Presidencial do Exército, que tinha tropa, treinamento e equipamentos para impedir invasões e vandalismos. “Boa tarde, senhores. O SCP (referindo-se ao secretário de Segurança e Coordenação Presidencial, general Carlos Feitosa Rodrigues) agradece o apoio dos dragões no dia de hoje. Pelotão de Choque pode ser liberado da prontidão”, afirmou o coronel André Garcia, coordenador de segurança do GSI, em mensagem para o Comando Militar do Planalto (CMP).

    As evidências mostram que o GSI tinha conhecimento da iminente invasão, tinha o dever legal de impedi-la e tinha as condições para fazê-lo, mas recuou duas vezes.

Para além da dispensa, os vídeos revelados ontem demonstraram a acolhida generosa dos invasores. 
Às 13 horas do dia 8 se somaram, aos 15 agentes do GSI, 35 policiais do Pelotão de Choque, equipados com balas de borracha, escudos, bombas de gás e cassetetes. 
Ainda assim, e apesar do treinamento e obrigação legal dessas pessoas, a resistência foi nenhuma. 
Dificilmente isso ocorreria sem orientação superior num órgão de treinamento militar. 
Em outros episódios de tentativa de invasão dos prédios dos Três Poderes, a reação e o desfecho foram muito diferentes: os soldados arriscaram suas vidas para cumprir o dever.
 
Desde as jornadas de junho de 2013, manifestantes já tentaram invadir ou invadiram áreas internas e externas do Congresso em ao menos nove oportunidades
Em 2017, diante dos protestos e atos de depredação nas ruas, o presidente Michel Temer convocou as Forças Armadas no Distrito Federal como medida para conter os protestos que tomaram a Esplanada dos Ministérios, em Brasília.

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Em 2016, depois de protestarem em frente ao Palácio do Planalto, os manifestantes que pediam o impeachment da presidente Dilma Rousseff se dirigiram ao Congresso Nacional. De acordo com a Polícia Militar (PM), reuniram-se cerca de 5 mil pessoas. A manifestação começou pacífica, mas houve confronto entre manifestantes, que invadiram os espelhos d'água da Câmara e do Senado. A polícia respondeu com spray de pimenta e bombas de gás lacrimogêneo para retirá-los. Rapidamente, eles foram contidos.

Em 2014, um enorme grupo de invasores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tentou invadir o Supremo Tribunal Federal. Segundo o número informado pela própria segurança do Distrito Federal, eram 20 mil pessoas. No entanto, esses treinados guerrilheiros foram barrados de maneira ágil pela própria guarda do STF e agentes da PM. Eles não conseguiram invadir o Supremo.

    Como no caso do salva-vidas que deixa a pessoa se afogar e é responsável por homicídio, as imagens indicam que o governo é responsável pelo 8 de janeiro.

Em miúdos: as evidências mostram que o GSI tinha conhecimento da iminente invasão, tinha o dever legal de impedi-la e tinha as condições para fazê-lo, mas recuou duas vezes. Primeiro, ao dispensar tropas e, depois, ao acolher os invasores e dar-lhes água em vez de voz de prisão. Como no caso do salva-vidas que deixa a pessoa se afogar e é responsável por homicídio, as imagens indicam que o governo é responsável pelo 8 de janeiro. E havia várias razões para isso: o governo foi o maior beneficiado pelas invasões criminosas.

De fato, fortaleceu-se o discurso de que o governo de Lula, recém-eleito, seria o único “defensor da democracia”, enquanto o governo hipocritamente apoia ditaduras
. A polêmica daquela semana sobre a constrangedora ligação da ministra do Turismo com a milícia foi abafada. Em especial, legitimou-se a criminalização da direita, que foi taxada de “terrorista”, e expandiu-se a restrição à liberdade de expressão.

Não só surgiram evidências da responsabilidade do governo pelo 8 de janeiro como agora está comprovado que ele atuou para ocultar da população as provas dos crimes. Primeiro, o governo negou os vídeos à imprensa e ao Parlamento – alegou-se um sigilo que não existia e agora se sabe o porquê. Segundo, pressionou deputados e senadores para que retirassem assinaturas da CPMI do 8 de janeiro, inclusive com o oferecimento de cargos e de verbas do novo orçamento secreto de Lula que chegam a até R$ 60 milhões. E, em terceiro lugar, o mais grave: mesmo tendo acesso aos vídeos, depoimentos e sabendo o que aconteceu, Lula manteve o ministro do GSI no cargo até ontem.

    O rigor para os agentes do governo federal deve ser o mesmo que foi aplicado aos agentes distritais.


Evidentemente, cabe à Justiça a última palavra sobre a prática de possíveis crimes, inclusive do ex-ministro-chefe do GSI, mas há evidências suficientes que requerem o aprofundamento urgente da investigação. O afastamento de Gonçalves Dias ontem foi uma importante medida, contudo é preciso avançar para apurar a responsabilidade de outras autoridades, como o ministro da Justiça e o próprio Lula, a quem o GSI respondia diretamente e que manteve o ministro no cargo por todo esse tempo.

Tão grave quanto o atentado às instituições, à democracia e ao nosso patrimônio histórico, econômico e cultural é a hipótese que emergiu ontem com força de que o governo permitiu propositalmente o 8 de janeiro para usufruir dos benefícios políticos e de imagem que viriam da posição de “vítima” dos ataques. 
 As imagens indicam que colocaram a politicagem acima dos direitos, da democracia e do patrimônio dos brasileiros. 
É desse tipo de populismo, que também erode a democracia, de que precisamos nos livrar como país. 
É urgente que o Congresso, por meio da CPMI do 8 de janeiro, e a Justiça avancem para esclarecer completamente os fatos. Proteger a democracia é essencial e isso requer responsabilizar todos os envolvidos cuja participação seja efetivamente comprovada, de modo coerente e igualitário, tanto da oposição como do governo.

Nunca é demais reforçar: tão importante quanto a responsabilização dos envolvidos é a absolvição inequívoca dos inocentes, pessoas que sequer depredaram o patrimônio público, e que agora se sabe que até mesmo repreenderam aqueles que praticaram vandalismo e violência, ou que caminhavam na região dos quartéis, mas que mesmo assim foram capturados e colocados no mesmo balaio que os verdadeiros criminosos.  

Uma das três vertentes dos inquéritos do STF sobre os fatos, aliás, é a omissão das autoridades que deveriam ter agido para impedir as invasões. Por conta da sua apontada omissão no dia 8 de janeiro, Anderson Torres está preso e Ibaneis Rocha foi afastado por meses do governo do Distrito Federal.

Apurados os fatos, mediante colheita do depoimento dos agentes do GSI e a análise mais abrangente dos vídeos das câmeras do Planalto, o rigor para os agentes do governo federal deve ser o mesmo que foi aplicado aos agentes distritais. O 8 de janeiro não deve ser tratado de forma partidária, mas sim pela ótica da necessária proteção das democracia, das instituições e do patrimônio brasileiro, doa a quem doer.

Deltan Dallagnol, procurador federal  e deputado federal  - Coluna Gazeta do Povo - VOZES

 

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

Desastre iminente - Rodrigo Constantino

Revista Oeste

É preciso ser muito trouxa, e não só ingênuo, para acreditar no mito do Lula moderado e responsável 

 Ilustração: Shutterstock

Ilustração: Shutterstock 

Não foram poucos os tucanos “liberais” que resolveram fazer o L por nojinho de Bolsonaro, e por acreditar, de forma totalmente patética, que Lula montaria uma equipe econômica mais responsável. É como se a simples presença de Alckmin na chapa fosse suficiente para apagar toda a essência petista da noite para o dia. Essa turma resolveu acreditar na tal “frente ampla”, e já começa a se dar conta da lambança feita.

Um economista tucano, ao publicar um desabafo, ilustra com perfeição o grau de alienação dessa gente. Ele se disse “ingênuo” por acreditar que a equipe econômica teria figuras como Arminio Fraga, Henrique Meirelles ou Persio Arida, em vez de Fernando Haddad e Aloisio Mercadante. Não obstante, ele ainda “espera” bom senso dos escolhidos e torce para que tudo dê certo. Haja ingenuidade! Ficar nessa torcida é fechar os olhos para a experiência e para tudo que economistas sérios aprenderam ao longo do tempo.

O secretário-executivo da Fazenda, apontado por Haddad, o futuro ministro, é um sujeito que nem sequer compreende o conceito de estagflação. Ele acha que uma economia fraca, em queda, jamais poderia conviver com um elevado índice de inflação. Para “pensar” assim é preciso ter ignorado todos os livros decentes sobre o tema, assim como fugir das aulas de história. Mas foi exatamente o que ele disse numa entrevista recente.

Haddad dispensa apresentações. Foi o pior prefeito de São Paulo, um ministro da Educação que teria de melhorar muito para ser apenas medíocre, e um perdedor nas urnas
Acabou premiado por Lula, pois o PT gosta do fracasso e porque Lula quer o controle da chave do cofre, para promover a divisão do butim entre seus comparsas. Não faltam tucanos avaliando que o perfil de Haddad, porém, é “moderado” e que ele é até um reformista.

Para ele, as economias da Argentina e da Venezuela vão mal porque a moeda deles perdeu muito valor, e não o contrário. É como se o rabo balançasse o cachorro

Mercadante era um fiscal do Sarney, um jovem economista empolgado com o congelamento de preços. Todos podem ser idiotas quando mais novos, mas o problema é que Mercadante nunca deu sinais de arrependimento ou aprendizado. Pelo contrário: seguiu a vida toda um defensor do socialismo, da gastança estatal, do “desenvolvimentismo” à la Dilma. 
 Lula achou adequado colocá-lo para comandar o BNDES, o que exigiu até mudança da Lei das Estatais no Congresso. O Brasil voltará a financiar seus companheiros ideológicos latinos, ou seja, o trabalhador brasileiro vai ter de ralar mais para sustentar oligarquias de Cuba, Venezuela ou Honduras.

O único nome mais “técnico” anunciado é para a reforma tributária, mas se trata de um economista obcecado com a ideia do imposto de valor agregado, o que certamente representaria aumento da carga tributária no país e perdas enormes para os setores de varejo e comércio. O próprio Haddad já fala em aumento de tributos, pois essa é e sempre foi a essência socialista: avançar sobre o que os outros produzem, incapazes que são de produzir riquezas por conta própria. É o modelo da pilhagem, que dura até o dinheiro dos outros acabar.

Haddad já fala abertamente em uma moeda comum dos países latino-americanos. Para ele, as economias da Argentina e da Venezuela vão mal porque a moeda deles perdeu muito valor, e não o contrário. É como se o rabo balançasse o cachorro. Unir as moedas de Brasil e desses países quebrados vai apenas acelerar a quebra do próprio Brasil.

Em suma, não corremos o menor risco de dar certo com essa turma e com essa mentalidade. Mas quem poderia de fato esperar algo diferente? É preciso ser muito trouxa, e não só ingênuo, para acreditar no mito do Lula moderado e responsável. Ele jamais deu sinais disso
E, mesmo sem apresentar um plano de governo na campanha, deu vários indícios do que desejava: furar o teto de gastos, revogar a lei trabalhista e voltar com o imposto sindical, parar com as privatizações e regular mídia e redes sociais. Não houve estelionato: Lula confessou os crimes planejados. Mas os tucanos “liberais” preferiam fingir nada ver, pois odeiam Bolsonaro e Paulo Guedes.
 
Se Lula subir mesmo a rampa em janeiro, e essa equipe econômica assumir o controle das finanças públicas, será questão de tempo para os indicadores se deteriorarem de forma muito acentuada. Não é preciso ser profeta ou ter bola de cristal para antecipar esse caos. 
Basta ter acompanhado os rumos de países que seguiram essa cartilha recentemente, como a Argentina, ou ter estudado um pouco de economia na vida. Com a volta do PT ao poder, o desastre é iminente.

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Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste