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domingo, 20 de dezembro de 2020

A grande sabotagem - Nas entrelinhas

Países de dimensões continentais têm inércia de manobra comparada aos grandes navios. Erros estratégicos na economia e nas políticas públicas têm graves consequências

A história universal tem inúmeros exemplos de tragédias humanitárias, causadas por fenômenos geológicos, climáticos, biológicos e/ou decisões políticas equivocadas, às vezes a combinação de duas ou mais causas. Essas tragédias deixam traumas sociais e provocam mudanças culturais e políticas. Uma das calamidades mais devastadoras da humanidade foi a peste negra, entre 1347 e 1351, que matou 50 milhões de pessoas na Europa e na Ásia. Causada por uma bactéria (Yersinia Pestis), a doença foi transmitida ao ser humano por meio das pulgas dos ratos e outros roedores. A peste disseminou o antissemitismo, provocou revoltas camponesas e a Guerra dos 100 Anos, mas, também, deu origem ao Iluminismo, em contraposição às teses místicas que atribuíam a doença ao castigo divino.

Em 1755, o grande terremoto de Lisboa resultou na destruição da capital portuguesa. O número exato de vítimas da tragédia é desconhecido, mas estima-se que pode ter chegado a 90 mil pessoas. Como consequência, o primeiro-ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, precisando de recursos para reconstruir Lisboa, acabou com as capitanias hereditárias no Brasil, transferiu a capital de Salvador para o Rio de Janeiro, criou o Distrito Diamantino, aumentou a cobrança de impostos nas Minas Gerais e fortificou as fronteiras na Amazônia, entre os quais o grande Forte Real do Príncipe da Beira, à margem direita do Guaporé, em Rondônia. Em contrapartida, a “derrama” deflagrou o movimento de Independência, cujo marco histórico foi a Inconfidência Mineira.

Em abril de 1986, um reator da central nuclear de Chernobyl explodiu e liberou uma imensa nuvem radioativa, contaminando pessoas, animais e o meio ambiente de uma vasta extensão da Europa. Na Ucrânia, Belarus e Rússia foram evacuadas e reassentadas 200 mil pessoas. O negacionismo e a censura agravaram a tragédia. Mais de 90 mil pessoas ainda poderão morrer de câncer, causado pela radiação do acidente nuclear. O episódio foi decisivo para Gorbatchov iniciar a glasnost (transparência) e desistir da corrida nuclear, o que acabou com a guerra fria com os Estados Unidos e foi um dos catalisadores do fim da própria União Soviética.

Pandemias e fome
No final da I Guerra Mundial, em 1918, uma pandemia do vírus Influenza se espalhou por quase todo o mundo. A gripe espanhola afetou 50% da população mundial. O número de mortos pode ter chegado a 100 milhões de pessoas. O vírus Influenza A, do subtipo H1N1, matou mais gente do que qualquer outra enfermidade na história e desapareceu tão misteriosamente como surgiu, mas ajudou a acabar com o conflito, provocou grandes reformas urbanas, uma revolução nas pesquisas médicas e nas políticas de saúde pública.

A maior tragédia humanitária do século passado, porém, não teve nada a ver com eventos geológicos, climáticos ou biológicos. Foi fruto do nacionalismo extremado de algumas nações e da ambição de poder de Adolf Hitler. A II Guerra Mundial, entre 1939 e 1945, mobilizou mais de 100 milhões de militares e deixou mais de 70 milhões de mortos. Foi a única vez que armas nucleares foram utilizadas em combate, resultando na morte de mais de 140 mil pessoas no Japão, nos bombardeios feitos pelos Estados Unidos nas cidades de Hiroshima e Nagasaki. Além disso, a loucura de Hitler resultou no Holocausto. Dos 6 milhões de judeus mortos somente em Auschwitz, o mais conhecido campo de concentração nazista, 1 milhão foi assassinado nas câmaras de gás e cremados.

Mortes em massa também foram provocadas por decisões políticas e econômicas equivocadas de líderes comunistas. As coletivizações forçadas de Josef Stálin, na antiga União Soviética, nos anos de 1932-33, mataram de fome 10 milhões de camponeses na Ucrânia, e 1,25 milhão no Cazaquistão. O Grande Salto Adiante de Mao Tse Tung, na China, de 1958 a 1961, matou de fome 20 milhões de chineses. Entre 1994 e 1998, na Coreia de Norte, o fim da ajuda soviética, fatores climáticos e erros de planejamento de Kim Jong-un provocaram a morte de, pelo menos, 600 mil pessoas por desnutrição (fala-se em até 3 milhões de norte-coreanos).

Países de dimensões continentais, por sua escala demográfica, têm inércia de manobra comparada aos grandes navios. Erros no rumo estratégico, principalmente na economia e políticas públicas, têm consequências de grande envergadura. O que está acontecendo nos EUA, por exemplo, devido ao negacionismo de Donald Trump, entrará para os anais da história como uma dessas grandes tragédias. O país é o epicentro da pandemia de covid-19, com 17 milhões de casos confirmados e 300 mil mortos pelo novo coronavírus, mais do que o número de soldados americanos mortos na II Guerra.

Aqui, no Brasil, com quase 7 milhões de infectados e 190 mil mortos, o presidente Jair Bolsonaro vai pelo mesmo caminho, com seu negacionismo, que chega a aponto de se recusar a tomar a vacina contra a covid-19. Sabota, assim, os esforços realizados por autoridades de saúde, prefeitos, governadores e até mesmo pelo governo federal — cuja atuação deixa muito a desejar — para conter a epidemia e imunizar a população contra a doença, única maneira de salvar a economia de profunda recessão e do desemprego em escala sem precedentes, ou seja, de voltar à vida normal. A história não perdoa erros dessa magnitude. [estávamos surpresos, até incrédulos, pela rara oportunidade de ler sete parágrafos de uma excelente matéria - característica do ilustre articulista -  abrangendo diversos exemplos claros, induvidosos, e o presidente Jair Bolsonaro não ser mencionado.

Lamentavelmente, sobrou para o nosso presidente. As abordagens exatas passaram ao campo das conjeturas, das afirmações sem fatos comprobatórios, etc. Foi esquecido que a VACINA pelo menos para o Brasil AINDA NÃO EXISTE - seja a vacina física, o conteúdo da ampola, seja a autorização legal da Anvisa ou de algum órgão da credibilidade do FDA.

A do governador paulista chegam carregamentos que noticiam ser da coronavac, só que nada é solicitado para a Anvisa.

Insistimos que não há uma única morte - comprovada, por óbvio - que possa ser atribuída como resultado dos comentários e frases, às vezes politicamente inadequadas, proferidas pelo nosso presidente.]

 Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense


sexta-feira, 1 de junho de 2018

Veja como você, que apoiou a greve dos ricos, vai pagar a conta da mamata; o chato é que as pessoas com miolos também serão prejudicadas

Pois é…
Como diria aquele Conselheiro, “as consequências vêm depois”. Há o risco de você que me lê estar entre aqueles 81% que, segundo o Datafolha, aplaudiram a greve dos caminhoneiros — levou lanchinho pra eles também? —, mas se nega a pagar a conta da mamata de R$ 13,5 bilhões, que até pode beneficiar alguns profissionais autônomos, mas vai mesmo é fazer a alegria de algumas gigantes do setor de transportes. Deve ter sido o evento mais bem-sucedido da história dos locautes mundo afora. Convenham: 87% formam o que a gente chama “maioria esmagadora”…  Como já lembrei aqui — e a questão foi reiterada por um auxiliar do presidente Temer —, governo não produz dinheiro; ele apenas o arrecada. Pode até gastar mal, mas esses são outros quinhentos. Se a turma da mamata do diesel vai “privatizarR$ 13,5 bilhões, de algum lugar o dinheiro há de sair.
Se for preciso, de novo, caracterizar o explorador com cartola, barriga e coxa de frango na mão, a gente caracteriza, ué… É um clichê? É. Mas ainda é um clichê menor do que aqueles que nos é oferecido pela  própria realidade.

O país tem uma folga orçamentária de R$ 6,1 bilhões. Só pra lembrar: a folga não e uma sobra depois de retiradas as despesas da receita; a folga NÃO é um dinheiro que está no azul. Ele continua no vermelho. Quer dizer apenas que o déficit seria menor. A dita-cuja foi engolida pela conta do diesel.   A segunda maior massa de recursos vem do “Reintegra”: R$ 2,27 bilhões. O programa devolvia 2% ao setor do que se arrecadava com PIS-Cofins. Passará a devolver 0,1%. Representantes do setor dizem que haverá perda de competitividade.

Havia uma reserva de R$ 2,1 bilhões para capitalização das estatais. Também vai virar fumaça. É a terceira maior rubrica a tapar o rombo orçamentário do diesel.  Na sequência, vem a grana do corte de despesas: R$ 1,2 bilhão. Cortar de onde? Ministérios dos Transportes (R$ 368,9 milhões); fortalecimento do SUS (R$ 135 milhões); concessão de bolsas de estudo (R$ 55,1 milhões); programa de prevenção e repressão ao tráfico de drogas (R$ 4,1 milhões) e até algumas migalhas (R$ 1,5 milhão) do policiamento ostensivo de rodovias e estradas federais. Dado o conjunto dos números, a área social padeceu pouco. Mas não ficou livre da garfada.  A reoneração da folha de pagamentos, de 17 setores inicialmente, renderá até o fim do ano outros R$ 830 milhões. Vêm de uma mudança tributária na área de concentrados de refrigerante outros R$ 740 milhões. No fim da fila, R$ 170 milhões sairão de mudanças no regime tributário da indústria química.

Então ficamos assim: computadas as perdas de todos os setores com a greve, chega-se fácil perto de R$ 100 bilhões. O PIB, em razão dos desastres em série e suas consequências, pode sofrer um impacto da ordem um ponto percentual (R$ 66 bilhões em valores de 2017). E, por ora ao menos, não se têm calculados os efeitos do fim de benefícios para a indústria. O ministro da Segurança Institucional, Sergio Etchegoyen, lembrou que a paralisação “teve o apoio de 90%” da população' — 87%, segundo o Datafolha. E emendou o que já lembrei aqui: “O governo não produz dinheiro; ele arrecada dinheiro”.
Na mosca! Os brasileiros escolheram um caminho quando aplaudiram a patuscada, certo?
Que aprendam ao menos a lição básica: as consequências vêm depois.

Blog do Reinaldo Azevedo