Dagomir Marquezi
Reportagem especial do Sunday Times revela detalhes sinistros sobre a origem da covid-19
Mapa da China com marcador na cidade de Wuhan | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
No
número 1 da London Bridge Street está a sede do jornal The Times, um
dos mais longevos e prestigiados da história da imprensa mundial.
No
arranha-céu envidraçado com vista para o Rio Tâmisa, Jonathan Calvert e
George Arbuthnott trabalham para a seção Insight.
Eles produzem
reportagens especiais para um diário que tem 238 anos de reputação a
defender.
Numa extensa reportagem publicada no último dia 11 na edição
dominical do Times, Calvert e Arbuthnott revelaram alguns segredos
perturbadores sobre a pandemia que afetou a todos.
“Cientistas
em Wuhan, trabalhando ao lado dos militares chineses, estavam combinando
os coronavírus mais mortais do mundo para criar um novo vírus mutante
assim que a pandemia começou”, começa a longa matéria do Sunday Times.
“Investigadores que examinaram comunicações interceptadas ultrassecretas
e pesquisas científicas acreditam que os cientistas chineses estavam
executando um projeto secreto de experimentos perigosos, que causaram um
vazamento do Instituto de Virologia de Wuhan e iniciaram o surto de
covid-19. (…) Investigadores norte-americanos dizem que uma das razões
pelas quais não há informações publicadas sobre o trabalho é que ele foi
feito em colaboração com pesquisadores do exército chinês, que o
financiava e que, segundo eles, buscava a criação de armas
biológicas.”
Como essas informações foram obtidas? “O
Sunday Times revisou centenas de documentos, incluindo relatórios
anteriormente confidenciais, memorandos internos, artigos científicos e
correspondências por e-mail obtidos por meio de fontes ou por ativistas
pela liberdade de informação nos três primeiros anos desde o início da
pandemia. Também entrevistamos os investigadores do Departamento de
Estado dos Estados Unidos — incluindo especialistas na China em ameaças
pandêmicas emergentes e em guerra biológica — que conduziram a primeira
investigação significativa dos Estados Unidos sobre as origens do surto
de covid-19.”<img
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300w" sizes="(max-width: 1368px) 100vw, 1368px" data-eio="p" />Reportagem publicada no último dia 11 na edição dominical do
Times | Foto: Reprodução
“Impacto devastador na civilização humana”
O
Instituto de Virologia de Wuhan, fundado em 1956, se envolveu nessa
história no final de 2002, quando pesquisava as origens do vírus
conhecido como Sars.
O vírus provocava febre, dor de cabeça, desconforto
e tosse seca.
Surgiu pela primeira vez na província de Guangdong,
sudeste da China.
Para pesquisar a origem da doença foi enviado
um grupo de pesquisadores liderado pela cientista mais famosa de Wuhan: a
doutora Shi Zhengli, conhecida como “Batwoman”, por causa de suas
pesquisas sobre morcegos. O objetivo aparente da pesquisa era encontrar
uma vacina contra a doença.
Guangdong, sudeste da China | Foto: ShutterstockEm
2009, o governo norte-americano ajudou a financiar o instituto com US$
18 milhões por intermédio de uma ONG chamada EcoHealth Alliance — algo
como “Aliança da EcoSaúde”. Seu presidente, o inglês Peter Daszak,
dividiu com os cientistas chineses suas técnicas mais avançadas de
manipulação de vírus.
Em 2012, a mesma doutora Shi descobriu em
algumas montanhas da província de Yunnan um vírus parecido com o Sars.
O
novo vírus foi chamado de WIV1, usando a sigla que identificava o
Instituto de Virologia de Wuhan.
Outro vírus, chamado SHC014, foi
enviado para o virologista norte-americano Ralph Baric. Baric
desenvolveu a técnica de “humanizar” ratos de laboratório para que seu
corpo se tornasse mais parecido com o organismo humano. Atropelou aí uma
fila de princípios éticos científicos mais básicos. Mas aparentemente
ninguém reclamou.
O doutor Baric passou a fundir genes de
diferentes vírus para torná-los mais fortes e virtualmente
incontroláveis.
Seu objetivo declarado era criar uma vacina contra
doenças como a Sars. A vacina nunca virou uma realidade.
E Baric tomou
consciência do caminho que estava trilhando, segundo um texto de sua
autoria de 2006: “Existem ferramentas para modificar simultaneamente os
genomas para aumentar a virulência [e] transmissibilidade. Essas armas
biológicas podem ser direcionadas a humanos, animais domesticados ou
plantações, causando um impacto devastador na civilização humana”. Um
desastre era apenas questão de tempo. Tudo “em nome da ciência”.
“O mais perigoso experimento de coronavírus já realizado”
Seguindo
o princípio de Ralph Baric, vírus diferentes eram combinados no
laboratório de Wuhan para um processo chamado “ganho de função”.
O
objetivo, acredite se quiser, era criar vacinas para doenças que não
existiam.
Cientistas estavam recebendo dinheiro para criar doenças fora
do nosso controle, misturando a embriaguez do poder de vida e morte com o
apetite por verbas fáceis.
A doutora Shi Zhengli anunciou em
2017 que seu pessoal no Instituto de Wuhan havia conseguido criar nada
menos que oito vírus mutantes, desenvolvidos a partir das fezes de
morcegos encontrados na Caverna Shitou. Dois desses vírus eram capazes
de infectar células humanas.
Virologista chinesa Shi Zhengli dentro do laboratório P4 em
Wuhan, capital da província chinesa de Hubei | Foto: Johannes Eisele/AFP
Segundo
a matéria do Sunday Times, “a maior parte desse trabalho aconteceu em
laboratórios (no Instituto de Wuhan) de nível 2 (BSL-2), que tomavam
apenas precauções leves, comparáveis às usadas numa cirurgia dentária”.
Fotos do interior do laboratório mostravam funcionários manipulando os
receptáculos desses vírus de alta periculosidade.
Usavam apenas luvas
cirúrgicas e uma dessas máscaras azuis que a gente compra na farmácia.
Nessa
mesma época, o Instituto de Wuhan desenvolveu o que foi descrito pelo
biólogo molecular Richard Ebright como “o mais perigoso experimento de
coronavírus já realizado”.
Vírus criados artificialmente (fundindo os
tipos WIV1 e SHC014) eram injetados nas narinas de ratos com pulmões
“humanizados” — 75% das cobaias morreram no experimento.
É um ambiente
de insanidade científica, mas a essa altura havia ainda mais pressão
para que o governo norte-americano continuasse enfiando dinheiro na
fábrica de morte de Wuhan. Em nome da sua “Aliança da EcoSaúde”, Peter
Daszak pediu mais US$ 14 milhões. O pedido foi negado.
O marco zero
E é a partir daí que a pesquisa científica se torna um enredo típico dos filmes de James Bond ou Missão: Impossível. Segundo um dos investigadores do governo norte-americano, “o rastro de documentos começa a escurecer”. Foi exatamente quando o programa secreto começou. “Minha opinião é que a razão pela qual [a pesquisa em] Mojiang foi encoberta foi o sigilo militar relacionado à busca [do exército] pela capacidade de uso duplo em armas biológicas, virológicas, e em vacinas”, disse o investigador, que não quis se identificar.
A partir daí,
a busca por uma vacina dá lugar à pesquisa para tornar o vírus,
desconhecido até então, ainda mais infeccioso para os seres humanos.
Segundo os investigadores, “tornou-se cada vez mais claro que o
Instituto de Virologia de Wuhan esteve envolvido na criação,
disseminação e encobrimento da pandemia de covid-19”.Instituto de Virologia de Wuhan, na China | Foto: Wikimedia
Commons
O marco zero da pandemia aparentemente ocorreu no mês de
novembro de 2019, quando pesquisadores de Wuhan foram levados para o
hospital com sintomas que hoje identificamos como covid-19. O silêncio
do regime chinês foi absoluto. Um mês depois, o resto do mundo foi
atingido pelo novo vírus.
A partir daí, a identificação da fonte
da nova doença foi proibida pelo governo de Xi Jinping.
A pesquisadora
inglesa Alice Hughes, que estava envolvida na pesquisa por meio da
Academia Chinesa de Ciências, foi proibida de se manifestar sobre as
investigações e passou a ser vigiada pelo aparelho repressivo do Partido
Comunista. Fugiu para Hong Kong.
O Departamento de Estado
norte-americano passou então a agir ativamente para descobrir o que
estava acontecendo nas entranhas do regime comunista chinês no período
anterior ao surgimento da covid. Serviços de inteligência dos Estados
Unidos tiveram acesso inédito a “metadados, informações telefônicas e de
internet”.
Xi
Jinping, ditador da China | Foto: Reprodução/Flickr
Por ser
altamente confidencial, o relatório publicado no início de 2021 foi
ridiculamente pequeno — apenas 700 palavras. Segundo o relatório,
“cientistas de Wuhan estavam conduzindo experimentos [no vírus] RaTG13
da mina de Mojang, e pesquisas militares clandestinas, incluindo
experimentos em animais de laboratório, estavam sendo realizadas no
instituto antes da pandemia”.
“O Instituto de Virologia de
Wuhan tem realizado pesquisas secretas, incluindo experimentos em
animais de laboratório, em nome do exército chinês desde pelo menos
2017”
O Sunday Times conversou com três dos membros dessa
comissão e cientistas ligados às pesquisas em Wuhan. Eles concluíram que
o objetivo era tornar os vírus cada vez mais perigosos, especialmente
através do uso de ratos “humanizados”. Segundo uma dessas fontes, a
técnica “acelera o processo natural de mutação. Em vez de levar anos
para ocorrer a mutação, pode levar semanas ou meses. Isso garante que
você acelere o processo natural”.
Ratos humanizados
Um dos
cientistas que trabalhavam com o Departamento de Estado, o doutor Steven
Quay, declarou que não fazia o menor sentido acreditar que vírus de
morcego pudessem ser transmitidos para humanos. “Seria a primeira vez
que isso aconteceria na história da ciência humana.” A covid-19 seria um
claro caso de criação proposital de vírus por meio de “ratos
humanizados”: “Você infecta os ratos, espera uma semana mais ou menos, e
depois recupera o vírus dos ratos mais doentes. Então você repete o
processo. Em questão de semanas, essa evolução direcionada produzirá um
vírus que pode matar todos os ratos humanizados”. Isso explicaria,
segundo ele, por que o vírus surgiu tão marcadamente adaptado para
infectar humanos.
A
covid-19 seria um claro caso de criação proposital de vírus por meio de
“ratos humanizados” | Foto: Shutterstock
O relatório do
Departamento de Estado deixa explícito o objetivo da criação desse
vírus: “Apesar de se apresentar como uma instituição civil, os Estados
Unidos determinaram que o Instituto de Virologia de Wuhan colaborou em
publicações e projetos secretos com o exército chinês. O Instituto de
Virologia de Wuhan tem realizado pesquisas secretas, incluindo
experimentos em animais de laboratório, em nome do exército chinês desde
pelo menos 2017″.
Um dos investigadores declarou que os
militares chineses estão envolvidos com o Instituto de Wuhan desde 2016,
quando as conclusões dos experimentos se tornaram cada vez mais
secretas. Segundo a matéria do Sunday Times, as pesquisas em Wuhan eram
realizadas em parceria com a Academia de Ciências Médicas Militares — um
ramo de pesquisas do Exército de Libertação Popular (ELP), o nome
oficial das Forças Armadas da China.
Um livro publicado por essa
mesma academia, em 2015, declarava que o Sars representava uma “nova
era de armas genéticas” (…) que podiam ser “manipuladas artificialmente
em um vírus emergente de doença humana, que então era transformado em
arma e utilizado”. Os autores do livro, pesquisadores do ELP, falavam
abertamente sobre armas biológicas e colaboraram diretamente com os
cientistas de Wuhan.
Caindo do telhado
Qual é a lógica por
trás da pesquisa? Segundo os investigadores entrevistados pelo Sunday
Times, a ideia seria transformar vírus em armas e, ao mesmo tempo,
trabalhar numa vacina contra essas novas doenças. Na cabeça desses
militares, os chineses sobreviveriam vacinados, enquanto o resto do
mundo seria dizimado pelo novo vírus modificado. O raciocínio não prevê o
estado de caos de uma pandemia, mas é típico de mentalidades
autoritárias.
A rapidez com que os chineses produziram uma vacina
quando a covid-19 saiu de controle só aumentou essa suspeita. O doutor
Robert Kadlec concluiu que a vacina chinesa contra a covid (coordenada
pelo cientista militar Yusen Zhou) já estava sendo trabalhada em
novembro de 2019 — antes, portanto, da pandemia.
Um incidente
aumentou o clima de suspeita em torno do caso. Em maio de 2020, o doutor
Yusen Zhou foi anunciado morto aos 54 anos. Causa mortis: ele teria
“caído” do telhado do Instituto de Wuhan.
Se isso acontecesse num filme
de James Bond, todo mundo ia considerar uma fantasia. Na reportagem,
pareceu o que se chama na linguagem policial de “queima de arquivo”.Segundo os investigadores entrevistados pelo Sunday Times, a
ideia seria transformar vírus em armas e, ao mesmo tempo, trabalhar numa
vacina contra essas novas doenças | Foto: Shutterstock
As
investigações revelaram que três cientistas do Instituto de Virologia de
Wuhan com idade entre 30 e 50 anos teriam sido os primeiros infectados
pela covid-19, ainda em novembro de 2019.
Um deles faleceu.
Sinais de
alerta foram captados nas comunicações pedindo reforços urgentes na
segurança interna do instituto.
Em 19 de novembro, o diretor de
segurança da Academia Chinesa de Ciências visitou o instituto.
Recebeu
pedidos de alguns de seus líderes para serem retransmitidos ao próprio
presidente Xi Jinping, alertando para a situação “grave e complexa”
vivida no conjunto de laboratórios.
A primeira reação do regime foi
apagar as evidências de que a origem da pandemia havia sido no Instituto
de Virologia.
Suspeitas foram fabricadas contra o “mercado molhado” de
Wuhan e as cavernas de morcegos de Yunnan.
Por muito tempo o mundo
comprou essas versões.
O artigo do Sunday Times deixa algumas
pistas que apontam os verdadeiros responsáveis por uma doença criminosa
que causou 7 milhões de mortes ao redor do mundo, provocou uma crise
econômica sem precedentes e possibilitou a instalação de “ditaduras
sanitárias” em todo o planeta.
Até agora, nenhuma punição aconteceu aos
que provocaram essa catástrofe global.
O que estará acontecendo neste exato momento no interior das paredes do Instituto de Virologia de Wuhan?
Leia também “Procuram-se profissionais de tecnologia”
Dagomir Marquezi, colunista - Revista Oeste