Caso se preservem os valores da democracia, sempre estaremos prontos a fazer a escolha certa e a reformar o mundo para fazê-lo mais generoso.
O presidente Michel Temer deu
autorização para que as Forças Armadas reforcem a segurança nas ruas de
Natal. Por quê? Aconteceu o esperado: a guerra de facções dentro dos
presídios foi para as ruas. Aliás, esse é o risco para o qual o,
desculpem a franqueza, idiotas ainda não atentaram. A inferência de que
conflito em presídio “é coisa lá deles, dos bandidos, não nossa” é uma
das maiores bobagens que se podem dizer a respeito. Nunca será.
Familiares de presos protestam próximos da Penitenciária Estadual de
Alcaçuz, em Nísia Floresta (RN) - 18/01/2017 (Andressa Anholete/AFP)
Por essa da foto e outras é que o Blog PRONTIDÃO TOTAL defende que visitas a presos devem ser tratadas como exceções, concedidas como um beneficio de forma excepcional, jamais podem ser a regra
Há gente que precisa aprender a pensar
as coisas segundo a sua gravidade particular e específica. Um dos
caminhos mais pavimentados do autoengano é aquele composto por
raciocínios metafóricos ou comparativos. No primeiro caso, o sujeito
encontra uma resposta para a metáfora e pensa que o problema está
resolvido; no segundo, alevanta um valor ainda mais alto para se omitir
de dar uma resposta à questão original.
Explico.
Vamos aplicar ao caso do Rio Grande do
Norte a máxima de que “o mal se corta é pela raiz”. Eis uma verdade
ensinada pela natureza, que assume um valor genérico. Bem, no limite,
esmaguem-se todos os rebelados de Alcaçuz, e a fatura estaria liquidada.
E as lorpas ainda babam: “Sem essa de direitos humanos….”Nem é preciso
ser especialmente sagaz para saber que, nesse caso, o sangue vai regar o
mal. Assim, a metáfora é boa como metáfora e desastrosa como ação
prática.
Ou, então, e tenho recebido muitas
mensagens nesse sentido, o sujeito vem falar das urgências da saúde, que
são reais; da educação, que são reais; da moradia, que são reais. Deus
do Céu! Sou até mais amplo: há um déficit de felicidade no mundo, não é?
A questão é saber quais são as questões que, embora precárias, não
inviabilizam a sociedade. Quem não investiria com mais gosto em creches e
escolas do que em presídios?
Há dificuldades que tornam a vida mais
triste, mais acabrunhada, mais miúda, mas que, ainda assim, mantêm as
esperanças, nem que seja em estado latente. Mais: se as instituições
funcionam, apesar de todas as precariedades, permanecem abertos os
caminhos da reforma. Notem que não falo em “redenção”. Essa palavra, em
matéria de ciência social, é coisa de autoritários tarados.
O que está em curso, no caso dos
presídios, afeta a própria essência de um regime ancorado nas liberdades
públicas e nas liberdades individuais. Onde está, a propósito, a deformação
moral da esquerda quando lhe é dado responder ao desafio a segurança
pública? Ela parte do princípio de que os bandidos são seres
revolucionários em estado larvar; ela infere que estamos a lidar com uma
espécie de “rebelde primitivo” que ainda não descobriu o inimigo certo.
Aliás, os comunistas, deixados nos mesmos presídios de criminosos
comuns, estão na raiz do Comando Vermelho. No fim das contas, são uns
idealistas estúpidos. Acham que não se pode delinquir por vontade.
Onde está, a propósito, a deformação da
direita brucutu? Em ignorar que, com efeito, há fatores condicionantes
da delinquência que podem ser corrigidos. E as iniquidades sociais, é
evidente, estão entre eles. Mas ela não quer se ocupar de políticas
públicas. Acredita que se elimina o problema com a eliminação do
problemático. E, no mais, viva a competição. Como se a competição
realmente virtuosa não fosse apenas aquela que se estabelece entre
competentes.
Estamos diante de uma questão
civilizatória, ora bolas!, não de um problema meramente policial. Caso
se preservem os valores da democracia e do Estado de Direito; caso se
mantenha a hierarquia de valores que nos distingue da Besta; caso se
conservem os fundamentos da empatia, que nos levam a reconhecer no outro
um nosso semelhante, sempre estaremos prontos a fazer a escolha certa e
a reformar o mundo para fazê-lo mais generoso.
Destruídos esses pressupostos, então
chegamos ao fim da linha. Aí, meus caros, estaremos condenados a entrar
naquele lugar onde não entra a esperança. O inferno existe. E ele pode ser aqui.
Forças Armadas, sim! Enquanto forem necessárias.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo