Rodrigo
Janot acusou o presidente da Câmara de corrupção e lavagem. Denúncia pressiona o peemedebista
e deve ampliar a guerra em Brasília
O
procurador-geral da República Rodrigo Janot apresentou nesta quinta-feira ao
Supremo Tribunal Federal (STF) as primeiras denúncias contra parlamentares
acusados de envolvimento no propinoduto da Petrobras. O principal alvo foi o
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), denunciado pelos
crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Também foram denunciados o
senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) - corrupção passiva e lavagem - e a
ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), atual prefeita de Rio Bonito (RJ) -
corrupção passiva.
Apesar da denúncia, Janot não
pediu ao Supremo que afaste o peemedebista da presidência da Câmara. Mas destacou que, além da
condenação criminal, a corte deve impor a restituição de 40 milhões de dólares
classificados como "produto e
proveito dos crimes", e outra parcela, no mesmo valor, como reparação
dos danos causados à Petrobras e à administração pública - no total, 277 milhões de reais, conforme cálculo do MPF.
O oferecimento da denúncia à Justiça não significa que dois sejam culpados, e sim que os investigadores apontam indícios robustos de que os
políticos se beneficiaram do esquema de corrupção e fraude em contratos da
Petrobras.
O
próximo passo é a defesa de ambos se manifestar e apresentar documentos e
provas que possam se contrapor à
acusação. O
Ministério Público também terá prazo para rebater o argumento dos advogados. O processo contra Collor será julgado na 2ª Turma do Supremo,
enquanto o de Eduardo
Cunha, por ser presidente da Câmara, será analisado pelos 11 ministros que
compõem o Plenário do Supremo. Não há
data para o julgamento das denúncias.
Segundo na linha
sucessória
da
República e responsável
por dar seguimento a eventuais pedidos de impeachment contra a
presidente Dilma Rousseff, Eduardo Cunha é a principal pedra no
caminho do Palácio do Planalto desde que assumiu o cargo. O embate piorou
recentemente quando o lobista Julio Camargo, em acordo de delação premiada,
acusou o peemedebista de ter embolsado 5 milhões de dólares do propinoduto.
Cunha aponta digitais do governo para
arrastá-lo ao centro do petrolão. Também acusa o
procurador-geral, Rodrigo Janot, de perseguição como parte de um
"acordão" com o Palácio do Planalto.
Desde que
as denúncias contra ele ganharam força,
o peemedebista tem afirmado que não se afastará do cargo. Seus adversários
aguardavam, inclusive, que a saída da cadeira fosse recomendada pelo Ministério
Público. Porém, neste momento, os
investigadores avaliam que provocariam um novo choque entre Poderes: no Congresso Nacional, a
maioria dos líderes defende que a saída
ou não do cargo é uma prerrogativa do Legislativo. Ou seja, no entendimento dos congressistas, só há
dois caminhos possíveis para que isso ocorra: 1) se o próprio deputado renunciar à cadeira; ou 2) como resultado de um longo e burocrático processo de
cassação do mandato.
Denúncia
-
As
primeiras referências ao envolvimento de Eduardo Cunha no petrolão apareceram
em 13 de outubro de 2014, quando o doleiro Alberto Youssef prestou depoimento
no acordo de delação premiada e implicou o peemedebista em um esquema de
pagamento de dinheiro sujo para viabilizar contratos de empresas privadas com a
Petrobras. Segundo o delator, nas negociações para o aluguel de um navio
plataforma da Samsung Heavy Industries para a Petrobras, "foi demandado que Julio Camargo repassasse para o PMDB percentual
[de propina] que se destinava a pagamento de vantagem indevida a integrantes do
partido PMDB, notadamente o deputado federal Eduardo Cunha". Youssef
também informou que "diante da
paralisação do pagamento das comissões", Cunha articulou na Câmara dos
Deputados a apresentação de pedidos de informações envolvendo a Petrobras, a
Mitsui e a Toyo Setal como forma de pressionar Julio Camargo a depositar a
propina.
O
ex-policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, conhecido como Careca e um
dos carregadores de propina de Youssef, também afirmou em depoimento que fez
entregas de propina em um endereço de Eduardo Cunha. Mas a situação se tornou
insustentável mesmo com o depoimento de Julio Camargo ao juiz Sergio Moro no
dia 16 de julho. Segundo o delator, o lobista Fernando Soares, conhecido como
Fernando Baiano e apontado como o operador do PMDB no escândalo do petrolão, foi o primeiro a repassar, em nome de Cunha, a reclamação
de um "débito" de 5 milhões de dólares.
Para
viabilizar o pagamento, Julio Camargo
fez uma alteração no sistema usual de repasse de propinas a agentes políticos
do PMDB e, em vez de utilizar unicamente os serviços de Fernando Baiano,
chamou o doleiro Alberto Youssef para entrar na transação. Com isso, afirmou,
cerca de 10 milhões de dólares a serem
rateados entre Eduardo Cunha e Baiano foram pagos por meio de depósitos a
Youssef por meio de operações com a empresa de fachada GFD, operações no
exterior e pagamentos diretos a empresas de Fernando Baiano.
A riqueza de detalhes é impressionante:
de acordo com o delator, parte do dinheiro da propina foi pago por meio de três
depósitos indicados por Youssef em 20 de outubro de 2011. Na transação foram
utilizadas as empresas Vigela, de Julio Camargo, para as empresas REY, RFY e
DGX. Dois depósitos foram no valor de
cerca de 2.350.000 dólares e outro de 400.000 dólares. Ainda houve
transferências para igreja vinculada a Eduardo Cunha, sob a falsa alegação de
que se tratava de doações religiosas, pagamentos à empresa Technis, de Fernando
Baiano, no valor de 700.000 reais e depois nove pagamentos à empresa Hawk Eyes
no valor de 3,2 milhões de reais.
Afastamento
-
Apesar de
não constar da denúncia, é possível que o MP peça no futuro o afastamento de
Eduardo Cunha seja afastado do cargo de presidente da Câmara. Se isso ocorrer, o STF deve decidir se,
neste caso específico, se cabe a interferência do Poder Judiciário no
Legislativo. O caminho para o pedido de afastamento do posto mais
importante da Câmara foi sedimentado nos últimos dias quando Janot encaminhou ao
Supremo parecer em que afirma que o peemedebista tem misturado seus interesses
privados com a Câmara como instituição pública, utilizando a Advocacia-geral da
União (AGU) e a própria Câmara como parte interessada no processo em que é
suspeito de ter recebido propina do petrolão.
Para o
eventual afastamento, juristas consideram que poderia
ser invocado o artigo 319 do Código de Processo Penal como base legal para retirar temporariamente o parlamentar da
presidência da Câmara - e não
do mandato. O artigo estabelece a possibilidade de "suspensão do exercício de função pública ou de atividade de
natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização
para a prática de infrações penais". Neste contexto, as suspeitas de
que Eduardo Cunha tenha utilizado a aliada Solange Almeida para apresentar
requerimentos de informação e pressionar o lobista Julio Camargo para o
pagamento de propina podem ser interpretadas como a utilização do cargo para a
prática de crimes.
Uma outra possibilidade para o
futuro de Eduardo Cunha está embasada no artigo 53 da Constituição, que prevê que os deputados
poderiam, no limite, suspender o
andamento de uma eventual ação penal contra o peemedebista. Essa hipótese,
considerada remota, estabelece que, depois de recebida
a denúncia, um partido político pode pedir a suspensão do processo no STF.
Collor
- No caso de Fernando Collor, também denunciado por corrupção passiva e
lavagem de dinheiro, as evidências são fartas. Em acordo de delação premiada, o
doleiro Alberto Youssef apontou o
senador alagoano como beneficiário de propina em uma operação da BR Distribuidora,
subsidiária da Petrobras. A distribuição do dinheiro sujo contava com a
participação do ex-ministro de Collor, Pedro Paulo Leoni Ramos, dono da GPI
Investimentos e amigo de longa data do senador. Na triangulação do suborno, foi
fechado um contrato com uma rede de postos de combustível de São Paulo e que
previa a troca de bandeira da rede, para que o grupo se tornasse um revendedor
da BR Distribuidora.
O negócio totalizou
300 milhões de reais, e a cota de propina, equivalente a 1% do contrato,
foi repassada a Leoni Ramos, que encaminhava finalmente a Collor. Na explosiva
delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia, Fernando Collor também foi citado como o
destinatário de 20 milhões de reais em propina, pagos pela construtora entre 2010 e 2012,
para que o senador defendesse interesses da companhia com a BR Distribuidora.
Teori promete agilidade em análise de denúncias
PGR
denunciou Eduardo Cunha e Fernando Collor nesta quinta-feira
O ministro Teori Zavascki, relator dos processos do
petrolão no Supremo Tribunal Federal (STF), prometeu nesta quinta-feira analisar com agilidade as denúncias
apresentadas pelo
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o senador Fernando Collor de Mello
(PTB-AL).
"Serei rápido", disse ele ao chegar à sessão
plenária do STF, antes da Corte confirmar a entrega das acusações. Caberá ao
magistrado analisar a argumentação do chefe do Ministério Público contra os
dois parlamentares e, na sequência, liberar seu voto para apreciação do
Plenário da Corte. Cunha e Collor são os primeiros congressistas denunciados
pelo MP por envolvimento no petrolão.
Fonte:
VEJA OnLine