Quando antigas certezas perdem a
validade, fazer perguntas certas já é avanço, porque respostas sobre a
reconstrução do Estado parecem inviáveis em meio ao estupor com sua quebra
“Como é que a gente sai dessa?”
Ninguém
respondeu.
— Não é apenas uma questão de “tira e
põe” — ele
insistiu. — Tira
a Dilma e põe quem?
No breve silêncio parecia que alguns na sala da
livraria, quarta-feira passada, no Rio, recitavam
mentalmente a linha sucessória da República. Na
ordem constitucional, a primazia é do vice Michel Temer (PMDB). Alinham-se, em sequência, o presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB), o presidente do Senado, Renan
Calheiros (PMDB), e o presidente do Supremo
Tribunal Federal (Ricardo Lewandowski, até setembro de 2016, quando será
substituído pela ministra Cármen Lúcia).
Não se cogitou sobre coalizão
partidária para apear Dilma e entregar o poder ao PMDB dos bons companheiros Temer, Cunha e
Calheiros. Tampouco
mencionou-se que os presidentes da Câmara e do Senado estão sob investigação
por suspeita de corrupção na Petrobras. E, assim, sequer se discutiu sobre a legitimidade de liderança de um processo de
impeachment por alguém com imputações de maracutaias. O Ministério Público pediu a abertura de processos criminais contra
Cunha e Calheiros. Se o STF aceitar a denúncia, abre a porta para o
afastamento de ambos do comando do Congresso.
Cunha,
Renan e outros 30 envolvidos em supostos crimes contra a Petrobras integram a
maior bancada legislativa brasileira: a dos denunciados em inquéritos e ações penais com
risco de prescrição no Supremo. Representam
mais de um terço dos 594 deputados e senadores. —
Estamos encalacrados — ele quebrou o silêncio. — Qual a saída? E para fazer o quê?
Quando antigas certezas perdem a
validade, fazer perguntas certas já é avanço, porque respostas sobre a reconstrução do Estado
parecem inviáveis em meio ao estupor com sua quebra. Mas é na política que se resolvem crises como
a que está aí, ele acrescentou: — Para
fazer o que tem de ser feito, da infraestrutura à garantia do pagamento das aposentadorias,
você vai ter de convencer a sociedade. Precisamos de mais sociedade. Se quer
mudança maior, você vai ter que falar ao país sobre as limitações das
capacidades do Estado. Precisa ter liderança para poder explicar e ter apoio,
confiança, do país para mudanças. Precisa de um bloco de poder, e não é só de
partidos ou de alguns setores da sociedade. Alguém vai ter de fazer isso, senão
o Brasil vai desandar...
Sugeriu-se
o caminho da “Constituinte exclusiva”,
com pessoas eleitas para votar uma nova Constituição, sem ser parlamentares. — É um pouco artificial — retrucou. — Não há ruptura institucional. E aqueles que
iriam lá não conhecem o jogo da máquina pública. Desenhar um novo futuro
glorioso para o Brasil no gabinete é fácil, qualquer um faz... Você tem é que
convencer o país do caminho. Não tem outro, a não ser pela via constitucional.
Lembrou-se
das manifestações de rua em junho de 2013, quando
Dilma foi à televisão propor Constituinte específica para a reforma política.
Fernando Henrique Cardoso contou que assistiu ao discurso ao lado do
ex-ministro do STF Ayres Britto. — Ele me disse: “Presidente, é o seguinte: a Constituição não dispõe sobre o seu
funeral.” Pois é, como a
Constituição não prevê a sua morte, não tem outro jeito de fazer as reformas.
Fonte: José Casado – O Globo
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