Erro duplo na reinvenção da CPMF para a Previdência
Não só o imposto é de má qualidade, por
onerar bastante toda a cadeia produtiva, como a solução dos déficits do
INSS não se dará por via tributária
Consultar o passado sempre ajuda a entender melhor o presente, uma
regra simples e sensata que se aplica com perfeição à tentativa do
governo Dilma de ressuscitar a CPMF, sob a justificativa de cobrir o
elevado e crescente déficit da Previdência. A eliminação pelo Senado, em dezembro de 2007, do “imposto do cheque”
suprimiu R$ 40 bilhões das contas de receitas previstas para 2008, no
governo Lula. O discurso oficial tentou traçar um panorama de tragédia
no SUS, a partir do fim da CPMF.
Mas nada ficou pior do que já estava no sistema publico de saúde. O
governo, com rapidez, aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras
(IOF) em várias transações e elevou a alíquota da Contribuição Social
sobre o Lucro Líquido (CSLL) do setor financeiro. E também, como a
economia crescia e, com ela, a coleta geral de impostos, por volta de
junho de 2008 aqueles R$ 40 bilhões haviam sido repostos, em termos
nominais, ao Erário.
Assim, recriar a CPMF não visa a recuperar receitas perdidas pela
União. Como provam os números, aqueles R$ 40 bilhões foram logo
recuperados, em questão de meses. O novo imposto significará, de fato, um peso a mais na carga
tributária. Calcula-se um acréscimo de 0,57% do PIB sobre uma carga
total estimada em 35,47% pelo Instituto Brasileiro de Planejamento
Tributário (IBPT). Em perigoso contrassenso, numa economia em recessão
eleva-se o bolo dos impostos para 36,2% do PIB. Dificulta-se, assim, a
retomada do crescimento, apenas para se financiar as contas de um
governo que, devido a razões políticas e ideológicas, se recusa a ir
fundo nos cortes e a fazer as reformas que ataquem os desequilíbrios
estruturais do Orçamento.
Recriar a CPMF, não importa sob qual nome, é um erro em si. Pela
conjuntura recessiva, em que os contribuintes não devem ser mais
pressionados do que já são pelo Erário, e por ser um imposto de má
qualidade, como sabe a própria economista Dilma Rousseff. Ele atinge
todos indistintamente, ricos e pobres — em termos relativos, mais os
pobres — e pune as empresas com acréscimos de custos bem maiores que sua
singela alíquota, por incidir sucessivamente em todas as fases da
produção e comercialização dos bens e serviços.
O segundo erro é usá-lo para abater o déficit da Previdência. É o
mesmo que combater câncer terminal com analgésico — será inútil. O
déficit aumenta por questões estruturais, devido ao perfil demográfico
da população. O economista Marcos Lisboa afirmou ao GLOBO que, se este é
o objetivo, será preciso mais uma CPMF a cada ano.
O problema da Previdência só será equacionado com a reforma da
fixação da idade mínima para a obtenção do benefício — com reflexo
imediato na percepção do mercado sobre a solvência do país. E, para
efeito a curto prazo, com a desindexação do benefícios do INSS pelo
salário mínimo. Querer jogar o tema para o tal fórum que debate a crise
previdenciária é tentar escapar do enfrentamento da questão com
seriedade.
Fonte: Editorial - O Globo
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