Celso Ming
Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do Produto Interno Bruto
Foi bom, vá lá... Não foi uma grande vitória, mas foi uma vitória, especialmente quando seu resultado é comparado com o que se esperava no início da crise. O avanço do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre do ano (sobre o anterior) foi de 7,7%, um pouco menor do que tinha sido cravado na expectativa dos analistas. É um número que parece graúdo, mas não deve enganar. Foi medido sobre uma base anterior muito baixa e ainda não pode ser tomado como garantia de que haverá uma recuperação firme nos trimestres seguintes.
Baseou-se no consumo turbinado pelo auxílio emergencial que distribuiu mais de R$ 275 bilhões para 68 milhões de beneficiários. Não foi possível contar com o avanço da agropecuária, o setor campeão deste ano, porque o terceiro trimestre coincide com a entressafra. Fator positivo inesperado foi o aumento da poupança, o pedaço da renda não consumido, na participação do PIB. Deveu-se ao comportamento mais conservador do consumidor, que temeu por dias piores e entendeu que devesse guardar algum dinheiro para enfrentar dias ruins.
Para fugir da crítica de uma análise excessivamente focada pelo espelho retrovisor, convém avaliar o que vem pela frente. O fator mais positivo é a perspectiva de vacinação. O ritmo de distribuição da vacina no Brasil deverá ser inferior ao de muitos países avançados por conta da política negacionista e confusa sobre os efeitos da pandemia mantida até aqui pelo governo federal. Mas, já no primeiro trimestre do ano que vem, haverá progresso, com forte impacto sobre o setor produtivo e, também, sobre o consumo.
Outro fator positivo para a economia brasileira é a melhora da economia mundial. Além de providenciar vacinação em massa, os governos das grandes potências continuam empenhados em investimentos destinados a destravar a economia.
O novo governo Biden, nos Estados Unidos, anunciou um programa robusto de infraestrutura. E os grandes bancos centrais seguem com políticas monetárias (políticas de juros) frouxas para evitar restrições ao crédito. Mas essa não é toda a história, pelos enormes riscos que estão logo aí, a começar pela desorganização das contas públicas. O governo federal continua sem planejamento claro sobre como resolvê-la. [o governo federal não pode planejar nada, sem antes um detalhado estudo - com perda de tempo - sobre todas as implicações do que planeja fazer.
Visto que os arautos do pessimismo - grande parte incrustado na imprensa e o resto em partidecos sem votos e sem programa - estão sempre prontos a ingressar com ações buscando travar a execução do planejado, ações que sempre são acatadas pelo Poder Judiciário e a primeira medida parar tudo.
Na quase totalidade dos demais países que estão adiantados em termos de planejamento, na Constituição vale o que está escrito, enquanto aqui vale a interpretação, ainda que conflite com o escrito.] Esse é o principal fator que deverá impedir a distribuição de mais parcelas do auxílio emergencial. Também não está claro como o governo pretende tocar as reformas tributária e administrativa.
Essas omissões são fontes de incertezas que seguram os negócios, os investimentos e
a criação de empregos,
num cenário já minado por nada menos que 14,1 milhões
de desempregados e pelo menos outros tantos de subempregados. Resumo
da ópera: a queda do PIB em todo este ano ultraproblemático pode ficar um pouco
aquém dos 4,5% agora projetados. E,
para 2021, já há quase certeza de bom crescimento da renda nacional. Mas é
preciso um pouco mais de quilometragem rodada para ter uma boa ideia de suas
proporções.
Celso Ming - Matéria na Folha de S. Paulo
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