República - Renan Ramalho
Combate ao crime
Flávio Dino e deputados da Comissão de Segurança da Câmara, em reunião nesta terça (21)| Foto: Tom Costa/MJ
A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados, majoritariamente formada por deputados de direita e pró-polícia, realizou nesta terça-feira (21) sua primeira reunião. E o foco esteve nas críticas e cobranças à condução da área, pelo governo federal, especificamente por parte do ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB).
Por pouco e só por causa de um esforço de negociação do governo, ele não foi convocado ao colegiado para ter de explicar várias condutas, declarações e suspeitas que, para os deputados, representam enormes retrocessos no combate à criminalidade e à violência no país.
Flávio Dino comunicou a Moraes que foi lá para se reunir com lideranças comunitárias, a fim de discutir políticas públicas de segurança – algumas das ONGs presentes no encontro militam contra a polícia, a quem acusam de violência nas comunidades pobres. O ministro da Justiça disse a Moraes que, ao associá-lo ao crime organizado, os parlamentares o caluniaram e ainda praticaram crime de racismo, porque, na visão dele, teriam sugerido que toda a comunidade da Maré seria formada por bandidos.
Nas postagens, os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carlos Jordy (PL-RJ), Paulo Bilynskyj (PL-SP), Otoni de Paula (MDB-RJ), Gilberto Silva (PL-PB), e os senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Marcos do Val (Podemos-ES) questionaram como Dino teria entrado na favela Nova Holanda, na Maré, com pouca segurança e sem avisar as autoridades locais.
Nesta terça, na Câmara, vários deles criticaram o ministro pela tentativa de intimidá-los, pedindo que fossem investigados no STF. “Não fiz nenhuma acusação, mas queremos tirar suspeitas. Atacar os parlamentares é atacar a Constituição. Se o parlamentar não puder fazer questionamentos, não há democracia”, disse Gilberto Silva.
Filipe Barros (PL-PR) defendeu a convocação imediata de Dino para prestar esclarecimentos à Comissão de Segurança Pública da Câmara. “Ele não quer diálogo, está processando deputados da oposição querendo intimidar, com tentativa de perseguição.” “É triste ver o ministro Flávio Dino querendo calar os deputados nesta tribuna. O presidente Bolsonaro, por mais que tenha sido atacado, jamais processou alguém”, disse Luiz Lima (PL-RJ).
“Por que fazer isso, ministro? Nós mentimos? Faltamos com a verdade? Ou apenas expressamos a surpresa do povo do Rio de Janeiro e do Brasil com a liberdade com que o senhor transita nas comunidades do Rio de Janeiro, lideradas pelo Comando Vermelho?”, provocou Otoni de Paula, alvo do pedido de investigação.
A pressão para a convocação, no entanto, vai muito além do pedido de investigação de deputados.
Deputados querem mais explicações sobre visita à Maré
A própria visita de Dino à Maré é objeto de requerimentos de convocação na Comissão de Segurança Pública da Câmara. Em seu pedido, o deputado Helio Lopes (PSL-RJ) destacou que “o ministro entrou sem segurança numa das comunidades mais armadas e violentas do Brasil e as pautas abordadas não foras questões como desarmamento ou recadastramento de armas”. “Agora, foram discutidas, sim, as mortes ocasionadas pelas ações policiais. Por qual motivo não foi discutida a morte de policiais?”, justificou.
No plenário, a deputada Caroline de Toni (PL-SC) citou reportagem da Gazeta do Povo em que o coronel da PM do Rio Fábio Cajueiro, ex-comandante de operações no Complexo da Maré, diz que nenhuma autoridade entraria ali sem a autorização das lideranças do narcotráfico. “Flávio Dino, vossa excelência tem que vir aqui ao plenário explicar como o senhor entra no Complexo da Maré sem escolta policial, sem informar nenhuma autoridade. Foi falar o quê e com quem? Vossa excelência tem que se explicar!”, apelou Gilberto Silva, em pronunciamento no plenário.
Nesta segunda-feira (20), ao anunciar que mais de 600 mil armas já haviam passado pelo recadastramento, Dino disse que o prazo não seria estendido. Nesta terça (21), deputados da bancada da segurança tinham maioria de votos, entre os 38 membros da comissão, para obrigar o ministro a comparecer na semana que vem para responder as críticas à norma.
Na noite desta terça, um grupo da comissão se reuniu com o ministro na sede da pasta. Dino prometeu uma resposta sobre a possibilidade de prorrogar o prazo na semana que vem. Além de considerar que o decreto, bem como novas restrições no acesso às armas planejadas pelo governo, levem a uma redução no direito à autodefesa dos cidadãos, os deputados também consideram que essas medidas vão quebrar clubes de tiro, lojas especializadas e treinadores, que prosperaram nos últimos anos com a política mais liberal do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A facilitação para a compra e porte de armas, para esses parlamentares, foi fator decisivo para a queda no número de homicídios de 2019 a 2022.
“Vamos mostrar que esse decreto é absurdo, acaba com comerciantes e clubes de tiro. E a PF não tem capacidade de fazer esse recadastramento, porque temos um milhão de CACs”, disse à reportagem o deputado Alberto Fraga (PL-DF), em referência aos caçadores, atiradores e colecionadores, grupo que conseguiu, nos últimos anos ganhar direito de adquirir armas de uso restrito e mais munições.
Para piorar, deputados dizem que o site de recadastramento não funciona corretamente. Se o ministro aceitasse adiar ou revogar o procedimento, os deputados poderiam desistir de sua convocação – que o obriga a comparecer e representa um desgaste político – e aceitariam aprovar um convite, desde que ele se comprometesse a ir à comissão. Deputados que se opõem a Dino de forma mais contundente queriam que ele fosse convocado para ir à Comissão de Segurança no próximo dia 28 – na mesma data, ele já aceitou comparecer voluntariamente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), colegiado, que, no entanto, é presidido e dominado pelo governo.
Outros deputados da bancada da segurança admitem que ele vá à Comissão de Segurança, a convite, no dia 11 de abril, data já aceita por ele e negociada por deputados governistas. “Não há intuito de esconder ministro dentro de ministério. Primeiro se convida, depois, não atendendo, se convoca. A Convocação é o poder mais duro que as comissões têm para exercer. Isso seria enfraquecer a relação salutar que queremos ter ao longo de toda a legislatura”, disse nesta terça, na comissão, o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), que negocia em nome do governo.
Deputados cobram posição sobre rebeliões no Rio Grande do Norte
Os parlamentares também cobram Dino sobre sua postura diante da rebelião, promovida por facções criminosas, que aterrorizou o Rio Grande do Norte, governado pelo PT, desde a semana passada. Foram mais de 300 ataques em 49 cidades diferentes.
Segundo Eduardo Bolsonaro (PL-SP), a governadora Fátima Bezerra (PT) teria responsabilidade direta, por não investir na segurança pública. “Não é de se admirar que PMs estejam pedindo em vídeo, como já ocorreu recentemente, dinheiro, vaquinha para consertar a viatura. Essa é a polícia de Fátima Bezerra, colega de Lula, para combater o crime organizado”, afirmou.
Nesta segunda, Dino anunciou a liberação de R$ 100 milhões para fortalecer o policiamento ostensivo e a reestruturação do sistema penitenciário no estado – a revolta se deu porque presos reclamavam das condições nas prisões.
Para deputados da direita, o ministro agiu tarde. “Enquanto Flávio Dino visitava o Complexo da Maré, ele deixava de lado a maior crise da segurança pública do estado do Rio Grande do Norte. Ele simplesmente deixou aquilo acontecer, mais de uma semana”, disse Jordy no plenário da Câmara.
Ele ainda criticou o fato de o ministro ter descartado uma intervenção federal no estado, inclusive com apoio da Forças Armadas. “Tudo isso causa muita estranheza, talvez pelo fato de o Estado do Rio Grande do Norte ser comandado por uma petista, Fátima Bezerra.”
No último domingo (19), em Natal, Dino disse que as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLOs) não resolvem a segurança pública. “As Forças Armadas são espécie de remédio extremo. Quando o sistema de segurança pública, federal e estadual, entra em colapso absoluto, o que não é a situação que nós temos aqui, é que você busca a GLO”, afirmou o ministro.
Gazeta do Povo - República
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