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segunda-feira, 5 de junho de 2023

Guerra Híbrida STF – O crime no Rio de Janeiro na era pós-ADPF 635

 Barricadas vão desde as mais simples, e de caráter transitório (que podem constar de montes lixo aos quais se ateia fogo, com móveis e carros atravessados nas vias), até as mais complexas, com pedaços de trilhos firmemente chumbados no chão e também blocos de concreto.

Um bom tempo já se passou desde que entraram em vigor as restrições determinadas pelo Supremo Tribunal Federal em relação às operações das forças de segurança cariocas em comunidades a não ser em casos ditos “absolutamente excepcionais”. 
Ao longo desse tempo, o crime organizado aproveitou esse hiato para “respirar” e reforçar seu controle sobre essas áreas
Para quem não tem ideia da quantidade de comunidades existentes no Rio de Janeiro e da quantidade de habitantes que elas abrigam, os números surpreender: o censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE indicou a existência de 793 favelas na cidade, onde vivia 22% da população, ou seja — na ocasião —cerca de 1.400.000 pessoas (sendo que, se considerada toda a região metropolitana, ou o chamado Grande Rio, esse total subiria para mais de 1.700.000 habitantes.

No entanto, um levantamento mais recente, de 2021, revelou uma significativa expansão na quantidade desse tipo de assentamento, indicando que o crime organizado atua em 1.413 comunidades no Rio (cerca de 12% do total de favelas existentes no país, sendo que, em números redondos, o tráfico domina 81% dessas áreas (a maior facção controla 828 favelas, a segunda atua em 238 e a terceira tem em suas mãos 69), ficando os restantes 19% na mão de milícias. Vale a pena ressaltar que muitas dessas favelas cresceram tanto que acabaram se unindo, formando os chamados “Complexos” (Alemão, Penha, Maré, Pedreira, Lins, etc.), compostos de várias comunidades. O Complexo do Alemão, por exemplo, é composto de 13 favelas, enquanto o da Penha — contíguo a ele — agrupa 15, e o da Maré engloba 17).

Esses números, porém, não devem ser considerados como definitivos, pois o “mapa” de quem domina quais áreas é por vezes submetido a mutações, em razão da disputa pelo controle de território. 
Sobre esse aspecto, é importante apontar que, para o crime organizado, a ação da polícia é diferenciada. 
Isso porque as forças de segurança realizam operações que não têm o objetivo de controlar territórios, ou seja: a polícia entra, cumpre sua missão (por exemplo: cumprir mandados de prisão) e sai. Via de Regra os criminosos resistem, mas há sempre a opção de retraírem caso se vejam em desvantagem, retornando ao local quando a polícia sair. 
 
Mas essas opções não existem quando se trata de incursões de outras facções ou da milícia, pois essas almejam expulsar seus adversários e assumir o controle físico de determinadas áreas, para aumentar sua presença, influência e lucro.  
A rivalidade entre esses grupos é extremamente exacerbada, e incluem pesados castigos a moradores que, por exemplo, se vistam com roupas que de alguma forma simbolizem grupos rivais, seja por suas cores ou estampas, ou sobre jovens que estejam de alguma forma se relacionando ou namorando com moradores de áreas consideradas como “inimigas”. Assim, esses confrontos, quando ocorrem, são de extrema violência.
 
Outra diferença importante é que as forças de segurança atuam dentro de regras de engajamento bem definidas, com normas explicitando quando pode ou não abrir fogo, etc. A polícia toma todos os cuidados possíveis para evitar vitimizar os moradores. 
Os criminosos, por sua vez, utilizam seu armamento sem qualquer preocupação sobre onde os projéteis irão parar ou o que irão atingir. Muitas das vítimas são atingidas pelas chamadas “balas perdidas” mesmo estando em suas casas, confiando que as paredes serão proteção suficiente — o que nem sempre acontece, pois munições de 5,56mm e 7,62mm podem perfurá-las, principalmente se os tijolos não estiverem recobertos por revestimento, como é o caso na maioria das vezes.

Quando ao argumento de que a polícia nem sempre segue as regras de engajamento, pode-se dizer que esses casos se configuram como exceções, e não são tão numerosas quanto a mídia pretende mostrar. Para a imprensa, invariavelmente, sempre que um morador de comunidade é atingido por uma “bala perdida”, a culpa é jogada sobre as forças de segurança. Além disso, muitas vezes as baixas entre os criminosos são apontadas como resultado de “massacres” ou “chacinas”, mesmo que nem tenha havido tempo hábil para algum tipo de investigação.

O domínio dos criminosos sobre as comunidades é muito forte, sendo exercido com mão de ferro. Por exemplo: uma ambulância só tem acesso a uma comunidade dominada para recolher um doente, ou um rabecão para apanhar um cadáver, ou a concessionária de energia elétrica para efetuar algum reparo, se sua entrada for autorizada pela facção dominante
Hoje em dia, a presença das UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), que experimentaram um período positivo quando de sua implantação, é — na maioria das comunidades onde estão instaladas meramente “tolerada” pelos criminosos, desde que “não façam marola”, ou seja, não incomodem as suas atividades.
 
A proibição das incursões policiais tem também grandemente favorecido um tipo de crime diferente do tráfico de drogas: trata-se do roubo de cargas. 
Frequentemente caminhões são abordados em estradas ou já no perímetro urbano e seus motoristas obrigados a desviarem seu trajeto, entrando em comunidades, onde a carga é retirada e armazenada, e o veículo é abandonado. 
Para angariar a simpatia dos moradores, às vezes é permitido que os mesmos retirem para si parte das cargas transportadas (as que não são do interesse dos criminosos que efetuaram o roubo, por falta de espaço de armazenamento ou por sua baixa lucratividade).

Além de disporem de farta munição (tanto que frequentemente atiram no modo automático, e não no semiautomático), e de normalmente em função de muitas das favelas se encontrarem em terrenos acidentados — ocuparem posições mais altas do que as forças de segurança (topos de escadarias, lajes, etc.), os criminosos contam com armamento igual ou muitas vezes mais potente que o dos policiais (é inquietante a descoberta de fuzis antimaterial, de calibre 12,7mm, em poder de grupos criminosos), conhecimento inigualável do terreno, “apoio” de parte dos moradores (em função de parentesco, amizades, ou ameaças) e muitas vezes de um certo grau de “imunidade” quando se trata da imprensa.

Uma pergunta recorrente toda vez que se trata desse assunto é: “Mas como as armas chegam às mãos dos traficantes e milicianos?”. 
Em recente entrevista concedida a um canal do YouTube, o delegado Fabrício Oliveira, que chefia a Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, e que foi o primeiro titular da Delegacia Especializada em Armas, Munições e Explosivos – DESARME, criada em 2017, declarou que foi constatado que a imensa maioria dessas armas provém do mercado negro de outros países, principalmente dos Estados Unidos, utilizando rotas marítimas, aéreas e terrestres (nesse último caso, via Paraguai)
 
Disse ainda que a grande maioria dessas armas são capazes de tiro automático (leia-se: armas que possam disparar em rajadas), um tipo de armamento que não é vendido para CACs (Caçadores, Atiradores Desportivos e Colecionadores), o que põe por terra o mito de que esse conceito explicaria a origem dos fuzis do crime. 
Revelou também que por vezes essas armas são passadas por empréstimos a outros grupos de criminosos para que esses executem grandes roubos ou invasões de território de rivais. 
Segundo ele, um estudo da Departamento Geral de Polícia Especializada estimou que, no Rio de Janeiro, havia 60.000 criminosos em liberdade (em comparação, existem aproximadamente 8.000 policiais civis, e cerca de 45.000 policiais militares, dos quais apenas metade trabalha nas ruas), e se considerarmos que possivelmente metade deles utilizem fuzis, o total desse tipo de armas no Rio poderia chegar a 30.000 unidades, quantidade imensamente superior aos cerca de 500 fuzis apreendidos pelas forças de segurança a cada ano, como em 2022. 
E isso sem considerar que, no Estado, há cerca de 51.000 presos ligados a facções criminosas.

Em resumo, poderíamos relacionar alguns dos principais efeitos da proibição de operações policiais em comunidades, sob o ponto de vista do autor, a maioria deles estabelecidos através de experiência pessoal:

  1. Aproveitando o “afrouxamento, o crime organizado procurou reforçar seu domínio sobre as áreas que atua, o que se reflete, por exemplo, no crescimento do número e da efetividade de barricadas; Estes obstáculos físicos à progressão de viaturas impedem o acesso de viaturas policiais ou “canalizam” seu progresso por vias intensamente batidas pelo fogo dos fora-da-lei.  
  2. Os tipos de barricadas vão desde as mais simples, e de caráter transitório (que podem constar de montes lixo aos quais se ateia fogo, com móveis e carros atravessados nas vias), até as mais complexas, com pedaços de trilhos firmemente chumbados no chão e também blocos de concreto. A remoção desse segundo tipo é muito difícil, e frequentemente exige máquinas como retroescavadeiras, etc., e mesmo assim nem sempre é possível sua retirada. De qualquer forma, a tropa embarcada tem sempre que desembarcar (para progredir ou até mesmo remover barricadas simples, compostas de móveis ou veículos atravessados na rua), e seus integrantes se convertem em alvos convidativos para os criminosos.
  3. Crescimento expressivo do Comando Vermelho – CV, a maior facção criminosa do Rio de Janeiro — as outras duas são a AdA (Amigos dos Amigos) e o TCP (Terceiro Comando Puro).
  4. Como já mencionado, aumento quantitativo e qualitativo do armamento nas mãos da criminalidade
  5. Presença acentuada, dentro das áreas dominadas pelo tráfico, de criminosos oriundos de outros estados e que aqui se sentem protegidos para permanecerem fora do alcance da Lei ou para continuarem comandando as ações em suas respectivas áreas. A Polícia Civil alegadamente já identificou a presença no Rio de centenas de criminosos provenientes de onze estados.
  6. Diminuição da participação da Polícia Federal – PF e da Polícia Rodoviária Federal – PRF em ações conjuntas com as forças de segurança cariocas.
  7. Embora o número de operações policiais em comunidades tenha sido drasticamente reduzido, a violência dos enfrentamentos, quando ocorrem, aumentou. Com o crime organizado fortalecido e mais fortemente posicionado em suascidadelas”, o nível da resistência oposta às forças de segurança cresceu. O Comando Vermelho, por exemplo, instruiu seus militantes a não abandonarem suas armas ou suas posições quando confrontados pela polícia ou grupos rivais, sob pena de punição severa, que pode incluir a morte. Isso faz com que o risco dedanos colaterais”, impostos à população das áreas conflagradas, aumente exponencialmente.
  8. Redução da participação da população das áreas dominadas no auxílio ao combate ao crime organizado, o que era feito principalmente através do Disque Denúncia, reportando a localização de esconderijos de indivíduos foragidos, ou informando locais onde havia grande quantidade de drogas ou de armas escondidas.
A solução desse complexo problema não é fácil nem rápida, e exige inúmeras providências em diversos segmentos da administração pública. Mas de uma coisa não se tem dúvida: a solução demanda um endurecimento da legislação, trazendo penas mais duras, que realmente possam ter um efeito desencorajador sobre aqueles que pensam em seguir o caminho do crime
Muitas vezes, um criminoso que é ativo no tráfico, porta fuzil, atira contra policiais, põe fogo em ônibus e, enfim, causa um sem número de problemas, recebe uma pena relativamente leve em comparação aos seus delitos e, portanto, em pouco tempo poderá ser libertado e retornar ao crime.
 

Ricardo Pereira

assuntosmilitares@assuntosmilitares.jor.br 
Especialista em Conflitos Urbanos
Especial para DefesaNet


quinta-feira, 23 de março de 2023

Bancada da segurança confronta Dino sobre visita à Maré, recadastramento de armas e crise no RN - Gazeta do Povo

República  - Renan Ramalho
 

Combate ao crime 

Flávio Dino e deputados da Comissão de Segurança da Câmara, em reunião nesta terça (21)| Foto: Tom Costa/MJ

A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados, majoritariamente formada por deputados de direita e pró-polícia, realizou nesta terça-feira (21) sua primeira reunião. E o foco esteve nas críticas e cobranças à condução da área, pelo governo federal, especificamente por parte do ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB).

Por pouco e só por causa de um esforço de negociação do governo, ele não foi convocado ao colegiado para ter de explicar várias condutas, declarações e suspeitas que, para os deputados, representam enormes retrocessos no combate à criminalidade e à violência no país.

Estavam pautados 15 requerimentos para obrigá-lo a ir ao colegiado para se explicar sobre temas que vão da visita que fez ao complexo da Maré ao recadastramento de armas, passando ainda pela crise de segurança pública do Rio Grande do Norte. A possibilidade de uma convocação, porém, não está descartada.
 
Um dos atos que mais incomodou os parlamentares foi um pedido de Dino ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para que investigasse cinco deputados e dois senadores no inquérito das fake news. 
Esses deputados haviam sugerido, nas redes sociais e na tribuna da Câmara, que o ministro esteve no dia 13 no complexo da Maré, local dominado por facções criminosas no Rio de Janeiro, para negociar com o Comando Vermelho.

Flávio Dino comunicou a Moraes que foi lá para se reunir com lideranças comunitárias, a fim de discutir políticas públicas de segurança – algumas das ONGs presentes no encontro militam contra a polícia, a quem acusam de violência nas comunidades pobres. O ministro da Justiça disse a Moraes que, ao associá-lo ao crime organizado, os parlamentares o caluniaram e ainda praticaram crime de racismo, porque, na visão dele, teriam sugerido que toda a comunidade da Maré seria formada por bandidos.

Nas postagens, os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Carlos Jordy (PL-RJ), Paulo Bilynskyj (PL-SP), Otoni de Paula (MDB-RJ), Gilberto Silva (PL-PB), e os senadores Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e Marcos do Val (Podemos-ES) questionaram como Dino teria entrado na favela Nova Holanda, na Maré, com pouca segurança e sem avisar as autoridades locais.

Nesta terça, na Câmara, vários deles criticaram o ministro pela tentativa de intimidá-los, pedindo que fossem investigados no STF. “Não fiz nenhuma acusação, mas queremos tirar suspeitas. Atacar os parlamentares é atacar a Constituição. Se o parlamentar não puder fazer questionamentos, não há democracia”, disse Gilberto Silva.

Filipe Barros (PL-PR) defendeu a convocação imediata de Dino para prestar esclarecimentos à Comissão de Segurança Pública da Câmara. “Ele não quer diálogo, está processando deputados da oposição querendo intimidar, com tentativa de perseguição.” “É triste ver o ministro Flávio Dino querendo calar os deputados nesta tribuna. O presidente Bolsonaro, por mais que tenha sido atacado, jamais processou alguém”, disse Luiz Lima (PL-RJ).

“Por que fazer isso, ministro? Nós mentimos? Faltamos com a verdade? Ou apenas expressamos a surpresa do povo do Rio de Janeiro e do Brasil com a liberdade com que o senhor transita nas comunidades do Rio de Janeiro, lideradas pelo Comando Vermelho?”
, provocou Otoni de Paula, alvo do pedido de investigação.

A pressão para a convocação, no entanto, vai muito além do pedido de investigação de deputados.


Veja Também:

Deputados querem mais explicações sobre visita à Maré
A própria visita de Dino à Maré é objeto de requerimentos de convocação na Comissão de Segurança Pública da Câmara. Em seu pedido, o deputado Helio Lopes (PSL-RJ) destacou que “o ministro entrou sem segurança numa das comunidades mais armadas e violentas do Brasil e as pautas abordadas não foras questões como desarmamento ou recadastramento de armas”. “Agora, foram discutidas, sim, as mortes ocasionadas pelas ações policiais. Por qual motivo não foi discutida a morte de policiais?”, justificou.

No plenário, a deputada Caroline de Toni (PL-SC) citou reportagem da Gazeta do Povo em que o coronel da PM do Rio Fábio Cajueiro, ex-comandante de operações no Complexo da Maré, diz que nenhuma autoridade entraria ali sem a autorização das lideranças do narcotráfico. “Flávio Dino, vossa excelência tem que vir aqui ao plenário explicar como o senhor entra no Complexo da Maré sem escolta policial, sem informar nenhuma autoridade. Foi falar o quê e com quem? Vossa excelência tem que se explicar!”, apelou Gilberto Silva, em pronunciamento no plenário.

Mais prazo para recadastrar armas na PF é demanda urgente
Uma questão urgente para esses parlamentares é o adiamento, ou mesmo a revogação, do decreto, formulado por Dino e assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que obrigou particulares a recadastrarem suas armas junto à Polícia Federal
Quem não realizar o procedimento até o fim deste mês perderá o direito ao porte ou posse e quem permanecer com as armas deverá sofrer um controle mais rígido por parte da PF.

Nesta segunda-feira (20), ao anunciar que mais de 600 mil armas já haviam passado pelo recadastramento, Dino disse que o prazo não seria estendido. Nesta terça (21), deputados da bancada da segurança tinham maioria de votos, entre os 38 membros da comissão, para obrigar o ministro a comparecer na semana que vem para responder as críticas à norma.

Na noite desta terça, um grupo da comissão se reuniu com o ministro na sede da pasta. Dino prometeu uma resposta sobre a possibilidade de prorrogar o prazo na semana que vem. Além de considerar que o decreto, bem como novas restrições no acesso às armas planejadas pelo governo, levem a uma redução no direito à autodefesa dos cidadãos, os deputados também consideram que essas medidas vão quebrar clubes de tiro, lojas especializadas e treinadores, que prosperaram nos últimos anos com a política mais liberal do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A facilitação para a compra e porte de armas, para esses parlamentares, foi fator decisivo para a queda no número de homicídios de 2019 a 2022.
“Vamos mostrar que esse decreto é absurdo, acaba com comerciantes e clubes de tiro. E a PF não tem capacidade de fazer esse recadastramento, porque temos um milhão de CACs”, disse à reportagem o deputado Alberto Fraga (PL-DF), em referência aos caçadores, atiradores e colecionadores, grupo que conseguiu, nos últimos anos ganhar direito de adquirir armas de uso restrito e mais munições.

Para piorar,
deputados dizem que o site de recadastramento não funciona corretamente. Se o ministro aceitasse adiar ou revogar o procedimento, os deputados poderiam desistir de sua convocação – que o obriga a comparecer e representa um desgaste político – e aceitariam aprovar um convite, desde que ele se comprometesse a ir à comissão. Deputados que se opõem a Dino de forma mais contundente queriam que ele fosse convocado para ir à Comissão de Segurança no próximo dia 28 – na mesma data, ele já aceitou comparecer voluntariamente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), colegiado, que, no entanto, é presidido e dominado pelo governo.

Outros deputados da bancada da segurança admitem que ele vá à Comissão de Segurança, a convite, no dia 11 de abril, data já aceita por ele e negociada por deputados governistas. “Não há intuito de esconder ministro dentro de ministério. Primeiro se convida, depois, não atendendo, se convoca. A Convocação é o poder mais duro que as comissões têm para exercer. Isso seria enfraquecer a relação salutar que queremos ter ao longo de toda a legislatura”, disse nesta terça, na comissão, o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), que negocia em nome do governo.
Deputados cobram posição sobre rebeliões no Rio Grande do Norte

Os parlamentares também cobram Dino sobre sua postura diante da rebelião, promovida por facções criminosas, que aterrorizou o Rio Grande do Norte, governado pelo PT, desde a semana passada. Foram mais de 300 ataques em 49 cidades diferentes.

Segundo Eduardo Bolsonaro (PL-SP), a governadora Fátima Bezerra (PT) teria responsabilidade direta, por não investir na segurança pública. “Não é de se admirar que PMs estejam pedindo em vídeo, como já ocorreu recentemente, dinheiro, vaquinha para consertar a viatura. Essa é a polícia de Fátima Bezerra, colega de Lula, para combater o crime organizado”, afirmou.

Nesta segunda, Dino anunciou a liberação de R$ 100 milhões para fortalecer o policiamento ostensivo e a reestruturação do sistema penitenciário no estado – a revolta se deu porque presos reclamavam das condições nas prisões.

Para deputados da direita, o ministro agiu tarde. “Enquanto Flávio Dino visitava o Complexo da Maré, ele deixava de lado a maior crise da segurança pública do estado do Rio Grande do Norte. Ele simplesmente deixou aquilo acontecer, mais de uma semana”, disse Jordy no plenário da Câmara.

Ele ainda criticou o fato de o ministro ter descartado uma intervenção federal no estado, inclusive com apoio da Forças Armadas. “Tudo isso causa muita estranheza, talvez pelo fato de o Estado do Rio Grande do Norte ser comandado por uma petista, Fátima Bezerra.”

No último domingo (19), em Natal, Dino disse que as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLOs) não resolvem a segurança pública. “As Forças Armadas são espécie de remédio extremo. Quando o sistema de segurança pública, federal e estadual, entra em colapso absoluto, o que não é a situação que nós temos aqui, é que você busca a GLO”, afirmou o ministro.

Gazeta do Povo - República


domingo, 19 de março de 2023

Flávio Dino explica o que foi fazer na Maré

Ministro da Justiça entrou na favela sem escolta 

 O ministro da Justiça, Flávio Dino, durante cerimônia de lançamento de um programa de entrega de viaturas para Delegacias Especiais da Mulher e para Patrulhas Maria da Penha - 15/03/2023 | Foto: Ton Molina/Estadão Conteúdo

O ministro da Justiça, Flávio Dino, publicou uma foto em resposta às perguntas sobre o motivo de ter ido visitar o Complexo da Maré, na capital fluminense. O socialista sequer usou escolta para entrar no local dominado pelo tráfico.

Na imagem, Flávio Dino aparece rodeado de ativistas. “Soube que representantes da extrema-direita (sic) reiteraram seu ódio a lugares onde moram os mais pobres”, disse o ministro.. “Essa gente sem decoro não vai me impedir de ouvir a voz de quem mais precisa do Estado. Não tenho medo de gritos de milicianos nem de milicianinhos.”

Considerada uma das mais perigosas áreas do Brasil, a região é dominada pelo crime organizado. Uma pesquisa realizada pela ONG local Redes Maré, entre 2018 e 2020, mostra que 63% dos moradores temem ser alvejado por balas na região.

A falta de escoltas durante a visita do ministro chamou a atenção do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). “Vamos convocá-lo na Comissão de Segurança Pública para explicar o nível de envolvimento dele e seu chefe, Lula, com o crime organizado carioca”, declarou, por meio do Twitter.

No complexo, moram cerca de 140 mil habitantes, distribuídos em 16 localidades. Flávio Dino esteve na Favela Nova Holanda, para o lançamento do boletim “Direito à segurança pública na Maré”, publicado anualmente pela ONG local. O evento contou com o apoio da Open Society, do bilionário George Soros.

Leia também: “Um comunista no Ministério da Justiça”, artigo de Silvio Navarro publicado na Edição 145 da Revista Oeste


segunda-feira, 10 de agosto de 2020

A dúvida municipal - Alon Feuerwerker

Análise Política


O que vai decidir a eleição para prefeito e vereador em novembro? O quadro local ou o nacional? 
Ou vai ser uma coisa em alguns lugares e a outra em outros? 
E quais serão os requisitos para alguém alcançar a maioria absoluta dos votos, indispensável a quem deseja a vitória já no primeiro turno? E o perfil mais encaixado nos desejos do eleitor médio em meio a esta pandemia? Assuntos para daqui até novembro.

Começando pelo final, há quem aposte numa onda de candidatos médicos ou das demais carreiras da saúde. A economia preocupa, mas a principal angústia das pessoas neste momento concentra-se em escapar da perseguição do SARS-CoV-2 e sobreviver à onda da Covid-19. Analistas já intuem: assim como em 2018 tivemos a onda de candidatos ligados à segurança, talvez 2020 seja a hora dos identificados com a saúde.

Mas os nomes anticrime de 2018 surfaram a insatisfação popular diante dos índices de violência e da ameaça potencial à vida e ao patrimônio. [lembrando que todas as tentativas do presidente Bolsonaro de adotar medidas para combater a criminalidade foram abatidas pelo Congresso Nacional ou Poder Judiciário = alguns dos 'abates' procederam, devido a que por falhas, propositais ou não, da assessoria do presidente, foram editados decretos para alterar leis - qualquer estudante do pré vestibular para Direito sabe que tal atitude é totalmente absurda, inaceitável.]O intrigante neste momento da Covid-19 é não existir uma maré montante de insatisfação ou revolta popular contra as autoridades. Ao contrário, o eleitor médio parece considerar que os governos estão de algum modo agindo.

Contribui para isso o sistema hospitalar não ter entrado em colapso. Mérito do Sistema Único de Saúde (SUS) e das medidas de isolamento e afastamento social, que segundo a epidemiologia produziram achatamento das curvas de casos e mortes. As curvas estão num patamar alto, mas relativamente estáveis. Pressiona para um lado a tragédia dos números fatais. Para o outro, os números não estarem em escalada aguda.

Outra curiosidade é se virá uma “nova onda” política e qual seria. O PMDB sucedeu a Arena, o PSDB sucedeu o PMDB e o PT sucedeu o PSDB. Daí veio Bolsonaro, mas já está rompido com o partido da eleição, o PSL. Assim, se a onda bolsonarista tiver continuidade municipal, virá pulverizada em múltiplos partidos. Neste fim de semana o presidente disse que vai ficar fora do primeiro turno. Ou seja, vai entrar firme no jogo quando vier a polarização.

Aí a trágica contabilidade de mortes da Covid-19 será um trunfo do antibolsonarismo. A narrativa já vem sendo bem trabalhada, uma semeadura que talvez permita boa colheita em novembro. Do outro lado, o governo tem um trunfo na economia. Os números aqui tampouco são bons, mas o dinheiro distribuído como auxílio emergencial vai ter seu papel. Principalmente no até agora grande reduto da oposição, o Nordeste. [Bolsonaro pode provar que não foi causador da mortalidade advinda da pandemia (que em novembro terá cessado - caso persista, dificilmente haverá eleições - serão adiadas por razões sanitárias, saúde pública, etc.) nem promoveu quarentenas meia-boca, na base do abre e fecha, e totalmente fora do tempo.
Nos estados do Sul a quarentena começou quando a mortalidade era praticamente 0, valendo o mesmo para Brasília.]

São os fatores da nacionalização. Mas não será prudente subestimar o localismo. O melhor palpite por enquanto é apostar fichas na racionália de que prefeitos e candidatos serão julgados pelo que fizeram ou deixaram de fazer, em particular neste último período pandêmico. Enquanto políticos e analistas gastam o miolo em torno do “fator nacional”, o eleitor talvez queira saber o que pode melhorar a vida dele no local onde mora. 

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político


segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Mourão classifica morte de Ágatha como 'tragédia' e coloca em dúvida relato da família e Witzel diz: 'É indecente usar um caixão como palanque':


O presidente em exercício afirmou que familiares podem ter sido pressionados por bandidos a negar confronto

A menina Agatha, de 8 anos, não resistiu aos ferimentos e morreu Foto: Reprodução
A menina Agatha, de 8 anos, não resistiu aos ferimentos e morreu Foto: Reprodução 
 
Mourão afirmou que é preciso fazer "o possível e o impossível" para evitar uma "tragédia" como a que aconteceu:— É uma tragédia isso, e nós temos que fazer o possível e o impossível para evitar que isso aconteça.
 
LEIA : 'Isso é a guerra do narcotráfico', diz Hamilton Mourão sobre morte de Ágatha
O presidente em exercício minimizou o relato de familiares de Ágatha e de outros moradores de que não havia confronto no momento em que a menina foi morta, dizendo que eles podem ter sido pressionados por traficantes a falar isso:— É aquela história, é a palavra de um contra o outro. Você sabe muito bem que nessas regiões de favela, se o cara disser quer foi o traficante que atirou, no dia seguinte ele está morto. Vamos lembrar de um colega de vocês, Tim Lopes, que morreu fazendo uma investigação. Então é difícil isso daí. 

Mais cedo, Mourão fez um breve comentário sobre o caso ao chegar no Palácio de Planalto:
— Isso é a guerra do narcotráfico — disse, sem entrar em detalhes.

Caso 'pode prejudicar' pacote de Moro
Mourão reconheceu que o episódio "pode prejudicar" a análise da proposta de um excludente de ilicitude para policiais, que conta no pacote anticrime elaborado pelo ministro Sergio Moro (Justiça), pela votação ocorrer em um "clima de emoção".
— Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Isso tem que ser discutido no Congresso. Eu não tenho as contas disso aí, quem faz esse trabalho de articulação é o ministro Ramos, isso não passa por mim. Não posso dar uma reposta: "Vai passar, não vai passar". Óbvio que dentro de um clima, vamos dizer assim, de emoção, como está, pode prejudicar.

Entretanto, o presidente em exercício defendeu a proposta, dizendo que os policiais precisam de algum tipo de "proteção":
— Dois policiais morreram. Ninguém comenta isso daí, parece que dois cachorros morreram. Nós, forças do Estado brasileiro, durante operação na Maré, tivemos um morto e 27 feridos. Ano passado, durante a intervenção no Rio de Janeiro, tivemos três mortos. E ninguém toca nisso aí. Então, tem que haver algum tipo de proteção. Óbvio que, uma coisa que eu falo sempre, se nós vivemos dentro de um Estado de direito, a lei tem que valer para todos. Quem infringiu a lei, tem que ser punido.


Ágatha estava em uma Kombi quando foi atingida por um tiro. Moradores afirmam que não havia confronto na favela. Segundo eles, uma policial teria feito um único disparo em direção a um motociclista que não tinha atendido à ordem de parar. Já a Polícia Militar informou que agentes foram atacados por traficantes e revidaram. Ágatha foi a quinta criança morta por bala perdida este ano no Rio e 57ª desde 2007, de acordo com levantamento da ONG Rio de Paz.

A Polícia Civil do Rio vai ouvir na manhã desta segunda-feira os policiais militares da UPP Fazendinha que participaram da ação que terminou na morte da menina. A DH também vai fazer uma reprodução simulada do assassinato durante a semana, para tentar esclarecer de onde partiu o tiro. Ágatha chegou a ser levada para o Hospital estadual Getúlio Vargas, na Penha, mas não resistiu aos ferimentos e morreu na madrugada de sábado.



'É indecente usar um caixão como palanque', diz Witzel sobre a morte da menina Ágatha




Entrevista coletiva acontece 72 horas após menina ser baleada. Governador defende política de segurança e diz que aproxima índices de criminalidade de "patamares civilizatórios"



Wilson Witzel afirmou nesta segunda-feira que a política de segurança adotada durante sua gestão está aproximando os índices de criminalidade de " patamares civilizatórios ". A declaração foi dada durante entrevista coletiva sobre a morte da menina Ágatha , de 8 anos, baleada no Complexo do Alemão na última sexta.
- É indecente usar um caixão como palanque, disse Witzel durante a coletiva. 

O governador só se pronunciou sobre a morte 72h após a menina ser atingida:
- A dor de uma família não se consegue expressar. Eu também sou pai e tenho uma filha de 9 anos. Não posso dizer que sei o tamanho da dor que os pais da menina estão sentindo. Jamais gostaria de passar por um momento como esse. Mas sei que jamais gostaria de passar por um momento como esse. Tem sido difícil ver a dor das famílias que tem seus entes queridos mortos pelo crime organizado. Eu presto minha solidariedade aos pais da menina Ágatha. Que Deus abençoe o anjo que nos deixou - disse o governador. 

Witzel afirmou também que tem uma reunião marcada com o ministro da justiça Sergio Moro na próxima quarta-feira para debater a questão da segurança no estado. O encontro já estava marcada antes da morte da menina acontecer.
- A gente não pode, de maneira nenhuma, ligar a morte da menina Ágatha à política de segurança do Rio de Janeiro - afirmou Marcus Vinícius Braga, secretário de Polícia Civil.
Na opinião do secretário, a morte da menina por uma bala perdida não põe em xeque a política adotada pelo governo Witzel.
 

 O Globo