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terça-feira, 26 de dezembro de 2023

Um pobre país rico - Percival Puggina

         Li jornal digital Poder 360° que só 30% dos brasileiros disseram dispor de R$ 200 se necessitassem desse valor em caso de emergência. O dado é fornecido pelo PoderData, divisão de pesquisa do próprio grupo, e foi realizada de 16 a 18 de dezembro de 2023. Trata-se do percentual mais baixo desde setembro de 2020, quando essa pesquisa, que é periódica, foi executada pela primeira vez.

O dado impressiona e comove. Sete em cada dez brasileiros não disporiam de R$ 200 se fosse necessário! O grau de pobreza que ele permite diagnosticar resulta de um amplo conjunto de fatores cujo produto também é medido em baixo crescimento econômico e ampliação dos desníveis sociais.

Farsantes, picaretas, vigaristas intelectuais jogam as responsabilidades sobre todos que, na atividade econômica e no mundo dos negócios, assumem riscos, criam empregos, pagam salários, geram produto econômico, prestam serviços, distribuem e comercializam os bens de consumo e pagam impostos, muitos impostos, federais, estaduais e municipais a um setor público ávido tomador de 40% de tudo que é produzido no país.

Sete em cada dez brasileiros não tem R$ 200 disponíveis, mas Brasília, que não produz um clipe de papel, tem o maior PIB per capita do país, resultante da circulação dos vencimentos pagos à elite do setor público nacional.

Sete em cada dez brasileiros não tem R$ 200 disponíveis, mas o ministro Dias Toffoli derrubou um acórdão do Tribunal de Contas da União e autorizou o pagamento de penduricalhos no valor de quase R$ 1 bilhão a juízes federais.

Sete em cada dez brasileiros não tem R$ 200 disponíveis, mas o presidente da República que manifesta tanta indignação com a pobreza dos pobres ostenta hábitos luxuosos à custa do erário.  
Se sincero em sua compaixão pelos desafortunados, sequer poderia cogitar sobre a compra de um avião novo para suas viagens! 
Se houvesse coerência entre palavra e vida, seus governos não teriam sido marcados por escândalos do porte do mensalão, no qual se disse traído, e do petrolão, que o levou junto.

Sete em cada dez brasileiros não tem R$ 200 disponíveis, mas o Congresso Nacional vai aprovar a duplicação do valor destinado a custear as campanhas eleitorais do ano que vem. E lá se vão R$ 4 bilhões para essa representação política surda aos anseios da população.

Sete em cada dez brasileiros não têm R$ 200 disponíveis
Enquanto essa miséria entrava para o presente e para o futuro, a esquerda berrava nos megafones contra o capitalismo que nunca tivemos. 
Tão repetida cantoria acabou por convencer cautos e incautos de que somente a esquerda poderia nos conduzir ao éden da igualdade, da justiça e da prosperidade geral.

Gradualmente, então, foi se abrindo a porta para o socialismo apesar de os fatos, pela janela, berrarem que isso é loucura e que tal sistema não consegue apresentar um único caso de prosperidade e democracia. Têm razão os fatos: o socialismo sempre iguala todos na pobreza, excetuadas suas elites, e só ao Estado concede liberdades. Mas isso quase ninguém fala. É nesse caminho que estamos sendo lentamente conduzidos enquanto as vozes do poder dizem ver o que ninguém vê e não ver o que todos veem.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras

 

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Aristocracia do Judiciário quer furar fila da vacina e Fux defende a indefensável 'reserva' de vacinas

Que fique bem claro: o brasileiro não é contra as castas oligárquicas que desejam furar a fila da vacina contra a Covid-19. É apenas contra ser passado para trás.

STF e STJ inventaram uma nova máxima: Vacina pouca, meu imunizante primeiro!

Era só o que faltava. Os tribunais superiores de Brasília desejam furar a fila da vacina contra a Covid. Requisitaram à Fiocruz doses em quantidade suficiente para imunizar servidores e magistrados. Para justificar o privilégio, STF e STJ recorreram ao escárnio. Alegam estar fazendo um favor ao país, pois a ausência da aristocracia judiciária nos hospitais e postos de saúde tornará mais ágil a vacinação dos brasileiros sem pedigree.

No ofício que endereçou à Fiocruz, o Supremo Tribunal Federal pediu uma "reserva de doses" para 7 mil pessoas. Escreveu que deseja "contribuir com o país nesse momento tão crítico da nossa História." Anotou que, realizando sua própria vacinação, liberará "equipamentos públicos de saúde para outras pessoas..." O Superior Tribunal de Justiça ecoou os mesmos argumentos.

A Fiocruz fabricará no Brasil a vacina da logomarca Oxford-AstraZeneca. Vinculada ao Ministério da Saúde, a entidade não cogita fornecer vacinas senão para o Programa Nacional de Imunização, que se encarregará de distribuir as doses para estados e municípios, quando for possível. A fila é um microcosmo da democracia. 
Rico ou pobre, o sujeito se posiciona no seu lugar e espera sua vez. No caso da vacina contra a Covid, a fila tornou-se uma questão de vida ou morte. Como não há imunizantes para todos, foi necessário fixar uma escala de prioridades. Vacinam-se primeiro os profissionais da trincheira da saúde. Depois, os brasileiros com doenças preexistentes. Na sequência, os idosos do grupo de risco, incluindo algumas togas. [ainda que se considerem e sejam considerados por alguns como supremos, só estarão no grupo de risco os supremos que portarem alguma comorbidade ou com mais de 60 anos.]

Na prancheta do comunista Niemeyer, Brasília era um Éden igualitário. Junto com Lúcio Costa, idealizou um lugar onde todos viveriam encaixotados em prédios iguais, plantados em superquadras idênticas. Fora da prancha de desenho, a cidade converteu-se em protótipo de privilégio e segregação.As edificações de Brasília foram dispostas segundo uma lógica setorial. Há o setor hoteleiro, o residencial, o comercial, o de clubes, o de embaixadas... Hoje, os habitantes da Capital estão distribuídos com a mesma lógica do resto do país. Há os setores de ricos e os setores de pobres. Existe a Brasília dos poderosos e a Capital dos impotentes.

A impaciência da cúpula do Judiciário subverte qualquer noção de justiça. Abre-se um abismo entre os tribunais e o Brasil. Aqueles prédios públicos monumentais, assentados no coração de Brasília... E o país lá longe. Já se sabia que um pedaço da sociedade brasileira não tomará vacina porque confia em Bolsonaro e tem medo de virar jacaré. Agora, quando a crise sanitária entra numa fase em que os brasileiros começarão a morrer por falta de vacinas, descobre-se que as Cortes brasilienses têm a sensibilidade de uma pedra.

Se Deus intimasse a cúpula do Judiciário a optar entre os seus quadros e a clientela preferencial das vacinas, ouviria uma resposta fulminante: morra a turma do grupo de risco! E com isso ficaria claro que, para certos setores, o privilégio é o grande acontecimento. Só o privilégio existe. O resto é uma fria paisagem pandêmica. STF e STJ inventaram uma nova máxima: Vacina pouca, meu imunizante primeiro!

Fux defende a indefensável 'reserva' de vacinas

Numa evidência de que os brasileiros são iguais apenas perante a dívida pública, o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal, saiu em defesa do pedido de "reserva de doses" de vacina que a Corte enviou à Fiocruz. Coisa suficiente para imunizar 7 mil pessoas, entre togas e servidores. Numa entrevista à TV Justiça, Fux declarou: "Nós também temos que nos preocupar para não pararmos as instituições fundamentais do Estado —nem o Executivo, nem o Legislativo, nem o Judiciário, normalmente, digamos assim, integrados por homens e mulheres que já têm uma certa maturidade."

O ministro prosseguiu: "Nós pedimos de toda forma educada, ética, um pedido dentro das possibilidades, quando todas as prioridades forem cumpridas, de que também os tribunais superiores tenham meios para trabalhar. E para isso precisa vacinar. Não adianta vacinar os ministros e não vacinar os servidores. A difusão da doença seria exatamente a mesma."

Alguém já disse que a morte é o clube mais aberto do mundo. O diabo é que ninguém quer entrar. Em meio a uma pandemia que está prestes a colecionar 200 mil cadáveres no Brasil, a forma mais prática de fugir da morte é a vacina. Na corrida pelo imunizante, as regras são sempre menos perigosas do que a imaginação de autoridades que tratam o absurdo como uma outra qualificação para "ética".

Noutro trecho da entrevista, Fux disse ter preocupação com a saúde dos servidores do Supremo. Beleza. Roçou o bom senso quando afirmou o seguinte: "Nós devemos ter servidores com comorbidades, com idade. Eles vão entrar na fila normalmente. E nós vamos esperar nossa vez. Enquanto não chega a cura, nós vamos trabalhar em prol das pessoas que sofrem, que têm esperança de viver."

Ora, se os servidores "com comorbidades" e os que têm "idade" entrarão normalmente "na fila" por que pedir "reserva de doses"? Se "nós vamos esperar a nossa vez", o mais lógico seria que Fux simplesmente fizesse uma autocrítica, elogiando o comportamento da Fiocruz, que informou que não destinará vacinas senão para o Plano Nacional de Imunização.

Quem comete um erro e não admite comete dois erros. Luiz Fux ainda não se deu conta. Mas, na administração pública, todo o mal começa com as explicações. Foi a partir de cobranças feitas pelo Supremo que o Ministério da Saúde teve de explicar por que demorou tanto para divulgar um plano de vacinação. Agora que as regras estão na vitrine, burlá-las em favor de seres supremos seria como reconhecer que o Brasil do jeitinho virou um país que não tem jeito. 

Blog do Josias - Josias de Souza, jornalista - UOL

 

 

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Força de Mourão vem dos erros de Bolsonaro


A oposição que me perdoe, mas, no curto prazo, o maior inimigo do governo federal é o próprio governo. A ausência de um projeto oposicionista de reforma do Estado e a crise atual do petismo constituem parte da explicação desse fenômeno. Só que existe outro lado mais importante neste processo: o eleitorado e os apoiadores de Jair Bolsonaro são muito mais amplos e heterogêneos do que o discurso mais sectário adotado regularmente pelo presidente. É disso que decorre o surgimento do vice-presidente, Antônio Hamilton Mourão, como sombra, contraponto e, numa hipótese mais extrema, alternativa real de poder.

Evidentemente que essas circunstâncias não são novidade no país. O presidencialismo brasileiro, pelo menos desde a Constituição de 1945, é marcado pelo possível conflito entre o titular e seu vice. Naquela época, a possibilidade de eleger uma dupla com políticos vindos de chapas diferentes, como foi o caso de Jânio Quadros e João Goulart, potencializava a crise. Mas mesmo durante o período autoritário houve embates fortes, como no caso de João Figueiredo e Aureliano Chaves. A falta de um papel institucional mais claro para a vice-presidência explica parte desse problema, contudo, no mais das vezes, são os erros do presidente que dão asas ao seu par.

O tipo de presidencialismo derivado da Constituição de 1988 tornou mais importante e complexa a montagem da coalizão de governo, por meio da combinação de multipartidarismo, federalismo e divisão de Poderes. O sistema não é ingovernável, como mostraram Fernando Henrique e Lula, no entanto, nenhum presidente ou partido consegue governar sozinho o país, de modo que é necessário angariar apoios políticos e sociais amplos e heterogêneos. Quando Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff perderam a capacidade de atrair os atores para além de seu grupo político mais restrito, abriram as portas não só para o próprio impeachment, mas também para a ascensão de seus vices.

É essa realidade mais geral que o presidente Bolsonaro precisa compreender. Embora a eleição dele tenha sido marcada pela crise do sistema político montado na Nova República e consolidado a partir do Plano Real, dois fatores continuam contribuindo para a necessidade de se governar por coalizão e levar em conta um espectro mais amplo de apoios. O primeiro é que sua vitória eleitoral não adveio do bolsonarismo raiz. O tamanho deste talvez esteja próximo dos dados da última pesquisa do Datafolha feita antes da trágica facada, enquete realizada nos dias 20 e 21 de agosto e que marcava 22% de preferências pelo então candidato Bolsonaro.

O episódio da facada e a incapacidade de outros candidatos de centro subirem nas pesquisas favoreceram a migração de um grande contingente de eleitores antipetistas ainda no primeiro turno para Bolsonaro, processo que se completou no segundo turno com a aquisição de votos de outro grupo considerável de cidadãos que não queriam o PT no poder. No computo final, o presidente eleito teve 55% dos votos válidos, mas deve-se ressaltar que, além dos que votaram em Fernando Haddad e daqueles que se abstiveram ou votaram branco e nulo, muitos dos que elegeram o novo governante, quiça a metade destes, não se identificavam com o bolsonarismo raiz.

Diante disso, o discurso do presidente precisa ser mais amplo e plural do que o conteúdo de seus tweets. Ao falar basicamente ao seu eleitorado mais cativo, Bolsonaro abre o flanco para o descontentamento de grande parte dos que votaram nele, para não falar dos oposicionistas e dos que não votaram em nenhum dos candidatos. Sei que seus estrategistas, principalmente seus filhos, têm uma opinião diferente. Eles preferem seguir a máxima de Trump, de apostar na manutenção do apoio dos mais fiéis. Só que há uma enorme diferença entre os Estados Unidos bipartidário e o Brasil multipartidário: aqui, sempre é possível ter mais opções políticas do que a luta entre um governo e uma oposição bem definidos.

Hoje, Mourão é a voz da moderação em comparação a Bolsonaro, atraindo a simpatia dos que votaram no presidente, mas não são bolsonaristas, e até dos que votaram no candidato da oposição. Esse poder de atração, entretanto, é um fator mais forte na esfera política e junto aos grupos de interesse mais influentes, como as instituições financeiras, a mídia, parte do empresariado, universidades e outros setores da sociedade civil organizada. É neste âmbito que há mais gente comparando o desempenho do presidente com o do vice.

A estratégia política de Bolsonaro, de discursar basicamente para os seus eleitores mais fiéis, principalmente usando as redes sociais, é a maior alavanca para o crescimento do poder de Mourão. Quando ele usa o argumento da "nova política versus a velha política" e emperra o processo político no Congresso Nacional, aqueles que querem a aceleração das reformas de Estado ficam mais descrentes do bolsonarismo e, como viúvas de seu próprio voto, procuram alguém para se consolar dentro do condomínio do governismo - se não for o vice, pode ser o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Ao atacar como inimigos da pátria grupos como a mídia, os ambientalistas, os ativistas sociais, as universidades, os professores, as minorias éticas ou de gênero e todos aqueles que não cabem no perfil bolsonarista raiz, Bolsonaro não atinge apenas a oposição. Seus atos e palavras desagradam mais gente e muitos dos seus eventuais eleitores de 2018, que não queriam o PT, mas que estão longe de um sectarismo conservador. O uso constante e radical dessa linguagem política contrasta com a comunicação feita agora por Mourão, que se orienta pela parcimônia no discurso e pela conversa com todos os atores sociais. O contraste entre presidente e vice também é percebida no plano das relações internacionais. Se Bolsonaro radicaliza o discurso sobre a Venezuela, Mourão adota uma postura mais cuidadosa e realista. Se o bolsonarismo propõe que a embaixada em Israel vá para Jerusalém, o vice conversa com os representantes dos países árabes. [não tem o menor sentido mudar na sede da Embaixada - a embaixada do Brasil deve permanecer em Telaviv e se Israel quiser mudar sua capital, aproveite e devolva o território que tomou dos árabes.

Para se massacrar palestinos, civis e inocentes, na Faixa de Gaza.]  E toda vez que o discurso da Presidência da República for contra o multilateralismo (ou globalismo, como diriam os olavistas) e agendas internacionais mais consolidadas, como a questão ambiental, parte dos atores internacionais vai procurar o morador do Palácio do Jaburu.

Mas o maior tiro no pé da estratégia política bolsonarista é tensionar a relação com os militares.
O discurso olavista, vindo do próprio ou dos filhos do presidente, começou batendo em Mourão e, pouco a pouco, migrou suas insatisfações para as Forças Armadas. Imagine se Olavo de Carvalho fosse apoiador de Lula ou Fernando Henrique e tivesse dito o que falou dos militares e de alguns de seus líderes específicos. Nem é possível imaginar.  Talvez a razão que levou setores do bolsonarismo a criticar o comportamento dos militares esteja no fato de que as lideranças das Forças Armadas, no mais das vezes, entenderam o sentido político do governo atual: para ter uma governabilidade efetiva, é preciso ampliar o diálogo e mesmo a negociação para além dos circuitos mais fechados do PSL e dos apoiadores de primeira hora do presidente Bolsonaro. E, neste sentido, comportam-se do mesmo modo que Mourão - e de maneira inversa à lógica dos tweets do presidente e seus filhos. [é preciso que Bolsonaro ceda um pouco, dispensando o assessoramento inútil dos filhos e detonando dispensando o próprio Olavo, mas, é inaceitável que os círculos mais conservadores pró Bolsonaro, que incluem os apoiadores de primeira hora e bolsões mais fechados do PSL, sejam deixados de lado.]

Claro que muitos atores políticos e analistas podem, com razão, pedir maior discrição no comportamento de Mourão. Porém, não se trata somente de uma situação individual. Do mesmo modo que o presidencialismo de coalizão responde a questões estruturais do sistema político e da sociedade brasileira, é possível dizer que quando o presidente não consegue manter um amplo apoio dos partidos e de diversos setores sociais quase que naturalmente surge um "vice-presidencialismo de conspiração". Isso já aconteceu antes, como nos casos de Collor e Dilma no período mais recente.

Pode-se acusar os vices de conspiradores, todavia, a maior causa desse processo está na inabilidade dos presidentes. Sempre se fala bem de Marco Maciel e José Alencar, pela sua lealdade em relação ao companheiro de chapa presidencial. Isso é verdade. Só que o comportamento deles esteve muito vinculado à qualidade da liderança e dos governos de Fernando Henrique e Lula, que conseguiram manter, por um longo tempo, um apoio político e social que era maior do que os seus partidos. Do outro lado do fenômeno, Itamar e Temer foram vistos como alternativa de poder quando a possibilidade de impeachment surgiu, mas vale lembrar que não eram vistos com bons olhos antes. A instabilidade e a mudança política derivaram mais dos erros dos respectivos presidentes do que pela grande capacidade conspiratória dos vices.

O presidente Bolsonaro e parte dos seus apoiadores precisam aprender com a história recente do país. Mais ainda agora, num momento em que o Brasil, mesmo se fizer reformas certas, vai demorar pelo menos dois anos para sair da crise econômica e social. Em vez de brigar com Mourão, deveriam tê-lo como ponte junto aos atores que não são bolsonaristas de raiz. Sem esse elo, a travessia será mais difícil e pode nos levar não ao Éden, mas a uma nova instabilidade política do presidencialismo de coalizão, antessala do "vice-presidencialismo de conspiração".

 
Fernando Abrucio - Valor Economico