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segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Fake News sobre fechamento de igrejas em caso de vitória da esquerda tem respaldo de deputado - O Globo

Notícia falsa se disseminou em São Paulo; Marco Feliciano, apoiador de Bolsonaro, admite que tem feito essa pregação para ‘alertar’ fiéis

A menos de dois meses da eleição, uma notícia falsa se espalhou por igrejas evangélicas em São Paulo: a possibilidade de seus templos serem fechados caso a esquerda volte a governar o país. Durante um mês, a Rádio CBN visitou seis grandes denominações no estado, além de outras menores, e em todas fiéis disseram acreditar nesse boato. Pastor da Assembleia de Deus, o deputado Marco Feliciano (PL), que é apoiador do presidente Jair Bolsonaro, admitiu que tem feito essa pregação para “alertar” os evangélicos.

Não há, nos planos de governo dos candidatos majoritários, incluindo os de esquerda, como os presidenciáveis Lula (PT) e Ciro Gomes (PDT), qualquer ataque à liberdade religiosa ou indicação de fechamento de igrejas, o que seria inconstitucional.— Conversamos sobre o risco de perseguição, que pode culminar no fechamento de igrejas. Tenho que alertar meu rebanho de que há um lobo nos rondando, que quer tragar nossas ovelhas através da enganação e da sutileza. A esmagadora maioria das igrejas está anunciando a seus fiéis: ‘tomemos cuidado’ — disse Feliciano, que é pastor da Assembleia de Deus Ministério Catedral do Avivamento.

Segundo pesquisa Datafolha de 2019, 31% dos brasileiros são evangélicos. Esse segmento é um dos únicos em que Bolsonaro, candidato à reeleição, supera o ex-presidente Lula em intenções de voto. De acordo com o último levantamento do mesmo instituto, Bolsonaro superaria o petista em dez pontos percentuais (43% a 33%) em uma eleição só com os votos de eleitores evangélicos.

Entre dezenas de fiéis ouvidos pela CBN, nenhum soube explicar de onde surgiram os boatos daameaça da esquerda”, mas a maioria acredita neles.— Se a esquerda entrar, eles tentarão fazer isso, pois não gostam (dos evangélicos). Já vi nas redes sociais candidato falar que vai proibir a pregação em praças públicas diz Fátima Dantas, evangélica há 24 anos, da comunidade da Igreja Quadrangular de Pari.

A CBN percorreu templos das maiores denominações: Assembleia de Deus, Universal, Renascer em Cristo, Quadrangular, Internacional da Graça e Presbiteriana. Sônia Samaritana frequenta a igreja Nova Vida em Cristo, em Taubaté, no Vale do Paraíba, a mais de 130 quilômetros da capital. Evangélica há 26 anos, diz que dois candidatos a deputado procuraram lideranças da igreja para pedir apoio e alertar para o risco de a esquerda vencer. — Na época mais dura da pandemia, muitos quiseram fechar as igrejas, e o povo evangélico ficou assustado — afirma.

Logo na entrada da Assembleia de Deus do Brás, no centro da capital paulista, um jornal de circulação interna estava disponível em três pilhas. Nos textos, as principais resoluções da Convenção Nacional das Assembleias. Em meio a elas, a necessidade de “combater a doutrinação progressista”.

Há evangélicos que denunciam fake news. Alice Cristina frequenta a Assembleia de Deus Ministérios Missões, em Guarulhos, há pelo menos 30 anos, e defende que a política fique fora das igrejas.— Na política, temos que pensar com razão e não com fé ou emoção — diz.

Vice-presidente nacional do PL e integrante da Frente Parlamentar Evangélica, o deputado Capitão Augusto (SP) afirmou que a notícia falsa não saiu da campanha de Bolsonaro. E criticou a disseminação de fake news:— Não tem o menor cabimento. As igrejas vão funcionar independentemente de quem esteja no poder. É boataria pura. 

[COMENTÁRIO: sobre ser fake news ou não, optamos por não se manifestar - por nos faltar elementos para um 'veredicto'; mas, na condição de CATÓLICOS = Igreja Católica Apostólica Romana =  podemos assegurar que em países comunistas foi (em alguns ainda é) prática comum perseguições ao CRISTIANISMO e aos cristãos, com fechamento de igrejas, também com prisões, torturas tenebrosas e execuções sumárias = FATOS. 
A esquerda e  o comunismo se confundem. 
Em um ato de CARIDADE CRISTÃ sugerimos ao pt = perda total = não usar o descondenado para rebater tais acusações = sua credibilidade e sua  condição de maior mentiroso do planeta Terra, não o credenciam para desmentir nada.
Vale lembrar que quando da promulgação da Constituição de 88, vários parlamentares da esquerda tentaram retirar do Preâmbulo do texto constitucional a expressão 'sob a proteção de Deus'; felizmente, mais uma vez, fracassaram.]

PT estuda resposta

Coordenador de comunicação da campanha de Lula, Edinho Silva diz que já foi identificada pelo partido a disseminação da fake news nos templos, e que o PT estuda formas de o próprio ex-presidente rebatê-la. — A notícia, além de falsa, é absurda. Foi Lula quem regulamentou, em 2003, a liberdade de constituição de igrejas no país. Se tem alguém que governou respeitando a religiosidade, em especial a evangélica, foi ele — diz. 

Política - O Globo 

 

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Por que Josiane virou evangélica - O Globo

por Ruth de Aquino

Fé e regalias na prisão

Por que tantos criminosos se tornam evangélicos na prisão?  
E não católicos, budistas, umbandistas, espíritas? 
Porque nenhuma igreja tem mais poder, influência e dinheiro do que a evangélica nas penitenciárias. Aos condenados por crimes hediondos, os pastores prometem a salvação em vida e não o paraíso após a morte. São mais persuasivos que os padres.

Agatha Moreira, a Jô, com cabelos compridos de crente, repete a conversão de tantos criminosos reais que veem na fé a única salvação


Agatha Moreira, a Jô, com cabelos compridos de crente, repete a conversão de tantos criminosos reais que veem na fé a única salvação -  Reprodução


Agatha Moreira, na pele de Josiane ou ‘Jô’, a vilã implacável de ‘A dona do pedaço’, assassina confessa que não teve tempo de matar a mãe antes de ser presa, passou a andar com a Bíblia e a gritar Aleluia, se arrependeu de todos os crimes, virou uma cordeirinha, deixou crescer os cabelos como crente, passou a rir como uma iluminada e...conseguiu redução na pena máxima, de 30 anos de prisão. Logo logo, feliz com a própria redenção, vai respirar o ar puro das escolhidas de Cristo.

O autor Walcyr Carrasco não está apelando à audiência evangélica. Apenas constata a vida real. O poder dos pastores vem de fora para dentro. Vem do Congresso, vem dos juízes, do presidente e ministros. [atualização: a facilidade que os protestantes possuem de converter assassinos em evangélicos, antecede em muito a eleição de um evangélico - presidente Bolsonaro - presidente da República.] Na ausência do Estado, em comunidades carentes de saneamento, escolas, hospitais, dignidade, os evangélicos se apropriaram da fé dos humildes e atropelaram a Igreja Católica. Os pastores são mais profissionais e pragmáticos, não necessitam estudos de Teologia e têm um discurso menos elitista do que o dos padres. O que não falta a Walcyr é a inspiração em conversões de criminosos famosos pela premeditação e crueldade. 

Suzane Von Richtofen, mandante do assassinato de pai e mãe, condenada a 39 anos, foi batizada pela Assembleia de Deus na prisão. Quando for libertada, bem antes de concluir a pena, ela se tornará pastora da Igreja Quadrangular. Na última “saidinha” no Dia das Mães, ela subiu ao púlpito de uma igreja e afirmou ter matado os pais porque foi “seduzida pelo diabo”. O mandante foi portanto o demônio e ela apenas uma vítima – embora psicólogos a considerem fria e manipuladora.

O goleiro Bruno, condenado por mandar matar a mãe de seu filho Bruninho com requintes de premeditação e crueldade, também virou evangélico, casou num culto ainda na prisão, já está de volta ao futebol e postou um vídeo em seu perfil ‘oficialbrunogoleiro’ no Instagram. Nele, um pastor grita, chora e ri: “Satanás vai dizer, você é um lixo, você não serve! O Espírito Santo vai te lembrar: você é escolhido!” A vítima, Eliza Samudio, coitada, não sabia que lidava com o demônio, pensava ser só o goleiro do Flamengo. O corpo dela ainda não apareceu.

Guilherme de Pádua, condenado pelo crime premeditado de Daniella Perez em 1992, com 18 punhaladas no pulmão, coração e pescoço, só ficou preso sete anos. Tornou-se obreiro da Igreja Batista da Lagoinha. Lançou um canal no YouTube em janeiro de 2019, explicando por que se tornou evangélico. “Não sou mais eu quem vivo, mas Cristo vive em mim. Tenho a mente de Cristo. Tenho o coração de Cristo”. Pádua lamentou a rejeição nas ruas: “Cheguei a levar cuspida na cara”. E disse que “sempre ora pela vida de Glória Perez”.

Anna Carolina Jatobá, condenada por jogar a enteada Isabella, de cinco anos, do sexto andar, também virou evangélica na prisão, passou a frequentar cultos e goza de regalias por isso. Detentos evangélicos levam uma vida melhor do que os outros. Os pastores oferecem aos “apenados” proteção e cuidados. Em troca de obediência. Algumas restrições são: bebidas e prática de homossexualidade. Conversei com Jaqueline Vasconcellos, 37 anos, professora de teatro, arte e música que ensinou 10 anos em penitenciárias. Ela deixou de ser atriz para estudar Direito. Seu relato é impressionante. “A Igreja Evangélica tem espaços bonitos, arrumados e pintados. Os espaços católicos parecem extensões do presídio. A Igreja Evangélica investe. Tem material de música, organiza atividades, corais. Em algumas prisões, há celas especiais para evangélicos. O poder deles sobre o comando interno é forte. Um detento parou de ir às minhas aulas de teatro porque, se ele faltasse ao culto, seria transferido para uma penitenciária que equivalia a uma sentença de morte”. 

ameaças e privilégios, diz Jaqueline. Um preso só conseguiu cigarros com os pastores depois de se converter. Antes, nem guimba. Os pastores fazem a ponte com a família. Passam recado, comida. Evangélicos são presos vip. Ganham água gelada, ventilador. Podem circular no presídio. O detento passa a crer, por fé ou oportunismo. O pastor promete que o receberá lá fora. E que ele será um herói, um sobrevivente, um escolhido”. 

A religião entra onde o Estado não existe. Ela dá um sentido à vida dos despossuídos e abandonados. Os pastores só querem almas e dízimos em vida, não têm preconceito. Trabalham com traficantes e milicianos, fora e dentro. Quando entrevistei o Nem, na Rocinha, foi por intermédio de uma igreja evangélica. Gente humilde honesta e do bem enxerga os pastores como seus semelhantes. Assassinos, alcoólatras, viciados sabem que, como evangélicos, podem culpar Satanás e retomar a vida como novos homens, novas mulheres.
“Se eu fosse presa, claro que eu virava evangélica”, diz Jaqueline. Eu também. E deixaria o cabelo crescer igual à Jô.

Ruth de Aquino, jornalista - O Globo


domingo, 23 de dezembro de 2018

Damares Alves vê ministério como 'chamado divino'

Escolhida por Bolsonaro, futura titular da pasta da Mulher, Família e Direitos Humanos é conhecida por defender ‘direito à vida’ e políticas conservadoras

Na manhã do dia 6 de dezembro, Damares Alves, como de costume, auxiliava seu então chefe, o senador Magno Malta (PR-ES), na condução da CPI dos Maus Tratos no Senado. A comissão investiga crimes contra crianças e adolescentes, assunto caro à evangélica Damares. Ela, no entanto, deixou a sala antes do fim da reunião. Quando Malta encerrou as discussões, voltou ao gabinete, e encontrou sua assessora dando entrevistas como futura ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos. [os temas que dão nome ao ministério,  que será ocupado por Damares, não justificam mais uma pasta - os três assuntos poderiam ser tratados pelo Ministério da Cidadania, apesar de haver dúvidas se há necessidade de uma pasta para cuidar da 'cidadania'.
É também um tema que ficar muito bem cuidado com o status de Secretaria e vinculado a um ministério, digamos, tradicional.]

Segundo amigos próximos, Damares foi surpreendida pelo convite de Jair Bolsonaro e decidiu aceitá-lo porque entendeu que se tratava de um “chamado divino”. A decisão foi previamente discutida em seus grupos de WhatsApp. Malta sabia do interesse do presidente eleito pela sua assessora, mas levou um susto com o anúncio. A história acabou estremecendo a relação entre os dois. [o senador 
esnobou convite do presidente eleito, para ser seu vice e, obviamente, a recusa deixou a impressão de desinteresse em fazer parte do futuro governo - apesar de ter participado com grande empenho da campanha do capitão.]


Assim que seu nome foi anunciado, internautas resgataram vídeos de palestras em igrejas, em que Damares contava que viu Jesus em um pé de goiaba. A história, colocada fora de contexto, levou a uma onda de memes que irritaram o presidente eleito. No Twitter, Bolsonaro disse ser “extremamente vergonhoso debocharem do relato”. A futura ministra acabou esclarecendo que a aparição havia se dado durante um quase suicídio, após sofrer sucessivos estupros quando criança, cometidos por pastores. Para o grande público, tudo foi uma grande e chocante novidade, mas o assunto fazia parte de suas pregações pelo País.

Em vídeos no YouTube, é possível ver uma futura ministra que brada contra a discussão de temas relacionados a gênero nas escolas e diz que a educação sexual precisa ser autorizada pelos pais. Mas também que afirma que “os cristãos sempre acolheram os gays”. A retórica é simpática, eloquente e emocional.  Damares faz apresentações didáticas, com uso de slides. Um deles mostra um material feito pelo Ministério da Saúde sobre prevenção do HIV, com cenas de sexo. A evangélica afirma que ele foi mandado para escolas, “para crianças de 10 anos”. “Vocês não estão prestando atenção ao que está acontecendo com seus filhos nas escolas brasileiras”, dizia aos fiéis, anos antes de livros contra a homofobia, apelidados de “kit gay”, se tornarem tema das eleições. Procurado, o Ministério da Saúde informou que o material é para adultos e “nunca foi distribuído às escolas”. 

Aborto e gays.
“Se a gravidez é um problema que dura só nove meses, o aborto é um problema que caminha a vida inteira com a mulher”, disse Damares, para indignação das feministas, em uma das suas primeiras declarações como futura ministra da Mulher. E, mais ainda, vai apoiar um projeto que dá direitos ao feto e restringe o acesso ao aborto legal. A proposta foi vista como uma espécie de “bolsa-estupro” para mulheres que decidirem não abortar.
O amigo e deputado federal Sóstenes Cavalcanti (DEM-RJ) conta que Damares é admirada no meio evangélico pela “dedicação para valorizar a vida, os direitos humanos e conservadores”. E é isso que a maioria do povo brasileiro quer, acredita ele. “Ela tem competência técnica e experiência para ser uma ministra em plena sintonia com Bolsonaro.”
 
Damares Regina Alves, de 54 anos, nasceu em Paranaguá, no Paraná, mas se mudou cedo para Sergipe. “Me autodeclaro sergipana por ser o lugar mais lindo do mundo”, disse ela, em mensagem de WhatsApp ao Estado. Morou ainda na Bahia e São Paulo, acompanhando o pai pastor. Formou-se professora e advogada. “Não esquece de colocar na matéria que, segundo pesquisas, sou a pastora mais bonita do Brasil, corintiana feliz e convicta.”  Em 1999, mudou-se para Brasília para trabalhar no gabinete do tio, o deputado e pastor Josué Bengtson (PTB-PA). Três anos depois de deixar a assessoria, em 2006, o parlamentar foi alvo da Operação Sanguessuga, acusado de desviar recursos para compra de ambulâncias. As ações prescreveram. Até 2015, quando começou a trabalhar com Malta, foi ainda secretária parlamentar de cinco deputados da bancada conservadora. 

Índios
Damares é divorciada, adotou uma menina indígena, hoje com 20 anos, e quer adotar mais duas crianças. O abuso na infância a teria impedido de ter filhos. A garota foi salva do que ela chama de “infanticídio indígena” e que se tornou uma de suas principais causas. Ao conhecer mães que haviam fugido de aldeias porque discordavam da cultura de matar crianças com deficiências ou doenças graves, ela resolveu fundar uma ONG sobre o assunto. “A batalha dela é pela vida. Já recebeu famílias indígenas em casa porque não tinham onde ficar”, conta a advogada Maíra Barreto Miranda, cofundadora da ONG Atini. As duas lutaram na Câmara pela aprovação de uma lei para proteger as crianças indígenas. Mas um filme sobre o tema, coproduzido pela Atini, foi proibido de ser divulgado pelo Ministério Público Federal. O órgão entendeu que ele leva à discriminação do índio.

Ao Estado, Damares contou também que já está pensando em programas para prevenção da automutilação e do suicídio infantil. “Esse tema não teve o olhar dos gestores públicos. Os pais estão desesperados.” Os casos de suicídios no Brasil têm crescido na faixa etária de 15 a 19 anos, segundo o Ministério da Saúde. Entre crianças, os números são baixos, com exceção das indígenas.

Segundo o assessor Luiz Carlos Bassuma, que trabalhou com Damares, pesou na decisão dela a transferência da Funai para a pasta que vai comandar. “Eu disse a ela: ‘você não buscou isso, não pleiteou, não pode negar’. É um chamado de natureza espiritual, para cumprir uma missão na nação.”
Pela falta de missionários evangélicos no Nordeste, Damares se tornou pastora muito jovem. Atuou primeiro na Igreja Quadrangular, da qual seu pai foi fundador, e hoje está na Igreja Batista da Lagoinha. Ambas são neopentecostais. “A igreja evangélica cresceu demais, amém, mas o que de fato está fazendo para mudar a sociedade?”, perguntava numa palestrava em 2013. Ela mesma dava a resposta. “Deus está nos preparando para uma nova fase, que é a transformação da sociedade.”

O Estado de S. Paulo