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quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Fora do “grande jogo” - Nas entrelinhas

Não está claro o objetivo de Bolsonaro ao desafiar os xiitas iranianos e seus aliados no mundo árabe. O mais correto é manter o Brasil longe da rota do terrorismo árabe

O Irã é uma república islâmica, tem um Estado teológico desde a queda da monarquia em 1979. Recém-chegado de 14 anos de exílio, o Aiatolá Khomeini protagonizou a Revolução Iraniana com amplo apoio popular e é seu líder máximo até hoje. Berço de uma das civilizações mais antigas do mundo (data de 2.800 a.C.), a antiga Pérsia viveu grande expansão durante o Império Aquemênida, fundado por Ciro, o Grande, em 550 a.C: se estendeu do Vale do Indo, no Leste, à Trácia e Macedônia, na fronteira nordeste da Grécia. São quase cinco milênios de história.
 

Derrotados por Alexandre, o Grande, os aqueménidas entraram em colapso em 330 a.C., mas o país alcançou uma nova era de prosperidade após o estabelecimento do Império Sassânida, em 224 d.C.. Durante quatro séculos, o Irã foi uma das principais potências da Europa Oriental e da Ásia Central. Em 633, árabes muçulmanos invadiram o Irã, num processo de expansão do Islã que também chegou à Península Ibérica, em 711, com a invasão comandada por Tarik, o Grande. Com cientistas, acadêmicos, artistas e pensadores persas influentes, em 1501, a formação do Império Safávida promoveu o xiismo duodecimano islâmico como religião oficial e se tornou um divisor de águas do mundo árabe. Esse momento é a gênese do atual projeto de expansão da influência religiosa do Irã.

Em 1794, Aga Muhammad Khan, chefe de uma tribo turca, fundou a dinastia que permaneceu no poder até 1921. Em meio às disputas entre a Rússia czarista, que lhe tomou a Geórgia, o Daguestão, Baku e a Arménia caucasiana, e o Império Britânico, que exerceria grande influência sobre os reis Qadjaridas, o Irã conseguiu manter sua soberania e nunca foi colonizado. Mas jamais saiu de sua posição subalterna no “grande jogo” entre as duas potências europeias na Ásia, mesmo depois da revolução constitucional persa de 1905-1921, que derrubou a dinastia Qadjar, e levou ao poder Reza Pahlavi.

Em 1941, em plena Segunda Guerra Mundial, o Reino Unido e a União Soviética chegaram a invadir o Irã, de olho nos seus poços de petróleo. Durante a “guerra fria”, os Estados Unidos forçaram o xá a abdicar em favor de seu filho, Mohammad Reza Pahlavi, em quem enxergavam um governante que lhes seria mais favorável. O reinado do xá tornou-se progressivamente ditatorial, especialmente no final dos anos 1970.

Terrorismo
A deposição de Reza Pahlavi foi uma derrota para os Estados Unidos, que se enfraqueceu em toda a região. O clero xiita assumiu o poder, adotou leis conservadoras inspiradas no Islamismo e mantém rígido controle político e ideológico do país. Todos os governos iranianos pós-revolucionários criticaram o Ocidente e os Estados Unidos; as relações nunca mais foram as mesmas. A partir de 1980, o Irã e o Iraque enfrentaram-se numa guerra destruidora que durou oito anos. Os Estados Unidos entraram em guerra com o Iraque, por duas vezes, a última para depor e matar Saddam Hussein, um ditador sunita num país de maioria xiita. O caos iraquiano abriu caminho para a influência iraniana junto aos xiitas daquele país.


Desde a vitória de Mahmoud Ahmadinejad em 2005, e sua reeleição fraudulenta, em 2009, conservadores e reformistas se enfrentam no Irã, mas o país se unifica em torno do projeto de expansão da influência xiita no mundo muçulmano, cujo grande artífice era o general Qasem Soleimani, comandante das Forças Quds, unidade de elite da Guarda Revolucionária. Seu assassinato no Iraque, pelos Estados Unidos, comoveu o país. O Irã não tem um grande exército para enfrentar os norte-americanos, mas tem um programa nuclear avançado, que os Estados Unidos e Israel consideram uma ameaça. Além disso, exerce grande influência sobre grupos armados de origem xiita, ou seja, pode promover uma guerra assimétrica numa região onde disputa influência com os Estados Unidos em aliança com a Rússia e a China. Irã tem fronteiras com Armênia, Azerbaijão e Turquemenistão, ao Norte; Cazaquistão e Rússia, no Mar Cáspio; Afeganistão e Paquistão, a Leste; Golfo Pérsico e Golfo de Omã, ao Sul; Iraque, a Oeste; e Turquia, ao Noroeste.

Essa região é um barril de pólvora. Temos boas relações com todos esses países, mas nunca fizemos parte desse jogo de superpotências. As declarações do presidente Jair Bolsonaro contra o Irã, endossando as acusações de “terrorismo” do presidente Donald Trump e o assassinato do general Soleimani, fogem à tradição da diplomacia brasileira. Além disso, inquietam e intimidam a pacata comunidade árabe que vive no Brasil. Não está claro o objetivo de Bolsonaro ao desafiar os xiitas iranianos e seus aliados no mundo árabe. O mais correto é manter o Brasil longe da rota do terrorismo árabe.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense

 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

E o Brasil com isso? - Eliane Cantanhêde

No maior teste da nova política externa, Brasil adota neutralidade ou assume lado?

O conflito dos Estados Unidos com o Irã é o maior teste do governo Jair Bolsonaro e já exibe duas claras guinadas, não apenas em relação aos governos petistas, mas à própria política externa tradicional do Brasil. E o pior está por vir, pois a vingança do Irã é certa, mas não se sabe quando, como e com que grau de ferocidade. O que fará o Brasil? [O Brasil tem que ser pragmático e seguir o caminho que qualquer estadista de importância, digno do nome - incluindo o próprio Trump - faria:
Colocar os INTERESSES do BRASIL ACIMA DE TODOS os demais interesses.
Acima do Brasíl, só DEUS ACIMA DE TUDO - que está, sempre esteve e sempre estará acima de tudo. 
E na situação atual a NEUTRALIDADE é a melhor, e mesmo a única opção de privilegiar os interesses do Brasil, colocando-os acima de todos os outros.
Registramos nosso entendimento de que não haverá guerra.
Saiba mais, lendo aqui.]

As duas mudanças perpassam as discussões de cúpula do governo e podem ser identificadas na nota do Itamaraty. A primeira é que o foco no Oriente Médio não é mais o conflito Israel-Palestina e sim o Irã. A segunda é que o Brasil deixa de tratar o terrorismo como uma questão distante, dos países desenvolvidos e do Oriente Médio. O terrorismo passa a ser problema nosso, sim.[considerando a natureza da operação, o caráter que não existe uma guerra declarada, estamos diante de um novo tipo de terrorismo? o terrorismo de estado?]

No “novo Brasil”, alinhado incondicionalmente não só aos EUA, mas ao governo Trump, o Irã é a maior ameaça internacional, com seu projeto audacioso de hegemonia na região e insinuando-se até como novo líder mundial a partir do seu programa nuclear. Persa, não árabe, é o Irã quem assume a dianteira no enfrentamento a Israel, negando até o holocausto e o próprio Estado de Israel, como já se esgoelava Mahmoud Ahmadinejad, homem forte do país entre 2005 e 2013.

Tanto Trump quanto Bolsonaro têm forte base política entre judeus e evangélicos, que estão na linha de frente pró-Israel. Não por acaso, o primeiro compromisso e a segunda manifestação de Trump após o ataque que matou o principal líder militar iraniano foram em Miami, num evento evangélico. Agregue-se à ascensão do Irã a sua proximidade com a Venezuela de Nicolás Maduro e tem-se a suspeita de apoio iraniano à instalação de células do Hezbollah na América do Sul. Bom pretexto para a mudança da posição brasileira sobre terrorismo. Não é mais “coisa dos outros”.

As primeiras manifestações do presidente Jair Bolsonaro foram bem-vindas. Ele admitiu o impacto da crise sobre o preço do petróleo, mas descartou tabelamento. Ponto com o mercado e com o Ministério da Economia. E lembrou que o Brasil não tem armamento nuclear e não pode assumir um lado, ficando sujeito a retaliações. Ponto com os militares e com a diplomacia responsável. A nota do Itamaraty, porém, é toda em cima do combate ao terrorismo e embica para a condenação ao Irã e o apoio aos EUA, deixando em aberto qual será a posição brasileira se, ou melhor, quando o Irã retaliar. Nesse momento, Trump cobrará posição e ação. O que o Brasil responderá? [NEUTRALIDADE; na Guerra das Malvinas, o Brasil assumiu uma postura correta e corajosa e manteve sua neutralidade naquele conflito, adotando as medidas adequadas que devem ser padrão no comportamento de uma nação neutra - inclusive negando trânsito sobre espaço aéreo brasileiro à aviões das nações beligerantes.
A Suíça se manteve neutra,  encravada entre países em conflito, durante a Segunda Guerra Mundial, e ao fim do conflito estava MAIOR do que ao início.
Talvez seja até conveniente que a competência para emitir manifestações  sobre a situação no Oriente Médio seja afastada, ainda que temporariamente, do Itamaraty.]
A nota não condena a ação americana e o assassinato do general Suleimani, mas sim, além do “terrorismo”, os ataques à embaixada dos EUA em Bagdá. E diz que o Brasil está pronto para participar de “esforços” para evitar uma escalada. Participar como? Como mediador neutro ou a favor de um lado? Ouçam-se os generais e estrategistas militares e eles responderão: “não é coisa nossa”. Ouçam-se embaixadores e especialistas em política externa e eles farão coro: “não temos nada a ver com isso”. E, juntos, concordam com a primeira avaliação de Bolsonaro: o Brasil não tem tamanho para entrar nessa guerra. Melhor seguir o exemplo da França: pedir cautela e fim da escalada. Ponto.

Além da questão geopolítica e dos riscos para o planeta, a crise envolve questões internas. Trump convive com o impeachment e a reeleição neste ano. O Irã sofre rejeição em parte do Iraque e do Líbano. Logo, arrumar “inimigos externos” é conveniente a ambos, assim como Hugo Chávez recorria ao “demônio” EUA a toda hora para unir a Venezuela. Objetivamente, o Brasil pode muito pouco num conflito ou numa guerra assim e tem de se preocupar com a ameaça imediata: o preço do petróleo. Isso, sim, tem reflexos diretos no País. Inclusive, na política interna.
 
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo
 
 
 
 
 

sábado, 10 de janeiro de 2015

O PT e Charlie Hebdo

O que ocorreu em Paris fere a conquista mais preciosa da humanidade, que é o direito de se manifestar. 

Alega-se que o cristianismo teve seu tempo de trevas na Idade Média. Pois é: quantos séculos faz? Estamos em pleno século 21

Terrorismo e coerência não combinam. Caso contrário, os energúmenos que enxergam agressão numa piada, por mais abjeta, veriam que é incomparável, sob todos os aspectos, com o que eles mesmos promovem em terras muçulmanas contra cristãos. Mais de cem mil cristãos – incluídas aí crianças - são assassinados por ano no mundo muçulmano pelo simples fato de que são cristãos. Não fazem proselitismo, não hostilizam, não fazem piada, nem muito menos constroem templos. Apenas têm outra crença. É o bastante.

Somente em Paris, há mais de cem mesquitas – grande parte construída nesta Era em que o Ocidente é alvo de atentados e hostilidades, sob pretexto religioso -, sem que se impeça ou constranja alguém de frequentá-las (a partir de agora, e em decorrência do que aconteceu na quarta-feira, já não se sabe). O atentado tem força simbólica maior que os inúmeros que o precederam nos últimos anos em todo o Ocidente. O alvo foi a liberdade, personificada numa revista de humor. Nesses termos, é ainda mais chocante que o das Torres Gêmeas de Nova York, que atingiu o coração financeiro do capitalismo.

O que ocorreu em Paris fere a conquista mais preciosa da humanidade, que é o direito de se manifestar. Alega-se que o cristianismo teve seu tempo de trevas na Idade Média. Pois é: quantos séculos faz? Estamos em pleno século 21. De lá para cá, muito sangue correu para que jornais pudessem circular livremente. O Charles Hebdo já ridicularizou padres, pastores e rabinos, e nenhum apontou nem sequer um estilingue contra a revista.[qual o prazer em ridicularizar uma religião? ou ver uma religião ser ridicularizada?
ridicularizem uma Nação, um Povo, mas deixem as religiões em paz. Respeitem a crença de cada um.]

Comentou-se a pouca ênfase com que o governo brasileiro repudiou o episódio, sem falar no silêncio de entidades diretamente ligadas às vítimas – Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), por exemplo. Outras, como PT e CUT, por meio de alguns de seus militantes, procuraram atribuir, nas redes sociais, a responsabilidade às próprias vítimas. É compreensível. É para essa gente – os que representam os algozesque a diplomacia brasileira (e bolivariana) tem direcionado seus interesses na Era PT. Foi Lula quem trouxe para cá, e o recebeu com tapete vermelho, o sanguinário ditador iraniano Mahmoud Ahmadinejad, que proclamava seu propósito de banir Israel da face da terra.

Foi ele também que comparou atos repressivos homicidas no Irã, em retaliação a protestos contra fraudes eleitorais, a uma briga de torcida entre Flamengo e Vasco. Dispôs-se a mediar, num lance cômico que o Charlie Hebdo, se lhe desse importância, teria ridicularizado -, os conflitos do Oriente Médio. Lula, como se recorda, invocou seus dons de sindicalista para resolver um conflito imemorial, que transcende a capacidade de compreensão (e solução) da humanidade.

Pior: pretendeu resolvê-lo em favor de uma das partes, o que desfaz o sentido do verbo mediar. Em Israel, recusou-se a visitar o monumento ao fundador do sionismo, Theodor Herzi, gesto diplomático que nenhum chefe de Estado, em visita ao país, recusa fazê-lo. Já Dilma, no final do ano passado, num igualmente ridículo discurso na assembleia da ONU, condenou as retaliações militares aos degoladores do Exército Islâmico, propondo diálogo.[aqui deve ser lembrado que Dilma participou de várias organizações terroristas, inclusive de uma das mais violentas e que vitimou o soldado Mario Kozel Filho. Dilma, Dirceu, Pimentel,Genoíno, Franklin Martins e toda a corja petralha não mudaram, continuam com a mente criminosa, apoiando e defendendo o terrorismo, condenando a liberdade de imprensa, apoiando aborto e outros atos criminosos e covardes que as religiões sérias reprovam.]

Sua proposta, quem sabe, poderia agora ser recolocada à polícia francesa e às famílias das vítimas. O tom da diplomacia petista, que transformou o Itamaraty de órgão de Estado numa célula partidária, é de hostilidade aos Estados Unidos e à União Europeia. Ao Ocidente. E de franca simpatia a governos que promovem e acobertam atos como os que estarreceram o mundo na quarta-feira. A diplomacia do PT definitivamente não pode repetir com o mundo civilizado: “Je suis Charlie”.

Fonte: Ruy Fabiano - O Globo