Experiências anteriores mostram que PDVs não costumam surtir efeito
Planos
de demissão voluntária esbarram na judicialização em busca da retomada
dos direitos, em uma baixa adesão e em propostas no Congresso para
readmissão dos exonerados
A baixa adesão em experiências anteriores, o risco de que uma
judicialização em busca de retomada de direitos e o apadrinhamento de
políticos com projetos para reintegração aos cargos anteriores mostram
que, na maior parte dos casos, os planos de demissão voluntária (PDVs)
implementados pelo governo federal dão em praticamente nada. A medida
provisória do governo Temer prevê uma adesão de 5 mil — haverá um
programa por ano até 2023. Mas ele terá de ser encaminhado ao Congresso,
onde tramitam ao menos cinco projetos de lei propondo a reincorporação
dos quase 15 mil servidores que deixaram a máquina pública ao longo do
governo Fernando Henrique Cardoso.
Para
deixar ainda mais claro que a tramitação da proposta não deve ser
fácil, algumas dessas iniciativas foram apresentadas por parlamentares
que integram a base de apoio do atual governo. Só o líder do PRB na
Câmara, Cleber Verde (MA), tem duas iniciativas: uma apensada a outra
proposta, de autoria do atual ministro do Esporte, Leonardo Picciani
(RJ), e outra à espera de análise pela Comissão de Trabalho,
Administração e Serviço Público. “Quem não aprende com os erros do
passado corre o risco de errar duas vezes e vai repetir o equívoco no
futuro”, alertou Verde.
O líder do PRB adianta
que a matéria será alvo de um intenso debate na Câmara e que o governo
está enganado se pensa em uma aprovação tranquila. “A experiência dos
PDVs feitos antes dos anos 2000 mostra os equívocos e os traumas que
eles provocaram. Vários servidores foram alvo de assédio moral para
aderir aos programas e, no fim, ficaram frustrados porque não
conseguiram ter êxito em seus empreendimentos. Muitos até cometeram
suicídio”, afirmou o deputado maranhense.
Na
opinião de Luiz Alberto dos Santos, ex-subchefe da Casa Civil (governos
Lula e Dilma), consultor legislativo do Senado e professor da
Ebape/FGV, os PDVs deveriam prever cláusula de “arrependimento eficaz”,
com previsão de retorno ao cargo anterior em um prazo predeterminado,
mediante ressarcimento do valor recebido, ou em caso de descumprimento
das condições oferecidas pelo governo ou empresas. “Como isso nunca é
feito, fica aquela coisa de que quem saiu se sentiu enganado ou entrou
numa fria e quer voltar”, disse Luiz Alberto.
Fatores
Especialistas
veem com ceticismo uma grande adesão ao PDV que o governo está tentando
realizar neste momento. “Estamos em um momento de recessão e de
desemprego elevado. A taxa de sucesso ao programa deverá ser baixa”,
aposta o economista Bráulio Borges, da LCA Consultores. A mesma opinião é
compartilhada pelo advogado Fernando Zilveti, professor de finanças
públicas da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Zilveti
lembra uma curiosidade interessante em relação ao hoje presidente Michel
Temer. “Quando Fernando Henrique tentou fazer uma reforma
administrativa e reduzir o tamanho do Estado, o então presidente da
Câmara, Michel Temer, bombardeou a reforma, alegando que ela impedia
novos concursos e limitava o reajuste dos servidores”, lembrou o
advogado.
Licença de até seis anos
O PDV proposto pelo governo para
os servidores públicos civis do Executivo corre o risco de gerar mais
custos do que a economia de R$ 1 bilhão por ano estimada pelo Ministério
do Planejamento. A pasta propõe que a iniciativa seja publicada por
medida provisória, que também deverá prever a jornada de trabalho
reduzida com remuneração proporcional e a Licença Incentivada sem
Remuneração (LIP) de até três anos, prorrogáveis por igual período.
Especialistas avisam que essa MP tem um risco elevado de judicialização
das demissões, mesmo que voluntárias.
“Muitos
servidores podem aderir ao PDV, receber uma bolada e depois entrar na
Justiça para serem reintegrados, como já aconteceu no passado”, alertou o
economista Braulio Borges, da LCA Consultores. “É provável que o custo
para reintegrar quem entrar na Justiça será bem maior do que a economia
que o governo está prevendo com o PDV, mais do que o dobro, como a
história recente provou”, avaliou o advogado Fernando Zilveti, professor
de finanças públicas da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP).
Os
dois especialistas citaram como exemplo as reversões de demissões
feitas durante os governos de Fernando Collor de Mello e de Fernando
Henrique Cardoso. “Milhares de servidores foram reintegrados e ganharam
os direitos que haviam perdido. No fim das contas, não houve economia
alguma. Pelo visto, o presidente Michel Temer não está ouvindo o
conselho de Roberto Campos de ‘que é preciso aprender com os erros do
passado’”, comentou Zilveti.
O consenso entre
os analistas é que o governo não está atacando o problema com esse PDV
de resultado pífio comparado ao rombo das contas públicas. Para Borges,
da LCA, o privilégio adquirido é que precisa acabar e nem sequer foi
mexido na reforma da Previdência, pois o deficit do funcionalismo é
muito maior do que o do setor privado se comparado pelo número de
beneficiários. “Se governo investir em uma agenda para cobrar uma
contribuição previdenciária maior de servidores já aposentados, seria
mais justo, além de corrigir uma injustiça. O PDV só faz cócegas. É
preciso gastar energia com algo que realmente impacte nos custos
públicos”, pontuou. “Esse R$ 1 bilhão não cobre o aumento real de um mês
do reajuste dos servidores, de R$ 8 bilhões até maio”, comparou o
economista Fernando Montero, economista-chefe da Tullet Prebon Brasil.
(RH) [o que o Borges chama de 'privilégio adquirido' é DIREITO ADQUIRIDO e a Constituição Federal garante o direito adquirido.
E, mesmo que o governo dobrasse o percentual da contribuição previdenciária dos servidores aposentados a economia obtida causaria um 'cócegas' de menor intensidade do que as que segundo ele seriam causadas pelo PDV.]
Fonte: Correio Braziliense