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sábado, 20 de julho de 2019

A Velha e a nova CPMF - O Estado de S. Paulo

Disputa de propostas de reforma tributária é gasolina pura

Jair Bolsonaro deu nesta sexta-feira um sonoro “não” à volta da CPMF. Mas a declaração do presidente não mudou em nada a intenção da equipe econômica de buscar a aprovação de uma contribuição incidente sobre os meios de pagamentos para bancar a desoneração da folha salarial das empresas. É parte da estratégia do ministro da Economia, Paulo Guedes, justamente procurar distinguir a nova contribuição previdenciária da velha CPMF, que deixou de vigorar em 2007 depois que o Congresso rejeitou a proposta do governo Lula de prorrogar a sua vigência por mais quatro anos.
[desde a primeira CPMF, nos tempos do ex-presidente Itamar Franco, chamada então de IPMF, sempre foi apresentada como IMPOSTO ÚNICO e PROVISÓRIO.
Em nenhuma das versões foi provisório ou único.
Temos que ficar alerta e impedir a criação do mais famigerado e inútil imposto até hoje criado no Brasil.]

Ao dizer mais uma vez que a CPMF não volta, Bolsonaro, de certa forma, ajuda nessa estratégia da via da diferenciação. O discurso do presidente reforça o mote da área econômica de que uma coisa não é mesma que a outra, para convencer os parlamentares a encampar a ideia de uma nova contribuição na votação da reforma tributária.  A equipe econômica prepara a narrativa de que a velha CPMF é um tributo que veio em cima de vários outros tributos para aumentar a carga tributária e gerar mais arrecadação para o governo na época em que foi criada. Ela não eliminou nenhum tributo e, por isso, teria se transformado no vilão visto hoje pela sociedade. Um símbolo da pesada carga de impostos no Brasil.

O argumento usado é o de que a nova contribuição de pagamentos, a CP, como vem sendo chamada informalmente, seria um tributo mais amplo do que a CPMF. Viria como um “salvador” para eliminar outro imposto muito pior, a contribuição previdenciária das empresas, que hoje incide em 20% dos salários. Essa mesma narrativa já foi apresentada ao presidente Bolsonaro pelo ministro Paulo Guedes em reunião esta semana. O texto de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma tributária já está pronto. Ele prevê, além da criação de um imposto sobre valor agregado (IVA) para substituir os impostos federais incidentes sobre consumo, a criação da CP.

Como antecipou o Estado em reportagem publicada na terça-feira passada, se aprovada, a CP começaria com uma alíquota de 0,6% para desonerar a parte da folha de salários acima do teto do INSS. Até a desoneração total da folha, empregados e empregadores pagariam a mesma alíquota, de 8,5% de contribuição para a Previdência.  A estratégia para convencer a opinião pública passa também por mostrar que a CP teria as mesmas características operacionais (a forma de cobrança) de tributos que já existem hoje, como o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mas não o mesmo “espírito” da morta CPMF.

Em outra frente, o time de Guedes se alimenta do crescimento do movimento de apoio do setor empresarial para conseguir levar adiante a proposta. No caso do movimento Brasil 200, de mais de 300 empresários que apoiaram o presidente Bolsonaro. O grupo lançou esta semana um manifesto pela criação de uma CPMF com alíquota de 2,5% para a criação do Imposto Único no País, uma ideia lançada no passado pelo atual secretário da Receita Federal, Marcos Cintra.  Muitos empresários têm procurado o presidente para mostrar interesse na CP. De alguma forma, a proposta radical do grupo de apoiadores do presidente, mesmo que rejeitada, pode pavimentar o caminho para a criação da CP e a desoneração da folha de salários ao abrir o debate nacional.

A tentativa de volta da CPMF em 2007, e depois em outras ocasiões, recebeu forte rejeição dos empresários.  Agora, o movimento dos empresários apoiadores da eleição de Bolsonaro quebra essa postura e promove um racha no meio empresarial, que até agora vinha apoiando em grande maioria a proposta de criação do IVA único para União, Estados e municípios, feita pelo economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF). A proposta da CCiF foi a encabeçada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e apresentada pelo líder do MDB, Baleia Rossi (SP).


A disputa de propostas de reforma tributária entre a equipe econômica e a Câmara, que incluiu nos últimos dias o Senado e os secretários de Fazenda dos Estados, é gasolina pura. Ou haverá convergência de ideias ou a reforma não anda. Com ou sem a nova CPMF.

Adriana Fernandes - O Estado de S. Paulo 


 

sábado, 13 de julho de 2019

Congresso empurra para STF decisão sobre prisão em segunda instância

Para escapar de desgaste com opinião pública, parlamentares retiraram tema sensível de pacote anticrime apresentado pelo ministro Sergio Moro 

As prisões de condenados por tribunais de segunda instância é o novo pano de fundo para a tensão entre o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). Tanto entre os parlamentares, como na Corte há interesse em mudar a regra atual, que permite o início do cumprimento da pena de forma antecipada. Mas os dois vértices da Praça dos Três Poderes evitam tomar a decisão para evitar desgaste com a opinião pública.  [o Congresso por incrível possa parecer age de forma correta;
o Supremo apesar de a instância máxima do Poder Judiciário, ser a Corte que pode errar por último (segundo Rui Barbosa) não tem o direito de legislar só sobre o que lhe convém.
- Vejamos o caso da homofobia: criminalizar tal conduta rende pontos para a opinião pública e diante disso Supremo decidiu  legislar, (e lei está valendo) mesmo tendo sido notificado pelo Senado Federal, com antecedência, da existência naquela Casa de dois processos sobre o assunto em tramitação - o que elide qualquer fundamento para acusar o Poder Legislativo de omissão;
- Agora o caso da prisão em segunda instância: o Supremo não tem interesse em manter preso, condenados com confirmação da sentença em segunda instância.  Pelo menos como regra geral, alcançando todos condenados.
Só que inexiste espaço para abrir exceções e proibir a prisão em segunda instância deixaria a Corte Suprema em má posição perante a opinião pública - curioso é até fácil de entender a preocupação do Congresso - uma casa política - com a opinião pública, mas o STF, a INSTÂNCIA MÁXIMA do Poder Judiciário não pode,nem deve, se preocupar com a opinião pública e sim o respeito às Constituição e às leis.]

Na terça-feira, o grupo de trabalho da Câmara dos Deputados que analisa o pacote anticrime apresentado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, retirou do projeto o trecho que transformaria em lei as prisões em segunda instância. Esse movimento tira o foco da discussão do Congresso e empurra para o STF. O presidente do tribunal, Dias Toffoli, vinha evitando o assunto, mas o jogo virou. Na semana passada, declarou que os processos que tratam das prisões antecipadas não estão na pauta do plenário do segundo semestre, mas ainda podem ser incluídos. A tendência na Corte é dar aos condenados o direito de recorrer em liberdade por mais tempo, até que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirme a punição. 

O relator dos processos, ministro Marco Aurélio Mello, acha natural que o STF decida, e não o Congresso. Há meses ele pede para Toffoli incluir o julgamento no calendário. "O lastro da matéria é constitucional, e não legal. No segundo semestre enfrentaremos, tenho fé, essa controvérsia", disse Marco Aurélio à coluna. O senador Marcos Rogério (DEM-RO), ligado a Moro, resumiu bem o quadro atual: "Acho que nesse momento ninguém quer colocar a mão nessa cumbuca. O Supremo e o Congresso sabem qual é o sentimento da sociedade sobre a prisão em segunda instância e, em momento de maior tensão, a cautela é o melhor caminho".


A decisão do grupo de trabalho da Câmara não foi surpresa. Moro já esperava que isso acontecesse, por causa do cenário político em torno da discussão. Ainda assim, a retirada de um dos principais pontos do pacote anticrime é contabilizada como uma derrota para o ministro da Justiça, que está sob os holofotes desde que o site The Intercept Brasil passou a divulgar supostos diálogos entre ele e o procurador da República Deltan Dallagnol.  As mensagens noticiadas revelam que os dois teriam combinado a condução do processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que resultou em condenação. Ironicamente, eventual mudança da regra da segunda instância beneficiaria Lula, que foi preso depois de ter a condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) . 

Para retirar a segunda instância do pacote anticrime, o discurso dos parlamentares foi de que a proposta mudaria a Constituição Federal — portanto, deveria ser discutido em uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Por trás do discurso, está a vontade de mudar a regra da segunda instância. Mas uma vontade ainda maior de empurrar para o Judiciário o desgaste que essa decisão acarretaria. 

Revista Época - por Carolina Brígido