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quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

Trump matou ‘Dr. Evil’ - William Waack

O Estado de S.Paulo

Desde o fim da Guerra Fria o Irã expandiu-se no Oriente Médio, e os EUA encolheram

A ordem do presidente Donald Trump para matar o general iraniano Qassim Suleimani expressa o fim da hegemonia americana no Oriente Médio. Estabelecida com grande abrangência desde o fim da Guerra Fria e a primeira Guerra do Golfo, em 1991, essa hegemonia foi perdida em grande parte por ações e erros dos próprios americanos, involuntariamente os principais responsáveis pela inédita expansão política e militar do Irã naquela região.

Como resultado de grandes acontecimentos, como a derrota do Taleban no Afeganistão, a desagregação do Iraque pós-invasão americana de 2003, a “primavera árabe” (que sacudiu monarquias sunitas), o acordo de potências (Rússia, China e as europeias) sobre o programa nuclear iraniano, o fim do Estado Islâmico e a restauração do poder de Assad na Síria, até o momento da liquidação do general, o Irã exibia uma posição política e militar no Oriente Médio mais forte do que possuía havia cinco anos. Levou uns 20 anos para chegar lá. O que muda agora?

A execução de Suleimani nada parece alterar na postura dos EUA diante da complexa situação do Oriente Médio: objetivos erráticos, concentração (uma quase obsessão) no conflito na Palestina, pouca vontade de se envolver em guerras, abandono de aliados (de militares egípcios a curdos). E não saber lidar com uma fratura fundamental na região: xiitas são apenas 10% entre os muçulmanos no mundo, mas quase a metade dos muçulmanos no Oriente Médio, o que ajuda a entender o peso dessa milenar disputa cultural, política e sectária em todos os vizinhos do Irã.

Boa parte da capacidade de expansão que o Irã registrou desde a Revolução de 1979 está no suporte sectário que recebeu de populações xiitas quase sempre tratadas como minorias perigosas em países árabes sunitas (alguns importantes para os EUA, como Arábia Saudita) – e não tanto o aspecto ideológico, embora o “feito” da revolução conduzida pelos aiatolás tenha sido o de virar de cabeça para baixo a relação entre religião e Estado no mundo islâmico.

A coligação levada adiante pelo Irã, num arco que vai do Afeganistão ao Mediterrâneo, passando pelo “coração” da região (norte do Iraque e Síria), mostrou-se razoavelmente coesa, enquanto o bloco “anti-iraniano” de aliados dos americanos tem motivos diversos, é mais fragmentado geograficamente e, pelo menos nas aparências, é adversário da principal potência militar amiga dos EUA na região, Israel, inimiga do bloco xiita também. Embora bem menos poderoso, o Irã pode ser comparado à Rússia e à China no papel de “revisionistas” da ordem de segurança e poder vigentes desde o fim da Guerra Fria. Como russos e chineses, iranianos se consideram herdeiros de civilização milenar que teria “primazia” sobre seu entorno, mas, ao contrário do que aconteceu na Rússia e na China, no Irã a ideologia como eixo de ação do regime não cedeu e tem como objetivo expulsar do Oriente Médio o inimigo “Grande Satã”, tal como o líder revolucionário Ruhollah Khomeini batizou os EUA – o grande corrompedor, que o digam Adão e Eva.

Ocorre que a visão “estratégica” de Trump vem direto de filmes nos quais um “Dr. Evil” precisa ser eliminado. Pena que roteiros de Hollywood se preocupem menos com coisas como o fim de uma ordem hegemônica, isto é, quando outros ocupam o lugar de quem antes podia fazer ou desfazer. Do ponto de vista político e militar, Rússia e Irã derrotaram os EUA e na guerra civil da Síria. O Irã é o virtual “ocupante” do Iraque. A Turquia, integrante da Otan, faz o que quer. Até a monarquia saudita olha hoje com mais cuidado para Moscou e mesmo Teerã, enquanto a China não esconde a intenção de, se puder, incluir o Irã no seu estratégico projeto de uma nova Rota da Seda. Mas Trump acha que matou o facínora.
 
William Waack, jornalista - O Estado de S. Paulo 
 
 

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

TERREMOTO NO IRÃ - Alexandre Garcia


Gazeta do Povo



No fim de semana, a terra tremeu no nordeste do Irã, na magnitude 5,8 da escala Richter. Mas a morte de Qassim Suleimani foi um sismo em grau máximo da escala.   O Chefe da Guarda Revolucionária da teocracia iraniana era também planejador estratégico e tático para controle do poder no Líbano, Síria, Iraque, Afeganistão e Iêmen, para cercar Israel e enfraquecer outros aliados dos Estados Unidos, como a Arábia Saudita.

O Hezbollah no Líbano se tornou um estado dentro do estado. Os Xiitas na Síria, os Houthis no Iêmen, o Hamas, o movimento Jihad Islâmico, eram instrumentos para Suleimani, que usava árabes e afegãos para não constranger as forças regulares do Irã em missões alheias à defesa de seu país."Parecia um herdeiro de Xerxes, filho de Dario e neto de Ciro, a dinastia que fez da Pérsia, hoje Irã, a grande potência que dominou o oriente médio da antiguidade, até que o macedônio Alexandre, o Grande, destroçasse o império.

Não parece sonho imaginar que o objetivo de Suleimani fosse o reerguimento do Império Persa. Sua presença ia das praias do Mediterrâneo ao Golfo Pérsico. Estava dentro do Iraque quando foi atingido, depois que os americanos, por falta de decisão, adiaram o momento de “puxar o gatilho”, embora tivessem tido outras oportunidades para lançar o ataque. A decisão de matar Suleimani não é um desafio dos Estados Unidos ao Irã; é um aviso e uma ameaça. O governo americano não está preocupado com a pesquisa nuclear iraniana; já sabia que acordos só seriam cumpridos no cerimonial. Israel vem monitorando o programa nuclear do Irã, pois disso depende a sobrevivência do país que se fundou com sangue e se mantém com sangue e vigilância.

Suleimani era a fonte de foguetes que sempre ameaçam Israel por todos os lados. Ele é dessas figuras de retaguarda e front, sempre presente a incentivar seus comandados. Por isso, sua morte é um desfalque maior que a de Bin Laden ou do líder do Estado Islâmico. No Irã, só estava abaixo do Aiatolá.  Seus seguidores atacaram petroleiros, cobriram de mísseis a maior refinaria da Arábia Saudita, mataram quase mil americanos no Iraque. E o governo americano esperou. Mas o recente ataque à embaixada em Iraque, onde estava Suleimani, fez Trump dar a ordem de fogo. "Até o momento em que escrevo, não vi manifestações fortes da China ou Rússia. Cada potência respeita os interesses da outra. Americanos não se meteram na Ucrânia ou em Hong Kong. O Irã não ganharia a guerra, mas pode fazer uma boa negociação. Só não pode controlar movimentos que ficaram órfãos de seu comandante e inspirador.

Pode haver vinganças de um lado, com punição imediata por parte dos americanos. Mas não haverá guerra mundial, como catastrofistas de plantão falam. Se houvesse, duraria apenas um dia e acabaria."

Alexandre Garcia, jornalista -  Coluna na Gazeta do Povo