Propina a jato
Superfaturamento
de US$ 900 milhões na compra de 36 caças supersônicos pode
ter favorecido Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, e o
prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho
O Ministério Público
e a Polícia Federal estão convencidos de que Luís Cláudio Lula da Silva, filho caçula do
ex-presidente Lula, e o prefeito petista de São Bernardo do Campo, Luiz
Marinho, estão envolvidos com o recebimento de propinas na compra dos 36 aviões
caças suecos Gripen feita pelo governo federal em outubro de 2014. O negócio no valor de US$ 5,4 bilhões é um dos mais nebulosos
realizados pela gestão de Dilma Rousseff.
SIGILO BANCÁRIO Documentos da PF e do MP provam que Luis Cláudio
Lula da Silva recebeu R$ 10 milhões de forma ilegal (Crédito: ERNESTO
RODRIGUES/ESTADÃO CONTEÚDO/AE)
A
hipótese de um superfaturamento estimado
em US$ 900 milhões vem sendo apurada há algum tempo, mas, na semana
passada, agentes da Operação Zelotes que tiveram acesso
à quebra do sigilo bancário da empresa de Luís Cláudio se convenceram de que
propinas foram efetivamente pagas. A LFT Marketing Esportivo, empresa do filho do presidente, era investigada
por ter movimentado irregularmente R$ 4,6 milhões. Os documentos bancários,
porém, provam que Luís Cláudio recebeu
mais R$ 10 milhões dos lobistas Mauro Marcondes e Cristina Mautoni. Ambos atuaram, com o aval e apoio do prefeito Marinho, na venda
dos caças.
O dinheiro encontrado
nas contas da empresa de Luís Cláudio será rastreado e, nos próximos dias,
toda a documentação será remetida para um outro grupo do Ministério Público do
Distrito Federal que investiga
especialmente o negócio feito com os suecos. O inquérito aberto para apurar
a compra dos aviões chegou a ser arquivado em outubro do ano passado, mas foi
reaberto em fevereiro após uma busca e apreensão feita no escritório dos
lobistas, atualmente presos pela Zelotes. Agora, com a descoberta dos R$ 10 milhões do filho de Lula as investigações
se afunilam. “A escolha dos caças da
empresa sueca pode ter sido resultado não apenas de critérios técnicos, mas de
possível influência indevida”, redigiu o procurador Anselmo Cordeiro Lopes
no despacho que reabriu as investigações. “Essa
influência envolve corrupção de agentes ou ex-agentes públicos federais”. O contrato assinado
pelo governo tem um valor US$ 900 milhões acima da proposta efetuada pela
própria empresa sueca. E-mails apreendidos pela Operação Zelotes
mostram que um executivo da Saab (representante
do Gripen) procurou a ajuda de Marcondes e do prefeito Marinho para agendar
reuniões com o ex-presidente Lula meses
antes de ser assinado o compromisso.
“Temos
indícios de que os R$ 10 milhões localizados na conta da LFT tenham origem no
esquema dos aviões”,
disse à ISTOÉ na quarta-feira 1 um
dos procuradores que acompanham a Operação Zelotes. “E temos provas concretas de que o prefeito Luiz Marinho participou
desse negócio”. O procurador estranha o fato de o prefeito ter influenciado
na compra dos caças, ainda que em São Bernardo esteja uma das unidades da Saab. “Por que um prefeito que não tem nenhuma
relação com as Forças Armadas e nenhum conhecimento técnico sobre aviões de
guerra exerceu tanta influência nessa negociação?”, questiona o procurador.
O ESCOLHIDO
O Gripen era o azarão e acabou favorito. Qual o segredo? (Crédito:Divulgação)
É
verdade que o prefeito, ex-sindicalista, não tem conhecimento técnico para
optar sobre a compra de caças supersônicos e participou ativamente do processo que escolheu os caças
Gripen para equipar a FAB. Mas o que não lhe faltou durante os anos de governo do PT foi
influência política. Marinho é íntimo da família do ex-presidente.
Considerado por Lula o melhor candidato para disputar o governo de São Paulo em
2018, é um dos poucos petistas que visita o ex-presidente sem avisar com
antecedência. Embora tenha se reunido
com americanos e franceses que concorreram com os suecos, Marinho sempre se
mostrou um parceiro da Saab.
Em 2010, o
prefeito, embora não tivesse nenhum cargo formal para tratar do caso, viajou a
Suécia e chegou a voar em um caça Gripen. Naquele
momento, Lula havia praticamente se comprometido a comprar aviões franceses e
no início do governo de Dilma os caças norte-americanos foram apontados pelo
Ministério da Defesa como os favoritos. A escolha do Gripen surpreendeu a todos
os especialistas. “O peso político do
prefeito, muito próximo da família Lula foi determinante para a decisão”,
afirma um lobista que defendia a compra dos caças norte-americanos.
De acordo com os delegados e
procuradores que atuam na operação Zelotes, o rastreamento dos R$ 10 milhões encontrados na conta da empresa do
filho de Lula certamente indicará a origem dos recursos. Num confronto
preliminar feito com os documentos apreendidos no escritório dos lobistas, os
investigadores encontraram indícios de que a empresa possa ter sido usada para
receber as propinas e que parte do dinheiro possa ter sido repassada a Luiz
Marinho. O prefeito nega qualquer irregularidade, mas
admite ter defendido a compra dos aviões suecos junto a autoridades do governo
federal.
Segundo ele, o objetivo não era obter vantagens indevidas, mas
criar um polo de desenvolvimento tecnológico em São Bernardo. Dois oficiais da FAB ouvidos na semana
passada por ISTOÉ, no entanto, asseguram que
houve pagamentos de propinas e lamentam
o fato de a própria Aeronáutica não ter tido uma participação mais efetiva na
elaboração do contrato.
O ex-presidente Lula já depôs
nesse processo e disse achar “um absurdo”
a possibilidade de seu filho e de Marinho terem se beneficiado. Nas próximas
semanas, tanto o prefeito como o caçula de Lula deverão ser convocados para dar
explicações.
O
jogo duplo de Lula
O novo e último
livro da série do jornalista Elio Gaspari sobre a ditadura militar brasileira,
“A Ditadura
Acabada”, é a parte mais
conhecida da narrativa sobre os anos de chumbo. Vai do desmantelamento de
regime autoritário, a partir de 1977, até a abertura, marcada pela eleição de
Tancredo Neves, em 1985. Passa assim pelo nascimento de Luiz Inácio da Silva, o
Lula, como liderança. Gaspari mostra
como nas grandes greves metalúrgicas do Grande ABC, em São Paulo, Lula cresceu e se
tornou uma figura de destaque nacional.
Mas o ganho de popularidade
pessoal do então líder do Sindicato dos Metalúrgicos não
foi, como se sabe, acompanhada pela vitória dos trabalhadores representados por
ele. O livro relaciona fatos,
entrevistas e documentos que legitimam a desconfiança
da composição do líder com os “patrões”
na derrota da paralisação de 1979. Ilustram declarações (de “companheiros”, inclusive) e a reprodução
de um bilhete afetuoso a Cláudio Bardella, com quem Lula negociou a capitulação
de 1979, uma derrota para a categoria que representava. (Ana Weiss)
Fonte:
Isto É