Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Taça. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Taça. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

A besta quadrada leva a taça - Augusto Nunes

 Revista Oeste

Dilma é eleita a melhor do ano por economistas que acham que 30% de 30% não é 30% de 30%

 

Dilma Rousseff, ex-presidente do Brasil | Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado 

Ouvi pela primeira vez um discurso de improviso de Dilma Rousseff no verão de 2010, quando Lula já decidira transformar em sucessora a chefe da Casa Civil. Fiquei atônito
Na forma, o palavrório era um desfile de frases sem começo, meio e fim, desentendimentos entre sujeito e predicado, plurais com “sss” amputados, verbos no infinitivo acaipirados pelo sumiço dos “rrr”, reticências que anunciavam abruptas mudanças de rumo que também não chegariam a lugar nenhum, vírgulas bêbadas atrapalhando o trânsito das palavras, fora o resto. No conteúdo, o falatório empilhava platitudes de debutante e maluquices.

Das duas, uma: ou eu me transformara numa cavalgadura ou aquela mulher era uma perfeita besta quadrada.   
Não havia uma terceira hipótese. 
Nos dias seguintes, enquanto examinava com lupa meus próprios escritos, mantive sob estreitíssima vigilância tudo o que Dilma dizia. 
Com a sofreguidão dos obsessivos profissionais das crônicas de Nelson Rodrigues, comecei a assediar todo jornalista que tivera alguma conversa com Dilma Rousseff. 
Segurava-lhe os braços e repetia o interrogatório: “E então? Deu para entender alguma coisa? Ela disse alguma frase compreensível?”.

Um deles garantiu que a entrevista transcorrera normalmente.
       Outro afirmou que ela sempre se mostrava bem mais desembaraçada em conversas a dois. E quase todos estranharam minha aflição: ninguém havia notado nada de estranho em Dilma Rousseff. 
Eu certamente andava exagerando. E então fui socorrido pelo jornalista Celso Arnaldo, um craque em língua portuguesa e bom senso que se tornara colaborador do blog que eu mantinha no site de Veja. “Essa mulher fala um subdialeto indecifrável”, liquidou o assunto Celso Arnaldo. 
Quem dizia que compreendia o que vinha da boca de Dilma estava mentindo, concluímos. Ponto final.
 
Foi esse blog que batizou o mistério linguístico e deu o furo mundial: Dilma Rousseff, e ninguém mais no mundo, falava dilmês.  
Nos meses e anos seguintes, a coluna acompanhou com tamanha atenção a estranha figura que há tempos me dei conta do paradoxo sem precedentes. Dilma é a única chefe do governo brasileiro desde 1978 com quem nunca conversei. 
Mas talvez seja quem eu mais conheça. Nunca serei fluente em dilmês, até porque para tanto é preciso não falar coisa com coisa. Mas aprendi o necessário para afirmar, no começo da campanha eleitoral de 2010, que o Brasil poderia ser presidido por uma candidata perto de quem dona Maria I, a Louca, seria considerada um exemplo de sensatez.

A advertência não impediu que o neurônio solitário de Dilma ganhasse a disputa pela Presidência em 2010. 
 (Cumprimentei pela façanha o principal adversário, José Serra: não é fácil ser derrotado por uma concorrente com severas avarias na cabeça.) Tampouco evitaria a reeleição com o triunfo sobre Aécio Neves e o maior desastre econômico sofrido pelo país neste século. A essa altura, já era tratada como piada de péssimo gosto pelo Brasil que pensa e presta. Foi essa parte saudável da nação que exigiu o despejo de Dilma depois de descobertas as pedaladas criminosas e impôs o impeachment ao monumento à cegueira coletiva.

Durante cinco anos e meio, a seita que tem num presidiário o seu único deus aplaudiu o desfile de espantos. Dilma anunciou, entre tantas outras ocorrências assombrosas, que por trás de toda criança há um cachorro oculto, que uma ponte é muito importante porque une um ponto a outro, que é gravíssimo permitir que a pasta saia do dentifrício, que 13 menos 7 é igual a 9, que 30% de 30% não é 30% de 30%, que a pandemia só seria liquidada pelo isolamento horizontal porque as famílias vivem na horizontal e o coronavírus — muito esperto, muito solerte — aprendeu a atacar sempre na horizontal.

O PT, embora menos esperto, menos solerte, tratou de manter Dilma longe de palanques desde o fiasco da candidatura ao Senado por Minas Gerais em 2018. Lula, capaz de deixar pra trás a família inteira se for esse o preço de uma vitória nas urnas, não reservou um espaço para a companheira no latifúndio ministerial com 39 gabinetes de luxo. Preferiu mandar Dilma Rousseff para a China, que no cérebro despovoado de neurônios do presidente é o país mais longínquo do planeta (e mesmo assim, quem diria?, foi invadido por Napoleão Bonaparte, pelo menos na cabeça de Lula). 

O País do Carnaval já foi considerado o país das oportunidades. 
Hoje é um viveiro de oportunistas de picadeiro. 
Há pouco mais de três anos, por exemplo, a paranaense Janja da Silva era namorada de preso. Hoje é primeira-dama. 
Aos 20 anos, Dilma Rousseff militava num grupelho que acha possível derrubar à bala o governo militar, sepultar o regime capitalista e instalar a ditadura do proletariado. Hoje, a jovem assaltante de bancos é a sessentona que ganha uma fortuna por mês para presidir o Banco do Brics.

Está feliz como pinto no lixo, confirma a mais recente aparição de Dilma na internet. A bordo de um avião, ouve de uma passageira a exclamação: “Viajando de primeira classe!…”  
A mais rabugenta governante da História foi à réplica: “Lógico, querida. Eu sou presidente de banco, querida. E você acha que presidente de banco viaja como?”. Dito isso, seguiu em frente para alojar as malas em alguma parte do bagageiro que nunca lembra qual é.

Enquanto isso, na primeira classe da Emirates:

“Eu sou Presidente de Banco, querida”.
— Roussef, Dilma (2023) pic.twitter.com/jEjdS8WyQc— Renata Barreto (@renatajbarreto) December 13, 2023


Não se sabe direito o que anda fazendo na China. Ninguém sequer ouviu falar de um único e escasso projeto relevante produzido por sua gestão. Mas o que fez, faz ou deixou de fazer foi considerado suficiente pelo Sistema Cofecon/Corecons, que reúne o Conselho Federal de Economia e os Conselhos Regionais de Economia, para outorgar-lhe a máxima condecoração da entidade: Mulher Economista de 2023. É possível que, isolada na China, Dilma tenha aprendido a somar, subtrair, multiplicar e dividir. Se isso aconteceu, os economistas eleitores e a economista eleita se merecem.

Preciso agora descobrir o local do evento. Dilma certamente vai falar. Tomara que seja de improviso. Faz tempo que não ouço uma peça retórica em dilmês castiço.Meme com frase de Dilma Rousseff | Foto: Reprodução/Redes Sociais 
 
 

 
 

domingo, 8 de julho de 2018

sexta-feira, 15 de junho de 2018

O ópio do povo

Apropriando-se de uma máxima do idealizador do comunismo Karl Marx, que dizia que a religião é o ópio do povo, o genial Nelson Rodrigues acusava os esquerdistas modernos de acharem que o futebol, sim, é o ópio do do povo. Bem quisera Vladimir Putin que a frase de Nelson, não a de Marx, fosse verdadeira na Rússia de hoje, quando começa para valer a última etapa do seu projeto de “soft power” em relação à Copa do Mundo de futebol.

Sem grandes expectativas por parte da população, descrente da seleção depois de uma série de derrotas, Putin sabe que o objetivo não pode ser entregar a Taça ao capitão russo Akinfeev, já considerado o pior goleiro da Liga dos Campeões, mas sim entregar ao mundo uma Copa bem organizada e sem problemas de violência, comuns aos torcedores russos, e riscos para a segurança das delegações e de milhares de autoridades e turistas que vão chegando à Rússia.

O fracasso da seleção russa é tamanho que um famoso jornalista de televisão iniciou campanha de autoestima denominada “o bigode da esperança” com base no bigode do técnico Stanislav Cherchesov.  Atribui-se a Putin uma improvável manobra no sorteio das chaves da Copa para que o jogo inicial fosse contra um time inofensivo. Deu Rússia e Arábia Saudita, a única seleção que tem piores resultados que os dos anfitriões. 

Coincidência ou não, esta será apenas uma das três Copas em que o jogo de abertura não tem um país campeão em campo. Em se tratando de FIFA e de Putin, tudo é possível, no entanto. Além da Arábia Saudita, a chave dos anfitriões tem ainda o Egito, dois países de maioria muçulmana que se encontram em posições distintas na guerra da Síria em relação à Rússia, que apóia a Bashar Al Assad: enquanto a Arábia Saudita opõe-se ao líder sírio, o Egito tem posição mais cautelosa. O Egito, no entanto, pode causar danos irreversíveis a Putin na Copa do Mundo. Como uma das duas vagas do grupo deve ficar com o Uruguai, a disputa da segunda ficará provavelmente entre Rússia e Egito, que tem no jogador Salah um diferencial que pode eliminar a seleção anfitriã ainda nas oitavas. [Atualizando: Egito perdeu para o Uruguai, 1 a 0 e a Rússia venceu a Arábia Saudita por 5 a 1.]

Cercado de símbolos capitalistas, o passado comunista da União Soviética que Putin ajudou a enterrar cisma de estar presente, como em frente ao estádio de Lujiniki, onde uma estátua de Lenin tem que conviver com uma grande propaganda da Coca-Cola. Em tudo semelhante ao filme alemão “Adeus Lenin”, que conta as dificuldades de um filho que tenta mudar a realidade para proteger a mãe, uma comunista radical que sai do coma após um ano, e não suportaria visões chocantes para ela, como a queda do Muro de Berlim e um grande cartaz da Coca-Cola em frente a seu prédio.

Na Rússia de hoje, essa convivência não é evitada, ao contrário, tornou-se mais um atrativo turístico. Foi-se a época em que Yeltsin queria retirar da Praça Vermelha o mausoléu de Lenin, para enterrar literalmente esse passado. Putin, ao contrário, mandou restaurar a múmia e a recolocou novamente onde os turistas possam visitá-la. A festa de abertura da Copa terá a presença de Ronaldo Fenômeno, na impossibilidade de Pelé comparecer devido a problemas no quadril. Putin, aliás, apostava muito na presença de Pelé, com quem se abraçou na cerimonia de sorteio das chaves da Copa do Mundo. A abertura será a cerimonia mais breve das últimas Copas no estádio de Lujiniki, reformado ao custo de R$ 1,4 bilhão, com acusações de superfaturamento. O mesmo que aconteceu com o nosso Maracanã.


Merval Pereira - O Globo