Das agências de checagem ao pesadelo kafkaniano produzido pelo Supremo Tribunal Federal
Começou com as agências de checagem. Em 20 de julho de 2020, uma reportagem de Oeste, com o título “Imagem da Nasa prova que a Floresta Amazônica não está em chamas”, foi classificada como fake news pela agência de notícias Aos Fatos. Em março deste ano, foi a vez do texto que mostrava como, mesmo depois de um mês de severo lockdown, o número de pacientes com covid-19 continuava a crescer em Araraquara, no interior de São Paulo.
Embora verídicos, o Facebook cravou uma tarja que substituía a imagem
dos posts compartilhados na rede social com um alerta: “Informação
falsa — Checada por verificadores de fatos independentes”. Em
consequência disso, a revista não pôde publicar anúncios na rede social,
o que prejudicou a venda de assinaturas. A tarja só foi retirada quando a Justiça encampou uma ação — a primeira do gênero no Brasil — movida por Oeste.
Comprovou-se que essas agências atuam como controladoras do que é
publicado nas redes sociais e em órgãos da imprensa, decidindo o que
pode ou não ser lido. Foi uma vitória da liberdade — de imprensa, de
expressão e de pensamento.
Em fevereiro deste ano, dois meses antes da vitória de Oeste,
entrara em cena o Supremo Tribunal Federal. O ministro Alexandre de
Moraes mandara prender o jornalista Oswaldo Eustáquio e o deputado
federal Daniel Silveira. O inquérito inventado por Moraes procurava, em
tese, combater notícias falsas. Mas o objetivo era evitar quaisquer
críticas aos ministros do STF. Em agosto, na sexta-feira 13, a vítima do
pesadelo kafkaniano foi o ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do
PTB, preso um dia depois de ter concedido uma entrevista exclusiva a Oeste.
O Artigo 5º da Constituição Federal estabelece que todos são iguais
perante a lei. Em novembro de 2019, o STF decidiu que um réu só pode ser
considerado culpado depois do trânsito em julgado da sentença
condenatória. Tradução: mesmo um criminoso confesso não tem sua
inocência contestada antes que seja rejeitado pelo STF o último recurso
encaminhado pelos defensores do réu.
Só então é encerrado o devido
processo legal a que tem direito todo cidadão brasileiro.
Seja qual for o crime cometido, o juiz do caso, denunciado pelo
Ministério Público, tem de ouvir os argumentos de ambas as partes. É
assim que funciona a Justiça nos países democráticos. Como democracia
não rima com preso político, no Brasil ninguém pode ser punido pelos
chamados crimes de pensamento. Isso é coisa de ditadura. O inquérito
contra Eustáquio, Silveira e Jefferson é o único do mundo em que as
supostas vítimas são, simultaneamente, acusadores e juízes.
Ainda atônitos com a prisão de Jefferson, incontáveis brasileiros
foram surpreendidos, no dia seguinte, com a decisão do corregedor do
Tribunal Superior Eleitoral, Luis Felipe Salomão. O ministro determinou
que alguns canais conservadores ou partidários do presidente Jair
Bolsonaro fossem proibidos de receber dinheiro pelo que publicam nas
redes sociais. O tamanho do absurdo torna assustador o silêncio da maior
parte da imprensa e dos autodenominados artistas e intelectuais que
vivem subscrevendo manifestos. [manifestos que NUNCA são a favor do presidente Bolsonaro, dos seus apoiadores e dos conservadores.] ]
Essa guerra contra a liberdade é o tema da reportagem de capa desta edição de Oeste, assinada por Cristyan Costa e Silvio Navarro, e do artigo de J. R. Guzzo.
Fica provado que os direitos constitucionais estão sendo ameaçados,
paradoxalmente, por servidores públicos incumbidos de defender a
Constituição.
Boa leitura.
Branca Nunes - Diretora de Redação