Número de homicídios ultrapassa barreira e pressiona o poder público a enfim executar o projeto consensual do enfrentamento compartilhado da criminalidade
O fato de
a divulgação do Atlas da Violência 2018, pelo Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ocorrer enquanto se
espalham atos de violência pelo país, alguns com aspectos de terrorismo,
ilustra a gravidade das informações da pesquisa. Uma onda
de ataques de incendiários a ônibus em Minas Gerais e no Rio Grande do Norte
reforça antiga constatação de que a criminalidade se expandia territorialmente,
uma tendência que se firma. Ao mesmo tempo, os tiroteios com armas pesadas
passam a ser parte do cotidiano do carioca, more ele em qualquer região da
cidade.
Nos
últimos dias, têm ocorrido no Leme, um dos pontos extremos do cartão-postal da
Praia de Copacabana. As duas comunidades do local, Babilônia e Chapéu
Mangueira, que passaram a ser frequentadas por turistas no período de bonança
permitido pelas UPPs, são QGs de quadrilhas rivais que não poupam munição.
A
situação crítica da segurança pública no Rio de Janeiro e outros estados se
reflete em dados como o de 62.517 mortes violentas contabilizadas no país em
2016, fazendo com que a barreira das 30 mortes por grupos de 100 mil habitantes
fosse ultrapassada pela primeira vez — o indicador atingiu 30,3. Ou três vezes
o limite máximo de 10 assassinatos por 100 mil, definido pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) como fronteira a partir da qual a violência é
considerada endêmica.
Os dados
e os fatos não surpreendem, mas assustam, porque há décadas especialistas
apontavam para este cenário de grupos criminosos atuando em escala nacional e
com ramificações do outro lado da fronteira nacional, por onde entram armas e
drogas. O poder público assistiu passivamente. Não causa estranheza que os mais
elevados índices de crescimento da violência estejam no Norte e Nordeste. Entre
2006 e 2016, os homicídios deram um salto de 119% no Tocantins; 93,2% no Acre;
71,9% no Amazonas; 256,9% no Rio Grande do Norte; 121% no Maranhão, e por aí
segue. O drama fica mais grave a partir dos dados de assassinatos de jovens de
15 a 29 anos: em 2016, foram 33.590 ou 53,7% do total. Além do óbvio aspecto
trágico, há o lado demográfico do necessário rejuvenescimento da força de
trabalho.
Tanto
quanto o número em si, preocupa a desenvoltura com que a criminalidade atua. No
Rio, por exemplo, os homicídios, no período, caíram, 23,4%, mas as
demonstrações de força de quadrilhas no estado, principalmente na capital, são
assustadoras. Espera-se
que este cenário ruinoso leve, enfim, a que os políticos de fato executem o
projeto consensual de integração das forças de segurança, em todos os níveis,
inclusive as federais, para enfrentar organizações mais bem estruturadas do que
muita polícia. Está em questão a defesa do estado democrático de direito.