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domingo, 12 de janeiro de 2020

O Ano do Rato - Nas entrelinhas

“O povo sentiu na carne, literalmente, a alta dos preços, mas também em outros itens da alimentação, nos aluguéis, nos transportes, nos planos de saúde e na educação

No milenar calendário chinês, estamos no limiar do Ano do Rato, que começa em 25 de janeiro e segue até 11 de fevereiro de 2021, sob influência do metal. Segundo os astrólogos, isso deve motivar o empreendedorismo, facilitar os pequenos negócios, os investimentos, as aplicações e as aquisições e promete um período de descobertas, agitação, busca por conhecimento, uso da inteligência e abertura de novos caminhos, boas estratégias e soluções práticas. Quando as pessoas recorrem ao horóscopo chinês ou a qualquer outro recurso metafísico para prever o próprio futuro, estão administrando as suas expectativas, o que levou os economistas a estudá-las no comportamento da economia.

Um desses economistas foi o norte-americano John Muth, que estudou engenharia industrial na Universidade de Washington de Saint Louis e economia matemática na Carnegie Tech de Pittisburg, na qual foi aluno de quatro prêmios Nobel: Franco Modigliani, John Nash, Herb Simon e Robert Lucas. Muth foi o primeiro a desenvolver uma teoria sobre expectativas racionais. Sua tese se baseia na ideia de que as pessoas são racionais e fazem previsões usando todas as informações possíveis, não somente o horóscopo ou o passado. Com isso criam expectativas racionais sobre o futuro e ajustam seu comportamento, o que faz muitas vezes as políticas de governo se tornarem ineficazes, porque preveem os efeitos das suas tentativas de estimular a economia e avaliam se estão funcionando ou não.

Muth desenvolveu sua teoria no começo dos anos 1960, quando as políticas keynesianas esgotavam suas possibilidades nos Estados Unidos. Os governos promoviam “choques econômicos” e aumentavam os gastos para ampliar a demanda. Presumia-se que os salários aumentariam em decorrência dos incentivos à economia, mas o aumento da demanda também implica aumento de preços, o que acaba anulando o aumento dos salários. Num primeiro momento, as pessoas não se apercebem disso e têm expectativas positivas; quando descobrem a perda salarial, porém, o desânimo volta e o nível de emprego regride ao que era antes. Isso se chama “expectativa adaptativa”.

A teoria das “expectativas racionais” de John Muth partiu da premissa de que o povo não é burro e não se deixa enganar por muito tempo. Não tenta adivinhar os preços futuros com base nos anteriores apenas, prevê os preços com base nas demais informações disponíveis. Sabe que não pode considerar apenas o passado, porque isso pode custar mais caro. No Brasil, até a implantação do Plano Real, que fez uma transição programada de moeda sem gerar falsas expectativas, muitos “choques econômicos” fracassaram porque as pessoas sabiam das limitações dos pacotes criados para estimular a economia. As pessoas aprenderam que um nível de emprego mais alto não se sustenta quando a inflação sobe, ainda mais num cenário de hiperinflação como nas décadas de 1980 e 1990. E que não adianta caçar o boi no pasto para a carne ficar mais barata, como se tentou no Plano Cruzado

A volta do dragão
Isso significa que as pessoas só tomam decisões racionais? Não, se fosse assim, a vida dos economistas e governantes seria muito mais fácil. Existe uma economia comportamental, as pessoas costumam violar as suposições-padrão dos economistas quando as consequências são imprevisíveis. Acabam influenciadas pelo modo como as soluções e propostas são apresentadas. Estudos psicológicos mostram que, contraditoriamente, as pessoas são avessas ao risco quando diante do ganho, mas se arriscam diante da perda iminente. Na política, isso fica muito mais claro do que na economia, principalmente durante as eleições. Essa teoria comportamental, por exemplo, orienta todas as campanhas de marketing que adotam a “estratégia do medo”.

No Brasil, o Ano do Rato começou com a volta do dragão da inflação, frustrando as expectativas, inclusive em relação ao aumento do salário mínimo, que teve perda de seu valor real antes mesmo de o trabalhador recebê-lo, pois o aumento de 4,1% (de R$ 998 para 1.039) ficou abaixo da inflação. Pressionado pelos preços das carnes, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou 2019 em 4,31%, acima do centro da meta para o ano, que era de 4,25%. Trata-se da maior inflação anual desde 2016, quando o índice ficou em 6,29%. Em 2018, o índice foi de 3,75%.

O mercado previa uma inflação de 4,13% em 2019, segundo a última pesquisa Focus do Banco Central. Apesar de estar dentro da meta, o aumento da inflação desconstrói a narrativa baluartista do ministro da Economia, Paulo Guedes, e frustra a onda de otimismo que operadores e analistas tentaram injetar na sociedade entre o Natal e o ano-novo. O povo sentiu na carne, literalmente, a alta dos preços, mas também em outros itens da alimentação, nos aluguéis, nos transportes, nos planos de saúde e na educação. A alta do dólar (política de Trump), o deficit fiscal (gastos públicos) e a queda das exportações (resultado da atual política externa) estão entre as causas do aumento de preços e revelam que o governo Bolsonaro ainda não fez o seu dever de casa. Se não fizer, a economia patina e o desemprego aumenta. E haverá nova alta de juros. [para saber mais,  leia: Inflação baixa que pesa no bolso]

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense

 

 

domingo, 1 de setembro de 2019

Dar sentido à vida - Merval Pereira

O Globo

Pessimismo no presente, mas com esperança

Para Ricupero, não haverá paz, estabilidade, retomada do desenvolvimento sem a integração progressiva dos marginalizados

“Os regimes atuais, quer o capitalismo ocidental, quer a versão estatizante chinesa, são incapazes de resolver os três maiores problemas humanos: o aquecimento global, o aumento da desigualdade, o desemprego estrutural agravado pelos robôs e a inteligência artificial”. Essa pessimista constatação faz parte do diagnóstico do embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero na Academia Brasileira de Letras, que fechou um ciclo de palestras dedicado a debater o futuro do Brasil. Durante o evento, coordenado pela escritora Rosiska Darcy de Oliveira, a questão foi analisada por diversos ângulos: o das políticas públicas, pela presidente da Fiocruz, Nísia Trindade; o da economia, por Edmar Bacha; o dos direitos humanos, por Antonio Cicero; o do sentimento nacional, por Cacá Diegues (os três últimos membros da ABL).

O ciclo encerrou-se com a palestra do ex-ministro Ricupero, que analisou o perigo de termos um futuro pior que o presente. Não apenas no Brasil, mas no mundo. Embora o diagnóstico seja pessimista, a conclusão é esperançosa, como veremos. Ricupero lembrou que houve outras fases de abatimento no Brasil, “mas a versão mais grave data de poucos anos atrás, de 2015/16, o instante em que começou a desfazer-se a ilusão de que o país tinha dado certo”.  As fórmulas petistas se tornaram insustentáveis, ressalta. “Algumas concorreram poderosamente para desencadear, primeiro, a crise fiscal, em seguida, o gravíssimo colapso que prostrou a economia até este momento”.

Após os sucessos do Plano Real, do crescimento do governo Lula, da conquista do grau de investimento, “a debacle da economia trouxe de volta aos brasileiros o efeito psicológico desmoralizante do fracasso”. Na visão de Ricupero, “o pouco que sobrava do prestígio das instituições políticas se viu, ao longo de três intermináveis anos, estremecido pelas revelações quase diárias de escândalos pela Lava-Jato, ela mesmo ora em vias de desmoralização devido a excessos e erros próprios, assim como à reação defensiva de setores políticos”.

A crise da democracia liberal se manifesta por todo lado, lamenta. “Cobrem já boa parte da população mundial os regimes antiliberais, anticientíficos, negadores da mudança climática, hostis às elites intelectuais, à tolerância da diversidade, ao respeito do outro em matéria sexual ou cultural”. O confronto entre o primeiro e o segundo centenário da Independência do Brasil põe em evidência o inédito da experiência corrente: a de que, em alguns aspectos importantes, nosso presente é pior que nosso passado. Além de aspectos subjetivos que nos fazem acreditar que os tempos mais amenos da modernização do Estado brasileiro e dos anos JK foram melhores que os conturbados dias de hoje, Ricupero utiliza-se de dados de um estudo da Goldman Sachs deste ano que aponta a possibilidade de o país perder meio século, com crescimento estagnado.

Para Ricupero, estamos “diante do maior desastre de desempenho coletivo de nossa História recente”. No entanto, estes 40 anos de altos e baixos coincidem com a consolidação da democracia. “Nesse período, em especial nos 20 anos entre 1995 e 2015, alcançou-se a maior redução relativa da pobreza e da indigência de nossa História”. O que nos cabe, diz Ricupero, é identificar razões para confiar que o futuro será melhor que o presente e superior aos melhores momentos do passado. No campo das ideias, lamenta-se, “os sinais não são encorajadores”, referindo-se à “versão brasileira requentada de fenômeno mundial, a seita de extrema-direita que mistura ideólogos pós-fascistas com iluminados, astrólogos, apocalípticos e lunáticos de todo o gênero”.

O padrão se reproduzirá por muito tempo, analisa, se não for rompida a polarização entre extrema-direita e PT, “com o medo empurrando os segmentos médios na direção da direita”. [na direita, está a segurança, a confiança,  rumo firme, o norte - não o do Ricupero, que é ' o que é bom a gente divulga o que é ruim esconde.] Superar o medo requer “a aliança entre o centro socialmente progressista e a esquerda democraticamente renovada”. Na sua visão, não haverá paz, estabilidade, retomada do desenvolvimento sem a integração progressiva dos marginalizados, que classifica de “novo ator”, como cidadão, produtor, consumidor e agente de cultura. “Depois desta hora do poder das trevas, impõe-se dar sentido à História, recuperar o sentimento de que a vida humana no Brasil não é absurda e insensata”.
 
Merval Pereira, jornalista - O Globo