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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Divisor de águas? - William Waack

O Estado de S. Paulo

É tudo muito diferente daquela vez quando a Câmara proibiu que um deputado fosse processado pelo regime militar

A história que se repete para nós não é uma farsa, tragédia, nem sequer uma rima tem. Em 1968, o AI-5 foi decretado para punir uma Câmara dos Deputados que impedira que fosse processado um deputado que defendia liberdades cerceadas pelos militares no poder. A atual Câmara dos Deputados – depois de uma ditadura, uma redemocratização e uma Constituição – vai se ocupar da situação de um deputado que usa das liberdades reconquistadas por gerações de brasileiros para propor acabar com essas liberdades. 
 
Do ponto de vista do estado de direito e do funcionamento de suas instituições era mais fácil então identificar onde estava o “bem” e o “mal”. Não, não é a questão da “liberdade de expressão” consagrada na imunidade parlamentar: essa proteção não é absoluta nem existe para a prática de delitos penais e o incitamento do golpe e destruição da ordem democrática. O pano de fundo muito mais preocupante é o da legitimidade das instituições envolvidas. 
 
[um único comentário: preferimos empregar o termo INVIOLÁVEL do que imunidade - tanto pela fidelidade ao texto constitucional, também para evitar 'imunidade' que lembra  memória imunização, igual a vacina, etc, etc. 
Não pretendemos afazer apologia ao Ato Institucional nº 5 = AI 5, vamos nos limitar a fatos - citá-los ainda não é crime no Brasil.
Não vemos intenção de punir a Câmara dos Deputados no  episódio do deputado Márcio Moreira Alves, que foi apenas a gota d'água  que fez transbordar o cálice com todos os abuso da situação vigente: o Brasil enfrentava o terrorismo, a guerrilha, sequestros de aviões, de pessoas, atentados a bomba contra instalações militares, manifestações de rua, morte de estudantes. 
O ilustre articulista diz: "impedira que fosse processado um deputado que defendia liberdades cerceadas pelos militares." Na verdade o que o deputado Márcio buscava era indispor a população contra os militares, chegando ao ponto de propor as jovens casadoiras não dançarem com militares nas festas de formatura.
A Câmara dos Deputados exercendo sua autonomia negou o pedido para processar o parlamentar - o Governo Militar não foi logo prendendo o acusado solicitou a necessária permissão. Negada, a situação afunilou para ou endurece ou endurece - o Brasil caminhava para a Guerra Civil, deixar impune o deputado seria o fim da nossa Pátria = O pleonástico CAOS CAÓTICO, seria insuficiente para definir.
Nosso  entendimento é que no caso do deputado do PSL, Daniel Silveira, a Câmara dos Deputados vai analisar se ao veicular as lives e outros comentários o deputado estava amparado pela inviolabilidade do seu mandato, estatuída no artigo 53 da Constituição Federal?
Entendendo que o parlamentar não estava abrigado pela inviolabilidade expressa naquele artigo, cabe analisar:
a) se a prisão ocorreu em flagrante delito? (situação que a expedição do  mandado de prisão anula);
 b) o ato praticado pelo deputado é  crime inafiançável? 
A Câmara dos Deputados, com tal procedimento, estará exercendo uma COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL e sua decisão DEVE ser acatada, tanto pelo STF quanto pelo Deputado Daniel Silveira =  não há constrangimento em se curvar ao IMPÉRIO DA LEI.] conferindo ao parlamentar

Começa pelo STF. Uma parte relevante da “insegurança jurídica” que caracteriza as relações na sociedade brasileira se deve à atuação política desse órgão. E do entendimento, entre seus integrantes, de qual seria o melhor efeito político ao tomarem decisões que fizeram da Constituição (que cabe ao STF zelar) uma questão de interpretação dependendo das circunstâncias do momento. Com ministros dando rasteiras em ministros. 

Essa noção (a da instabilidade causada por canetadas de magistrados), mais a situação de caos social com a greve dos caminhoneiros, é o que estava na raiz do “pronunciamento” em 2018 do então comandante do Exército, general Villas Bôas. Na prática, o coletivo do STF aceitou o que dizia o oficial. [nada impedindo que qualquer um dos 'onze' manifestasse individualmente sua posição, ainda que discordante do coletivo.]
Naquele mesmo ano assumiu um novo presidente da Corte e, num entendimento peculiar com o próprio general, aceitou-se como um dos principais assessores do presidente do STF quem até ali fora o chefe de Estado-Maior do Exército (e hoje é o ministro da Defesa). Tudo em nome da pacificação e estabilização da atmosfera política. 

A franja aloprada do bolsonarismo, eleita com expressiva votação na onda disruptiva daquele ano, dedicou-se desde sempre a atacar qualquer instituição ou nome entendido como obstáculo ou adversário do “mito”, em boa parte incentivada por ele mesmo. Para efeitos práticos, foi acompanhada por alguns militares que, de fato, passaram a enxergar no STF um tolhimento inconstitucional dos poderes do chefe do Executivo. Até ele entender-se prazerosamente com o “Centrão”, esse velho conjunto de forças políticas em parte conduzido por gente notória por colidir com a ética, a moral e o Código Penal. 

Legislativo brasileiro, a quem cabe a relevante decisão política sobre o deputado aloprado bolsonarista, vem perdendo qualidade [fosse só o Legislativo a perder qualidade o remédio seria fácil = o recurso das eleições permitiria uma correção em no máximo dois anos.]  e sofre com extraordinária fragmentação. São resultados muito evidentes de décadas de desgaste do sistema político. No topo desse desgaste figura exatamente a questão da representatividade, ou seja, do distanciamento entre quem elege e quem foi eleito – como ocorre com outros fenômenos do populismo moderno (como Trump), há mais do que um grão de verdade na denúncia que esses movimentos fazem “disso tudo que está aí”. 

Em 1968, a decisão da Câmara de proibir que um deputado fosse processado pelo regime militar foi um divisor de águas na nossa história política. Não é o que se prenuncia agora, pois a palavra de ordem em Brasília é “acomodação”. Fora os estridentes aloprados e suas redes sociais, não há forças relevantes dispostas a partir para qualquer coisa remotamente parecida a um tudo ou nada. Os militares se acomodaram no governo, que se acomodou com o Centrão, empenhado desde sempre em acomodar seus interesses às custas dos cofres públicos, por sua vez esticados ao limite para acomodar as visões antagônicas de garantir ajuda emergencial e respeitar o teto de gastos. Todos confortáveis com a ideia de que o próximo embate é só para 2022.

William Waack, colunista -  O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

O que sempre fomos - William Waack

O Estado de S. Paulo

Governo Bolsonaro dominado pelo Centrão é a política como sempre foi

O que é o governo Bolsonaro dominado pelo Centrão? É a política brasileira como sempre foi nas últimas décadas, a ponto de se duvidar se realmente tivemos uma alternância de poder de esquerda para direita. Talvez a periodização à qual historiadores costumam recorrer indique como último grande divisor de águas na política brasileira o processo de redemocratização do período entre 1985 e 1989 (sim, quatro anos decisivos).[o quadriênio decisivo não para a redemocratização do Brasil e sim para a instalação e inicio da consolidação da chamada 'nova república' e da roubalheira que imperou no Brasil daquela época até janeiro 2019.]

Visto com uma distância de três décadas, o que se iniciou ali foi uma tentativa fracassada de estabelecer no Brasil um estado de bem-estar social aos moldes do sul da Europa, sem que cuidássemos que nossa economia de baixa produtividade e competitividade conseguisse financiar gastos públicos que subiram sempre acima da inflação, não importa qual fosse o governo. O encontro com a verdade chama-se crise fiscal.

Com maior nitidez desde aquele período grupos diversos foram capturando a máquina de Estado – ou ampliaram o domínio já existente (como ocorre com a elite do funcionalismo público, espalhada por autarquias, estatais e Judiciário [o Legislativo precisa e deve ser incluído neste rol.]). A política foi se reduzindo à negociação entre grupos esparsos, com cada vez menos direção central, para acomodar às custas dos cofres públicos interesses setoriais e regionais dos mais variados. Dentro de um ambiente de ideias que o sociólogo Bolívar Lamounier chama de “maçaroca ideológica”.

O “desenho” do nosso sistema de governo, que opõe o vitorioso num plebiscito direto (o presidente da República) a um Legislativo fracionado e de baixa representatividade (mas cheio de prerrogativas), com partidos dominados por caciques, “funcionou” nesses moldes até a quebra dos cofres públicos. A atuação desses “donos do poder” foi muito facilitada pelo fato de os setores privados da economia brasileira não terem sido capazes de desenvolver um “projeto nacional”, uma visão de conjunto que fosse muito além do que sempre foi o “norte” para gerações de empresários e banqueiros: garantir a amizade e a proximidade do rei.

A reforma de Estado ensaiada por FHC foi tímida, assim como as privatizações. O projeto petista do “nacional-desenvolvimentismo” (para dar um rótulo aos 13 anos) era uma obra conjunta com o Centrão, entendido como esse conjunto de forças políticas setoriais, regionais, unidas apenas no intuito de se apoderar de pedaços da máquina pública. Como se constata nos índices, a tal “preocupação pelo social” tão propalada naquele período não alterou fundamentalmente o País em termos de sua desigualdade e misérias relativas.

Ironicamente, a política brasileira parece ter mudado tanto nos últimos quatro anos (desde o impeachment de Dilma) para desaguar no mesmo lugar: no papel essencial dessas forças do Centrão, agora carregando consigo um presidente de escassa capacidade de liderança e que não entendeu onde reside seu poder: na possibilidade de ditar a agenda política, e não na tinta da caneta em suas mãos (que, aliás, encolheu bastante nos últimos dois anos).[poder é como elástico, encolhe, mas pode voltar e quando volta vem mais forte.]

Ao celebrar o entendimento político com os dois novos homens do Centrão no comando do Legislativo, Bolsonaro voltou a escancarar o fato de não ter estratégia nem saber o que quer, além de se reeleger. Trinta e cinco prioridades entregues ao Congresso é o mesmo que dizer que não tem nenhuma. Nessa “shopping list”, em parte a pedidos de seu ministro da Economia, estão matérias prometidas desde sempre (como reformas administrativa e tributária, além de privatização de estatais) que não progrediram basicamente pela incapacidade ou falta de interesse político por parte do chefe do Executivo.

É possível que o dia 1.º de fevereiro de 2021, data da oficialização do comando do Centrão nas principais esferas da política, talvez sirva aos historiadores no futuro para marcar o fim de um intenso período nessa linha do tempo, o da onda disruptiva de 2018. É também a data da dissolução da força-tarefa da Lava Jato, sem a qual essa onda é impossível de ser entendida. Talvez os historiadores no futuro considerem que não foi mera coincidência.

William Waack, jornalista - O Estado de S. Paulo 

 

 

terça-feira, 14 de novembro de 2017

PMDB do B



Interessante a estratégia do grupo do senador Aécio Neves para não caracterizar a saída de Bruno Araujo do ministério de Temer como um protesto. 

Ele se antecipou a seus colegas, e foi anunciado que coordenará a campanha do governador Marconi Perillo à presidência do partido.  Ao mesmo tempo, abre caminho para uma reorganização ministerial, deixando Temer com o cobiçado ministério das Cidades livre para negociações. Com a decisão do governador de Goiás de não aceitar uma candidatura de consenso para a presidência do PSDB, insistindo em permanecer na disputa, fica claro que a candidatura do governador paulista à presidência da República não é consensual.

A disputa pela presidência do partido será um divisor de águas, e se o grupo do senador Aécio Neves demonstrar que ainda controla as bases partidárias, provavelmente, aliado ao governo Temer, apresentará outro candidato, que poderá ser o prefeito João Dória ou o próprio Perillo, que há muito tem o sonho de se candidatar à presidência da República. Ou se aliar a uma candidatura que represente uma eventual retomada econômica, como a do ministro da Fazenda Henrique Meirelles, filiado ao PSD de Kassab. Que, aliás, poderia apoiar também seu velho aliado, o senador José Serra, que pretende disputar o governo de São Paulo.

O centro da disputa passou a ser o futuro do PSDB visto pelas lentes do grupo do senador Aécio Neves, que já anunciou que pretende se candidatar a um cargo majoritário nas próximas eleições, governador de Minas ou senador. Mesmo tendo o controle da maior base eleitoral do partido, o governador Geraldo Alckmin não tem influência importante nas demais máquinas estaduais, o que aparentemente o senador Aécio Neves mantém, apesar dos percalços por que vem passando. Se a opção desse grupo for mesmo por um candidato paulista como Dória em oposição a Alckmin, não restará ao governador outra saída que ir para o PSB, uma alternativa que estava em cogitação já desde que escolheu Marcio França para seu vice.

O PSB ganhará de qualquer maneira um governador de São Paulo, em troca de apoio a Alckmin numa coligação ou, no limite extremo, lançando-o à presidência da República. A montagem prevista por Fernando Henrique, com a indicação de Alckmin como candidato de consenso à presidência do PSDB, levaria a uma decisão antecipada do candidato do partido à presidência, e a um ambiente mais pacificado.  A resistência até o momento de Marconi Perillo, e agora o anúncio de que a saída de Bruno Araujo não significa o início da debandada tucana, mas o reforço de uma candidatura a presidente do PSDB com o apoio do Palácio do Planalto, demonstra que a estratégia do grupo de Aécio Neves é mais ampla.

Controlando o partido no ano da eleição, esse grupo poderá impor as soluções que lhe convierem. A destituição do presidente interino, senador Tasso Jereissati, combinada com o próprio presidente Michel Temer, faz parte de um acordo que certamente coloca o PMDB mais uma vez em uma coligação eleitoral que, se será prejudicada pela baixa popularidade governista e pela imagem fisiológica do partido, terá recompensas com o tempo de televisão e a máquina governamental.

Além da esperança de que a economia estará em melhores condições em 2018, beneficiando os aliados do governo. Resta saber se os mecanismos da velha política ainda serão úteis em um país que está polarizado entre posições radicalizadas à esquerda e à direita, e ansiando pelo novo, que tenta surgir, apesar do ambiente adverso. O PSDB, que já representou o novo na política, corre o risco de um triste fim, novamente se aliando ao PMDB velho de guerra, transformando-se numa espécie de PMDB do B.     

Merval Pereira - O Globo