Se a
ideia, há dois anos, foi evitar crise institucional, agora estamos em
plena crise e já se viu qual poder se abasteceu da omissão do
Parlamento.
O
Supremo Tribunal Federal, como poder de Estado, exerce função política. É
assim na teoria e tem sido assim na prática. Ao longo do tempo, o que
se observa são certas variações em sua interferência para definir o que
seja interesse público. Pode-se afirmar que a Suprema Corte, como tal,
historicamente, observou seus devidos limites.
Assim foi, até ser tomada por petistas e serem, os não petistas
capturados pelo ativismo e pela rejeição ao conservadorismo e ao
liberalismo. Pois não é que quando tudo estava certinho, bem combinado,
hegemonizado entre marxistas e fabianos, 57 milhões de eleitores
entenderam a tramoia, viram para onde se perdia o barco e disseram –
"Basta!"?
A
partir daí o STF deixou de ser um dos poderes políticos para se tornar o
mais político dos poderes de Estado e, por óbvio, o pior de todos. O
pior no mais amplo sentido. Sem unção popular, monocrático em muitas
decisões, maleficamente corporativo (tomado por aquele corporativismo
que subscreve sandices para não deixar mal um companheiro). Capaz de
usar o poder para constranger a opinião pública, a opinião parlamentar e
o jornalismo divergente. Sempre pronto a usar mão leve para soltar
criminosos e mão pesada para manter preso quem os desagrada pessoalmente
(também no absolutismo monárquico o maior crime era o de
lesa-majestade). E fiquemos, prudentemente, por aqui, posto que a
imaginação, quando trabalha sobre fatos não esclarecidos, pode incorrer
em mau juízo.
A
situação do Supremo se agrava porque, de hábito e cultura do próprio
poder, seus integrantes têm o ego diariamente untado por mesuras e
reverências servis e até a divergência, recebida com enfado (só falta um
lencinho perfumado sob o nariz), vem enrolada em vênias e escusas. Por
vezes parece faltar, apenas, o apelante se retirar curvado, dando passos
em marcha ré perante tais fulgurações.[o mísero apelante, quase sempre, teme o risco de um dos integrantes do Supremo se sentir perturbado, no seu merecido repouso pela ousadia de um reles mortal ao discordar do supremo entendimento.]
Corresponde aos senhores senadores (são 81) pôr fim a esses abusos de
poder. Reitero o que já escrevi antes: não é ao impessoal Senado, mas
aos senadores individualmente que se deve clamar pela solução desse
problema. É de seu querer que tudo pende. E aí o bicho pega. Um terço de
laranjas podres estraga o cesto inteiro.
Vinte e seis, nenhum petista,
assinaram a Lava Toga em 2019 (1). Vinte e cinco perderam a liberdade de
abanar a cauda porque estão sob investigação, ou respondem processo ou
são réus perante o STF.
O terço final se revela solidário aos colegas
encrencados.
Os primeiros já sabem o que tem que ser feito.
Os segundos
jamais o farão. É dos terceiros, dos que poderiam agir e não agem, que
pode e deve ser extraída posição para fazer andar a Lava Toga ou os
abundantes pedidos de impeachment de ministros do Supremo pendentes na
Câmara Alta da República.
Fora
os que já se mostraram convencidos da necessidade de agir, de defender
as instituições dos que sequestram seus poderes, todos os demais
precisam ser conscientizados pelos cidadãos de onde vivem, ou onde quer
que vão, da responsabilidade que têm sobre os ombros e do caráter
imperdoável de suas omissões. Se não ouvirem o grito das ruas, ouvirão a
vaia das urnas.
O
valor de um senador não se mede em verbas conquistadas, mas por coragem
cívica e política, especialmente nos momentos cruciais, em que a nação
se sente abandonada por instituições que surfam onde os eleitores
soçobram.
(1) Eram
27, mas o senador Elmano Férrer [Podemos - PI] retirou a assinatura e o pedido
foi arquivado por insuficiência de apoio.
Lista dos 27 aqui e notícia do arquivamento final, aqui.
Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de
Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site
Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e
sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a
tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus
brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.