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sábado, 13 de março de 2021

Pária duas vezes - Carlos Alberto Sardenberg

Coluna publicada em O Globo - Economia 13 de março de 2021

Não custa lembrar. A Operação Castelo de Areia, de 2009, foi uma espécie de pré-Lava Jato. O alvo, uma empreiteira, a Camargo Correia, da qual quatro diretores foram presos no primeiro momento, pairando ameaças sobre outros membros da empresa e associados no governo do então presidente Lula. Mas logo apareceu um recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça, que caiu com o magistrado Cesar Asfor Rocha. E ele simplesmente cancelou toda a operação, com base numa ridícula formalidade: as denúncias iniciais haviam partido de fontes anônimas.

Ridícula, para não dizer outra coisa, porque as denúncias recebidas anonimamente foram objeto de uma ampla investigação que encontrou, sim, grossa corrupção. Não foi mera coincidência que o ministro da Justiça na época era o advogado Marcio Thomas Bastos, uma espécie de grande chefe dos criminalistas especialistas em anular processos e adiar processos indefinidamente. Reparem, não se tratava, então, de provar a inocência dos réus, mas de melar o processo ou de reduzir crime a simples infrações. Como diziam os advogados no julgamento no Petrolão – não é corrupção, é simples caixa dois.

Por outro lado, não é própria polícia que incentiva as denúncias anônimas, no mundo todo?  Aliás, não resisto a contar uma historinha que se não é verdade, é bem ilustrativa. Diz que um empresário quebrado e envolvido em confusões procurou um famoso escritório e pediu: não me importo de perder todo meu dinheiro, só quero ficar com o nome limpo de novo. E ouviu do advogado: o senhor veio ao escritório errado; aqui nós salvamos o dinheiro e deixamos o nome sujo.

E o que aconteceu nesta semana, no caso Lula? Depois de mais de cinco anos de investigações, um caminhão de provas e condenações em primeira, segunda e terceira instâncias, aparece uma “incompetência”. Algo assim: pois é pessoal, desculpa aí, mas esses casos do Lula deveriam ser julgados em Brasília, não em Curitiba. Pode ter sido uma jogada do ministro Fachin livrar Lula, para salvar a Lava Jato – mas, pelo menos até aqui, deu muito errado
Decretou o Lula livre, prestes a ter todos seus crimes prescritos, e desacreditou a Lava Jato.

Tudo isso deu força ao ministro Gilmar Mendes na sua campanha para não apenas livrar Lula, mas anular toda a Lava Jato – e livrar assim todos os empresários e políticos amigos apanhados pela operação. Acrescente a intensa movimentação do presidente da Câmara, Artur Lira, ele próprio um denunciado, para aprovar leis que restringem o conceito de crimes do colarinho branco e protegem os eventuais apanhados, e pronto: está em curso avançado o movimento das elites para abafar o combate à corrupção. Ou, dito pelo avesso, movimento pró-impunidade.

Ou ainda: foi tudo uma miragem. 
A Petrobras, outras estatais e o governo não foram assaltados na era petista. 
A Odebrecht não pagou um tostão por fora. 
A delação de seus donos foi uma invenção. 
A Petrobras não recebeu dinheiro de volta. 
Os estádios da Copa saíram a preço de custo. 
E por aí vai. Dizem os garantistas: sim, corrupção, mas deveria ter sido provada pelo devido processo legal. Qual? 
Aquele das formalidades de anular toda uma operação porque a denúncia inicial foi anônima? 
Que dinheiro de caixa dois não é roubado?

A operação Lava Jato aprendeu com os processos de combate à corrupção desenvolvidos inicialmente nos Estados Unidos e depois absorvidos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE. O Brasil é signatário, por exemplo, do acordo de combate à lavagem de dinheiro, prática apanhada pela Lava Jato. Aliás, a OCDE, hoje em dia, leva em consideração dois temas básicos quando define políticas de crescimento sustentado: proteção ao meio ambiente e combate à corrupção.

O Brasil não se torna pária “apenas” por causa de Bolsonaro.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Estádios da Copa, após dois anos, dão prejuízo aos governos



A Copa não acabou - Os estádios construídos para o evento dão prejuízos. Pior, boa parte é bancada com dinheiro público. Dois anos após o fim do Mundial, o cidadão continua a pagar por ele. E continuará a pagar por muito tempo 

[a melhor solução é implodir; implodindo se fica sem o estádio mas acaba a sangria dos cofres públicos que são obrigados a bancar ‘elefantes brancos’.
O Nacional de Brasília, mais conhecido como Mané Garrincha, construído pelo governador petista Agnelo Queiroz – que responde a vários processos por uso indevido e mesmo apropriação ilícita de dinheiro público -  se transformou em um grande criadouro do mosquito Aedes aegypti.] 

Faz dois anos que o alemão Mario Götze, aos oito minutos do segundo tempo da prorrogação, matou o cruzamento que veio da esquerda no peito e, quase dentro da pequena área, acertou o voleio que decidiu a partida. No Maracanã, a Alemanha bateu a Argentina e venceu a Copa do Mundo pela quarta vez na história. De lá para cá os argentinos jogaram – e perderam – mais duas finais em Copas Américas. Os alemães deixaram passar uma Eurocopa para, quem diria, Portugal. A Seleção Brasileira dispensou Luiz Felipe Scolari, o técnico do 7 a 1, recontratou e já demitiu Dunga, quem a fez cair na primeira fase da Copa América. Mas algo não mudou. O Brasil – mais especificamente, você, cidadão – continua a pagar a Copa.

Quando se fala em arena, ou em qualquer obra, uma coisa é a construção, outra é a operação. O Brasil já gastou bilhões de reais para levantar os estádios da Copa e as estruturas da Olimpíada no Rio de Janeiro. Isso não tem volta. O que você precisa considerar, agora e nos próximos anos, é quanto dinheiro ainda vai gastar com a manutenção dessas instalações esportivas. O custo do legado do Parque Olímpico da Barra passa de R$ 1,4 bilhão nos próximos 25 anos – voltaremos a este tópico na véspera da Olimpíada. O preço do legado da Copa está aberto. Aumenta a cada ano com os prejuízos anuais dos estádios. Abaixo, você vai descobrir qual é o quadro e, nos links, as situações individuais das novas arenas brasileiras.

ÉPOCA coletou nos últimos seis meses as demonstrações financeiras e os documentos de 15 novos estádios brasileiros, um legado deixado pela Copa. Além dos 12 que receberam jogos no Mundial, foram considerados Allianz Parque, do Palmeiras, Arena do Grêmio e Independência, todos reformados no mesmo período e nos mesmos padrões. A falta de transparência dificulta. Mato Grosso, Distrito Federal e Amazonas são três governos que informam apenas os dados referentes a 2015. Os números de 2014 e 2013, como estavam sob a batuta de outros governadores, sumiram. As empresas que gerem o Castelão, no Ceará, ignoraram os contatos feitos por três meses até que o governo cearense, a pedido de ÉPOCA, cobrou do consórcio o envio das informações solicitadas. Elas chegaram aos 45 do segundo tempo para fechar a reportagem.