Opinião do Estadão
Supremo
agora pretende decidir qual índice deve corrigir o FGTS, numa clara
intromissão em seara do Congresso. Corte parece perdida na compreensão
de seu papel constitucional
Opinião - O Estado de S. Paulo
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Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
Luís Ernesto Lacombe, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
O ministro, na fala que fez a receber os advogados, disse que o TSE não vai tolerar o “negacionismo eleitoral”; como o único negacionista que há no Brasil, segundo a pregação maciça dos seus adversários, é o presidente da República, ficou claro de que lado está o chefe atual do TSE na campanha pela presidência.
“E aí deixa comigo também que eu vou aliviar. Não vou botar 43 anos no cara. Cara tá assustado com os 43 anos”, diz o juiz. Conhecido pela rigidez de seus veredictos, Bretas, ao citar os tais “43 anos”, se referia ao pânico que se espalhou entre os investigados quando ele anunciou sua decisão de condenar por corrupção o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, a 43 anos de prisão logo no início da Lava-Jato, em 2016. A sentença imposta a Pinheiro, naquele momento a maior da operação, gerou um temor generalizado nos réus. “Foi boa então você ter colocado 43 no Othon, né?”, elogia o advogado no diálogo gravado. Entre risadas, Bretas confirma: “É, ooo”. A conversa produziu os resultados esperados pela trinca. Logo Cavendish começou a confessar seus crimes e mais tarde assinou um acordo de delação premiada com o Ministério Público. O empreiteiro, entre outras revelações, confessou o pagamento de milhões em propina a vários políticos e, em troca, ganhou o direito de responder ao processo em liberdade.
Às vezes, no entanto, o próprio Supremo parece não compreender adequadamente seu papel constitucional, invadindo as atribuições do Congresso. Isso se expressa, por exemplo, no recebimento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) manifestamente ineptas, como a que questiona a Lei das Estatais, como já criticamos neste espaço (ver o editorial Cabe ao STF rejeitar a judicialização da política, dia 20/2/2023).
A Adin 5090 questiona um sistema vigente desde a Lei 8.177/1991, que definiu regras para a desindexação da economia. O tema foi levado diversas vezes ao Judiciário. Em 2014, o STF rejeitou apreciar a matéria. Em 2018, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que não competia ao Judiciário substituir a TR por outro índice de correção monetária. Um mínimo de estabilidade na jurisprudência é respeito não apenas à segurança jurídica, mas ao próprio Judiciário.
Há motivos razoáveis para criticar a sistemática atual e postular mudanças no modo de correção do FGTS. O ponto é: esse debate deve ser feito no Congresso, e não no STF. A escolha do índice a ser aplicado ao saldo das contas é uma decisão política, com consequências sobre diversos temas políticos, sociais e econômicos. Por exemplo, mudar a forma de correção do FGTS afeta o financiamento imobiliário para a população de baixa renda.
No momento em que o STF toma para si esse tipo de decisão, a Corte passa, na prática, a gerir uma série de questões que não lhe competem, reduzindo a responsabilidade do Congresso sobre temas centrais da vida nacional. Basta ver que, nos dias de hoje, boa parte da equação fiscal, a afetar inúmeras políticas públicas, depende não dos parlamentares eleitos, mas das escolhas que serão feitas pelos ministros do Supremo.