O Estado de S. Paulo
Bolsonaro vai ser Bolsonaro hoje na ONU, mas, fora do Brasil, quem acredita no que ele diz?
Seria
exagero de retórica dizer que o mundo inteiro estará de olhos e ouvidos
abertos para o discurso do presidente Jair Bolsonaro hoje, na abertura
da Assembleia-Geral da ONU, mas não há como contestar que raras vezes o
mundo esteve tão atento, perplexo e preocupado com o Brasil,
insistentemente chamado de “pária internacional”. Em vez de amenizar, o
risco é Bolsonaro aprofundar os temores de governos, sociedades e
investidores.
[A Organização das Nações Unidas tem a obrigação de todo ano conceder palanque mundial ao Presidente da República Federativa do Brasil e que atualmente é JAIR BOLSONARO e tudo que que constar do seu pronunciamento é a posição oficial do Brasil.
Aquele palanque no período de 2003 a 2015, foi desvalorizado, apequenado, pelos que representaram o Brasil.
Bolsonaro falará em nome dos mais de 210.000.000 de brasileiros - os quase 60.000.000 de votos recebidos pelo capitão o tornam legítimo e único representante da Nação brasileira.
Os que não gostam, não aceitam, terão que engolir e se acostumar - não sendo necessário que aceitem.
O que os Macron, presidente da Noruega, a pirralha e outros do mesmo naipe não importa. Cuidem dos seus países e tenham sempre a lembrança que as florestas que possuíam foram eles que destruíram.]
O
tema da ONU neste ano é multilateralismo, mas Bolsonaro deve entrar na
contramão, ao lado de seu mentor Donald Trump, com críticas à própria
ONU, à Organização Mundial da Saúde (OMS), à Organização Mundial do
Comércio (OMC) e ao debate sobre questões de gênero. E, claro, ele não
perderia a chance de dizer que o Brasil é “um sucesso” (?!) no combate à
pandemia, na recuperação da economia e na preservação do ambiente.
Ninguém
se surpreende mais com as falas de Bolsonaro, o surpreendente é que,
quanto mais estrangeiros se chocam, mais brasileiros acreditam e até
replicam as barbaridades sobre a covid-19, meio ambiente e uma tal
ameaça comunista. O documentário O Dilema das Redes explica muita coisa,
mas não como tanta gente com diploma, carreira, livros nas estantes e
acesso a múltiplos meios de informação compra o que ele diz – sem
ruborizar.
A
covid-19 já atinge 196 países em todos os continentes, com 31 milhões
de casos confirmados (na realidade, são muito mais), e vai atingir um
milhão de mortos ainda em setembro, mas eles dizem que não é pandemia,
só histeria da mídia. Jura? Se não é pandemia, é o quê? E, no Brasil, já
estamos chegando a 140 mil mortos, mas o presidente, sem máscara,
sorridente, foi aplaudido por produtores rurais ao dizer que o “Fica em
casa” é “conversinha mole para os fracos”.
Amazônia
e Pantanal estão em chamas e o avião do presidente teve de arremeter
abruptamente por excesso de fumaça em Mato Grosso. O que ele diz? Que há
“alguns focos” de incêndio, mas o Brasil é “um exemplo” de preservação.
Em fila, o vice Hamilton Mourão e os ministros batem continência. A
verdade, porém, é que está muito quente e seco e o risco de incêndio
aumenta muito, mas há sérios indícios de incêndios criminosos e o
governo foi displicente, imprevidente.
O
Brasil, os fundos internacionais, oito grandes democracias,
ex-ministros da Economia, ex-presidentes do Banco Central, os maiores
grupos do agronegócio nacional e, evidentemente, ambientalistas das mais
variadas tendências e regiões do mundo cobram ações, mas na realidade
delirante do presidente, as críticas têm origem “oculta”, com o objetivo
de derrubá-lo – como disse ontem o general Augusto Heleno.
Por
fim, o discurso na ONU, gravado, ocorre em meio a mais um fuzuê na
política externa, com a visita do secretário de Estado Mike Pompeo a
Roraima, de onde lançou ameaças a Nicolás Maduro. Afora Gleisi Hoffmann e
um petista ou outro, ninguém apoia Maduro e o regime da Venezuela, mas
daí permitir que um terceiro país use o Brasil para atacar um vizinho? A
46 dias das eleições americanas? E quando os EUA vão presidir o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID), após 66 anos?
Rodrigo Maia considerou uma “afronta”. Fernando Henrique Cardoso e
ex-chanceleres classificaram como “utilização espúria do solo nacional”. [a opinião do deputado Maia e do sociólogo e de outros não seriam sequer contadas;
só está sendo contada, considerada, comentada, por ser contra o presidente Bolsonaro = falar mal do nosso presidente, do presidente do Brasil é esporte predileto dos que nada tem a dizer de útil.] E o ministro Ernesto Araújo, que serviu de escada para Pompeo, reagiu
com populismo e o “sofrimento do povo venezuelano”. Não colou. E serviu
para acordar Câmara, Senado, diplomatas, academia e a mídia. Assim,
o discurso de hoje não é só mais um de presidentes brasileiros abrindo,
ano a ano, a Assembleia-Geral da ONU, mas uma boa chance para Bolsonaro
expor ao mundo quem ele é. Aliás, será que ele acha que a Terra é
plana?
Eliane Cantanhêde, colunista - Folha de S. Paulo