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sexta-feira, 11 de maio de 2018

STF precisa conter ímpeto em súmula sobre foro



A revisão da prerrogativa para deputados e senadores não deve levar a que a Justiça a estenda de tal forma que invada área institucional do Congresso 

Durou um ano, incluindo pedidos de vista, o julgamento no STF do caso concreto de um político fluminense que aproveitou a gangorra da troca sucessiva de foro para escapar da denúncia de compra de voto pela porta da prescrição.  Na semana passada, enfim, confirmou-se a vitória da maioria que já havia sido formada há tempos, em favor da proposta do ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso, de quebrar a rigidez do princípio do foro privilegiado.

Restrita a deputados federais e senadores, julgados no Supremo, a nova interpretação do foro limita sua aplicação apenas a crimes cometidos pelo parlamentar no decorrer do mandato e em função deste. A não ser nestas circunstâncias, denúncias contra deputados e senadores serão encaminhadas à primeira instância. O ganho para o Supremo é a redução de uma fila de aproximadamente 500 processos e inquéritos, parte dos quais já começou a ser remetida para juízes de primeiro grau. Menos sobrecarregado, o STF terá como fazer tramitar os casos que lhe cabem — além dos parlamentares federais, ministros, o presidente da República e o vice —, sem maiores riscos de prescrições. Além disso, a primeira instância, por suas características, tem mais agilidade para fazer tramitar processos penais. Outra garantia de que a prescrição de crimes não será a regra. 

Mas a conclusão do julgamento no STF levou o Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, a fazer uma consulta ao Ministério Público e à defesa sobre se uma denúncia de caixa 2 contra o governador fluminense Luiz Fernando Pezão deverá ser transferida para o juiz da primeira instância, no Rio, que trata da Lava-Jato, Marcelo Bretas.  Como se o veredicto do julgamento do Supremo tivesse alterado o conceito de foro para todas as autoridades — estima-se um total de mais de 50 mil pessoas.  O ministro do Supremo Dias Toffoli, por sua vez, encaminhou quarta-feira à presidente da Corte, Cármen Lúcia, duas propostas de súmulas vinculantes, que, se aprovadas, todas as instâncias terão de segui-las.  Uma estende a restrição de foro a todas as autoridades federais, estaduais e municipais. E a outra elimina das constituições estaduais e municipais esta prerrogativa de autoridades.

Não se pode esquecer, entretanto, que uma proposta de emenda constitucional que mantém o foro especial apenas para presidentes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário foi aprovada no Senado e está na Câmara. A Justiça precisa tomar cuidado para não invadir espaço do Legislativo. O caso do novo foro dos deputados federais e senadores, além de ter sido longamente debatido no STF, está sustentado em argumentos sólidos. A sensatez aconselha a que os juízes esperem uma definição do Congresso, até para evitar serem acusados de legislar em releituras constitucionais.

Editorial - O Globo


quinta-feira, 22 de março de 2018

Veja o que dizia Gilmar Mendes quando guerreava pela prisão na 2ª instância

O vídeo  exibe um Gilmar Mendes muito diferente do magistrado que frequenta a cena jurídica como adepto da política de celas vazias na Lava Jato. Há 17 meses, ele ajudou a compor a maioria de 6 a 5 que aprovou no Supremo Tribunal Federal a prisão de condenados na segunda instância. Pronunciou um dos mais eloquentes votos do julgamento, ocorrido em outubro de 2016.

Em seu voto, Gilmar Mendes disse, por exemplo, que o encarceramento na segunda instância aproximaria o Brasil do mundo civilizado. E atenuaria o flagelo da impunidade. Irônico, o ministro chegou a declarar que a presença de “ilustres visitantes” melhoria o sistema prisional do país. Realçou que já não havia “banho frio” na carceragem da Polícia Federal em Curitiba. “Agora, há até chuveiro elétrico”, celebrou.

Quem ouve esse Gilmar Mendes de 2016 tem dificuldades para entender a metamorfose que o transformou em protagonista do enredo que pode resultar na revisão da regra sobre prisão. Em sua versão 2018, Gilmar está decidido a modificar o voto. Ele agora quer retardar o encarceramento pelo menos até a terceira instância do Judiciário, permitindo aos condenados com bolso para pagar bons criminalistas que recorram em liberdade ao Superior Tribunal de Justiça. Dá de ombros para o fato de que o índice de absolvições no STJ é ínfimo: 0,62%.

O Gilmar Mendes de 2016 não ignorava que juízes de primeiro grau e tribunais de segunda instância poderiam cometer erros. Mas ele parecia despreocupado. “Não vamos esquecer: o sistema permite correção”, tranquilizava. “Permite até o impedimento do início da execução da pena, com obtenção de liminar em habeas corpus.”  Antes de 2016, Gilmar Mendes tinha uma visão estática do conceito de presunção de inocência. Só admitia a prisão depois de esgotadas todas possibilidades de recurso, inclusive ao Supremo Tribunal Federal. Súbito, ampliou seus horizontes: “Praticamente não se conhece no mundo civilizado um país que exija o trânsito em julgado”, disse na sessão de 17 meses atrás.

Nessa época, Gilmar Mendes havia decidido adotar uma escala móvel de aferição das culpas: “Uma coisa é ter alguém como investigado. Outra coisa é ter alguém como denunciado, com denúncia recebida. Outra coisa é ter alguém com condenação. E agora com condenação em segundo grau! O sistema estabelece uma progressiva derruição da idéia de presunção de inocência. Essa garantia institucional vai esmaecendo.”

A injustiça que incomodava Gilmar Mendes era a presença na cadeia de 220 mil brasileiros pobres sem nenhum julgamento. “Nós sabemos que a prisão provisória no Brasil pode ser das mais longas do mundo”, declarou em seu voto, antes de recordar duas atrocidades que testemunhara como presidente do Conselho Nacional de Justiça. “Nós encontramos um indivíduo no Espírito Santo preso provisoriamente há 11 anos. […] Encontramos em seguida um sujeito esquecido nas masmorras do Ceará há 14 anos.

Havia um quê de indignação no timbre de Gilmar Mendes quando ele comparou “essa gente presa provisoriamente” aos condenados “que respondem soltos” às imputações criminais. A essa segunda categoria de brasileiros “interessa estender” os processos, disse. “…O sujeito planta num processo qualquer embargos de declaração. E aquilo passa a ser tratado como rotina. O processo ainda não transitou em julgado, vamos examinar.. E daqui a pouco sobrevem uma prescrição […] e o quadro de impunidade.”

A certa altura, Gilmar Mendes mencionou algo que ouvira do ministro aposentado do STF Sepúlveda Pertence, hoje advogado de Lula. O ex-colega lhe dissera, emtom jocoso”, que criminalistas só lançam mão dos recursos disponíveis nos tribunais superiores recurso especial no STJ e extraordinário no STFquando miram a prescrição. No Brasil, afirmou Gilmar, a impunidade via prescrição “é uma obra bem sucedida”.  O julgamento de 2016 envolveu duas ações declaratórias de constitucionalidade: a ADC 43 e a ADC 44 —uma subscrita pelo Partido Ecológico Nacional; outra de autoria da OAB. Ambas questionavam a possibilidade de prisão na segunda instância, que havia sido avalizada pelo Supremo oito meses antes, em fevereiro de 2016. Na sessão de outubro, o voto de Gilmar Mendes ajudou a indeferir a liminar que suspenderia a aplicação da regra que aproximara os corruptos da cadeia.

Gilmar Mendes dizia estar “confortável” na posição de defensor da execução antecipada das sentenças de segundo grau. Seu conforto era tão grande que ele sugeriu que o julgamento da liminar fosse convertido numa decisão definitiva, sem volta. “Talvez, se formada a maioria, nós devêssemos converter esse julgamento num julgamento de mérito.” Do contrário, disse Gilmar, “vamos ter um outro debate sobre a eficácia desse julgamento, uma vez que estamos apenas indeferindo a liminar. […] É importante que essa decisão tenha eficácia geral, efeito vinculante.”

Por mal dos pecados, a proposta de Gilmar Mendes não prosperou. Quinze meses depois, em dezembro de 2017, o ministro Marco Aurélio Mello, relator da encrenca da prisão em segunda instância, liberou as ADCs 43 e 44 para que Cármen Lúcia as incluísse na pauta de julgamento. Sobreveio, um mês depois, a aguardada condenação de Lula no TRF-4: 12 anos e 1 mês de cadeia. E a presidente do Supremo passou a administrar com a barriga a análise do mérito das duas ações. Adia o julgamento, impedindo Gilmar Mendes de refazer o voto que pode inverter o placar de 2016.

Momentaneamente impedido de deliberar sobre as ações que tratam genericamente da prisão em segunda instância, o Supremo terá de julgar nesta quinta-feira o habeas corpus protocolado pela defesa de Lula. Nele, os advogados do ex-presidente petista pedem ao Supremo que reconheça o “direito” do seu cliente de recorrer em liberdade contra a condenação no caso do tríplex do Guarujá. Uma condenação que o TRF-4, tribunal de segunda instância, deve ratificar na segunda-feira, liberando Sergio Moro para decretar a prisão de Lula.

O pano de fundo pintado por Gilmar Mendes em 2016 permanece inalterado. Os países civilizados continuam prendendo na primeira e na segunda instância. O risco de prescrição de crimes ainda é latente entre os investigados com foro privilegiado. O fantasma da impunidade paira sobre os escaninhos dos tribunais superiores. As cadeias do país não perderam a aparência de masmorras superlotadas. Os presos provisórios respondem por 40% da população carcerária. Só uma coisa mudou: a Lava Jato aproximou-se dos calcanhares de amigos de Gilmar Mendes —gente como Michel Temer (PMDB) e Aécio Neves (PSDB). Ambos ainda protegidos sob a marquise do foro privilegiado.

Blog do Josias de Souza
 

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Defesa de Lula pede prescrição de crimes no caso tríplex


Advogados pedem que, caso seja negado, ex-presidente possa recorrer em liberdade ao STJ e STF


A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou pedido ao Tribunal Regional Federal para que reconheça a prescrição dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro referentes ao tríplex do Guarujá e, caso indefira o pleito, que seja assegurado a ele o direito de recorrer em liberdade aos tribunais superiores - Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. Os advogados argumentam que se o benefício ocorreu em 2009 - quando a OAS assumiu a construção do edifício Solaris, onde fica o imóvel, transcorreu o tempo entre o ato e a denúncia contra o ex-presidente, seja no ato de lavagem de dinheiro ou de corrupção. O processo de apelação de Lula corre em sigilo no TRF-4. Os documentos da defesa do ex-presidente foram divulgados pelo site do "Estado de S. Paulo" e confirmados pelo GLOBO.

A defesa sustenta que Lula é inocente, mas parte do pressuposto que, se houve vantagem indevida, como argumenta a acusação, ela ocorreu em 8 de outubro de 2009, quando a OAS assumiu a construção do prédio e teria supostamente ocorrido a ocultação da propriedade do tríplex, que foi mantido em nome da empresa. "Desse modo, caso se mantenha o quantum imposto na sentença, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva retroativa, pois a referida pena prescreve em 06 (seis) anos, lapso temporal já transcorrido entre a suposta consumação do delito (em 08.10.2009) e o recebimento da denúncia. Da mesma forma, a lavagem de dinheiro teria sido consumada em 08.10.2009 (data da assunção do empreendimento imobiliário pela OAS, quando teria ocorrido a ocultação da propriedade do apartamento tríplex), tendo transcorrido o lapso temporal prescricional entre a suposta consumação do delito de lavagem e o recebimento da denúncia".

No documento, a defesa acusa o juiz Sergio Moro de ter feito análise parcial e facciosa dos autos e diz que se foi dito na sentença que ninguém está acima da lei, também ninguém está "abaixo dela ou fora de sua proteção". No documento, chamado Memorial, os advogados afirmam que o poder de punição do Estado não pode se "se fundamentar em abstratas narrativas, meras conjecturas ou sofismas".

Caso seja confirmada a condenação, haverá ainda apreciação de recursos do tribunal


Lula foi condenado a nove anos e seis meses de prisão por Moro, em regime inicial fechado, e a progressão da pena foi condicionada a uma reparação de danos no valor de R$ 16 milhões.
Ás vésperas do julgamento da apelação pelo TRF-4, a defesa volta a afirmar ainda que não há qualquer vínculo entre o financiamento do edifício Solaris e o custo da reforma do apartamento com contratos da Petrobras, o que faz com que o caso fique na 13ª Vara Federal de Curitiba/PR. Ressalta que na própria sentença o juiz Sergio Moro diz que jamais afirmou que os valores obtidos pela OAS nos contratos com a Petrobras foram usados para pagar vantagens indevidas a Lula. E acrescenta que, sem ter vínculo com a Petrobras, o caso não deveria ficar com a Justiça Federal de Curitiba, mas sim no Distrito Federal, já que se afirma que os atos de corrupção ocorreram durante o período em que ele ainda era presidente da República.


O documento também volta a falar da suspeição do juiz Sergio Moro e diz que a conduta dele deixou "transparecer, bem claras, a desafeição e a inimizade que, por razões políticas e ideológicas" em relação ao ex-presidente, além de afirmar que a força-tarefa do Ministério Público Federal também é suspeita por ter feito "verdadeiro show midiático" na apresentação da denúncia. Relembra que o falecido ministro do STF Teori Zavascki considerou a "espetacularização" incompatível com apuração dos fatos.

A defesa diz ainda que denúncia foi baseada num imaginário “caixa geral de propinas” assentado única e exclusivamente na palavra de delatores e do corréu Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS.  Na sentença, o juiz Sergio Moro diz que parte do benefício ocorreu em 2009, quando a OAS assumiu o empreendimento, e em meados de 2014, quando foram feitas as reformas no imóvel e , segundo Léo Pinheiro, foi acertado que o valor seria descontado da conta geral de propina com o PT. "Não importa que o acerto de corrupção tenha se ultimado apenas em 2014, quando Luiz Inácio Lula da Silva já não exercia o mandato presidencial, uma vez que as vantagens lhe foram pagas em decorrência de atos do período em que era presidente da República", afirmou o juiz ao determinar a sentença.

MATÉRIA COMPLETA em O Globo