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terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Um Ministério dos Direitos Humanos que só se preocupa com humanos “do lado certo” - J. R. Guzzo

Gazeta do Povo - VOZES
 
Poucas vezes o Ministério de Direitos Humanos, se tivesse um mínimo de interesse real em direitos humanos, teria tanto trabalho a fazer quanto neste primeiro ano de governo progressista, antifascista e dedicado ao amor.  
Mas o Ministério de Direitos Humanos está num silêncio de túmulo há quase um ano inteiro, porque os direitos que vem sendo ofendidos não pertencem aos humanos de quem o ministro e o resto do governo gostam. São direitos “de direita”. 
No Brasil de Lula, do STF e do ministro dos Direitos Humanos isso é algo que simplesmente não existe
Mandam índios de classe executiva para Paris e Nova York; ali, enfeitados de penas coloridas e com a “curadoria” do Itamaraty, desfilam pelos salões dos bilionários de esquerda, intelectuais e desocupados em geral para denunciar os “crimes” que o agronegócio está provocando na “floresta amazônica”
Enquanto isso, o governo democrático de Lula comete, aqui dentro, as piores violações aos direitos humanos da história recente do Brasil. O ministério não diz nada.
 
No Amazonas, barcaças e dragas de mineração usadas por garimpeiros, bem como suas casas e propriedades, estão sendo fisicamente destruídas pelas forças armadas do governo. 
Destroem tudo. 
Não só o equipamento, mas também móveis, geladeiras, fogões, roupas e o que mais estiver lá. É essa a coragem atual do Exército brasileiro – ataca pobres coitados, incluindo mulheres e crianças, que não têm como se defender.  
Para o Alto Comando, que fala dia sim, dia não, que está garantindo a “legalidade” no Brasil, garimpeiro não tem família. 
Também não está entre as populações mais pobres do país. 
Em obediência à Tábua de Mandamentos do Governo Lula, garimpeiros são apresentados pelo serviço de propaganda que funciona na maior parte da mídia brasileira como capitalistas selvagens que só pensam no “lucro” – quando são na vida real brasileiros miseráveis que garimpam para não morrer de fome. 
A destruição da sua propriedade é uma violação grosseira, violenta e rancorosa aos direitos humanos
Mas o Ministério dos Direitos Humanos não deu um pio sobre o assunto. Os militares acham que estão sendo heróis de guerra.

O Ministério de Direitos Humanos está num silêncio de túmulo há quase um ano inteiro, porque os direitos que vem sendo ofendidos não pertencem aos humanos de quem o ministro e o resto do governo gostam

O Brasil está convivendo desde o dia 8 de janeiro com o ataque maciço aos direitos humanos das pessoas que foram presas no quebra-quebra da Praça dos Três Poderes.  
Praticamente nenhum direito individual dos acusados está sendo respeitado pelo STF. 
Onze meses depois dos fatos, há mais de 100 pessoas presas, sem culpa formada e sem julgamento. 
Centenas de outros estão submetidos à tortura legal da tornozeleira eletrônica, com efeitos destruidores sobre suas vidas pessoais; 
são acusados primários, que não oferecem nenhum risco à sociedade e só estão com as tornozeleiras para satisfazer à vontade do ministro Alexandre de Moares em impor o máximo de sofrimento a quem tomou parte nos distúrbios de Brasília. Um dos réus morreu na prisão, porque o ministro negou a sua liberação temporária para tratamento urgente de saúde. 
Os advogados não podem fazer a defesa oral dos acusados; têm de gravar vídeos que ninguém vê e esperar a sentença, que sempre é de condenação. O Ministério dos Direitos Humanos não foi capaz de dizer absolutamente nada, sobre nada disso – nem na morte do preso Cleriston da Cunha.

A preocupação do ministro dos Direitos Humanos é denunciar o “racismo” (na sua opinião, os brancos são racistas mesmo quando não sabem que estão sendo racistas), pagar passagem e hotel da mulher de um chefe do tráfico (condenado a 31 anos de cadeia) e puxar desesperadamente o saco do presidente da República. Se houvesse em Cuba um “Ministério de Los Derechos Humanos” (os cubanos nunca perderam tempo com isso), seria muito parecido com o seu.

Conteúdo editado por:Jônatas Dias Lima
 
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Sebastião Coelho lava a alma da Nação: “As pessoas mais odiadas deste país” - Paulo Polzonoff

Gazeta do Povo. - VOZES

"Ensina-me, Senhor, a ser ninguém./ Que minha pequenez nem seja minha". João Filho.


SEBASTIÃO COELHO
Sebastião Coelho: “Infelizmente”.| Foto: Reprodução/ Twitter


O desembargador aposentado e agora advogado Sebastião Coelho, na defesa de um dos acusados de participar do oh-golpe de 8 de janeiro, disse o que eu e você temos vontade de dizer, mas não podemos. “Aqui nesta bancada estão as pessoas mais odiadas deste país”, traulitou ele com um leve tremor na voz. E depois repetiu a constatação óbvia, mas proibida para nós, reles mortais.

A sentença, porém, foi recebida com o já tradicional desprezo pela realidade. Que é a marca registrada do Supremo Tribunal Federal, com seus salamaleques, positivismos e lagostas. 
Alexandre de Moraes, por exemplo, retrucou Sebastião Coelho dizendo que apenas uma minoria extremista odeia a corte. Algo que pode ser empiricamente contestado se o calvíssimo ministro ousasse passear pelas ruas de qualquer cidade do país.



Odiadas?
O exagero retórico de Sebastião Coelho tem lá seu charme
Ainda mais quando se leva em conta o dedo em riste do advogado. Mas... odiadas? Será que a palavra expressa com exatidão o nosso sentimento? 
E, no mais, o que significa odiar uma instituição ou uma autoridade que só se conhece pela televisão?  
Também senti falta da, digamos, pretensão aforística da frase. Mas sou exigente e um chato, bem sei. Desculpe.



Bom, me segura senão fico aqui emendando uma pergunta na outra até amanhã de manhã. 
O fato é que Alexandre de Moraes & Cia. são, no mínimo, as pessoas menos admiráveis e respeitáveis do país
Uns pulhas cujo poder se nutre justamente da nossa revolta. 
Essa aí que faz as vezes de ódio. E, para piorar, eles ocupam o poder que deveria ser o mais admirado do Estado. Aí é só fazer uma regra de três e...
 
Infelizmente
Claro que o verbo “odiar” faz muito barulho. Se duvidar, até assusta. 
E é por isso que passou despercebido para muitos o advérbio “infelizmente” – que o orador solta como uma concessão algo insincera. 
É no “advérbio de tristeza”, no entanto, que está o pouco que resta de esperança democrática na alma daqueles que Alexandre de Moraes reduz a uma minoria de extremistas que evidentemente não somos.
 
O “infelizmente” contém todo ativismo, toda hermenêutica criativa, toda parcialidade, todo abuso de poder, toda arrogância e todas as ordens ilegais e inconstitucionais;
-  todos os perdeu-manés e nós-derrotamos-o-bolsonarismo e todo o Estado de exceção excepcionalíssimo; toda a militância progressista e, por fim, toda a bajulação política a Lula e às elites que ele representa. O “infelizmente” é um sonho de liberdade do qual acordamos para nos deparar com esse STF aí. Infelizmente.
 
Estratégia suicida
Apesar da coragem do advogado, se eu fosse o réu Aécio Pereira estaria bastante preocupado. 
Porque, convenhamos, começar um julgamento opondo-se dessa forma a juízes sabidamente parciais e hostis pode até lavar a nossa alma (e lava), mas não é das estratégias mais inteligentes ou prudentes. 
É um heroísmo juridicamente suicida, esse do advogado Sebastião Coelho.
 
O doutor, não sei se por cálculo, descuido ou ímpeto, age como se os ministros do STF fossem suscetíveis à lógica e ao bom senso
Como se temessem ter a honra ferida por suas ações despóticas. 
Como se eles se importassem com o legado. 
Como se ainda houvesse juízes – e não apenas dez militantes togados, um café-com-leite e um omisso – em Brasília. 
Não são, não temem, não se importam e não há.
 
Fake news
Alexandre de Moraes foi o primeiro a dar seu voto
– para inocentar o réu, claro. De cabeça baixa, o ministro reconheceu que é uma das pessoas mais odiadas do Brasil, pediu desculpas pelos excessos dos últimos anos, dizendo que “se empolgou na defesa da democracia”
E, num gesto teatral, rasgou uma folha de papel para confessar que não tinha competência para julgar nenhum dos acusados.
 
Claro que é mentira. Ou fake news, se preferirem. Alexandre de Moraes votou pela condenação do coitado do Pereira, que agora pode (e provavelmente vai) pegar até 30 anos de cadeia.  
Mas que é bom imaginar, nem que seja por um parágrafo apenas, um STF habitado por homens virtuosos, capazes de arrependimento e dignos de perdão, lá isso é. 
Quem sabe num universo paralelo, noutra vida ou em outras crendices do tipo.

Paulo Polzonoff Jr., colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

sábado, 9 de setembro de 2023

O que fazer com o dinheiro? - Carlos Alberto Sardenberg

O que a Petrobras fará com os R$ 6,28 bilhões que recebeu de empresas e executivos, inclusive da própria estatal, a partir dos acordos de leniência firmados no âmbito da Operação Lava-Jato? Se foi tudo uma “armação”, se os pagamentos foram indevidos, a Petrobras tem de devolver esses bilhões.

Parte do dinheiro pago pela Odebrecht foi para o Departamento de Estado dos Estados Unidos e a Procuradoria-Geral da Suíça. Colaboraram nas investigações que chegaram ao famoso sistema Drousys, usado pelo setor de Operações Estruturadas da empresa para controlar os pagamentos de propina a autoridades e políticos.

Mas, se não aconteceu nada disso, os acionistas da Odebrecht têm o direito de reclamar de volta esse dinheiro enviado para os gringos.

A Petrobras teve de pagar indenizações a acionistas que negociavam seus papéis na Bolsa de Wall Street. Foi um acordo por meio do qual a estatal brasileira reconheceu a má gestão — ou, mais exatamente, a corrupção, o petrolão —, circunstância que, obviamente, influiu negativamente no valor de suas ações.

Mas, se foi “armação”, todas essas indenizações foram indevidas. E então, que órgão do governo brasileiro organizará as cobranças aqui e lá fora?

Ou vai ficar tudo por isso mesmo?

Ocorre que o ministro Dias Toffoli encaminhou outras providências. Determinou que todos os órgãos envolvidos nos acordos de leniência sejam alvo de investigação para apurar eventuais danos à União. É uma longa lista. Vai da Lava-Jato de Curitiba até a Advocacia-Geral da União, Ministério Público e mais — centenas de gestores.

Um deles está ali mesmo, ao lado de Toffoli, numa cadeira do Supremo. Trata-se de André Mendonça, ex-chefe da AGU. O órgão foi parte ativa nos acordos de leniência, como o próprio Mendonça confirmou e elogiou numa entrevista em abril de 2019. Disse ainda que a AGU continuava patrocinando outros acordos.

No total, os acordos de leniência levaram a pagamentos de R$ 25 bilhões a diversas empresas estatais e instâncias de governos estaduais e federal.  
Também há complicação no âmbito do Judiciário. 
Em 23 de abril de 2019, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu por unanimidade manter a condenação de Lula no caso do tríplex do Guarujá. 
 O mesmo STJ permitira a prisão de Lula, em abril de 2018, com base no entendimento de que o réu poderia começar a cumprir a pena depois da condenação em segunda instância. 
E o plenário do STF, em 4 de abril daquele ano, negara habeas corpus que livraria Lula da prisão
A decisão foi apertada, 6 a 5, mas tomada pelo plenário. “Armação”? 
 
A recente decisão de Dias Toffoli foi monocrática, assim como fora a de Edson Fachin, quando, em 8 de março de 2021, anulou todas as condenações de Lula na Lava-Jato
Argumentou que o processo deveria ter sido aberto em Brasília, e não em Curitiba — “descoberta” feita cinco anos depois da abertura do caso. A decisão foi confirmada pelo plenário do Supremo o que denota um tipo de corporativismo. Você não mexe na minha sentença, eu não mexo na sua. 
 
Depois disso, o então ministro Ricardo Lewandowski tomou várias decisões monocráticas anulando as delações da Odebrecht nos processos de Lula. 
Toffoli completou o serviço, anulando toda a delação. 
Então ficamos assim: um erro processual, primeiro, e uma sequência de decisões monocráticas, depois, determinaram que as delações foram irregulares, o que dispensa, nessa grande “armação”, a verificação das provas.  
Quer dizer: aqueles computadores e programas da Odebrecht não existem, foi tudo uma ilusão.

Tudo considerado, há uma conclusão que se pode tirar para preservar a democracia e a segurança jurídica. Como já sugeriu o advogado, jurista e ex-ministro da Justiça José Paulo Cavalcanti Filho, as decisões monocráticas deveriam ser simplesmente vetadas. Abolidas. Do jeito como está, não temos uma Corte, mas 11 capitanias que decidem cerca de 90% dos casos. Dá nisso.

Agora, quem quiser saber a história real, está no livro de Malu Gaspar “A organização: a Odebrecht e o esquema de corrupção que chocou o mundo”.

Suas Excelências deveriam ler.

Carlos Alberto Sardenberg, colunista 

Coluna em O Globo,  9 setembro 2023


 


terça-feira, 25 de abril de 2023

Quando o medo submete (quase) todos - Percival Puggina

         Não é de hoje que observo nos parlamentos brasileiros, muito especialmente neles, titulares de mandato receosos em suas relações funcionais com o Poder Judiciário. 
Nem sempre esse sentimento é marcado apenas pela eventual tensão entre quem faz a Lei e quem faz cumprir a Lei. Com crescente frequência, o Poder Judiciário cria a lei conforme preceituam, de modo objetivo e persistente, estranhas correntes do Direito ensinadas nas Universidades. 
Acontece que essas novidades ideológicas não estão incorporadas à Constituição ou a qualquer convenção internacional a que o país esteja legalmente submetido por norma brasileira. Ou seja, é puro abuso de poder.
 
Gravíssimo problema surge, então. Quando um tema qualquer chega ao Poder Judiciário, é dele a última palavra. 
 E o que disser, terá que ser cumprido, mesmo que a sentença ou a ordem entre em conflito com o que estiver escrito na Lei. 
Estou falando, já se vê, em insegurança jurídica. 
Na mesma medida em que a base da formação jurídica despeja mais e mais “operadores do Direito” nas carreiras do Poder Judiciário e suas cortes, mais difícil fica o trabalho dos advogados que veem a Lei desfolhar-se sob o vendaval de doutrinas que escapam a seu manuseio. Nem os membros do próprio Judiciário e das Instituições independentes, que junto a ele atuam, são imunes ao que aqui descrevo.
 
Evidentemente, o resultado disso é poder e lá no topo dos poderes de Estado vai produzir péssimas consequências para a sociedade. Refiro-me, especificamente, ao medo que os congressistas passaram a ter do Poder Judiciário, um sentimento do qual poucos e valentes escapam. Mesmo os que não têm motivos factuais para recear o braço da Justiça, têm medo de sua balança, ou de seu mau olhado. 
Ponderam as consequências do voto negado a um candidato a ministro, da redução do orçamento proposto, da recusa ao pedido de um ministro para rejeição do voto impresso
Têm medo de negar a prisão de um deputado irreverente, ou de defender um senador que caiu em desgraça perante a Corte.

Por isso, é vedado, mesmo em brincadeira, sugerir o que em público ministros já disseram um do outro e para o outro. Por isso, é possível assistir a lei ser violada e a liberdade de opinião e expressão ser submetida a uma tutela não prevista na Constituição.

É o abandono da sociedade ao arbítrio. O fenômeno ocorre porque, de algum modo, o medo de um poder que escapou a todo controle se esconde sob a imitação vagabunda de uma virtude – a prudência submetendo quase todos num constrangido mecanismo de autoproteção. O que, na prática, significa simplesmente tudo. E nada tem a ver com democracia, ou com Estado de Direito.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


terça-feira, 6 de dezembro de 2022

As mentiras do desencarceramento (Parte 1) - Revista Oeste

Roberto Motta

Uma sociedade que não consegue condenar moralmente seus criminosos jamais conseguirá condená-los judicialmente — e muito menos puni-los. 

A função principal da prisão é afastar o criminoso do convívio social, impedindo-o de continuar a cometer crimes. A segunda função é enviar um sinal a toda a sociedade de que a atividade criminosa não será tolerada. A terceira função é punir o criminoso pelo crime que ele cometeu.

Foto: Shutterstock

Foto: Shutterstock 

Essa última função causa horror nos pensadores politicamente corretos. Segundo eles — a maioria sem qualquer experiência em policiamento ou criminologia —, o criminoso não deve ser punido, mas acolhido. Esse pensamento dá ao crime violento um caráter de ato de protesto contra a injustiça e a “desigualdade”, e transforma o criminoso em combatente pela causa de uma revolução.
Punir o criminoso — o combatente — seria apenas confirmar a opressão do “sistema” que, através do seu “mecanismo de concentração de riqueza”, produziu o criminoso em primeiro lugar.

Qualquer cidadão brasileiro — aquele que tenta sobreviver em meio ao crime sem fim do Brasil — reconhece nas ideias do parágrafo anterior um amontoado de bobagens. Pois bem: são essas as ideias que fazem a cabeça de um número cada vez maior de defensores públicos, promotores, juízes, desembargadores, ministros, professores de direito e — pasmem — até policiais.

São essas ideias que estão por trás da inacreditável pauta do desencarceramento.

Essa visão romantizada do criminoso e do crime, e o equívoco (ou, em muitos casos, a deliberada estratégia político-ideológica) de transferir a responsabilidade do autor do crime para a sociedade, não são apenas violações da lógica e da moral; elas ignoram a imensa massa de estudos e de literatura científica já produzida sobre o tema, aqui no Brasil e lá fora, que afirma, com base em evidências claras, que o crime é uma escolha racional que o criminoso faz depois de avaliar os riscos e os benefícios de sua ação.

Do ponto de vista da sociedade, a prisão é uma punição essencial. A sentença do criminoso é uma resposta que a Justiça dá às famílias e aos indivíduos que tiveram seus direitos violados pelo bandido.

A prisão é uma das formas mais humanas de punição. Basta lembrar que, até poucos séculos atrás, criminosos eram condenados a espancamento e torturas, ou executados de forma cruel e lenta
Hoje, nas democracias ocidentais, até o autor do crime mais sádico e obsceno será condenado, no máximo, a uma sentença de prisão pelo resto da vida ou a uma pena de morte, executada de forma a minimizar seu sofrimento.
No Brasil, não existe nenhuma dessas duas opções.[lamentavelmente e por isso a criminalidade aumenta; além da flexibilização das punições as autoridade procuram facilitar a vida dos bandidos. Exemplos: o individuo eleito presidente da República criticou a prisão de ladrões de celulares, aos quais chamou, carinhosamente,  de 'mininos'; 
- no mesmo ritmo o ministro Fachin, do STF. proibiu a polícia do Rio de Janeiro de realizar operações em favelas, sem antes cumprir um extenso ritual que só favorece os bandidos, por dar oportunidade para vazamentos e mesmo para fugas.]

Uma sociedade que não consegue condenar moralmente seus criminosos jamais conseguirá condená-los judicialmente — e muito menos puni-los.

No Brasil, enquanto um pai de família assassinado pode deixar sua família na miséria, a família do assassino pode ser protegida pelo “Auxílio-Reclusão”

Dizem a lógica e a moral e o próprio conceito de Estado de Direito — que a punição do criminoso tem de ser proporcional ao crime cometido. Ou dito de outra forma: a sentença do criminoso não pode ser mais leve que a sentença da vítima.

Como se trata de punição, uma prisão jamais será uma colônia de férias paga com os impostos dos cidadãos honestos. 
As condições dos presídios são ruins na maior parte dos países, inclusive nos desenvolvidos.
 As únicas exceções talvez sejam alguns países nórdicos, que são exceções em quase tudo.  Ir para a prisão não é a mesma coisa que ir para a escola ou para uma colônia de férias bancada pelos contribuintes. Prisão é sempre uma coisa ruim. Cadeia não é assistência técnica de pessoas. Cadeia é punição. [no Brasil, o criminoso pode ser  condenado por vários crimes, por diferentes juízes e confirmação em várias instâncias, ganha o direito a cumprir pena em condições que tornam sua cadeia um 'resort', depois pode ser descondenado, SEM SER INOCENTADO, e liberado para concorrer a Presidência da República.
NÃO É ´PIADA. Aconteceu no Brasil, nas eleições de 2022.]
 
É evidente que todo indivíduo merece ser tratado de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Mas esses direitos precisam ser garantidos primeiro aos indivíduos cumpridores da lei, e não aos que a violam. Um criminoso não pode ter direitos que são negados a um cidadão honesto
Mas, no Brasil, enquanto um pai de família assassinado pode deixar sua família na miséria, a família do assassino pode ser protegida pelo “Auxílio-Reclusão” (perceba a cuidadosa escolha das palavras)
Criado pela Lei nº 8.213, de 24 de junho de 1991, o Auxílio-Reclusão dá ao preso o direito de receber um benefício de até R$ 1.503,25 (valor vigente no ano de 2021). 
Para isso, o preso precisa apenas comprovar que exerceu atividade remunerada que o enquadre como contribuinte obrigatório da Previdência Social. Trocando em miúdos: basta o criminoso ter passado pelo período de experiência de 90 dias em um emprego antes de cometer um crime para que, ao ser preso, sua família tenha direito a receber o auxílio todo mês. Em 2012, o governo pagou R$ 434 milhões em Auxílio-Reclusão.

O Auxílio-reclusão é um deboche. Dar dinheiro do Estado para um criminoso enquanto ele cumpre sua pena é fazer piada com o sistema de Justiça Criminal e com o sofrimento das vítimas.

Quando apresento minha crítica a essa inaceitável inversão da lógica e da moral (mais uma), alguns usam o argumento — que funciona com muitas pessoas — de que o dinheiro vai para a família do preso, não para ele.

Eu pergunto: e daí?

Me perguntam: mas a família do preso vai ficar desamparada, Roberto?

Eu pergunto: e a família da vítima, vai ser amparada por quem?

Na verdade, a família da vítima, além de não receber nada, também ajuda — com seus impostos — a sustentar a família do criminoso.

Perceba a gravidade do que está acontecendo aqui: confrontados com a situação trágica de um crime —por exemplo quando um bandido, para roubar um celular, mata um pai de família —, os arquitetos da confusão jurídica que é o sistema de Justiça Criminal brasileiro fizeram a opção de ajudar a sustentar o criminoso e sua família e esqueceram a família da vítima.

É óbvio que aquele que escolhe o caminho do crime coloca o sustento de sua família em risco. Mas os legisladores brasileiros resolveram proteger o criminoso desse risco. É a moral pelo avesso. Investir no crime tem de deixar de ser um bom negócio no Brasil. Precisamos de promotores, deputados, senadores, juízes e desembargadores com a coragem de dizer isso.

Para entender melhor o problema do crime no Brasil e as alternativas que temos para resolvê-lo, é preciso também perguntar: para que servem as prisões? Elas realmente reabilitam?

“Sem punições para aqueles que as violam, as leis são ineficientes. No caso da lei criminal que proíbe homicídio, agressão, estupro, roubo e outros crimes, a punição pode tomar a forma de prisão”, diz A.C. Grayling, professor de filosofia da Universidade de Londres, em seu livro Ideias que Importam. Ele lembra que existem outras questões importantes
Será que a punição é a resposta correta ao crime? 
Não seria melhor pensar em termos de reabilitação, reparo e compensação? 
Será que prendemos criminosos para proteger o público, e não para punir o criminoso?

Segundo Grayling, as teorias de punição se dividem em dois grupos. O primeiro é o da escola Utilitária, que afirma que a punição só é certa se produz boas consequências, como proteção da sociedade e reabilitação do ofensor. O segundo grupo é o da escola Retributiva, que diz que, se um erro é cometido voluntariamente e o ofensor tem consciência disso, ele merece ser punido e sofrer.

A taxa de reincidência de ex-presidiários nos Estados Unidos é de 60%. A média europeia é de 55%

Em meados do século 20, ainda havia visões otimistas sobre a possibilidade de usar o sistema penal como uma oportunidade de reabilitar criminosos e devolvê-los à sociedade como cidadãos melhores. Essa ideia foi incorporada, por exemplo, no nome usado nos Estados Unidos para o sistema penitenciário — que é chamado de sistema “correcional”.

“Mas, por uma dessas dolorosas ironias que nos ensinam as melhores lições, os Estados Unidos encarceram uma porcentagem maior de sua população que qualquer outro país”, diz Grayling. Ao mesmo tempo — ou talvez como consequência disso —, os Estados Unidos têm índices de criminalidade muito inferiores aos dos países em desenvolvimento.

Segundo Grayling, estudos sobre reincidência criminal realizados por especialistas em Direito penal, criminologistas e sociólogos nos anos 1970 demonstraram que as prisões não reabilitam:

A esses fatos empíricos juntaram-se as vozes de filósofos retornando à ideia de que a punição é, na verdade, essencialmente retributiva, e com propriedade, pois serve aos interesses da Justiça que o causador de dano e sofrimento pague o custo dos seus atos com sua liberdade e sua propriedade.

Se as prisões são incapazes de reabilitar os criminosos para uma vida em sociedade, elas ainda assim cumprem um importante papel: o de demonstrar a disposição da sociedade de punir de forma exemplar aqueles que violam seus valores mais sagrados.O sistema penitenciário não recupera criminosos. [entendemos que deve ser priorizada a punição e não a ressocialização = e a cada reincidência a penalidade agravada.] Ressocialização é um conceito ideológico usado para aliviar a culpa do criminoso e provar” a “ineficácia” da prisão. A mídia e os “especialistas” brasileiros repetem todos os dias: não adianta prender criminosos porque nossas prisões são horríveis e não “ressocializam” os presos.

Mas a prisão não “ressocializa” nem reabilita em nenhum país do mundo. Nenhum sistema penitenciário do mundo faz isso. A taxa de reincidência de ex-presidiários nos Estados Unidos é de 60%. A média europeia é de 55%. Dois terços dos ex-presidiários da Grã-Bretanha são presos novamente em um período de 3 anos.

Apenas uma minoria dos criminosos se regenera, e a influência do Estado nesse processo é mínima. Por mais que isso ofenda os ideólogos e muitas pessoas bem-intencionadas, crime é uma escolha individual, especialmente o crime econômico, cometido pelo criminoso para ganhar uma vantagem ou benefício (que pode ou não ser material).

Cela da delegacia da cidade de Eunápolis (BA) - 
 Foto: Joa Souza/Shutterstock

Os ativistas recorrem também à falácia de dizer que manter alguém preso custa caro. Na verdade, custa muito mais caro deixá-lo solto, como explica o economista Thomas Sowell em seu livro Economia Básica:

Uma das objeções levantadas contra a construção de mais penitenciárias para manter mais criminosos presos por maiores períodos é que custa ao Estado uma grande quantia mantê-los atrás das grades.

Frequentemente se faz uma comparação entre o custo de manter um criminoso preso versus o custo de manter uma pessoa na escola pelo mesmo período.

Entretanto a alternativa relevante aos custos de encarceramento incorridos pelo Estado são os custos impostos à população quando criminosos profissionais estão fora das prisões.

No início do século XXI, por exemplo, os custos totais do crime na Grã-Bretanha foram estimados em 60 bilhões de libras por ano, enquanto os custos totais das prisões são menos de 3 bilhões.

É claro que os funcionários do governo estão preocupados com os 3 bilhões de custo das prisões que são de sua responsabilidade, e não com os 60 bilhões que afetarão diretamente os cidadãos.

Nos Estados Unidos, estimou-se que o custo de manter um criminoso profissional atrás das grades é 10 mil dólares por ano MENOR que o custo de deixá-lo nas ruas.

Existe outro fator relevante para explicar o papel das prisões na preservação da segurança pública: a maior parte dos crimes é cometida por uma parcela relativamente pequena dos criminosos. O famoso estudo científico, “Revisitando os Lobos Vorazes: Uma Revisão Sistemática da Concentração de Crime”, realizado por pesquisadores da Escola de Justiça Criminal da Universidade de Cincinnati, concluiu que os 10% dos criminosos mais ativos no conjunto da população são autores de 66% dos crimes.

Diz o trabalho:

Numerosos estudos determinaram que o crime está altamente concentrado entre um pequeno grupo de criminosos. Essas descobertas orientaram o desenvolvimento de várias estratégias de prevenção ao crime. O tema comum a essas estratégias é que, ao nos concentrarmos nos poucos infratores responsáveis pela maior parte do crime, podemos prevenir a maior quantidade de crimes com o mínimo de recursos […]

Descobrimos que o crime está altamente concentrado na população e em diferentes tipos de criminosos. Existe pouca variação na concentração entre jovens e adultos ou entre infratores americanos e os de outros países […] Os 10% das pessoas mais ativas criminalmente respondem por cerca de 66% dos crimes.

Colocar esses criminosos na prisão significa reduzir significativamente o número de crimes cometidos e aumentar dramaticamente a sensação de segurança da população. Prestem atenção na consequência dessa descoberta: não é necessário prender milhões de pessoas para acabar com a crise de criminalidade do país.

Uma parcela desproporcional dos crimes é cometida por esse pequeno grupo de criminosos, já conhecidos da polícia e que, por causa da leniência da nossa lei, vive entrando e saindo da cadeia.

Esses indivíduos já fizeram sua opção pelo crime. Eles não são pobres coitados ou revolucionários tentando implantar um sistema social mais justo. Eles são criminosos por vontade própria, por vocação, ambição desmedida ou deformação do caráter.

Alguns são pobres, outros são ricos; alguns são negros, outros são brancos ou asiáticos. Há homens e mulheres, senhores de idade e garotos de 16 anos. Todos sabem o que estão fazendo e aproveitarão qualquer oportunidade para atacar a sociedade, cada um com sua forma peculiar: colocando uma pistola na cabeça de um motorista, dando uma gravata em uma senhora de idade, subornando para ganhar uma licitação ou violentando e matando crianças.

(continua na próxima edição)

Leia também “Elon e eu”

Roberto Motta, colunista - Revista Oeste


sábado, 19 de novembro de 2022

Fala enigmática de Braga Netto reativa rumor de virada de mesa golpista no bolsonarismo

‘Não percam a fé, é só o que eu posso falar agora’, disse o ex-candidato a vice de Bolsonaro a militantes em Brasília

 Uma declaração enigmática do general da reserva Walter Braga Netto (PL), vice na chapa derrotada de Jair Bolsonaro, deixou o bolsonarismo em polvorosa nesta sexta-feira. Após visitar o presidente no Palácio da Alvorada, o ex-ministro da Defesa conversou com apoiadores bolsonaristas e pediu que “não perdessem a fé”, sem elaborar. 

A declaração de Braga Netto, que foi gravada, foi imediatamente recebida nas redes pró-Bolsonaro como um recado implícito aos apelos por uma virada de mesa eleitoral ecoados em protestos golpistas na porta de quartéis Brasil afora.

“Vocês não percam a fé, é só o que eu posso falar para vocês agora”, disse Braga Netto aos militantes que permaneciam na entrada da Alvorada com adereços alusivos à bandeira do Brasil. “A gente está na chuva, no sufoco”, interpelou uma bolsonarista com a voz embargada, tentando segurar o choro. “Eu sei, senhora. Tem que dar um tempo, tá bom?”, completou o ex-vice de Bolsonaro.Braga Netto conversa com Jair Bolsonaro durante cerimônia do Dia do Soldado na capital federal, em agosto

Braga Netto conversa com Jair Bolsonaro durante cerimônia do Dia do Soldado na capital federal, em agosto Cristiano Mariz/O Globo

Foi o suficiente para que Braga Netto figurasse entre os tópicos mais discutidos no Twitter nesta sexta-feira, em que as instabilidades na rede social em função de demissões em massa nos Estados Unidos dominaram a rede.

No canal mantido pelo site bolsonarista Jornal da Cidade Online no Telegram, que conta com 34 mil seguidores, o padrão se repete. “A mensagem foi dada”, afirma a mensagem acompanhada do link para o vídeo da fala de Braga Netto.

A lista reproduziu mensagens no mesmo tom. 

 

“General faz sua declaração mais impactante e estremece as bases de Brasília. O clima de tensão domina Brasília”, diz uma mensagem disparada na noite desta sexta-feira na lista, em referência a uma publicação do deputado federal General Girão (PL-RN) nas redes atacando o Supremo Tribunal Federal.

Pela manhã, o destaque foi uma reunião interna do Exército que, na verdade, ocorreu nos dias 8 e 9 discutiu assuntos burocráticos da instituição, segundo o site da corporação. “Exército realiza nova reunião em Brasília, desta vez com os adjuntos de comando. Forças se organizam e se preparam”, diz o trecho destacado no Telegram.

A fala do general é mais uma da longa lista de demonstrações de atores importantes do bolsonarismo feitas desde o segundo turno que, embora pareçam despretensiosas, funcionam como “dog whistle” (apito de cachorro) - expressão popularizada nos Estados Unidos que define mensagens cifradas e interpretadas devidamente apenas pelo seu grupo alvo.

[dificil de entender o esforço estúpido e inútil que a mídia militante faz para passar a ideia de golpe em tudo; 
agora selecionaram uma declaração do general Braga Netto para atribuir intenções golpistas.
Esses jornalistas deveriam entender que o general Braga Netto é um oficial-general do Exército Brasileiro, com uma carreira responsável, não é um desses esquerdistas irresponsáveis que tentam se garantir,  apresentando denúncias infundadas e irresponsáveis - caso daquele senador 'estridente' do AP e  daquele deputado que pediu o afastamento do ministro da Defesa - o individuo foi eleito deputado federal, passou pela Câmara, sua presença não foi percebida  em 4 anos e partiu para pedidos estúpidos e que não colaram.  
Também o general Braga Netto não é um boquirroto, tipo o individuo eleito presidente, que expele mentiras, asneiras e promessas vãs.
Qualquer pessoa sensata pode concluir facilmente que é público e notório que até o 15º  corrido,  após a diplomação do eleito,  o seu mandato pode ser impugnado e, sendo preceito constitucional, o TSE tem o dever de analisar, julgar e proferir sentença  fundamentada sobre a impugnação requerida do mandato do eleito  - situação que justifica o estímulo dado pelo general aos apoiadores do presidente Bolsonaro, ao dizer que  "não perdessem a fé".]
 
Em O Globo - MATÉRIA COMPLETA 
 
 

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Sentença que condenou Bolsonaro vai ser encaminhada para Tribunal de Haia [qual o o valor desse TPP?]

A sentença do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) que condenou o presidente Jair Bolsonaro por crimes contra a humanidade durante a pandemia de Covid-19 vai ser encaminhada para o Tribunal Penal Internacional (TPI), o Tribunal de Haia, segundo Paulo Sérgio Pinheiro, membro da Comissão Arns. Ele disse à RFI que a decisão será anexada à denúncia, feita pela Comissão e pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que já corre no TPI.

Valéria Maniero, correspondente da RFI na Suíça

“Eu não sei se vai aumentar a pressão internacional, mas a sentença vai ser juntada à queixa que nós já fizemos com a Articulação dos Povos Indígenas no Tribunal Penal Internacional. O próximo passo concreto é isso. Eu espero que a Comissão [Arns] e as outras entidades [APIB, Internacional de Serviços Públicos e Coalização Negra por Direitos], passado o período eleitoral, possam vir a propor algumas outras iniciativas”, disse o diplomata brasileiro, ex-ministro de Direitos Humanos.

Segundo ele, “é claro que a sentença tem um valor simbólico muito grande por causa da conjuntura que nós estamos vivendo”. “Em termos do discurso do presidente Bolsonaro, ele continua a repetir, por exemplo, os ataques às mulheres, a misoginia dele. Agora, ele continua a repetir e achar que foi correta a política negacionista dele em relação à Covid”, disse o representante da Comissão Arns.

Entenda a decisão que condenou Bolsonaro
Na tarde desta quinta-feira, em São Paulo, o Tribunal Permanente dos Povos (TPP) condenou o presidente Jair Bolsonaro por crimes contra a humanidade durante a pandemia de Covid. De acordo com a sentença, se o país tivesse adotado uma política mais responsável, teriam morrido 100 mil pessoas a menos.

Com sede em Roma, na Itália, o TPP é um tribunal internacional de opinião, dedicado aos direitos dos povos.[Certamente o TPI tem assuntos de maior importância e não vai perder tempo pedindo opinião a certos tribunais.]  Foi criado em 1979 e é herdeiro do Tribunal Russell, constituído em 1966 para investigar crimes e atrocidades na guerra do Vietnã. Considerado uma expressão ativa de mobilização e articulação em defesa da Declaração Universal dos Direitos dos Povos, o TPP conta com a participação de entidades e movimentos sociais contra violações praticadas por autoridades públicas e agentes privados.

Segundo a sentença, “o crime pelo qual o presidente Bolsonaro foi responsável consiste em uma violação sistemática dos direitos humanos, por ter provocado a morte de dezenas de milhares de brasileiros devido à política insensata que promoveu em relação à pandemia de Covid-19”.

“Contrariando a posição unânime de cientistas de todo o mundo e as recomendações da Organização Mundial da Saúde, Bolsonaro não só fez com que a população brasileira não adotasse as medidas de distanciamento, isolamento, proteção e vacinação destinadas a limitar a infecção, como várias vezes criou vários obstáculos a elas, frustrando as tentativas de seu próprio governo de estabelecer políticas de alguma forma destinadas a proteger a população do vírus”, diz o texto.

A sentença informa que como resultado, calcula-se, fazendo uma comparação entre o número de mortes no Brasil e em outros países que adotaram as políticas recomendadas, que morreram no Brasil cerca de 100 mil pessoas a mais do que teriam falecido em decorrência de uma política mais responsável. “É claro que esse número é bastante aproximado: pode ser um número menor, mas também um número maior. O certo é que a absurda política de saúde do presidente Bolsonaro causou dezenas de milhares de mortes. Pois bem, tal conduta foi qualificada, pela sentença, como crime contra a humanidade”, diz o documento.

Por que se trata de crime contra a humanidade
Apesar de apontar a política desastrosa no combate à doença, a decisão do TPP não reconheceu na conduta de Bolsonaro a “intenção expressamente genocida”, “mas o enquadramento, não menos grave e igualmente imprescritível, como crime contra a humanidade".

Além da Comissão Arns, participaram do julgamento representantes de outras organizações responsáveis pela iniciativa, como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Coalizão Negra por Direitos e Internacional de Serviços Públicos. No fim do julgamento, que terminou com gritos de “Fora, Bolsonaro” e foi realizado na Faculdade de Direito da USP, a cantora Daniela Mercury cantou “O Samba não pode esperar” e o Hino Nacional.[essa cantora teve seu último sucesso na década de 90, por isso está se valendo do Hino Nacional.]

MSN - RFI - Transcrição


segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Quem julgará os julgadores? - Revista Oeste

Roberto Motta

No país dos juízes ativistas, justiça é item em falta no cardápio do brasileiro 
Foto: Shutterstock
Foto: Shutterstock

“Eles estão acostumados a deliberar sobre os assuntos
mais sérios enquanto estão bêbados,
e qualquer decisão que eles tomem nessas sessões é novamente proposta
a eles no dia seguinte pelo anfitrião em cuja casa eles deliberaram na noite anterior.
Então, se a decisão ainda os agrada quando estão sóbrios,
eles agem de acordo com ela; se não, eles desistem.
Por outro lado, quaisquer que sejam as decisões provisórias
que eles consideram enquanto estão sóbrios,
eles reconsideram quando estão bêbados.”

Heródoto, As Histórias, Livro 1, 1.33, Vários Costumes dos Persas

No domingo 7 de agosto de 2022o dia em que escrevo esse texto —, Thiago Duarte, empresário de 34 anos, acordou cedo para levar um amigo e o pai ao Aeroporto do Galeão.
No caminho, teve a mesma surpresa que milhões de brasileiros têm todos os dias: seu caminho foi bloqueado por assaltantes na Rua Conde de Agrolongo, na Penha, Rio de Janeiro. 
Não se sabem os detalhes, e eles não importam. 
O que importa é que Thiago foi baleado na barriga. Um tiro no abdômen causa intenso sangramento e uma dor insuportável. Thiago foi levado ao Hospital Getúlio Vargas, onde foi submetido a cirurgia, mas morreu. Thiago tinha dois filhos: Mateo, 5 anos, e Maya, nascida há 2 meses.
 
Thiago é apenas um dos 110 brasileiros que serão assassinados no dia de hoje. Esse massacre acontece todos os dias
O brasileiro planeja sua rotina tentando evitar ser alvo de criminosos.
As estatísticas mostram que isso é inútil. 
Quase todo mundo já foi, ou conhece alguém que já foi, vítima de um crime violento. Todos se queixam da violência. 
A sensação é de sufocamento. Como chegamos aqui?
 
Para entender o que está acontecendo, é preciso começar do início. Um bom começo é o vocabulário.
O Brasil não é um país “violento”. O Brasil é um país perigoso.  
Nosso problema não é “violência”. Nosso problema é uma crise de criminalidade sem precedentes nas democracias ocidentais desenvolvidas.
Um crime tem sempre um criminoso e uma vítima. O sistema de justiça criminal brasileiro funciona em função do criminoso e esquece a vítima. A legislação penal é cada vez mais branda. 
Um ativismo judicial sem precedentes coloca cada vez mais obstáculos à ação da polícia (nenhum exemplo supera a inacreditável decisão do STF na ADPF 635, que suspendeu as ações policiais nas comunidades do Rio de Janeiro, em junho de 2020, para “não atrapalhar o combate à pandemia”).

Para entender o que está acontecendo é preciso, primeiro, esquecer a ideologia e rever algumas lições aprendidas no mundo, há muito tempo, sobre crime — mas que ainda são quase desconhecidas no Brasil.

Indivíduo X sociedade
O crime pode ser examinado sob dois pontos de vista. O primeiro é o ponto de vista do indivíduo. O outro é o ponto de vista da sociedade.

Do ponto de vista do indivíduo, o crime é sempre uma escolha feita pelo criminoso. Até o último momento, o bandido sempre tem a opção de não apertar o gatilho, não enfiar a faca e não violentar uma mulher ou uma criança. Com exceção dos casos em que há desequilíbrio mental, os crimes — inclusive ou principalmente aqueles crimes mais violentos e depravados — são sempre o resultado de uma decisão consciente tomada por um indivíduo.

A deformidade moral que retira do criminoso a capacidade de sentir empatia pelas vítimas faz com que a maioria deles opte por uma carreira vitalícia no crime

Mas por que alguém toma a decisão de ferir, matar ou violentar outro ser humano? O psiquiatra forense Stanton Samenow, autor do livro A Mentalidade Criminosa, já respondeu a essa pergunta. Depois de analisar milhares de casos de criminosos durante a sua carreira, Samenow concluiu que os criminosos pensam de forma diferente de nós; eles não conseguem ter empatia, são indivíduos que não se importam com o sofrimento dos outros. 
Embora quase sempre criados em famílias, junto com vários irmãos, enfrentando as mesmas dificuldades e recebendo a mesma educação, só eles escolheram o caminho do crime.

A deformidade moral que retira do criminoso a capacidade de sentir empatia pelas vítimas faz com que a maioria deles opte por uma carreira vitalícia no crime. Pouca diferença faz se eles são ricos ou pobres, se têm uma profissão ou se vivem de expedientes, se são analfabetos ou muito cultos; a verdade é que, dada uma oportunidade, cometerão os crimes

A lista de crimes abjetos cometidos por anestesistas, ginecologistas, banqueiros, empresários, pilotos, parlamentares e professores mostra que não há nenhuma relação entre a decisão do indivíduo de cometer o crime e sua renda, instrução ou classe social.

Crime é uma questão de escolha, não de escola.

A conclusão é clara: do ponto de vista do indivíduo, crime é resultado de uma ação consciente do criminoso, pela qual ele deverá ser responsabilizado. Não deveria haver mais nenhum debate sobre uma verdade tão evidente, tão fartamente documentada e tão aceita em todo o ocidente democrático. Mas no Brasil isso ainda é motivo de debate.

Do ponto de vista da sociedade, o ato criminoso é uma decisão que o criminoso toma depois de avaliar os riscos e os benefícios envolvidos. Essa foi a tese que deu ao economista norte-americano Gary Becker o Prêmio Nobel de Economia em 1992. Antes de cometer o crime, o criminoso se faz, instintivamente, duas perguntas. A primeira pergunta é: qual a chance de eu ser preso? A segunda pergunta é: se eu for preso, o que acontece?

No Brasil de hoje, as respostas são: a probabilidade de você ser preso é muito pequena e, se você for preso, enquanto estiver na cadeia gozará de inúmeros benefícios e direitos a maioria deles desconhecida nas outras democracias ocidentais. Mas, de qualquer forma, independente do crime, você ficará pouco tempo em uma cela de prisão.

No Brasil, mesmo os autores dos crimes mais violentos e depravados como o criminoso que violentou, amarrou e queimou vivo o menino Lucas Terra, em Salvador, em 2003 raramente ficam mais de dez anos em uma cela. Nem quando a vítima é um jornalista conhecido, um membro da mídia — como foi o caso do jornalista Tim Lopes, que foi sequestrado, torturado e assassinado em uma favela do Rio, em 2002 —, nem assim a punição dos criminosos se parece ainda que remotamente com justiça. Um dos assassinos de Tim Lopes recebeu o “benefício da progressão para o regime semiaberto” depois de apenas cinco anos preso e aproveitou a oportunidade para fugir
O outro assassino também recebeu o mesmo benefício dois anos depois e fez a mesma coisa: fugiu.

Estima-se que ocorram no Brasil 6 milhões de assaltos por ano, 2 milhões deles só nas capitais. A única estatística disponível revela que apenas 2% desses assaltos são esclarecidos. Dizendo de outra forma: a chance de sucesso de um assaltante no Brasil é de 98%. É um cenário irresistível para aqueles indivíduos nos quais a ausência de barreiras morais e a incapacidade de empatia com o sofrimento alheio criam a disposição de conseguir riquezas, diversão e prazer através do crime.

Bolas azuis
Imagine na sua frente uma parede branca, totalmente preenchida com desenhos de bolas azuis. Essa é uma representação da sociedade. Aqui e ali, espalhadas pela parede, estão algumas bolas amarelas. Digamos que, para cada cem bolas azuis, há uma bola amarela. As bolas amarelas representam os criminosos potenciais. São os lobos à espreita, em busca de uma oportunidade para atacar as ovelhas.

Enquanto você continua a olhar a parede, observe que algumas bolas amarelas se tornam vermelhas. Esses são os criminosos que resolveram agir. São os lobos que assaltam, estupram, sequestram e matam. Todas as sociedades contêm, no seu meio, um determinado número de criminosos potenciais. Por isso existe crime em todos os países do mundo, mesmo nas sociedades mais desenvolvidas. O que determina quantos desses criminosos potenciais se transformarão em criminosos reais é a percepção que eles têm dos riscos que correm ao cometer um crime.

Dizendo de outra forma: quanto mais fracas as leis, maior será o número de crimes cometidos. Quanto mais ineficiente e injusto o sistema de justiça criminal, maior a ousadia dos bandidos. 
 Quanto maiores os benefícios e os direitos dos criminosos presos, menor será o medo que eles terão de ser presos e punidos.

No Brasil ocorre uma crise de criminalidade sem paralelo entre as democracias ocidentais. O brasileiro vive sob a ameaça constante de ser vítima de um crime violento. Isso não é uma situação normal. Para responder a esta crise, e reconquistar a liberdade de viver vidas normais, é preciso entender dois pontos fundamentais.

O primeiro é que o crime é uma decisão individual do criminoso, que deve ser responsabilizado por ela de forma proporcional à gravidade dos danos que causou. Ou, dizendo em outras palavras: a sentença do criminoso nunca pode ser mais leve do que a sentença da vítima.

O segundo ponto é que o criminoso, antes de agir, analisa os riscos e os benefícios do crime. Por isso, cometer um crime não pode ser um bom negócio para o criminoso.

Hoje, no Brasil, o crime é um excelente negócio.

Para mudar isso precisamos corrigir o sistema de justiça criminal, que foi capturado por interesses ideológicos, populistas e até criminosos. Esses interesses — um verdadeiro consórcio de veículos do mal — trabalham todos os dias para reduzir as punições e criar direitos e benefícios para os bandidos.

O cidadão de bem é penalizado duplamente: primeiro, quando é vítima de um crime violento, e, depois, quando descobre que nunca será feita a justiça.

É isso que acontece no Brasil.

Leia também “O animal político”

Roberto Motta, colunista - Revista Oeste